Abordagem

O manejo do transtorno bipolar é complexo por causa da natureza recorrente da doença, com episódios de alternância da polaridade do humor (depressiva versus maníaca ou hipomaníaca), assim como por apresentações mais complexas de características mistas: ciclagem rápida, transtorno bipolar psicótico e transtorno bipolar refratário a tratamento.

A melhor abordagem de tratamento vai além da resolução dos episódios agudos e leva em consideração a necessidade de propor simultaneamente uma estratégia individualizada que possa prevenir episódios futuros ou que resulte na redução da frequência dos episódios e em uma melhora da capacidade funcional e da qualidade de vida. Os fundamentos do manejo incluem o acesso a serviços, a segurança do paciente e de outras pessoas, e esforços de cuidados reforçados (aliança terapêutica, educação para o paciente e familiares, adesão ao tratamento e manejo do comprometimento funcional).[103]​​[104]​​ O tratamento de comorbidades clínicas e psiquiátricas e a mitigação do risco de suicídio são outros aspectos importantes do manejo.[84]

As recomendações a respeito deste tópico se baseiam principalmente nas orientações da Canadian Network for Mood and Anxiety Treatments (CANMAT).[5][36]​​ Essa é uma das várias diretrizes internacionais publicadas recentemente que orientam a seleção do tratamento do transtorno bipolar.[29][36][103]​​​​[105][106]​​​​​​ Existem diferenças entre as recomendações das diretrizes. Via de regra, todas as diretrizes possibilitam uma variedade substancial entre as opções de primeira linha, já que os tamanhos dos efeitos são modestos e semelhantes entre as classes de medicamentos. Muitas das recomendações de tratamento de última linha se baseiam no parecer de especialistas, o que reflete a escassez de evidências, especialmente no que se refere ao tratamento de pacientes mais complexos, por exemplo, aqueles com comorbidades psiquiátricas e aqueles que necessitam de polimedicação para controlar os sintomas. Em geral, há uma relativa falta de evidências sobre o tratamento do transtorno bipolar II em comparação com o bipolar I, já que poucos ECRs têm se concentrado em tratamentos para a bipolaridade II.

Na prática, dada a incerteza acima, a escolha da farmacoterapia depende de vários fatores, tais como diretrizes locais, polaridade e gravidade dos sintomas, preferência do paciente, história de tratamento, presença de comorbidades e problemas de tolerabilidade anteriores.[107]​ Considere os perfis de efeitos colaterais em curto e longo prazos da farmacoterapia e, sempre que possível, selecione medicamentos com perfis de tolerabilidade mais seguros, uma vez que se acredita que os efeitos adversos dos medicamentos para o transtorno bipolar sejam responsáveis por grande parte do aumento da mortalidade padronizada (aproximadamente 2.6 vezes maior) em pessoas com transtorno bipolar, em comparação com a população em geral.[107][108]

O lítio continua sendo o medicamento mais efetivo para o transtorno bipolar I, demonstrando efeitos antimaníacos, antidepressivos e antissuicidas. No entanto, ele está associado a várias questões sérias sobre tolerabilidade e segurança, inclusive tremor, poliúria, comprometimento cognitivo, ganho de peso, toxicidade renal, índice terapêutico estreito e alto risco de superdosagem.[84]​ Os antipsicóticos atípicos têm demonstrado eficácia tanto na mania quanto na depressão mas, como classe, estão associados a ganho de peso, síndrome metabólica, aumento da prolactina, sedação, acatisia, prolongamento do intervalo QT e discinesia tardia. Vale ressaltar que alguns antipsicóticos atípicos (por exemplo, a olanzapina) têm uma carga de efeitos colaterais mais intensa do que outros.[84][109]​​​​ Por se tratar de uma classe mais nova de medicamentos, atualmente, não há dados sobre os efeitos dos antipsicóticos atípicos em longo prazo. O divalproato de sódio é efetivo para a mania, embora os dados sobre a eficácia na depressão e na prevenção de recorrências em longo prazo sejam menos sólidos.[84] Os efeitos adversos do divalproato de sódio incluem uma teratogenicidade intensa se administrado durante a gravidez, síndrome do ovário policístico, hepatotoxicidade e pancreatite.[84]

A redução do discernimento pode afetar a disposição dos pacientes para aceitarem o tratamento; sempre que possível incentive a tomada de decisão compartilhada sobre o plano de tratamento, pois ela pode melhorar a adesão ao tratamento. A estreita colaboração com os pacientes e familiares pode ajudar a identificar os períodos em que o risco de recidiva é alto, o que permite ajustar o tratamento em tempo hábil.[110]​ A tecnologia por smartphones representa um método promissor para aprimorar o monitoramento dos sintomas e a colaboração entre pacientes e médicos, embora, até o momento, não tenha demonstrado melhorar os desfechos e ainda não faça parte do tratamento de rotina para o transtorno bipolar.[111][112][113][114]​​​​​​​

O tempo de resposta ao tratamento varia entre os pacientes e de acordo com a natureza do episódio agudo (por exemplo, presença de sintomas maníacos ou depressivos). Via de regra, o tratamento farmacológico para a mania aguda deve produzir uma resposta dentro de 2 semanas; depois disso, deve-se considerar que os pacientes não apresentam resposta a medicamentos específicos em dosagens específicas.[36] Para a depressão bipolar aguda e episódios mistos agudos, a resposta ao tratamento pode demorar mais, e a melhora pode ser mais sutil.[105]

As definições variam e os dados compostos são inconsistentes, mas o transtorno bipolar resistente a tratamento foi definido em um estudo como "incapacidade de alcançar remissão sintomática sustentada por 8 semanas consecutivas após duas tentativas de tratamento diferentes, em doses terapêuticas adequadas, com pelo menos dois tratamentos em monoterapia recomendados ou pelo menos um tratamento em monoterapia e outro tratamento em combinação".[115]​ Se não houver resposta ao tratamento, os médicos deverão explorar com sensibilidade a possibilidade de não adesão, problemas com uso de substâncias ou álcool ou outras comorbidades como possíveis fatores contribuintes.[84]​ As opções de tratamento de linhas adicionais têm uma base de evidências muito limitada, e a maioria é usada off-label; assim, elas devem ser consideradas por um especialista quando os pacientes não responderem a várias tentativas adequadas de opções de primeira e segunda linha isoladas ou combinadas.[36]

É essencial observar que há uma substancial variação internacional na abordagem do tratamento do transtorno bipolar, cabendo aos médicos se familiarizarem com as diretrizes locais.

A tabela abaixo resume os medicamentos comumente usados para o transtorno bipolar e inclui evidências de eficácia para diferentes subtipos e estágios do tratamento da bipolaridade.

Observe que, desde que a tabela inicial foi produzida em 2018, outros medicamentos foram aprovados para o transtorno bipolar, embora seu uso não faça parte da prática clínica de rotina atualmente (consulte a seção Novos tratamentos para obter exemplos).

[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Medicamentos aprovados pela FDA para o transtorno bipolarAdaptado de Butler M, et al. Treatment for Bipolar Disorder in Adults: A Systematic Review [Internet]. Rockville (MD): Agency for Healthcare Research and Quality (US); 2018 Aug. (Comparative Effectiveness Review, No. 208.) Tabela 1, medicamentos aprovados para o transtorno bipolar Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/sites/books/NBK532193/table/ch2.tab1; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@500979f3

Manejo do quadro agudo de mania ou hipomania

O tratamento da mania é uma emergência psiquiátrica e, muitas vezes, requer internação hospitalar, uma vez que os comportamentos de risco na mania podem ter consequências pessoais, ocupacionais e financeiras substancialmente negativas.[107] Embora existam várias diferenças entre as recomendações das diretrizes internacionais, muitas priorizam o uso de antipsicóticos atípicos (por exemplo, aripiprazol, asenapina, cariprazina) para as pessoas com sintomas maníacos mais graves que exijam tratamento rápido, com base em sua eficácia e no início de ação rápido.[116] O lítio, o divalproato de sódio e a carbamazepina são também recomendados com frequência, dada sua eficácia comprovada na mania. Normalmente, o lítio é recomendado como opção de primeira linha para quem não precisa de uma resolução rápida dos sintomas.[84][107][117]

Vale ressaltar que as orientações sobre as opções de tratamento de primeira linha variam internacionalmente. A abordagem para pacientes com mania com agitação e com mania sem agitação descrita nos itens abaixo geralmente se alinha com as orientações do CANMAT, cabendo aos médicos também conhecerem suas diretrizes locais.[36]​ No Reino Unido, o National Institute for Health and Care Excellence (NICE) recomenda o haloperidol, a olanzapina, a quetiapina ou a risperidona como possíveis opções de primeira linha para a mania, levando em consideração a preferência do paciente, a resposta prévia aos tratamentos e as comorbidades. Se o primeiro antipsicótico for inefetivo ou mal tolerado, ofereça um antipsicótico alternativo dentre os listados. O NICE recomenda que, se o antipsicótico alternativo não for efetivo à dose máxima, os médicos considerem a adição de lítio.[29]

Antes de iniciar o tratamento, descarte sintomas secundários a transtornos por uso de substâncias, drogas ou comorbidades clínicas (no entanto, se estiverem presentes, os medicamentos antimaníacos ainda devem ser considerados por um prazo curto).[36] Considere se é necessário encaminhamento para serviços de assistência a transtornos relacionados ao uso de substâncias. Descontinue os antidepressivos; se for a primeira aparição de sintomas maníacos em um paciente que toma antidepressivos, confirme o diagnóstico de transtorno bipolar antes de iniciar o tratamento antimaníaco, observando o paciente por um período após a descontinuação do antidepressivo, para verificar se os sintomas persistem.[29][36]

Mania com agitação

  • Os casos de pacientes gravemente afetados e/ou aqueles sem percepção de sua doença talvez exijam uma internação psiquiátrica urgente para garantir a sua segurança e a segurança de outras pessoas.[29][36]

  • Para os pacientes agitados com mania, forneça o tratamento inicial em um ambiente tranquilo, com redução de estímulos, e tente a tranquilização verbal.[110]

  • O primeiro passo no controle da agitação é tentar prevenir ou pelo menos mitigar a intensidade tratando rapidamente o episódio maníaco causador (consulte abaixo).

  • A terapia inclui farmacoterapia para reduzir rapidamente os sintomas maníacos e minimizar os efeitos adversos. O manejo do episódio maníaco causador é geralmente o mesmo para os pacientes com mania aguda sem agitação; no entanto, em circunstâncias específicas, por exemplo quando há mania grave com agitação e é necessária uma resposta rápida ao tratamento, pode-se considerar o tratamento combinado desde o início com um estabilizador do humor associado a um antipsicótico.[36]

  • Quando a agitação persiste ou se agrava apesar do manejo agressivo da mania aguda, pode ser necessária a administração de um antipsicótico ou benzodiazepínico não oral de ação rápida. As opções de primeira linha sugeridas incluem a olanzapina intramuscular, a loxapina inalatória ou o lorazepam intramuscular.[36] O lorazepam pode ser usado como adjuvante ou como monoterapia.[36] As opções de segunda linha recomendadas incluem a asenapina sublingual, o comprimido de risperidona de dissolução oral, a ziprasidona intramuscular, o haloperidol intramuscular, e o haloperidol intramuscular associado a prometazina.[36]

  • Vale destacar que existem diferenças internacionais nas recomendações de medicamentos não orais de ação rápida para o controle da agitação. Isso é por vezes chamado de "tranquilização rápida". As orientações do NICE do Reino Unido recomendam a monoterapia com lorazepam intramuscular ou a terapia combinada com haloperidol intramuscular e prometazina intramuscular para tranquilização rápida nos adultos.[118] É importante observar que o NICE recomenda o uso de lorazepam intramuscular em vez do haloperidol intramuscular associado a prometazina se houver evidências de doença cardiovascular, inclusive intervalo QT prolongado, ou se nenhum ECG tiver sido realizado.[118]

  • Em alguns casos, talvez não se consiga a cooperação imediata do paciente, havendo necessidade de administração forçada ou involuntária da medicação (por exemplo, quando a saúde e a vida do paciente ou de outras pessoas estiver em risco).

Mania sem agitação

  • A monoterapia é um ponto de partida razoável para muitos pacientes, especialmente aqueles sem doença complexa; no entanto, o tratamento combinado pode eventualmente ser necessário para controlar adequadamente os sintomas. Algumas diretrizes internacionais (por exemplo, da Canadian Network for Mood and Anxiety Treatments) recomendam o tratamento combinado com um estabilizador do humor e um antipsicótico como opção de primeira linha.[36] No entanto, outras diretrizes e muitos médicos preferem a monoterapia antes da terapia combinada por causa dos possíveis riscos da polimedicação.[29]​ Em casos específicos, pode-se considerar o tratamento combinado. Esta é uma decisão clínica e depende da gravidade da doença do paciente, da rapidez necessária para resposta ao tratamento (tratamentos combinados tendem a agir mais rapidamente), da resposta prévia aos tratamentos, de questões de tolerabilidade com a terapia combinada e da preferência do paciente. Com frequência, os pacientes preferem a monoterapia, porém a maioria dos especialistas e a experiência clínica sugerem que uma combinação é mais efetiva.[119][120][121][122]

  • Para os pacientes com mania aguda, o lítio é efetivo e deve ser considerado como monoterapia de primeira linha, a menos que haja razões específicas para não fazê-lo, por exemplo quando é necessária uma resolução rápida dos sintomas. Uma vantagem importante do lítio é o seu efeito robusto na prevenção de episódios de humor futuros.[36][123][124] [ Cochrane Clinical Answers logo ] [Evidência B]​​​ Outras opções iniciais de primeira linha para monoterapia são o divalproato de sódio ou um antipsicótico atípico, incluindo o aripiprazol, a asenapina, a cariprazina, a paliperidona, a risperidona ou quetiapina.[36] [ Cochrane Clinical Answers logo ] [Evidência A] [ Cochrane Clinical Answers logo ] [Evidência B]​ O uso da paliperidona para o transtorno bipolar é "off-label" e não recebeu aprovação para essa indicação.

  • A carbamazepina, a olanzapina, a ziprasidona e o haloperidol são recomendados como opções secundárias para monoterapia em decorrência dos efeitos adversos associados; normalmente, os médicos devem considerar as opções primárias antes de considerar qualquer opção secundária, a menos que haja outros fatores relevantes, como história de efeitos adversos ou a de resposta a um medicamento de primeira linha em particular, ou a preferência do paciente.[36]

  • Se o tratamento antimaníaco inicial for efetivo, espere uma resposta ao tratamento em 1 a 2 semanas.[36] Para os pacientes que não responderem durante este período, otimize a dose e verifique a adesão à medicação. Se a resposta permanecer inadequada, a próxima etapa é mudar para uma escolha alternativa de monoterapia com um estabilizador do humor ou antipsicótico, ou usar um tratamento combinado com um estabilizador do humor e um antipsicótico (normalmente, adicionando-se outro medicamento). Na experiência do autor, a mudança para outra forma de monoterapia é preferencial se houver preocupações acerca da tolerabilidade com a escolha inicial da monoterapia; na mania aguda, quando um paciente não estiver bem e não tiver respondido ao tratamento inicial, a opção mais rápida e efetiva geralmente é prosseguir para a terapia combinada. Os regimes de combinação recomendados a serem considerados primeiro incluem o lítio ou o divalproato de sódio associados a um antipsicótico atípico (por exemplo, risperidona, quetiapina, aripiprazol ou asenapina).[36] Caso não haja resposta à segunda opção de terapia após 2 semanas, otimize a dose e verifique a adesão à medicação.

  • Considere a eletroconvulsoterapia (ECT) adjuvante para as pessoas com transtorno bipolar que estiverem gravemente enfermas, catatônicas ou que não apresentarem resposta a várias tentativas de medicação.[29][36][125][126]​​​​ A ECT pode também ser considerada quando os riscos da medicação forem maiores que os riscos da ECT (por exemplo, nas pessoas com idade mais avançada ou mais clinicamente frágeis), ou se a pessoa preferir esta opção.[127]

  • As opções de tratamento de terceira linha têm uma base de evidências limitada, e a maioria é usada off-label; assim, devem ser consideradas por um especialista quando os pacientes não responderem a várias tentativas adequadas de opções de primeira e segunda linhas isoladas ou em combinação.[36]

  • As evidências para as técnicas de estimulação cerebral têm aumentando e, nos pacientes resistentes à farmacoterapia, pode-se considerar uma tentativa de estimulação magnética transcraniana (EMTr) como adjuvante.[36][110]

Hipomania

  • Para alguns pacientes, a hipomania pode ser curta e resultar em comprometimento funcional mínimo; se assim for, o tratamento pode não ser recomendado. No entanto, o tratamento é necessário se os sintomas forem prolongados, graves e/ou associados a comprometimento funcional significativo. O tratamento costuma ser o mesmo fornecido para tratar a mania, com os estabilizadores do humor como o lítio ou o divalproato de sódio e/ou os antipsicóticos atípicos usados com frequência.[36]

Manejo do quadro agudo da depressão bipolar

Os episódios de depressão são comuns e, muitas vezes, representam o principal motivo para as pessoas com transtorno bipolar buscarem tratamento.[107]​ Os pacientes com depressão bipolar I devem ter tido pelo menos um episódio maníaco ou misto em algum momento da evolução da doença.[1]​ Os pacientes com depressão bipolar II devem ter tido pelo menos um episódio de hipomania anteriormente.[1]

Antes de iniciar o tratamento farmacológico para um episódio depressivo bipolar, é importante descartar sintomas secundários ao uso de bebidas alcoólicas/drogas, medicamentos, outros tratamentos ou afecções clínicas gerais. Use uma técnica como uma entrevista motivacional para ajudar os pacientes a descontinuarem o uso de estimulantes e a limitarem o uso de nicotina, cafeína, drogas e álcool; considere se é necessário encaminhamento para serviços de assistência a transtornos relacionados ao uso de substâncias.[36][128]

O manejo do risco de suicídio é imperativo por causa do alto risco de suicídio para as pessoas com transtorno bipolar durante um episódio depressivo, sendo que mais de 70% das tentativas de suicídio ou mortes ocorrem durante a fase depressiva do transtorno bipolar.[34][36]

É importante observar as diferenças internacionais na abordagem. A abordagem dos pacientes com depressão bipolar I e depressão bipolar II descrita nos itens abaixo geralmente se alinha às recomendações das diretrizes do CANMAT; os médicos devem consultar as orientações locais. A orientação do NICE no Reino Unido não distingue entre depressão bipolar I ou bipolar II em termos de manejo.[29][36]​​​ De acordo com o NICE, o tratamento de primeira linha em alguém que não esteja tomando nenhum medicamento para tratar a depressão bipolar é oferecer monoterapia com quetiapina (ou olanzapina/fluoxetina, que é a terceira linha em outros países), dependendo da preferência da pessoa e da resposta prévia ao tratamento. Como alternativa, considere a monoterapia com olanzapina ou lamotrigina. Se uma pessoa desenvolver depressão bipolar moderada ou grave e já estiver tomando lítio, o NICE recomenda verificar os níveis plasmáticos de lítio e aumentar a dose se estiver inadequada. Se o lítio estiver no nível máximo, adicione quetiapina (ou olanzapina/fluoxetina), monoterapia com olanzapina ou lamotrigina, dependendo da preferência da pessoa e da resposta prévia ao tratamento. O NICE também recomenda que as pessoas com depressão bipolar recebam terapia psicológica concomitante.[29]

Depressão bipolar I

  • É importante destacar que existem diferenças internacionais na abordagem do tratamento, e algumas diretrizes de tratamento (por exemplo, do NICE no Reino Unido) não distinguem entre bipolar I e bipolar II em termos de recomendações de tratamento (veja acima).[29]

  • ​​ O uso de antidepressivos pode causar o surgimento de mania ou episódio misto ou ciclagem rápida; além disso, os antidepressivos não foram associados à remissão duradoura ou à recuperação da depressão bipolar.[129][130]

  • As opções de primeira linha para o manejo do quadro agudo de depressão bipolar I incluem a quetiapina, a lamotrigina, o lítio ou a lurasidona.[36][131][132][133]

  • A lurasidona pode ser usada isoladamente ou em conjunto com o lítio ou o divalproato de sódio.[36][132]​ A escolha do tratamento inicial é influenciada por fatores como respostas prévia e presente à medicação, segurança e tolerabilidade dos medicamentos e preferência do paciente. Por exemplo, se um paciente for estabilizado com um medicamento específico (por exemplo, lítio) e apresentar um episódio incidental de depressão, considere adicionar um antipsicótico de primeira linha (por exemplo, quetiapina, lamotrigina ou lurasidona) ou mudar para monoterapia com quetiapina ou lamotrigina. Ao avaliar a resposta ao tratamento, a ausência de melhora inicial (em 2 semanas) é um preditor robusto de ausência de resposta.[134] A lamotrigina é uma exceção, devido à necessidade de ajuste lento da dose ao se iniciar esse medicamento.

  • Se os pacientes não responderem adequadamente à primeira escolha de tratamento, otimize a dosagem e explore a adesão antes de mudar o tratamento. Se continuar a haver uma resposta insatisfatória ao tratamento inicial, considere mudar para um medicamento de primeira linha alternativo ou adicionar outro medicamento de primeira linha (por exemplo, adicionando lítio ou divalproato de sódio a um antipsicótico atípico). Em geral, uma mudança de tratamento é preferível a adicionar outro tratamento por causa dos riscos associados à polimedicação; no entanto, em alguns casos, uma polimedicação cuidadosa pode ser necessária para controlar adequadamente os sintomas, uma vez que um único medicamento pode ser efetivo contra alguns, mas não contra todos os componentes da doença do paciente. Ao decidir trocar ou adicionar um medicamento, leve em consideração o efeito de um determinado medicamento no tratamento do transtorno bipolar do paciente como um todo; por exemplo, considere manter o lítio ou um antipsicótico atípico mesmo que sejam inefetivos no tratamento da depressão do paciente, em decorrência do seu papel na profilaxia antimania, e adicionar outro medicamento no caso de uma falha do tratamento inicial em vez de trocar. Se a troca da medicação for necessária, deverá ser feita como uma sobreposição e esquema de retirada gradual em vez de se interromper abruptamente, a menos que haja uma justificativa convincente para a interrupção abrupta.[36]

  • Se um paciente não apresentar melhora adequada após várias tentativas com agentes de primeira linha, outros medicamentos que podem ser considerados como terapia adicional ou alternativa incluem a olanzapina/fluoxetina e a cariprazina.[36][133][135][136]​​​​ Como alternativa, um antidepressivo adjuvante (por exemplo, um inibidor seletivo de recaptação da serotonina como o escitalopram, ou bupropiona) pode ser considerado em conjunto com o lítio ou divalproato de sódio, ou um antipsicótico atípico como tratamento adicional.[36][130][137]

  • Os antidepressivos devem ser evitados nos pacientes com características mistas (veja abaixo) e naqueles com história de mania ou hipomania induzida por antidepressivos, ou ciclagem rápida recente (veja abaixo). Os pacientes e cuidadores devem ser avisados sobre os sintomas de alerta precoce de mudança para mania ou aceleração do ciclo, e os antidepressivos devem ser suspensos caso surjam esses sintomas. A monoterapia com antidepressivos não é adequada para o tratamento da depressão bipolar I.[36]

  • Considere a ECT como tratamento adjuvante para os pacientes com um episódio depressivo bipolar I que não apresentarem resposta a várias tentativas adequadas de medicamentos.[36] A ECT é também indicada para a depressão bipolar caracterizada por probabilidade aguda de suicídio/alto risco de suicídio; manifestações psicóticas ou catatônicas; rápida deterioração da condição física causada pela depressão, como anorexia; quando os riscos dos medicamentos superarem os riscos da ECT (por exemplo, em pessoas idosas ou clinicamente frágeis); nas pessoas com história prévia de boa resposta à ECT; ou se houver preferência do paciente pela ECT.[127]

  • As opções de tratamento de linhas adicionais têm uma base de evidências limitada, e a maioria é usada off-label; assim, devem ser consideradas por um especialista quando os pacientes não responderem a várias tentativas adequadas de opções de primeira e segunda linhas isoladas ou em combinação.[36]

  • Os procedimentos adjuvantes que podem ser benéficos em associação com a medicação são a fototerapia, com ou sem privação total do sono, ou a estimulação magnética transcraniana repetitiva (EMTr).[138][139]

  • Esses tratamentos podem ser considerados por um especialista na atenção secundária, levando em conta os fatores individuais do paciente.[36]

  • A adição de intervenções psicossociais para a depressão bipolar tem sido associada a taxas de recuperação mais altas em 1 ano, bem como a menores tempos de recuperação, sendo apoiada por diretrizes internacionalmente.[29][36][140][141]

  • Pacientes com depressão bipolar que receberam qualquer 1 das 3 modalidades principais de psicoterapia intensiva (terapia focada na família, terapia do ritmo interpessoal e social, terapia cognitivo-comportamental) relataram melhor capacidade funcional geral, melhor capacidade funcional de relacionamento e maior satisfação com a vida durante um período de 9 meses de acompanhamento.[140][141]

Depressão bipolar II

  • É importante destacar que existem diferenças internacionais na abordagem do tratamento, e algumas diretrizes de tratamento (por exemplo, do NICE no Reino Unido) não distinguem entre bipolar I e bipolar II em termos de recomendações de tratamento (veja acima).[29]

  • Há menos evidências sobre o manejo do quadro agudo da depressão bipolar II, em comparação com a depressão bipolar I; em termos gerais, o tratamento agudo da depressão bipolar II é similar ao tratamento agudo da depressão bipolar I, com o uso de estabilizadores do humor e antipsicóticos. Embora os antidepressivos possam ter uma relação risco-benefício mais favorável do que na depressão bipolar I, seu uso permanece controverso por causa do risco de mudança para hipomania/mania, estado misto ou ciclagem rápida.[36]

  • A monoterapia com quetiapina é recomendada como primeira linha, a menos que haja motivos específicos para não usá-la (por exemplo, falta de resposta prévia ou questões de tolerabilidade).[133][142][143]​​​​ A quetiapina também demonstrou eficácia como tratamento adjuvante para a depressão bipolar II.[144][145]​​ Avalie a resposta após 2 semanas de tratamento; em caso de resposta limitada ou ausência de resposta ao tratamento inicial, otimize a dosagem e avalie a adesão antes de ajustar as estratégias de tratamento.

  • O lítio e a lamotrigina são opções de segunda linha. A monoterapia de curta duração com os antidepressivos sertralina ou venlafaxina é também uma opção de segunda linha, mas adequada apenas para os pacientes com depressão pura (sem características mistas).[146][147][148]​​ A ECT adjuvante é outra opção de segunda linha, e pode ser adequada para os pacientes com sintomas refratários a tratamento e para aqueles com necessidade de resposta rápida.

  • As opções de tratamento de linhas adicionais têm uma base de evidências limitada, e a maioria é usada off-label; assim, devem ser consideradas por um especialista quando os pacientes não responderem a várias tentativas adequadas de opções de primeira e segunda linhas isoladas ou em combinação.[36]

  • A adição de intervenções psicossociais para a depressão bipolar tem sido associada a taxas de recuperação mais altas em 1 ano, bem como a tempos de recuperação mais curtos, e é apoiada por diretrizes internacionais.​[29][36][140][141]​​ Pessoas com depressão bipolar que receberam qualquer uma de 3 psicoterapias intensivas (terapia focada na família, terapia interpessoal e de ritmo social, terapia cognitivo-comportamental) relataram melhor capacidade funcional geral, melhor capacidade funcional de relacionamento e maior satisfação com a vida durante um período de 9 meses de acompanhamento.[140][141]​​ Os resultados de um estudo piloto pequeno, de 12 semanas, sugerem que a terapia interpessoal e de ritmo social e o tratamento com quetiapina são igualmente efetivos no tratamento agudo de pessoas com depressão bipolar II.[149]

Manejo do quadro agudo de características mistas

Os episódios mistos são caracterizados pela coexistência de sintomas simultâneos de depressão e mania, e podem representar um estado ainda mais difícil de ser tratado. As apresentações mistas estão associadas a um maior risco de tentativas de suicídio; é imperativo avaliar e mitigar cuidadosamente o risco de suicídio, inclusive determinar o cenário de tratamento mais adequado.[4][5]

O manejo inicial quando o paciente apresenta características mistas é avaliar possíveis contribuintes e quadros clínicos alternativos (por exemplo, distúrbio endócrino, transtornos de personalidade, TDAH, transtornos por uso de substâncias e indução iatrogênica de sintomas (por exemplo, com antidepressivos ou estimulantes).[5] Os médicos devem considerar seriamente a redução gradual e/ou a descontinuação cuidadosa dos antidepressivos nos pacientes que já os estiverem tomando, com base em uma avaliação dos riscos individuais versus benefícios da redução ou interrupção do antidepressivo; a redução gradual e/ou a descontinuação devem sempre ser acompanhadas de monitoramento cuidadoso para um agravamento dos sintomas depressivos.[5] É importante saber que os antipsicóticos, o lítio e o divalproato de sódio podem causar sedação, embotamento emocional ou lentificação psicomotora que podem mimetizar sintomas depressivos em uma apresentação mista; portanto, os médicos devem comparar o início dos sintomas do tipo misto com o momento da introdução ou das mudanças nos medicamentos.[5]

Para os pacientes com características mistas, a maioria das diretrizes de tratamento é a favor do tratamento dos sintomas maníacos concomitantemente à redução e descontinuação de quaisquer antidepressivos que estejam sendo utilizados.[36][150]​ Estudos sugerem que as características mistas indicam uma evolução mais grave da doença, e o tratamento combinado costuma ser necessário para controlar os sintomas de maneira adequada.[36][151] Existem diferenças internacionais na abordagem, cabendo aos médicos consultarem as diretrizes de tratamento locais com relação ao manejo das características mistas.

Embora as recomendações apresentadas neste tópico nos marcadores abaixo estejam, em geral, alinhadas com o CANMAT, observe que outras diretrizes internacionais (inclusive as orientações do NICE no Reino Unido) não recomendam um ciclo específico de tratamento para os pacientes com episódios mistos.[29]​ Em vez disso, o NICE recomenda o tratamento da mania, com rigoroso monitoramento para o surgimento de depressão.[29]

Embora não existam estudos que examinem especificamente o papel das intervenções não farmacológicas nas apresentações mistas, a opinião de especialistas apoia o uso da psicoeducação e/ou de outras intervenções psicossociais baseadas em evidências nos estados de humor bipolar.[5]

Características mistas: observação importante na seleção do tratamento

A evolução dos critérios diagnósticos para características mistas no transtorno bipolar representa um desafio para a seleção de tratamentos baseados em evidências, uma vez que a maioria dos dados de ensaios clínicos se baseia em estudos que utilizam os critérios anteriores (mais rigorosos) do DSM-IV para episódios mistos, em vez de no novo especificador (mais permissivo) do DSM-5-TR para características mistas.

A orientação do CANMAT, com o qual este tópico geralmente se alinha, divide as recomendações sobre o tratamento agudo das apresentações mistas em 3 seções e recomenda 3 abordagens de tratamento separadas para cada uma delas.

Os grupos de tratamento separados são:[5]

  • Episódios maníacos ou hipomaníacos do DSM-5 com características mistas (apresentações que consistem em sintomas predominantemente maníacos ou hipomaníacos com algumas características depressivas)

  • Episódios depressivos do DSM-5 com características mistas (apresentações que consistem em sintomas predominantemente depressivos com algumas características maníacas ou hipomaníacas)

  • Episódios mistos do DSM-IV (episódios sindrômicos maníacos e depressivos concomitantes)

Para determinar qual abordagem de tratamento é mais adequada, o CANMAT aconselha que, ao avaliar uma pessoa com uma apresentação mista de transtorno bipolar, os médicos usem a impressão global do paciente para determinar o tratamento mais adequado.[5]

Essa abordagem se reflete no tópico da seguinte forma:

  • Para um paciente que apresentar um episódio predominantemente maníaco ou hipomaníaco com alguns sintomas depressivos associados, consulte: "Manejo do quadro agudo da mania ou hipomania com características mistas segundo o DSM-5-TR".

  • Para um paciente que apresentar um episódio predominantemente depressivo com alguns sintomas maníacos ou hipomaníacos associados, consulte: "Manejo do quadro agudo da depressão com características mistas segundo o DSM-5-TR".

  • Para um paciente no qual os sintomas maníacos e depressivos forem igualmente proeminentes, consulte: "Manejo do quadro agudo de episódios mistos segundo o DSM-IV (episódios maníacos e depressivos totalmente sindrômicos concomitantes)".

Mania ou hipomania com características mistas segundo o DSM-5-TR

  • A mania (ou hipomania) com características mistas ocorre quando todos os critérios de um episódio maníaco (ou hipomaníaco) são atendidos e, pelo menos, 3 sintomas de depressão estão presentes durante a maioria dos dias do episódio vigente ou mais recente de mania (ou hipomania).[1]

  • A base de evidências sobre o tratamento farmacológico nas apresentações mistas, segundo o DSM-5-TR, é limitada.[5]

  • As opções de primeira linha recomendadas pelo CANMAT incluem a asenapina, a cariprazina, o divalproato de sódio ou o aripiprazol.[152][153][154][155]​​​[156][157]

  • As opções secundárias incluem a monoterapia com ziprasidona, olanzapina, quetiapina ou carbamazepina.[5][158][159]​​[160][161]

  • O tratamento combinado é geralmente necessário para controlar adequadamente os sintomas.[36][151]

  • O tratamento combinado com olanzapina associada a lítio ou divalproato de sódio é outra opção secundária de acordo com o CANMAT.[5][162][163]

  • A ECT é uma possível opção adjuvante ou independente; embora não tenha sido especificamente estudada em pessoas com mania com características mistas pelo DSM-5-TR, ela é recomendada pelo CANMAT com base na opinião de especialistas para pacientes muito doentes ou que não tiverem respondido à farmacoterapia recomendada com opções de primeira e segunda linhas.[5] Ela também pode ser considerada quando os riscos da medicação forem maiores que os riscos da ECT (por exemplo, em pacientes com idade mais avançada ou mais frágeis), ou se o paciente preferir esta opção.[127]

  • A eficácia do lítio nos estados mistos é questionável.[5][151]​​ Algumas diretrizes de tratamento internacionais não recomendam seu uso como opção de tratamento inicial no transtorno bipolar misto.[5][36]​​ No entanto, na prática, para os pacientes que desenvolvem características mistas e já tiverem sido estabilizados com lítio, geralmente há continuação do tratamento com lítio (a justificativa é a prevenção em longo prazo dos episódios de humor).

  • Para os pacientes com mania associada a características mistas e agravamento da agitação, apesar do uso de medicamentos antimaníacos ou antipsicóticos orais, pode ser necessária a administração de um antipsicótico ou benzodiazepínico não oral de ação rápida. As opções de primeira linha incluem a olanzapina intramuscular, a loxapina por via inalatória ou o lorazepam intramuscular.[36] O lorazepam pode ser usado como adjuvante ou como monoterapia.[36] As opções de segunda linha recomendadas incluem a asenapina sublingual ou a ziprasidona intramuscular.[36] O haloperidol e a risperidona não são recomendados pelo CANMAT para o manejo de características mistas, ao contrário do que ocorre no tratamento de pacientes com mania "pura".[5]

  • Vale ressaltar que existem diferenças internacionais, cabendo aos médicos consultarem as orientações locais. A administração de medicamentos não orais de ação rápida para a agitação é às vezes chamada de "tranquilização rápida". As orientações do NICE no Reino Unido recomendam a monoterapia com lorazepam intramuscular ou a terapia combinada com haloperidol intramuscular e prometazina intramuscular para tranquilização rápida nos adultos.[118] É importante notar que o NICE recomenda o uso de lorazepam intramuscular em vez de haloperidol intramuscular associado a prometazina se houver evidências de doença cardiovascular, inclusive intervalo QT prolongado, ou se nenhum ECG tiver sido realizado.[118]

  • Nos episódios agudamente mistos, a resposta ao tratamento pode demorar mais de 2 semanas (em comparação com a mania).

DSM-5-TR - depressão com características mistas

  • A depressão com características mistas ocorre quando são preenchidos todos os critérios para um episódio depressivo e pelo menos 3 sintomas de mania/hipomania estão presentes na maioria dos dias de episódio de depressão presente ou mais recente.[1]

  • A base de evidências sobre o tratamento farmacológico é limitada.[5]

  • A CANMAT sugere que a opção farmacológica inicial mais adequada a ser considerada é a monoterapia com cariprazina ou lurasidona.[164][165]

  • As opções farmacológicas secundárias incluem a olanzapina, olanzapina/fluoxetina, quetiapina, divalproato de sódio, lamotrigina ou ziprasidona.​​​​​​​​[166][167][168][169][170][171]​​​[172]

  • A ECT é uma possível opção adjuvante ou independente; embora não tenha sido especificamente estudada em indivíduos com depressão com características mistas pelo DSM-5-TR, ela é recomendada com base na opinião de especialistas para os pacientes gravemente doentes ou que não tiverem respondido à farmacoterapia recomendada com opções de primeira e segunda linhas.[5] Ela também pode ser considerada quando os riscos da medicação forem maiores que os riscos da ECT (por exemplo, em pacientes com idade mais avançada ou mais frágeis), ou se o paciente preferir esta opção.[127]

  • A monoterapia com antidepressivo ou a terapia antidepressiva adjuvante não são recomendadas para os indivíduos com depressão bipolar e características mistas, devido a um aumento do risco de alterações maníacas.[5][173]

  • Observe que há diferenças internacionais na abordagem de tratamento, e os médicos devem consultar as orientações locais (ver acima).

DSM-IV - episódios mistos (com episódios depressivos e maníacos totalmente sindrômicos concomitantes)

  • Os critérios do DSM-IV para episódios mistos requerem episódios depressivos e maníacos totalmente sindrômicos concomitantes (mas com depressão que dura ≥1 semana, em vez de 2 semanas); isso representa os critérios mais restritivos para uma apresentação mista.[174]​ Para os indivíduos com episódios depressivos e maníacos totalmente sindrômicos concomitantes há uma quantidade significativamente maior de dados para embasar as decisões de tratamento, em comparação com aqueles que atendem às definições de características mistas do DSM-5-TR.[5]

  • O tratamento de primeira linha é com aripiprazol ou asenapina, pois há evidências de que ambos melhoram os sintomas maníacos e depressivos, com base em análises post-hoc/de subgrupos de ECRCs.[153][156][157]​​[175][176]​​

  • As opções secundárias incluem monoterapia com olanzapina, olanzapina associada a lítio ou divalproato de sódio, ou monoterapia com carbamazepina ou divalproato de sódio.[177][121][178]​​​​​​[179][180]​​​​​​​​​

  • As opções de outras linhas incluem a ziprasidona, o divalproato de sódio associado a carbamazepina, a cariprazina e o lítio associado a divalproato de sódio.[181][182]​​

  • A ECT é uma possível opção adjuvante ou independente.[127][183][184][185][186]​​​​​​​​ Ela também pode ser considerada quando os riscos da medicação forem maiores que os riscos da ECT (por exemplo, em pacientes com idade mais avançada ou mais frágeis), ou se o paciente preferir esta opção.[127]

  • Observe que há diferenças internacionais na abordagem de tratamento, e os médicos devem consultar as orientações locais (ver acima).

Manejo do quadro agudo de ciclagem rápida

A abordagem de tratamento de um paciente que estiver vivenciando uma ciclagem rápida (4 ou mais episódios de humor no período de 1 ano) requer planejamento e paciência. As alterações nos estados de humor podem ocorrer repentinamente, e o tratamento do episódio vigente pode ser contraproducente. Por exemplo, o acréscimo ou aumento da dose de um antidepressivo para um indivíduo com ciclagem rápida que estiver depressivo pode precipitar uma viragem para mania ou para uma aceleração dos ciclos; como resultado, os antidepressivos não são recomendados para os pacientes com ciclagem rápida, pois podem desestabilizar o humor, mesmo se usados de maneira concomitante com um estabilizador de humor.[36]

Ao tratar uma pessoa com transtorno bipolar com ciclagem rápida, elimine quaisquer fatores que possam desestabilizar o humor. Eles incluem os medicamentos antidepressivos e psicoestimulantes, bebidas alcoólicas ou drogas ilícitas, ingestão excessiva de cafeína, tratamentos hormonais, pílulas para emagrecer ou "remédios" sem prescrição médica desnecessários, ou hipotireoidismo não tratado.

A farmacoterapia deve focar nos medicamentos estabilizadores do humor. No geral, eles são terapias antimaníacas ou agentes aprovados para mania bipolar. Não há evidências para apoiar a qualquer agente específico para tratar a depressão aguda durante a fase de ciclagem rápida, então o tratamento deve ser escolhido com base na eficácia nas fases aguda e de manutenção, se conhecida. O lítio, o divalproato de sódio, a olanzapina e a quetiapina demonstraram eficácia como tratamento de manutenção para os pacientes com ciclagem rápida.[187]

O transtorno bipolar de ciclagem rápida se apresenta com resistência à maioria das monoterapias, geralmente exigindo combinações com estabilizadores do humor. Pode ser necessário acrescentar um segundo ou terceiro estabilizador do humor.

A ciclagem rápida foi introduzida como possível variante ou especificador da evolução do transtorno bipolar, e isso destaca a falha na profilaxia com lítio no seu tratamento; no entanto, o lítio não deve ser evitado nesses pacientes, devido aos notáveis benefícios do lítio na evolução geral da doença.[124][188]​​ Pode-se argumentar a favor da inclusão de lítio como parte do plano de tratamento farmacológico, ou o seu uso em combinação com outros medicamentos psicotrópicos, como os antipsicóticos atípicos, na maioria dos indivíduos com ciclagem rápida.[124][188]​​ Embora haja preocupações relativas à tolerabilidade em curto e longo prazos associadas ao seu uso, o lítio é uma intervenção efetiva e custo-efetiva; e, quando o transtorno bipolar requer tratamento vitalício, o lítio continua sendo a terapia de manutenção recomendada.[124] Além disso, o transtorno bipolar envolve um alto risco de suicídio e o lítio pode conferir algum nível de proteção.[124][189]​​ O mecanismo de ação do lítio é desconhecido e provavelmente único, o que o torna uma opção atraente para complementar outros estabilizadores do humor nos pacientes com ciclagem rápida. O acréscimo do lítio no tratamento de sintomas residuais, especialmente os sintomas maníacos ou subsindrômicos na ciclagem rápida, pode ajudar a estabilizar o humor e melhorar a capacidade funcional.

Observe que há diferenças internacionais na abordagem de tratamento, e os médicos devem consultar as orientações locais. As orientações do NICE no Reino Unido recomendam que os médicos ofereçam às pessoas com transtorno bipolar com ciclagem rápida as mesmas intervenções oferecidas a pessoas com outros tipos de transtorno bipolar, citando a ausência de evidências fortes para orientar diferenças no tratamento.[29]

Manejo de comorbidades de saúde mental

A comorbidade com outras condições de saúde mental é comum e, como orientação geral, as comorbidades estão associadas com uma sintomatologia mais grave e um maior comprometimento funcional.[190]​ Os dados sobre o manejo de comorbidades são limitados, e é necessário critério clínico.[107][191][192]

Uma abordagem é tratar o transtorno bipolar primário o máximo possível antes de considerar o tratamento adicional para comorbidades.[107]​ É importante observar que é preciso ter precaução ao tratar a ansiedade ou o TDAH comórbidos com antidepressivos ou estimulantes, respectivamente, devido ao risco associado de instabilidade/alteração de humor com essas classes de medicamentos.[107]

Idosos com transtorno bipolar

Embora pareça que a prevalência está em declínio nas pessoas com idades mais avançadas, os pacientes idosos com um novo episódio ou com a persistência do transtorno bipolar ao longo da vida apresentam desafios no tratamento. Comorbidades psiquiátricas e clínicas são observadas nos idosos que têm transtorno bipolar com tanta frequência quanto, se não mais que, nos pacientes mais jovens, com taxas mais altas de comorbidades clínicas nos idosos com transtorno bipolar.

É mais provável que o início da mania após os 60 anos de idade esteja associado a uma condição clínica geral (como AVC ou outra lesão cerebral) que ao transtorno bipolar.

Existem dados limitados sobre o tratamento de idosos com transtorno bipolar. No entanto, os medicamentos com eficácia em adultos jovens parecem ser efetivos no transtorno bipolar em idade avançada. Inicie o tratamento com uma dosagem baixa e realize aumentos graduais devido ao aumento do risco de baixo clearance renal, de interações medicamentosas e a questões farmacocinéticas (como um ligação reduzida às proteínas plasmáticas) nos idosos.[193]

Considerações pré-concepção em mulheres e homens

Para as mulheres que puderem engravidar, o manejo mais efetivo durante a gestação deve ser iniciado, idealmente, antes da concepção como parte de uma gestação planejada. Isso permite que a paciente e seus familiares consultem o psiquiatra e o obstetra para serem orientados quanto à hereditariedade do transtorno bipolar, aos riscos (conhecidos, incluindo teratogenicidade, e desconhecidos) da exposição à medicação durante a gestação, e aos riscos da interrupção da medicação. Um plano de intervenção também pode ser estabelecido caso ocorra recorrência durante a gestação ou no período pós-parto.

As recomendações pré-concepção para homens e mulheres incluem:

  • Pergunte rotineiramente a todas as mulheres em idade reprodutiva sobre contracepção, especialmente antes da prescrição de qualquer medicamento psicotrópico.

  • As mulheres em idade fértil com transtorno bipolar devem ser encaminhadas a um especialista para receber orientações pré-concepção.[194]

  • As vitaminas maternas pré-natais, inclusive altas doses de ácido fólico, são recomendadas antes da concepção e durante a gestação.[36]

  • Como o lítio tem uma janela terapêutica estreita, o ideal é que os níveis de lítio nas mulheres que planejam engravidar estejam estabilizados antes da concepção, e os objetivos terapêuticos devem estar estabelecidos.[195]

  • O ácido valproico e seus derivados (inclusive o divalproato de sódio) apresentam um alto risco de malformação congênita e transtornos do desenvolvimento nas crianças nascidas de mães que tomam o medicamento durante a gravidez; até 4 em 10 bebês têm risco de transtornos do desenvolvimento, e aproximadamente 1 em 10 bebês tem risco de malformação congênita (inclusive defeitos do tubo neural).[196]​ O ácido valproico e seus derivados não são recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para uso em meninas e mulheres em idade fértil.[197]​​​ As diretrizes europeias e dos EUA não recomendam o uso de ácido valproico em pacientes mulheres em idade fértil, a menos que outros medicamentos não sejam adequados, haja um programa de prevenção à gravidez e sejam atendidas algumas condições.[29]​​[198][199]​​​

  • Medidas de precaução também podem ser necessárias em pacientes do sexo masculino tratados com ácido valproico e seus derivados, devido ao risco potencial de que o uso nos três meses anteriores à concepção possa aumentar a probabilidade de transtornos do neurodesenvolvimento em seus filhos.

  • As regulamentações e medidas de precaução relativas ao ácido valproico e seus derivados para pacientes dos sexos feminino e masculino podem variar entre os países, e você deve consultar as orientações locais para obter mais informações.

  • As orientações do National Institute for Health and Care Excellence (NICE) do Reino Unido adotam uma postura de maior precaução e recomendam que esses agentes não sejam iniciados nos primeiros episódios em qualquer pessoa (homem ou mulher) com menos de 55 anos, a menos que dois especialistas, de maneira independente, concordem que as outras opções não são adequadas, ou que haja razões convincentes de que não se aplicam riscos reprodutivos.[29]

Pacientes gestantes

O período periparto é considerado um período de alto risco para episódios de distúrbios do humor, especialmente episódios depressivos ou psicóticos.[200][201][202]​​​​​​​​​[203][204]​​​​ As mulheres com uma história de psicose pós-parto têm um risco particularmente alto de recorrência após partos futuros; para as mulheres com história de psicose pós-parto, é essencial receber cuidados psiquiátricos especializados durante a gestação e no pós-parto, incluindo um planejamento de assistência pré-parto multidisciplinar.[195]

Análises sobre a medicação durante a gestação demonstram a dificuldade de tratar as gestantes com transtorno bipolar.[205] Algumas revisões incluem novos dados sobre os estabilizadores do humor mais comuns usados no transtorno bipolar.[206] As recomendações para o manejo durante a gestação e no período pós-parto imediato incluem o seguinte.

  • O American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG) recomenda a continuação da farmacoterapia (exceto do ácido valproico e seus derivados) para as gestantes com transtorno bipolar.[195]

  • A descontinuação da farmacoterapia para o transtorno bipolar na gestação e no período pós-parto está associada a um aumento de três vezes no risco de recidiva, em comparação com a descontinuação em mulheres fora do período perinatal.[200]​ Se a descontinuação for considerada, isso requer uma avaliação cuidadosa e uma tomada de decisão compartilhada com a mulher sobre o risco de recorrência.[195]

  • Durante a gestação, quando forem necessários medicamentos, prescreva a dose efetiva mais baixa em monoterapia.[207][208]

  • Nos EUA, a prática padrão é a de que o ácido valproico e seus derivados só sejam prescritos para o tratamento de episódios maníacos associados ao transtorno bipolar durante a gravidez se outros medicamentos alternativos não forem aceitáveis ou efetivos, ou se a paciente tiver respondido apenas ao ácido valproico no passado. A European Medicines Agency recomenda que o ácido valproico e seus derivados são contraindicados no transtorno bipolar durante a gestação, em razão do risco de malformações congênitas e de problemas de desenvolvimento no lactente/criança.[199]

  • O uso de lítio na gestação está associado a um pequeno aumento do risco de malformações congênitas.[209]​ O risco de anomalia de Ebstein é 20 vezes maior, de acordo com alguns estudos, embora dados mais recentes sugiram um risco mais baixo, com uma razão de chances de 1.81 para anormalidades congênitas em geral, e uma razão de chances de 1.86 para anomalias cardíacas.[210][124][211]​​ O risco é maior no primeiro trimestre e na exposição a doses mais altas.[210] É imprescindível o monitoramento rigoroso da dose e dos níveis de lítio sérico durante toda a gestação, no parto e no pós-parto imediato, devido às significativas alterações que ocorrem no volume de distribuição.[212] O ACOG recomenda que as pacientes gestantes que recebem lítio no primeiro trimestre sejam submetidas a uma ultrassonografia detalhada no segundo trimestre. Uma ecocardiografia fetal também pode ser considerada.[195]​ Após o parto, uma titulação decrescente cuidadosa, porém rápida, do lítio é necessária para evitar a toxicidade.[195] Um monitoramento rigoroso e ajustes na dose do lítio também podem ser necessários em vários cenários comuns, inclusive pré-eclâmpsia, comprometimento renal, uso pós-parto de anti-inflamatórios não esteroidais, hiperêmese e hemorragia recente.[195] O início do lítio em altas doses logo após o parto tem as melhores evidências de prevenção da psicose pós-natal.[213]

  • Estudos de reprodução com animais não demonstraram risco para o feto associado à lurasidona, e não há estudos adequados e bem controlados realizados em gestantes.

  • Se a farmacoterapia for iniciada durante a lactação, a passagem pelo leite materno deve ser considerada junto com a probabilidade de eficácia do medicamento.[195]

  • Como orientação geral, as mulheres que recebem farmacoterapia para o transtorno bipolar normalmente não devem ser desencorajadas de amamentar devido a preocupações relativas à transmissão pelo leite materno, se for seu desejo fornecer alimentação desta maneira. No entanto, as recomendações relativas à amamentação com uso de lítio pela mãe são mistas, e há risco de toxicidade por lítio no neonato para os bebês expostos através do leite materno.[195] É necessário o trabalho conjunto de um obstetra, um pediatra e um psiquiatria se uma mulher que toma lítio considerar amamentar.[195]

  • Em geral, a decisão de amamentar deve ser individual, levando em consideração fatores como o impacto sobre a privação do sono e o estresse materno, que podem ser fatores desestabilizadores no transtorno bipolar.[85]​ Dependendo das circunstâncias individuais, pular a amamentação durante a noite pode ser considerado, pelo menos inicialmente.[195]

  • Consulte um especialista para obter orientações quanto à farmacoterapia durante a gravidez e a lactação. Informações atualizadas sobre possíveis danos causados por medicamentos durante a gravidez e amamentação podem ser encontradas em recursos como o LactMed e o UKTIS. Drugs and Lactation Database (LactMed®) Opens in new window UKTIS Opens in new window

  • Apresentações mistas são comuns na gestação e no período pós-parto, particularmente quando os estabilizadores do humor são descontinuados antes ou no início da gravidez.[214]​ Assim como na população não gestante, as apresentações mistas estão associadas a um aumento do risco de autolesão e suicídio, e requerem avaliação cuidadosa e mitigação.[26]

  • As mulheres com psicose pós-parto têm um risco elevado de suicídio e infanticídio e requerem internação psiquiátrica de emergência imediata, avaliação, monitoramento intensivo e tratamento, para garantir a sua segurança e a segurança do lactente e para otimizar o tratamento farmacológico.[195] A mulher não deve ser deixada sozinha, ou sem supervisão com o bebê.[195]

  • A ECT pode ser considerada para a depressão bipolar na gestação se os riscos do medicamento superarem os riscos da ECT.[215]

Duração do tratamento de fase aguda

As diretrizes de tratamento disponíveis se baseiam sobretudo na opinião de especialistas devido à ausência de evidências.[103][105]​ Para os sintomas maníacos, trate a fase aguda com o mesmo medicamento e a mesma dosagem por um período mínimo de 2 meses após a resolução total dos sintomas.[105] A recuperação total da mania pode demorar mais, e o tratamento pode ser mantido por 3 a 6 meses para atingir estabilidade do humor.[103] Para sintomas depressivos, um grupo de diretrizes de consenso internacional recomenda a continuação do tratamento por 6 meses após a resolução total dos sintomas; após esse período, dê continuidade ao tratamento ou troque gradualmente para o tratamento de manutenção recomendado.[105] A British Association for Psychopharmacology recomenda reduzir gradualmente e, por fim, descontinuar o uso dos antidepressivos 3 meses após a recuperação. No entanto, ela adverte que serão necessários períodos de tratamento mais longos se os pacientes apresentarem recidiva quando o tratamento for suspenso.[103]

Tratamento de manutenção

As diretrizes de tratamento da CANMAT reiteram o início da terapia farmacológica de manutenção após um único episódio maníaco e recomendam discutir as opções de manutenção com todos os pacientes estabilizados após um episódio agudo.[36]

A maioria dos pacientes pode continuar a terapia de manutenção com medicamentos usados para estabilizar um episódio agudo, particularmente se a terapia demonstrar eficácia como agente de manutenção. Uma exceção a isso é a terapia de longo prazo com antidepressivos, que não costuma ser recomendada devido a preocupações sobre o potencial risco de alteração maníaca/hipomaníaca e ciclagem rápida.[36] As orientações do NICE do Reino Unido recomendam que, ao considerar o tratamento em longo prazo, os médicos devem discutir com a pessoa se ela prefere continuar esse tratamento ou mudar para lítio; o lítio é recomendado pelo NICE como tratamento de manutenção de primeira linha para o transtorno bipolar.[29]

Para todos os pacientes que recebem tratamento (manutenção) em longo prazo para transtorno bipolar, monitore rigorosamente para recidiva ou recorrência, bem como quaisquer efeitos adversos emergentes do tratamento, especialmente efeitos neurológicos (efeitos colaterais extrapiramidais, discinesia tardia) ou metabólicos (obesidade, diabetes, dislipidemias) ou toxicidade (renal, hepática, hematológica, tireoidiana). Pode ser necessário reduzir a dose no tratamento de manutenção, pois, geralmente, os pacientes apresentam mais efeitos colaterais nesse estágio. A integração precoce entre serviços de saúde física e mental é importante para as pessoas que sofrem efeitos metabólicos adversos ou toxicidade secundária aos medicamentos para transtorno bipolar.[84]

A prevenção da recidiva precoce após um único episódio maníaco pode estar associada a uma evolução benigna da doença. Aconselhe os pacientes que estão estáveis no tratamento há vários anos a permanecerem na manutenção por tempo indeterminado, já que o risco de recorrência permanece alto.[103]

O monitoramento constante e a melhora da adesão fazem parte da rotina do manejo em longo prazo do transtorno bipolar, pois a não adesão ao tratamento está associada a recorrência.[216] As estratégias efetivas que aumentam a adesão incluem: programas educacionais, automonitoramento, prevenção da recorrência, manejo dos efeitos adversos, identificação e manejo dos estressores e a abordagem dos sistemas de crenças e atitudes em relação à doença.[217]

Não há ensaios clínicos controlados sobre transtorno bipolar para apoiar a ECT na prevenção da recorrência dos episódios de humor bipolar, mas estudos não controlados e a análise de dados retrospectivos dão algum suporte ao seu uso.[218]

Evidências crescentes apoiam a eficácia das seguintes intervenções psicossociais na terapia de manutenção do transtorno bipolar.[36][219]​​​ Ofereça psicoeducação sobre o reconhecimento e o manejo dos sintomas precoces de alerta em primeira linha para todos os pacientes. A psicoeducação tem demonstrado reduzir as taxas de recidiva, melhorar a adesão ao tratamento em longo prazo e melhorar o funcionamento social global dos pacientes.[220] Uma revisão sistemática mostrou que a psicoeducação aumentou o tempo a qualquer recorrência do humor, reduziu as taxas de hospitalização e melhorou a capacidade funcional.[221] A terapia cognitivo-comportamental adjuvante reduziu os escores de depressão, prolongou o tempo até a recorrência depressiva e melhorou atitudes disfuncionais.[222] Ofereça terapia cognitiva adjuvante, terapia focada na família, terapia interpessoal e de ritmo social e suporte por pares como opções de segunda linha com base nos pontos fortes e necessidades individuais. As razões para considerar a terapia psicossocial adjuvante incluem disfunção interpessoal ou em relacionamentos, dificuldades relativas a emprego, trauma, probabilidade de suicídio e/ou presença de comorbidades psiquiátricas.[84]​ A terapia psicossocial em grupo também mostrou reduzir as taxas de recidiva e de hospitalização.[223]

É importante observar as diferenças internacionais na abordagem; os médicos devem consultar as orientações locais. A abordagem do tratamento de manutenção em pacientes com bipolaridade I, bipolaridade II e com características mistas, descrita nos marcadores abaixo, geralmente se alinha com as recomendações das diretrizes do CANMAT, mas observe que as outras diretrizes de tratamento não fazem distinção entre bipolaridade I, bipolaridade II ou características mistas em termos de manejo em longo prazo.[29]​ De acordo com as orientações do NICE, os médicos devem recomendar o lítio como tratamento farmacológico de primeira linha e de longo prazo para todos os subtipos de transtorno bipolar. Se o lítio for inefetivo, mal tolerado ou inadequado, considere um antipsicótico. Se o primeiro antipsicótico for mal tolerado em qualquer dose, ou ineficaz na dose máxima, considere um antipsicótico alternativo. Se um antipsicótico alternativo for inefetivo, considere uma combinação de divalproato de sódio com um antipsicótico ou lítio.[29]

Bipolar I: farmacoterapia de manutenção

  • O lítio apresenta as evidências mais fortes em relação à prevenção da recorrência no transtorno bipolar em comparação com outros agentes e continua sendo o tratamento de primeira escolha para a terapia de manutenção de longo prazo, e é apoiado por diretrizes internacionais.​[29][36][124][224]​ O lítio é efetivo contra a recidiva tanto dos sintomas maníacos quanto dos depressivos e parece ter um efeito antissuicídio.[225][226]​ Um grande estudo de coorte nacional finlandês relatou que o tratamento de manutenção com lítio esteve associado ao menor risco de hospitalização devido a um transtorno mental ou distúrbio somático entre todos os tratamentos estudados.[227]

  • As outras opções de primeira linha incluem a quetiapina (como adjuvante ao lítio ou divalproato de sódio, ou como monoterapia), o divalproato de sódio, a lamotrigina, a asenapina e o aripiprazol (como adjuvante ao lítio ou divalproato de sódio, ou como monoterapia em preparação oral ou parenteral).[171][228][229][230]​​

  • A quetiapina é efetiva para prevenir episódios maníacos, depressivos e mistos.[231] A monoterapia com asenapina ou aripiprazol é mais eficaz na prevenção da mania que da depressão. A lamotrigina é mais eficaz na prevenção da depressão do que a mania, mas também é indicada para prevenir a recorrência de qualquer transtorno de humor.[232]

  • A maioria das pessoas com transtorno bipolar I precisa de um tratamento combinado de curto ou longo prazos em algum momento da vida, para controlar de maneira adequada os sintomas e reduzir as taxas de recorrência. Há evidências de que o risco de recorrência é menor quando um antipsicótico atípico é combinado com lítio ou divalproato de sódio; quando um antipsicótico atípico é combinado com lítio ou divalproato de sódio, há evidências que sugerem um benefício na continuação desse tratamento nos primeiros 6 meses após a resposta ao tratamento.[233] Os riscos e benefícios após esse período não estão claros atualmente. Para pacientes com ambos os sintomas, mania e depressão, lítio ou divalproato de sódio em combinação com quetiapina é um tratamento preventivo da recidiva. Para os pacientes estabilizados com a quetiapina, há evidências que sugerem que a continuação da quetiapina ou a mudança para o lítio seja eficaz no retardo da recorrência de eventos maníacos e depressivos, comparado com o placebo.[171]

  • Considere as injeções de ação prolongada como uma alternativa à medicação oral, se disponíveis, e, caso você esteja preocupado com uma não adesão que resulte em recidiva frequente e/ou se o paciente preferir a administração intramuscular.[234][235]​ Antes de prescrever uma preparação injetável de ação prolongada, garanta que o paciente tenha sido estabilizado (e tenha tido uma boa resposta) à preparação oral do mesmo medicamento.

  • Para os pacientes com sintomas recorrentes ou que permanecem sintomáticos com a monoterapia ou terapia combinada de primeira linha, otimize a posologia e verifique a adesão à medicação. Caso a terapia não seja tolerada ou os resultados estejam abaixo do ideal com a dose terapêutica, mude ou acrescente um medicamento de primeira linha alternativo. Para os pacientes que não tiverem respondido adequadamente a várias tentativas de medicamentos de primeira linha, as opções incluem monoterapia com olanzapina ou carbamazepina, risperidona oral ou injeção de risperidona de ação prolongada (como monoterapia ou como tratamento adjuvante), paliperidona, lurasidona ou ziprasidona em combinação com lítio ou divalproato de sódio.[36]​ O uso da paliperidona para o transtorno bipolar é "off-label" e não recebeu aprovação para essa indicação.

  • A olanzapina é efetiva contra episódios maníacos e depressivos, mas é considerada um medicamento de segunda linha devido aos seus efeitos adversos (particularmente síndrome metabólica).[235][236]​ A risperidona parece ser efetiva contra a mania, mas não contra a depressão.[233][237][238]​ A paliperidona parece ser mais efetiva que placebo, mas menos efetiva que a olanzapina na prevenção de episódios de humor.[239]

  • As opções de tratamento de linhas adicionais têm uma base de evidências limitada, e a maioria é usada off-label; assim, devem ser consideradas por um especialista quando os pacientes não responderem a várias tentativas adequadas de opções de primeira e segunda linhas isoladas ou em combinação.[36]

Bipolar II: farmacoterapia de manutenção

  • Como regra, se um paciente tiver apresentado resposta a um medicamento particular na fase aguda do tratamento, recomenda-se a continuação do tratamento com esse medicamento. A monoterapia com quetiapina, lítio ou lamotrigina é recomendada como tratamento de primeira linha, apoiada por diretrizes internacionais.​[29][36][229][240][241][242][243]​​​​​ A quetiapina protege particularmente bem contra recidivas da depressão.[240] O lítio é outra boa opção para o tratamento de manutenção do transtorno bipolar II, e é apoiado por pesquisas que demonstram que ele reduz a frequência e a gravidade da hipomania e da depressão no transtorno bipolar II.[241][244]​​​ O lítio também é apoiado por estudos naturalísticos de longa duração, que mostram que ele reduz o tempo passado tanto em episódios de hipomania quanto de depressão em mais de 50%.[245]

  • Para os pacientes com sintomas recorrentes ou que permanecem sintomáticos com a monoterapia de primeira linha, otimize a posologia e verifique a adesão à medicação. Caso a terapia não seja tolerada ou os resultados estejam abaixo do ideal com a dose terapêutica, mude para um medicamento de primeira linha alternativo. Caso a terapia não seja tolerada ou os resultados estejam abaixo do ideal após várias tentativas de medicamentos de primeira linha, considere uma tentativa de tratamento com venlafaxina por tempo limitado.[246] As opções de tratamento de outras linhas têm uma base de evidências limitada, e algumas são usadas off-label; assim, devem ser consideradas por um especialista quando o paciente não tiver respondido a várias tentativas adequadas de opções de primeira e segunda linhas isoladas e combinadas.[36]

Apresentações mistas: farmacoterapia de manutenção

  • Independentemente da polaridade do episódio de humor inicial, a CANMAT recomenda a continuação do tratamento inicial bem-sucedido na fase de manutenção, exceto para os antidepressivos.[5]

  • Para os indivíduos cuja apresentação aguda ocorrer com um episódio predominantemente maníaco ou hipomaníaco com alguns sintomas depressivos associados (ou seja, quando o diagnóstico pelo DSM-5-TR é de mania com características mistas), a CANMAT recomenda os seguintes tratamentos de manutenção, com suporte na opinião de especialistas (devido à ausência de evidências): asenapina, cariprazina, divalproato de sódio, monoterapia com olanzapina (ou terapia combinada com olanzapina associada a lítio ou divalproato de sódio), quetiapina, carbamazepina ou lítio.[5] A ECT também pode ser considerada como uma opção de outras linhas para os pacientes com doença grave, catatônicos, ou que não apresentarem resposta a várias tentativas de medicamentos.[5][36][125][126]​​ Ela também pode ser considerada quando os riscos da medicação forem maiores que os riscos da ECT (por exemplo, em pacientes com idade mais avançada ou mais frágeis), ou se o paciente preferir esta opção.[127]

  • Para os indivíduos cuja apresentação aguda tiver ocorrido com um episódio predominantemente depressivo com alguns sintomas maníacos ou hipomaníacos associados (ou seja, quando o diagnóstico pelo DSM-5-TR é de depressão com características mistas), a CANMAT observa que a opinião de especialistas apoia as seguintes opções de tratamento de manutenção: cariprazina, lurasidona, olanzapina, quetiapina, divalproato de sódio, asenapina ou lítio.[5] A ECT também pode ser considerada como uma opção de outras linhas.[5]

  • Para os indivíduos com sintomas maníacos e depressivos igualmente proeminentes (ou seja, quando o diagnóstico pelo DSM-IV é de episódio misto), a monoterapia com quetiapina ou a terapia combinada (com lítio ou divalproato de sódio) são as opções de primeira linha recomendadas para o tratamento de manutenção.[171][231]​​​​​ As opções de manutenção secundárias recomendadas para episódios mistos pelo DSM-IV incluem o lítio e a olanzapina.​[226][236][247]​​​​[171]

  • As opções de manutenção de outras linhas recomendadas para episódios mistos pelo DSM-IV (com base na opinião de especialistas) incluem a asenapina, a carbamazepina, odivalproato de sódio, divalproato de sódio associado a carbamazepina, cariprazina ou lítio associado a divalproato de sódio.[5] A ECT também pode ser considerada como uma opção de outras linhas.[5]

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