Novos tratamentos

Gepirona

A gepirona é um agonista seletivo do receptor de serotonina 5-HT1A oral. O mecanismo de ação ainda não está totalmente compreendido. Ela tem um mecanismo de ação diferente em relação aos inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRSs), que bloqueiam a reabsorção da serotonina nas células, o que significa que é provável que ela tenha um perfil de efeitos adversos ligeiramente diferente dos outros tratamentos disponíveis para depressão, notadamente com menor potencial de disfunção sexual. Ela está aprovada pela Food and Drug Administration (FDA) para o tratamento do transtorno depressivo maior em adultos com base em dois ensaios clínicos randomizados que demonstraram eficácia superior em comparação com o placebo, com tamanhos de efeito demonstrados semelhantes aos de outros antidepressivos aprovados.[380]​ A gepirona ainda não é usada rotineiramente na prática clínica. Atualmente não se sabe ao certo se existe algum subgrupo de pacientes com maior probabilidade de responder à gepirona; evidências de uma análise de acompanhamento de dados de ensaios clínicos sugerem que os adultos com depressão com sintomas de ansiedade proeminentes (depressão ansiosa) tiveram uma resposta maior do que aqueles sem sintomas de ansiedade proeminentes.[381]​ A gepirona ainda não está aprovada na Europa.

Novos antidepressivos

Depois de quase meio século em que os únicos tratamentos farmacológicos padrão para a depressão se baseavam na neurotransmissão da serotonina e da noradrenalina, houve uma explosão de novos métodos promissores que surgiram na última década.[382]​ Há uma variedade de agentes novos e antigos reformulados em desenvolvimento que, diferentemente de antidepressivos tradicionais, nem sempre têm um mecanismo de ação principal que envolve a neurotransmissão monoaminérgica.​​ O dextrometorfano e a bupropiona foram aprovados pela Food and Drug Association (FDA) dos EUA. O dextrometorfano é o primeiro antagonista oral do receptor de N-metil-D-aspartato (NMDA) (e agonista do receptor sigma-1) a ser aprovado para o tratamento do transtorno depressivo maior. Ele é de ação rápida, mas o mecanismo exato de ação no tratamento da depressão não está claro. A bupropiona é formulada em conjunto com o dextrometorfano para aumentar e prolongar os níveis plasmáticos de dextrometorfano através da inibição competitiva do citocromo P450 2D6. A aprovação seguiu-se aos resultados de dois ensaios clínicos positivos; o primeiro em que demonstrou superioridade em relação ao placebo, e o segundo em que demonstrou superioridade em relação à bupropiona isoladamente. É importante observar que a eficácia do dextrometorfano/bupropiona foi observada no início do tratamento (em 1-2 semanas) e mantida após isso.[383][384]​​​​ A psilocibina, uma droga psicodélica, recebeu a designação de terapia inovadora da FDA para a depressão resistente a tratamento.[385] Em um estudo de fase 2 comparando o tratamento com psilocibina ao tratamento com escitalopram, houve graus semelhantes de melhora em ambos os grupos de tratamento.[386] Há evidências de que, em alguns pacientes, os efeitos benéficos da psilocibina sobre os sintomas depressivos podem durar pelo menos até 12 meses após a intervenção.[387]​ Um esquema de dose única de psilocibina mostrou evidências de eficácia, de acordo com dois ensaios clínicos randomizados.[388][389]​​​ Tem-se sugerido que os benefícios positivos são mediados mais diretamente pela terapia psicológica administrada com psilocibina em vez de por um efeito farmacológico direto.[390] O óxido nitroso produziu alguns resultados positivos preliminares em um ensaio aberto.[391] A agomelatina, um agonista do receptor de melatonina e antagonista do receptor 5-HT2c da serotonina, mostrou-se efetiva e está disponível na Europa.[392] [ Cochrane Clinical Answers logo ] ​​ O antibiótico minociclina tem gerado alguns resultados preliminares positivos quando usado como tratamento adjuvante com antidepressivos, embora os resultados sejam mistos.[393][394][395]​​ O direcionamento da minociclina para pessoas com evidências de depressão com inflamação sistêmica de baixo grau (aumento da proteína C-reativa) é uma nova área de pesquisa.[396]

Cetamina intravenosa

A cetamina intravenosa, um antagonista do receptor NMDA, juntamente com seu isômero inalatório escetamina (veja abaixo) continuaram a ter um desempenho melhor que o placebo no alívio dos sintomas depressivos, mas ainda não são usados na prática clínica padrão.[397][398][399][400]​​​ Em relatos de caso, séries de casos e ensaios clínicos selecionados, a cetamina mostrou ter um efeito rápido na redução dos escores de diversas escalas da depressão.[401][402][403]​ Há algumas evidências de efeito antidepressivo sustentado por até 6 semanas.[404] A cetamina intravenosa parece ser mais eficaz que a escetamina intranasal.[405] No entanto, sua segurança e eficácia para uso em longo prazo permanecem desconhecidas.[406][407]​ Os efeitos colaterais agudos são comuns e têm maior probabilidade de ocorrer nos pacientes que recebem cetamina intravenosa. A maioria dos efeitos colaterais tem resolução logo após a administração do medicamento. Eles incluem efeitos psiquiátricos (mais comumente ansiedade), psicotomiméticos, cardiovasculares e neurológicos. Os efeitos somáticos mais comuns foram cefaleia, tontura, dissociação, pressão arterial elevada e visão turva.[408] O uso repetido de cetamina em outros grupos de pacientes foi vinculado à toxicidade urológica e hepática, a deficits cognitivos e à dependência.[408]

Spray nasal de escetamina

A escetamina é o isômero ativo da cetamina. Em março de 2019, a FDA aprovou o spray nasal de escetamina para ser utilizado juntamente com um antidepressivo oral para a depressão resistente a tratamento em adultos e, em agosto de 2020, a FDA ampliou sua aprovação para incluir adultos com transtorno depressivo maior com ideação suicida aguda ou comportamento suicida. A administração do medicamento só está disponível através de um sistema de distribuição restrito, mediante uma avaliação de risco e estratégia de mitigação (REMS, Risk Evaluation and Mitigation Strategy) na qual tanto o médico quanto o paciente assinam um formulário de inscrição do paciente. O medicamento deve ser autoadministrado pelo paciente, que é supervisionado por um profissional de saúde em um consultório médico certificado, e o paciente é monitorado por ao menos 2 horas devido ao risco de sedação, problemas de atenção, julgamento e raciocínio (dissociação), pensamentos e comportamentos suicidas, e ao potencial para uso indevido do medicamento. Esteja ciente de que pacientes com hipertensão mal controlada ou transtorno vasculares aneurismáticos preexistentes podem ter um aumento do risco de efeitos cardiovasculares ou cerebrovasculares adversos. A eficácia da escetamina foi avaliada em dois ensaios clínicos de curto prazo (quatro semanas) e um ensaio de manutenção do efeito de prazo mais longo. Em um dos estudos de curto prazo, o spray nasal de escetamina demonstrou efeito estatisticamente significativo comparado com o placebo na gravidade da depressão, e algum efeito foi observado em um prazo de dois dias.[409] O outro ensaio de curto prazo não apresentou eficácia estatisticamente significativa, mas os autores observaram que o efeito do tratamento com spray nasal de escetamina excedeu o nível considerado clinicamente significativo para antidepressivos aprovados em comparação com placebo.[410] No ensaio de manutenção do efeito de prazo mais longo, a escetamina associada a um antidepressivo oral resultou em um tempo significativamente maior em termos estatísticos até a recidiva dos sintomas depressivos em comparação com o spray nasal placebo associado a um antidepressivo oral.[411] Um estudo aberto de longo prazo encontrou evidências de efeito sustentado, com duração de 1 ano, em pessoas que responderam à escetamina.[412] Um estudo duplo-cego de fase 3 não conseguiu demonstrar evidências de eficácia em idosos com 65 anos de idade ou mais.[413] Algumas evidências sugerem que a escetamina pode ter um efeito anti-suicida rápido em pessoas com depressão maior e ideação suicida.[414] Um ECRC aberto de fase 3b constatou que, em pacientes com depressão resistente ao tratamento, a escetamina associada a um ISRS ou um inibidor de recaptação de serotonina-noradrenalina (IRSN) foi superior à quetiapina associada a um ISRS ou IRSN.[415] Os efeitos colaterais mais comuns são dissociação, tontura, náuseas, sedação, vertigem, diminuição da sensação ou sensibilidade (hipoestesia), ansiedade, letargia, aumento da pressão arterial, vômitos e sensação de embriaguez. No entanto, a escetamina não prejudicou a capacidade de dirigir em um pequeno estudo duplo-cego controlado por placebo.[416] A European Medicines Agency (EMA) aprovou o spray nasal de escetamina para a depressão resistente a tratamento em outubro de 2019 e, em dezembro de 2020, ampliou sua indicação para incluir o tratamento de adultos com depressão moderada a grave como tratamento agudo de curto prazo, para a redução rápida dos sintomas depressivos, o que, de acordo com o julgamento clínico, constitui uma emergência psiquiátrica.

Estimulação magnética transcranial (EMT)

Desde a sua introdução em 2008, a EMT - aplicação de um campo magnético através do crânio até o cérebro para induzir atividade elétrica, em sessões diárias ao longo de 1 a 2 meses - tornou-se amplamente disponível em alguns cenários clínicos. Dados apoiam um efeito antidepressivo da EMT repetitiva de alta frequência administrada ao córtex pré-frontal esquerdo, e diretrizes para as melhores práticas foram desenvolvidas.[417][418][419]​ Embora já haja consenso sobre alguns aspectos das indicações e da aplicação do tratamento, ele continua sendo um tratamento novo, pois ainda há muitas perguntas importantes sobre quando, como e em quem usá-lo. Em comparação com os antidepressivos, a EMT envolve um alto custo em termos de tempo e dinheiro. No momento, geralmente, é reservada a pacientes que não apresentaram resposta a antidepressivos. A ausência de psicose e uma idade mais jovem podem prever o sucesso.[417] A revisão da literatura encontrou evidências inconsistentes de um benefício na depressão e algumas evidências de efeito sinérgico com tratamento antidepressivo concomitante.[420][421][422][423][424][425]​ Em um estudo de durabilidade, a terapia com EMT demonstrou efeitos duráveis, podendo ser usada com sucesso como estratégia de resgate intermitente para impedir recidivas iminentes.[426] Outro estudo sugere que o tratamento de manutenção pode aumentar a durabilidade dos efeitos antidepressivos da EMT.[427] Com base em uma amostra de pequeno tamanho, parece ser segura e eficaz durante a gestação, embora os dados sejam limitados e mais estudos controlados sejam necessários.[428]​ Os trabalhos continuam no sentido de determinar se uma variação nos parâmetros de tratamento poderia afetar os resultados.[429] Outras evidências sugerem que a EMT não é diferente do tratamento simulado de EMT nos pacientes com depressão.[430] Estudos de larga escala são necessários.[431]

Terapia de neuromodulação de Stanford (SNT)

A SNT é uma técnica de estimulação cerebral não invasiva, de ação rápida, que utiliza direcionamento funcional guiado por ressonância nuclear magnética, a qual é administrada durante um período de 5 dias. Ela é uma variante de um tipo de EMT que utiliza estimulação intermitente do tipo "theta-burst". Ela está aprovada pela FDA para adultos com depressão maior resistente ao tratamento, após dados de um ECRC demonstrarem não inferioridade ao protocolo de EMT padrão, mais longo, bem como dados de um ECRC realizado com 29 adultos com depressão resistente a tratamento que apresentaram redução média de 62% nas pontuações da Escala de Classificação da Depressão de Montgomery-Asberg (MADRS) após 5 dias de tratamento, em comparação com uma redução média de 14% nas pontuações da MADRS no grupo de estimulação simulada.[432][433]​​

Estimulação do nervo vago (ENV)

A ENV envolve a estimulação do nervo vago cervical esquerdo, usando um dispositivo comercial.[434] Um gerador, com o tamanho aproximado de um relógio de bolso, é implantado por via subcutânea na parede torácica esquerda e é conectado aos eletrodos bipolares fixados no nervo vago esquerdo.[435] O gerador é programado para aplicar pulsos elétricos leves em ciclos contínuos, normalmente com 30 segundos de estimulação seguidos por 5 minutos desligado.[435] A ENV foi aprovada no Canadá, Europa e EUA para o tratamento adjuvante de longo prazo da depressão crônica para pacientes de 18 anos de idade ou mais, que estejam apresentando um episódio depressivo maior e não tiveram uma resposta adequada a ≥4 tratamentos com antidepressivos adequados.[436][437] As evidências sobre a eficácia da ENV são mistas.[438][439] Em um estudo de acompanhamento de longo prazo, no entanto, os benefícios da ENV sobre o tratamento de costume ainda puderam ser observados ao longo de 5 anos.[440]

Estimulação cerebral profunda (ECP)

Como intervenção neurocirúrgica, a ECP das estruturas do prosencéfalo tem apresentado efeitos promissores contra a depressão resistente a tratamento em um pequeno grupo de indivíduos, mas está longe de ser um método de tratamento de rotina ou de baixo risco.[441][442]​ Os resultados são limitados pelo pequeno tamanho da amostra e dados randomizados de controle insuficientes.[443][444][445]

Estimulação transcraniana por corrente contínua (ETCC)

Uma corrente elétrica fraca é aplicada ao couro cabeludo, geralmente por meio de um eletrodo. Semelhante à EMT na localização do tratamento e na tolerabilidade, mas usa corrente elétrica em vez de campo magnético. Embora o tamanho do efeito tenha sido semelhante ao da EMT em um estudo, os resultados de outros ensaios foram mistos.[446][447]​ A ETCC parece apresentar um desempenho melhor para a depressão aguda do que para a depressão resistente a tratamento e parece ser uma opção relativamente segura, com apenas efeitos adversos menores observados até o momento.[448]​​

Medicamentos anti-inflamatórios não esteroidais

Duas revisões sistemáticas e metanálises da eficácia dos AINEs na depressão sugerem que eles podem ser efetivos (particularmente, o celecoxibe) e seguros para essa indicação, embora os resultados sejam mistos, sendo necessários mais trabalhos para determinar em quais pacientes os AINEs podem ser mais efetivos.[449][450][451]

Buprenorfina

A buprenorfina, um agonista parcial de receptor opioide atualmente em uso disseminado no tratamento da dependência de opioides, demonstrou eficácia de curta duração para a depressão resistente ao tratamento.[452] Faltam dados de segurança e eficácia de longo prazo.

Nutracêuticos

O uso adjuvante de nutrientes de grau farmacêutico, como a S-adenosilmetionina (SAMe), a acetilcisteína, o metilfolato, ácidos graxos ômega-3, vitamina D, probióticos e outros, mostrou ser efetivo na melhora da resposta aos antidepressivos em alguns estudos e agrega pouco, ou nenhum, risco para o paciente.[453][454]​​​[455][456][457][458][459]​​​​​[460][461]​​ A erva-de-são-joão pode ser efetiva para o tratamento da depressão leve a moderada.[462][463][Evidência C][Evidência C]​​ No entanto, vários relatos indicam a possibilidade de interações medicamentosas clinicamente significativas, que devem ser levadas em consideração antes que ela seja usada.[464][465] O ácido fólico tem sido de particular interessante devido à observação de que os pacientes com depressão apresentam níveis séricos mais baixos de folato que pacientes sem depressão, incluindo pessoas com outras doenças psiquiátricas.[144] A suplementação com ácido fólico pode ser benéfica para pacientes deprimidos com deficiência de folato. A suplementação com folato também pode ser eficaz quando adicionada ao tratamento padrão com antidepressivos em pacientes que nunca foram tratados ou que são resistentes ao tratamento. No entanto, os resultados foram inconsistentes.[144][466][467] ​​Um ensaio clínico randomizado fatorial 2×2 de multinutrientes (ácidos graxos ômega-3, selênio, ácido fólico e vitamina D3 associada a cálcio), terapia (em grupo ou individual) ou uma combinação, administrada em pacientes com sobrepeso e sintomas depressivos subsindrômicos, mostrou que os multinutrientes não reduziram os episódios de transtorno depressivo maior ao longo de 1 ano.[468]

Farmacogenética

O surgimento de testes genéticos rápidos e economicamente acessíveis tem propiciado o uso cada vez mais difundido de testes genéticos para orientar a seleção dos antidepressivos para a depressão.[469] Os testes geralmente transmitem dois tipos de informação: alguns dos testes detectam variantes alélicas de enzimas importantes que provaram estar associadas com variações na resposta ao tratamento; a maioria delineia as variantes das enzimas metabolizadoras hepáticas de um indivíduo.[470] Esta informação não revela quais medicamentos um indivíduo pode achar eficaz, mas sim se um paciente pode precisar de altas doses de um medicamento (sendo um metabolizador rápido que excreta o medicamento antes que ele possa perfundir adequadamente o cérebro), ou doses baixas ( para um metabolizador lento que pode achar que as doses recomendadas do medicamento têm efeitos colaterais intoleráveis). Estes testes podem melhorar o desfecho.[471][472]​ No entanto, eles não provaram ser custo-efetivos na prática. A análise farmacogenômica ainda não é recomendada para uso rotineiro.[473]

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