Abordagem

Essa condição é um diagnóstico de exclusão; as manifestações podem ser sutis. Deve-se manter um índice de suspeita elevado para encefalopatia hepática (EH) como possível diagnóstico em qualquer paciente com disfunção hepática crônica ou aguda.

Em pacientes com doença hepática crônica, um fator desencadeante pode estar causando o desenvolvimento da EH, como hipovolemia, hemorragia digestiva, infecção, distúrbios eletrolíticos (hipocalemia, hiponatremia) e insuficiência renal, ingestão de sedativos ou opioides, hipóxia, hipoglicemia, consumo excessivo de proteínas pela alimentação, constipação, trombose aguda da veia porta ou hepática ou colocação recente de uma anastomose portossistêmica intra-hepática transjugular (TIPS).[1][16][17][18]

O diagnóstico e o estadiamento do EH baseia-se no exame clínico. Investigações são necessárias para descartar outras causas de alteração do estado mental.[1] Entre essas causas estão infecção, anormalidades eletrolíticas (sódio, cálcio e potássio), anormalidades da glicose, hipoxemia, uremia, exposição a toxinas (álcool ou medicamentos sedativos) e anormalidades primárias no sistema nervoso central, como sangramento ou infecção.

História

Se possível, a história completa deve ser colhida para estabelecer se existe uma causa desencadeadora ou outra causa de alteração do estado mental. Pode ser necessário obter uma história paralela com um cuidador, parente ou amigo.

Os pacientes podem descrever sintomas de perturbação do sono (principalmente sonolência diurna excessiva); alterações da personalidade como apatia, irritabilidade e desinibição; alterações de humor incluindo euforia e ansiedade; e tempo de atenção encurtado. À medida que a condição evolui, os pacientes ficam desorientados no tempo e no espaço. Eles podem ficar muito confusos, ter comportamentos inadequados ou demonstrar alterações óbvias da personalidade. Distúrbios motores, como asterixis (flapping) e dispraxia, se desenvolvem. Sonolência, confusão aguda e comportamento estranho que podem ser seguidos de inconsciência ou coma.[1]

Os pacientes, ou caso estejam confusos, seus cuidadores/familiares, devem ser questionados se tiveram algum episódio anterior de EH. Após um episódio de EH manifesta (grau 2, 3 ou 4), há um risco de 40% de recorrência no próximo ano.[1]

Exame

Deve-se realizar um exame físico completo em busca de sinais de fatores precipitantes e outras causas de alteração do estado mental. Os achados físicos de cirrose incluem icterícia, ascite, eritema palmar, edema e telangiectasias aracniformes. Pode-se observar hepatomegalia na hepatite viral inicial. Pode haver icterícia.

É possível que haja alteração nos reflexos e nistagmo. Pode ocorrer hiper-reflexia e um sinal de Babinski positivo. Sintomas extrapiramidais como rigidez muscular, bradicinesia, hipocinesia, fala lenta e monótona e tremor como de Parkinson são comuns.[1]

Asterixis (flapping) geralmente está presente.[1]

Em pacientes com cirrose e sem história de EH manifesta, deve-se realizar o rastreamento para EH oculta. Não há padrão-ouro e há poucos dados sobre quais exames devem ser usados para isso. O Animal Naming Test (ou seja, o número de animais listados em 60 segundos, sem necessidade de equipamento) é o único exame à beira do leito até o momento e mostrou resultados promissores, embora seja necessária uma validação adicional.[2]

Alguns pacientes podem não expressar sinais mentais (cognitivos e comportamentais) e sinais motores de EH. Outros expressam ambos, mas estes não se desenvolvem em paralelo, tornando o estadiamento da EH um desafio.

Investigações iniciais

Eletrólitos séricos, testes hepáticos, perfil de coagulação, ureia e creatinina, hemograma completo, glicose sérica, marcadores inflamatórios (por exemplo, proteína C-reativa), hormônio estimulante da tireoide, nível de álcool no sangue, gasometria arterial ou venosa, perfil de toxinas na urina, urocultura e hemoculturas devem ser solicitadas.[2]

Tem havido muito debate sobre o uso da medição de amônia na prática clínica.[21][22][23]​​​​ O nível de amônia sanguíneo está relacionado com a gravidade da EH, mas nem todos os casos de hiperamonemia estão associados à EH.[2]​ Níveis altos de amônia, isoladamente, não têm valor diagnóstico, de estadiamento ou prognóstico para os pacientes com EH com doença hepática crônica.[1][22]​ No entanto, um valor normal justifica uma reavaliação diagnóstica.[1]​ O teste pode ser útil nos pacientes com coma indiferenciado, para os quais níveis baixos de amônia tornam a EH menos provável.[22]​ As diretrizes europeias recomendam verificar os níveis de amônia plasmática em todos os pacientes com delirium/encefalopatia e doença hepática, pois considera-se que eles têm alto valor preditivo negativo em relação a um diagnóstico preliminar de EH, e um valor normal colocaria o diagnóstico de EH em questionamento.[2]

Exames de imagem

Uma tomografia computadorizada (TC) ou uma ressonância nuclear magnética (RNM) cranioencefálica podem ajudar a descartar outros diagnósticos ou verificar as causas precipitantes. Embora possam detectar edema e atrofia cerebral, essas alterações não são sensíveis nem específicas para EH. Em pacientes com delirium/encefalopatia e doença hepática, a imagem cerebral por TC ou RNM deve ser realizada se houver dúvidas diagnósticas ou ausência de resposta ao tratamento. São sempre justificáveis se houver suspeita clínica de hemorragia intracerebral, AVC ou lesão com efeito de massa.[2] O risco de hemorragia intracerebral aumenta pelo menos cinco vezes neste grupo de pacientes.[1] O rendimento de uma TC cranioencefálica é baixo em pacientes com cirrose e EH recorrente.[24]

Deve-se considerar uma ultrassonografia do quadrante abdominal superior em todos os pacientes com descompensação aguda inexplicada, já que uma trombose aguda da veia porta ou hepática pode ser a causa.

Outras investigações

Um eletroencefalograma (EEG) pode ser útil no diagnóstico da EH leve e na exclusão de atividades convulsivas ocultas em pacientes comatosos.[2] A EH pode estar associada à diminuição da frequência e da amplitude das ondas cerebrais.

Em pacientes com ascite, deve-se também realizar uma paracentese diagnóstica a fim de excluir peritonite bacteriana espontânea, que pode desencadear a EH.

A punção lombar pode ser considerada para descartar a meningite como causa do estado mental alterado em cenários apropriados.

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