Etiologia
A causa da policitemia vera (PV) é desconhecida, mas sabe-se que as mutações genéticas que afetam as células-tronco hematopoiéticas desempenham um papel.
A mutação condutora somática V617F na Janus quinase 2 (JAK2) está presente em aproximadamente 95% dos pacientes com PV.[3][4][5][6] As mutações no exon 12 de JAK2 estão presentes em aproximadamente 3% a 4% dos pacientes.[29] A JAK2 é uma proteína tirosina quinase citoplasmática, necessária para que o receptor de citocina hematopoiética sinalize a transdução.[30] Outras mutações (por exemplo, mutações LNK) estão presentes em aproximadamente 1% dos pacientes.[31]
A PV é uma consequência fenotípica clássica da mutação V617F em JAK2. No entanto, essa mutação não é específica para PV, pois está presente em outras neoplasias mieloproliferativas (trombocitemia essencial, mielofibrose primária), leucemia mielomonocítica crônica e leucemia mieloide aguda.[32] Existe a hipótese de que a mutação JAK2 V617F surja como um evento genético secundário, subsequente a mutações em outros genes (por exemplo, genes reguladores epigenéticos ou genes transcricionais), que causam a hematopoiese clonal na PV.[30][33] Quando o haplótipo JAK2 46/1 está presente, o risco de adquirir uma mutação V617F aumenta significativamente, e também pode aumentar o risco de outras mutações associadas à PV.[34][35][36]
Muitas variações de sequência diferentes de JAK2 (ou seja, mutações não condutoras) têm sido implicadas na PV. Em um estudo envolvendo 133 pacientes, o sequenciamento do gene visado identificou mutações não condutoras em aproximadamente 50% dos pacientes, com os reguladores epigenéticos TET2 e ASXL1 sendo os mais comuns.[37] Neste estudo, ASXL1, SRSF2 e IDH2 foram associados a um prognóstico desfavorável. Em um estudo semelhante, mutações não condutoras foram identificadas em aproximadamente 27% dos pacientes com PV (n = 130), com mutações para TET2, DNMT3A e ASXL1 mais comumente observadas.[38] TET2, DNMT3A e ASXL1 são os três genes que sofrem mutação com mais frequência na hematopoiese clonal de potencial indeterminado.[39][40] Em um estudo tipo caso-controle, a presença de uma ou mais dessas mutações aumentou consideravelmente o risco de trombose em pacientes com PV.[41]
Considerando que as mutações em reguladores epigenéticos podem ocorrer tanto antes como após a aquisição da JAK2 V617F, surgiu um interesse em estudar os efeitos da ordem das mutações nas neoplasias mieloproliferativas.[33] Estudos demonstraram que a aquisição da JAK2 V617F antes das mutações no TET2 ou no DNMT3A favorece um fenótipo de PV em vez de trombocitemia essencial.[42][43]
PV familiar e aquisição precoce de mutação condutora
A PV familiar ocorre, mas a maioria dos casos é esporádica. Mesmo nos casos familiares, a PV geralmente não é congênita, mas adquirida (isto é, os hemogramas no momento do nascimento são normais). Dados epidemiológicos, no entanto, sugerem um aumento do risco de PV em pessoas que têm um membro da família afetado.[44] Essa associação pode ser causada por mutações genéticas hereditárias que predispõem a um fenótipo de PV.[45] A policitemia neonatal quase nunca é causada por PV.
As mutações JAK V617F parecem ocorrer durante a infância (inclusive no útero) em pacientes com neoplasias mieloproliferativas. Isto é seguido pela expansão clonal e evolução de clones que determinam o fenótipo, com características clínicas apenas se tornando aparentes mais tarde na vida. A taxa de expansão clonal parece ocorrer em taxas variáveis ao longo da vida, sugerindo que fatores adicionais podem influenciar as consequências da mutação JAK2V 617F.[46]
Como em muitas neoplasias hematológicas, fatores ambientais não reconhecidos podem ser contribuintes.[47] No entanto, atualmente não existem circunstâncias ou agentes etiológicos claramente identificados.
Fisiopatologia
A PV é um distúrbio clonal de células-tronco hematopoiéticas. As mutações nas células-tronco hematopoiéticas da medula óssea favorecem sua progênia com uma vantagem proliferativa. A mutação JAK2 V617F resulta na ativação das vias bioquímicas envolvidas na sinalização do receptor da eritropoetina. Na PV, isso provoca uma expansão tri-linhagem de eritrócitos, leucócitos e plaquetas morfologicamente normais.[48] Pacientes com maior carga alélica de JAK2 V617F parecem ter maior risco de trombose e progressão mielofibrótica.[49][50][51] Um estudo de coorte revelou que a frequência alélica da variante JAK2 V617F >50% estava associada a um risco maior de trombose venosa em pacientes de baixo e alto risco com PV.[49]
Os sintomas pletóricos parecem estar relacionados à hiperviscosidade. O aumento do risco de trombose também tem sido atribuído à hiperviscosidade, conforme manifestado pelo aumento da massa de eritrócitos e/ou hematócrito.[52][53][54] No entanto, estudos sugeriram que a trombose pode ser independente do hematócrito e pode ser influenciada pela contagem leucocitária.[55][56] Os leucócitos ativados liberam vários marcadores inflamatórios que podem ser pró-trombóticos.[57] Armadilhas extracelulares dos neutrófilos (NETs) foram implicadas na fisiopatologia da trombose na neoplasia mieloproliferativa, e a formação de NET pode ser inibida, pelo menos pré-clinicamente, pela inibição farmacológica de JAK.[58] Essas conclusões são baseadas em associações e não estão estabelecidas; nem todos os estudos demonstraram existir uma relação entre leucocitose e trombose.[59][60]
As evidências coletivas de diversos estudos na PV e na trombocitemia essencial sugerem que a trombocitose não é um fator de risco independente para a trombose.[61][62][63]
Perfis genômicos da PV
O perfil de expressão gênica pode permitir a diferenciação de dois fenótipos clínicos da PV, independente de diferenças conhecidas específicas de sexo.[64] Portanto, pacientes que não diferiram significativamente com relação à idade, à carga do alelo JAK2 V617F, à contagem leucocitária, à contagem plaquetária ou à dominância clonal podem ser separados precisamente por métodos moleculares em grupos que diferiram significativamente em termos de duração da doença, nível de hemoglobina, frequência de eventos tromboembólicos, esplenomegalia palpável e esplenectomia, exposição à quimioterapia, transformação leucêmica e sobrevida.[64] Os perfis genômicos na PV também podem ser diferentes com base na idade no momento do diagnóstico.[65]
Classificação
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