Etiologia
As convulsões generalizadas podem ser genéticas ou podem ser causadas por uma doença metabólica ou imunológica subjacente ou, menos comumente, podem ocorrer na presença de uma anormalidade estrutural, tipicamente difusa, do cérebro (caso no qual também pode haver convulsões focais), ou sua etiologia pode ser desconhecida. A International League Against Epilepsy (ILAE) usa o sistema de classificação etiológica a seguir.[1]
Genética
As convulsões resultam diretamente de uma variante genética patogênica conhecida ou presumida. As epilepsias nas quais uma etiologia genética foi implicada são bastante diversas. Embora tenham sido identificados mais de 100 genes ou loci associados à epilepsia, na maioria dos casos os genes subjacentes ainda não são conhecidos. Exemplos de epilepsias genéticas incluem síndrome de Dravet e epilepsia genética com convulsões febris plus (GEFS+). Geralmente não existe um padrão de herança específico, mas sim uma herança complexa, muitas vezes com penetrância idade-dependente.[6]
O termo "epilepsias genéticas generalizadas" é usado para o amplo grupo de epilepsias com tipos de convulsões generalizadas e complexos espícula-onda generalizados, com base em uma etiologia genética presumida. Isso inclui o subgrupo de "epilepsias generalizadas idiopáticas", que se refere às quatro síndromes de epilepsia do tipo ausência da infância, epilepsia mioclônica juvenil, epilepsia do tipo ausência juvenil e epilepsia com crises tônico-clônicas generalizadas isoladas, que são as síndromes mais comuns dentro das epilepsias genéticas generalizadas.[1][3][7]
Estrutural
Refere-se a anormalidades visíveis na neuroimagem estrutural, em que a avaliação eletroclínica, juntamente com os achados de imagem, levam a uma inferência razoável de que a anormalidade na imagem é a provável causa das convulsões do paciente. As etiologias estruturais podem ser adquiridas (por exemplo, AVC, trauma e infecção) ou genéticas (por exemplo, muitas malformações do desenvolvimento cortical). Quando uma etiologia estrutural tem uma base genética bem definida, ambos os termos etiológicos (genético e estrutural) podem ser utilizados.[1] A identificação de uma lesão estrutural sutil requer estudos adequados de ressonância nuclear magnética (RNM) usando protocolos específicos de epilepsia.
Metabólica
As convulsões generalizadas podem ser causadas por um distúrbio metabólico conhecido ou suspeito ou por um distúrbio neurodegenerativo (a epilepsia faz então parte de uma encefalopatia generalizada).
Imune
As convulsões resultam diretamente de um distúrbio imunológico, no qual as convulsões são o principal sintoma do distúrbio. Deve-se suspeitar de uma etiologia imunológica quando houver evidências de inflamação do sistema nervoso central mediada por autoimunidade. Os exemplos incluem encefalite anti-receptor N-metil-D-aspartato (NMDA) e encefalite anti-LGI1 (embora estes sejam mais comumente associados a convulsões focais).
Infecciosa
As convulsões resultam diretamente de uma infecção conhecida, na qual as convulsões são o principal sintoma do distúrbio. A etiologia mais comum no mundo é aquela em que a epilepsia ocorre como resultado de uma infecção. Uma etiologia infecciosa refere-se a um paciente com epilepsia, em vez de convulsões ocorrendo no contexto de uma infecção aguda, como meningite ou encefalite. Os exemplos incluem neurocisticercose, tuberculose, vírus da imunodeficiência humana (HIV), malária cerebral, panencefalite esclerosante subaguda, toxoplasmose cerebral e infecções congênitas, como vírus da Zika e citomegalovírus.
Desconhecidas
Quando a epilepsia generalizada não pode ser classificada como uma das quatro síndromes de epilepsia generalizada idiopática ou faltam evidências de uma base genética, a epilepsia pode ser classificada como tendo uma base desconhecida.
Fisiopatologia
Nossa compreensão atual da fisiopatologia é bastante limitada. Durante as crises epilépticas, uma alteração na função do sistema nervoso central causa um paroxismo de descargas elétricas no córtex ou no tronco encefálico. Neurotransmissores excitatórios e inibitórios desempenham um papel no desenvolvimento das descargas convulsivas. Em geral, o aumento da excitabilidade e da sincronia neuronal é considerado responsável pelo início e pela propagação das convulsões. Alterações sinápticas e nas propriedades intrínsecas dos neurônios podem ser a causa da hiperexcitabilidade. Isto, por sua vez, pode ser o resultado de uma mudança no equilíbrio entre os sistemas neurotransmissores do glutamato e do ácido gama-aminobutírico (GABA). Os sistemas neurotransmissores catecolaminérgicos e os peptídeos opioides também mostraram desempenhar um papel na epileptogênese. Várias anormalidades genéticas e estruturais podem contribuir para que grupos de neurônios evoluam para esse estado.
Cada vez mais, o papel das redes funcionais em oposição a uma rede anatômica estrutural é considerado relevante, sendo as epilepsias percebidas como "um distúrbio de organização da rede cortical".[8] Para a epilepsia tipo ausência, sugere-se um modelo que envolve o circuito de neurônios corticais e talâmicos. Nesse circuito, há "neurônios rapidamente pulsantes" (fast-spiking) e neurônios inibitórios que realizam interconexões, sendo a atividade de ambos modulada por GABA.[9] Além dessa rede tálamo-cortical, outros modelos incluem uma rede límbica, neocortical e do tronco encefálico.
Classificação
Tipos de convulsões segundo o sistema International League Against Epilepsy (ILAE)[2]
O sistema da International League Against Epilepsy (ILAE) classifica as convulsões de início generalizado nos seguintes tipos com base nas manifestações clínicas motoras ou não motoras:
Não motora: ausência; interrupção nas atividades da criança, frequentemente com olhar perdido ou desatenção (ou seja, apatia)
Típica
Atípica
Ausência mioclônica
Mioclonia palpebral
Motora:
Clônica: espasmos musculares rítmicos com ou sem comprometimento da consciência
Tônica: extensão ou flexão tônica dos membros
Tônico-clônica: a crise geralmente começa com uma fase tônica e a perda de consciência do paciente, que possivelmente cai no chão, e extensão ou flexão dos membros. Pode ser precedida por aura. A fase clônica consiste, em geral, em contrações musculares violentas que resultam em tremor aparente.
Mioclônica: espasmos musculares arrítmicos e breves envolvendo um músculo ou um grupo de músculos
Mioclônico-atônicas
Mioclônico-tônico-tônicas
Atônica: breve perda de tônus muscular, causando as conhecidas "síncopes", quando o paciente cai no chão
Espasmos epilépticos
Classificação etiológica ILAE[1]
A ILAE classifica as convulsões como sendo devidas a etiologia genética, estrutural, imunológica, infecciosa, metabólica ou desconhecida. Para obter detalhes adicionais, consulte Etiologia.
Síndromes epilépticas[3]
Em 2022, a ILAE publicou uma classificação e a definição de síndromes epilépticas. Uma síndrome epiléptica é definida como "um conjunto característico de aspectos clínicos e eletroencefalográficos, muitas vezes apoiados por achados etiológicos específicos (estruturais, genéticos, metabólicos, imunológicos e infecciosos)".[3]
Na prática clínica, as características clínicas, incluindo a idade de início das convulsões, outros sinais, sintomas e achados de eletroencefalograma, ajudam a fazer um diagnóstico sindrômico eletroclínico. Síndromes diferentes têm diferentes histórias naturais e, às vezes, o diagnóstico sindrômico pode orientar o tratamento. Características importantes a serem identificadas incluem a resposta das convulsões ao tratamento e o grau de comprometimento do desenvolvimento.
O termo anterior "epilepsia generalizada sintomática", geralmente usado para se referir à epilepsia com rápido envolvimento de rede bilateral devido a uma causa subjacente, agora é substituído pelo termo "encefalopatia epiléptica e/ou do desenvolvimento", que pode consistir em uma convulsão de tipo generalizado, focal ou de ambos. O conceito de encefalopatia epiléptica implica que a epilepsia está afetando diretamente o desenvolvimento, causando um platô e a regressão cognitiva e comportamental. Nas encefalopatias do desenvolvimento e epilépticas, as etiologias genéticas, estruturais ou outras adquiridas específicas da epilepsia estão associadas ao comprometimento do desenvolvimento, que é afetado adicionalmente pela epilepsia.[1]
A seguir estão as síndromes epilépticas mais comuns (ou seja, não é uma lista exaustiva) com convulsões predominantemente generalizadas que são reconhecidas na infância, subdivididas pela idade típica de início, conforme definido pela ILAE.[3]
Início na primeira infância (1 mês a 2 anos)
Espectro de epilepsia genética com convulsões febris plus (GEFS+)
Epilepsia mioclônica do lactente (EML)
Encefalopatia epiléptica e do desenvolvimento infantil precoce (EIDEE) (inclui síndrome de Ohtahara)
Síndrome de espasmos epilépticos infantis (IESS) (inclui síndrome de West)
Síndrome de Dravet
Início na infância (geralmente entre 2 e 12 anos)
Epilepsia com crises mioclônico-atônicas (EMAtS)
Síndrome de Lennox-Gastaut (SLG)
EAI
Epilepsia com ausência mioclônica (EMA)
Epilepsia com mioclonia palpebral (EEM)
Início em idade variável (geralmente entre 10 e 14 anos)
Epilepsia mioclônica juvenil (EMJ)
EAJ
Epilepsia com crises tônico-clônicas generalizadas isoladas (GTCA)
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