Etiologia
O transtorno decorrente do uso de bebidas alcoólicas é uma doença crônica de etiologia multifatorial, com antecedentes genéticos, sociais, psicológicos e ambientais.[12][13] A hereditariedade do transtorno decorrente do uso de bebidas alcoólicas foi estimada entre 40% e 70%, mas a concordância entre gêmeos é inferior a 50%.[14] Assim, embora a genética possa desempenhar um papel, outros fatores ambientais são importantes. A exposição crônica do cérebro a bebidas alcoólicas pode resultar em alterações adaptativas em longo prazo, inicialmente produzindo um maior reforço ao uso das bebidas alcoólicas e, com o tempo, progredindo para abstinência e estados afetivos negativos, de modo que passa a existir a necessidade do uso de bebidas alcoólicas para se sentir normal.[15] Essas alterações podem persistir por meses após o abandono do uso de bebidas alcoólicas pelo indivíduo, colocando-o em risco de retorno ao uso e representando um alvo importante e efetivo para o tratamento.
O consumo excessivo de bebidas alcoólicas parece ser particularmente prejudicial, com os episódios de consumo excessivo associados a aumento da mortalidade, mesmo quando a ingestão geral de bebidas alcoólicas é baixa.[16]
Fisiopatologia
Foram relatados diversos efeitos neurocomportamentais das bebidas alcoólicas relacionados ao desenvolvimento de transtornos decorrentes do uso de bebidas alcoólicas. Os efeitos agradáveis das bebidas alcoólicas são mediados por uma via dopaminérgica que se projeta da área tegmental ventral até o núcleo accumbens.[12] A ingestão repetida de bebidas alcoólicas sensibiliza esta via e leva à dependência. A exposição em longo prazo a bebidas alcoólicas causa alterações adaptativas em diversos sistemas neurotransmissores, incluindo down-regulation dos receptores inibitórios do ácido gama-aminobutírico neuronal, up-regulation dos receptores excitatórios do glutamato e aumento da atividade central da noradrenalina.[17]
A interrupção da ingestão de bebidas alcoólicas deixa esse estado excitatório sem oposição, resultando na hiperatividade e na disfunção do sistema nervoso que caracterizam a abstinência alcoólica. Sugeriu-se, também, que os sintomas da abstinência se intensificam conforme os episódios de abstinência aumentam em número, um fenômeno chamado de abrasamento (kindling).[17][18] Os pacientes com transtornos decorrentes do uso de bebidas alcoólicas comumente sentem fissura, definida como o desejo consciente ou o impulso por ingerir bebidas alcoólicas. A fissura está relacionada aos sistemas dopaminérgicos, serotonérgicos e opioides, que mediam o reforço positivo, e aos sistemas de ácido gama-aminobutírico, glutamatérgico e noradrenérgico que mediam a abstinência.[13] Sugere-se, também, que o uso de bebidas alcoólicas em longo prazo aumente o fator de liberação da corticotrofina, do neuropeptídeo Y e de outros neurotransmissores e hormônios relacionados ao estresse, por isso o uso continuado de bebidas alcoólicas se torna necessário a fim de se reduzir o estresse e a disforia.
Classificação
O uso não saudável de bebidas alcoólicas é definido pelo National Institute on Alcohol Abuse and Alcoholism (NIAAA) dos EUA como mais de 3 doses de álcool por dia ou 7 doses de álcool por semana para mulheres e mais de 4 doses de álcool por dia ou 14 doses de álcool por semana para homens.[1]
Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, 5ª edição, revisão de texto (DSM-5-TR)[3]
Classificação de transtornos decorrentes do uso de bebidas alcoólicas:
Um padrão problemático de uso de bebidas alcoólicas durante um período de 12 meses que resulta em incapacidade ou sofrimento clinicamente significativos.
Pelo menos 2 de 11 critérios diagnósticos devem ser atendidos. Consulte Critérios.
Classificação Internacional de Doenças, 11ª edição (CID-11)[4]
A dependência alcoólica é um padrão de uso recorrente episódico ou contínuo de bebidas alcoólicas com evidências de comprometimento da regulação do uso das bebidas alcoólicas. As características da dependência geralmente são evidentes ao longo de um período de, pelo menos, 12 meses, mas o diagnóstico pode ser estabelecido se o uso for contínuo por, pelo menos, 3 meses.
O uso prejudicial do álcool é um padrão de uso que causou danos clinicamente significativos à saúde física ou mental de uma pessoa, ou que resultou em comportamento que prejudica a saúde de outras pessoas.
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