Etiologia

As alterações cerebrovasculares de fundo hipertensivo de longa duração respondem pela grande maioria das hemorragias intracerebrais primárias.[13]

Angiopatia amiloide cerebral (AAC)

É responsável por um número significativo de AVCs hemorrágicos primários, especificamente nos idosos. A prevalência permanece baixa nas pessoas com menos de 55 anos.[14] A angiopatia amiloide cerebral (AAC) é causada pela deposição beta-amiloide nas paredes das artérias de tamanho médio e pequeno restritas ao córtex cerebral (recobrindo as leptomeninges) e cerebelo.[15] Casos hereditários raros podem decorrer de mutações genéticas na cistatina C, na proteína precursora de amiloide ou na transtirretina.[16]

A deposição amiloide nos vasos sanguíneos causa danos à arquitetura vascular, necrose fibrinoide e ruptura da parede vascular, resultando em microssangramentos causados pelo acúmulo perivascular de macrófagos com depósito de hemossiderina. Esses microssangramentos cerebrais são visíveis na ressonância nuclear magnética e resultam do extravasamento de eritrócitos de pequenos vasos sanguíneos. Está comprovado que pessoas com alelo do épsilon 4 (E4) do gene para apolipoproteína (Apo) apresentam aumento do risco para AAC comparadas àqueles sem alelo. Pacientes que são heterozigotos para Apo-E4 correm maior risco de uma forma mais grave de AAC que aqueles sem o alelo Apo-E4; a probabilidade de uma forma extrema de AAC é ainda maior nos homozigotos.[14]

A presença de Apo-E2 também está relacionada ao aumento do risco de AVC hemorrágico nas pessoas com AAC. Normalmente, os microssangramentos cerebrais na AAC localizam-se nas regiões cortical e subcortical do parênquima cerebral; portanto, a AAC é uma causa importante de hemorragia lobar, mas não é causa de hemorragia em outros locais intracranianos.[14]

Hipertensão

Pode causar hemorragia em qualquer localização intracraniana. A hipertensão crônica também pode resultar em microssangramentos cerebrais causados por pequenos vasos danificados, mas eles costumam ocorrer nas estruturas cerebrais mais profundas.[13]​ Acredita-se que a presença e a quantidade de microssangramentos cerebrais seja um marcador da gravidade da doença dos pequenos vasos subjacente.[17]

Hemorragia associada a anticoagulação

Considerada pela maioria dos especialistas como uma forma de hemorragia intracerebral primária.

Hemorragia intracerebral secundária

Decorre de alguma malformação vascular identificável ou como complicação de outros quadros clínicos ou neurológicos que causem comprometimento da coagulação ou ruptura vascular. As etiologias incluem:

  • Infarto cerebral ou tumor cerebral com hemorragia no tecido doente.

  • Drogas de abuso simpatomiméticas. A cocaína e as anfetaminas compartilham características farmacológicas e também efeitos fisiológicos, mas a anfetamina tem efeitos sistêmicos mais sustentados devido a sua meia-vida mais longa. Seus efeitos simpatomiméticos causam aumentos transitórios na pressão arterial sistólica e diastólica que podem levar a danos vasculares devido à patogênese da arteriosclerose, fraqueza arterial e hemorragia intracraniana. Não há relação entre uma via de administração específica (isto é, oral, inalação ou injeção) e a incidência de AVC hemorrágico. O uso de anfetaminas está associado a um grande aumento do risco de AVC hemorrágico entre pessoas com idade entre 18 e 44 anos. Cerca de 80% dos acidentes vasculares cerebrais (AVCs) associados a anfetaminas são hemorrágicos.

  • Malformações arteriovenosas (MAVs) cerebrais são um tipo raro de lesão vascular congênita que pode apresentar-se com a hemorragia intracerebral espontânea (58%), novo episódio de convulsão (34%) ou cefaleia (8%). Elas estão presentes em 0.1% da população e tendem a ser achados incidentais durante exames de neuroimagem realizados devido a outras queixas neurológicas. Há uma prevalência maior de MAVs cerebrais associadas à telangiectasia hemorrágica hereditária (THH); os exames de neuroimagem que mostram mais de uma MAV cerebral são altamente preditivos de THH. As MAVs são conexões arteriovenosas sem um leito capilar interveniente. A conexão arteriovenosa de alto fluxo potencializa os fenômenos relacionados ao fluxo como forças de cisalhamento que podem resultar em arterialização do membro venoso, fenômeno do roubo vascular e, até mesmo, o desenvolvimento de aneurismas na MAV. De maneira geral, a hemorragia intracerebral causada por MAV tem um histórico natural mais benigno que a hemorragia intracraniana primária. O risco anual de hemorragia intracerebral derivada de uma MAV não rota é de 1.3%, enquanto o risco anual de sangramento após uma MAV rota é de 4.8%. Portanto, o risco mais importante para hemorragia intracerebral de uma MAV cerebral é uma ruptura inicial da MAV cerebral.[18]

Fisiopatologia

A hemorragia intracerebral é causada pela ruptura vascular com sangramento no parênquima cerebral, resultando em uma lesão mecânica primária no tecido cerebral. O hematoma em expansão pode causar o cisalhamento de artérias vizinhas adicionais, resultando em mais sangramento e na expansão do hematoma, que podem resultar em lesão secundária devido ao efeito de massa, aumento da pressão intracraniana, perfusão cerebral reduzida, lesão isquêmica secundária e herniação cerebral.[19]

O crescimento significativo do hematoma (30% a 40% de aumento) no período de várias horas após a apresentação é comum nos pacientes que comparecem até 3 a 4 horas após o início dos sintomas.[20] O período de sangramento pode ser ainda mais prolongado em pacientes anticoagulados. Deter o crescimento do hematoma é, portanto, um objetivo crucial das terapias clínicas ou cirúrgicas.[21] A hemorragia pode irromper no espaço subaracnoide ou no espaço intraventricular em consequência do crescimento do hematoma.

O papel das metaloproteinases da matriz (MMPs) na gênese da neuroinflamação e do crescimento do hematoma está sendo amplamente investigado. As MMPs são proenzimas inativas que, quando ativadas, estão envolvidas na degradação da matriz extracelular da membrana basal cerebral e da barreira hematoencefálica. As concentrações de MMP-9 aumentam rapidamente na neuroinflamação, e há algumas evidências de que níveis crescentes de MMP-9 estão associados à expansão do hematoma e aumento dos deficits neurológicos.[22][23][24]

A mortalidade aumenta na presença de hemorragia intraventricular, em parte devido ao aumento do risco relacionado de hidrocefalia comunicante ou não comunicante.[25] A mortalidade por hemorragia intracerebral é elevada, podendo resultar da destruição direta de áreas cerebrais críticas, compressão de áreas cerebrais críticas por hematoma adjacente ou retenção circulatória cerebral causada pelo aumento global da pressão intracraniana.

Classificação

Etiologia da hemorragia intracerebral[1]

Espontânea primária

  • Idiopática (sem malformações vasculares identificáveis ou doenças relacionadas)

  • Anticoagulação.

Secundária

  • Malformação vascular identificável

  • Quadros clínicos ou neurológicos que causam comprometimento da coagulação ou ruptura vascular (por exemplo, infarto cerebral ou tumor, abuso de drogas simpatomiméticas ou neoplasias hematológicas).

Local da hemorragia intracerebral[2]

É útil subdividir a hemorragia intracerebral por local, pois as etiologias e prognósticos podem variar dependendo da localização.

  • Lobar: ocorre no córtex ou na substância branca subcortical dos hemisférios do cérebro.

  • Hemisférico profundo: ocorre nas estruturas de substância cinzenta profunda supratentorial, com mais frequência no putâmen e nos núcleos talâmicos.

  • Tronco encefálico: ocorre principalmente na ponte.

  • Cerebelar: ocorre principalmente no núcleo denteado.

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