Etiologia

Hipogamaglobulinemia primária

A hipogamaglobulinemia primária pode ser explicada, em alguns casos, por defeitos genéticos conhecidos (por exemplo, a mutação do gene de tirosina quinase de Bruton [BTK] na agamaglobulinemia ligada ao cromossomo X [XLA]).[1] Em outros casos, pode haver defeitos de genes únicos que ainda não são reconhecidos e, em outros casos, pode haver defeitos poligênicos.

Muitos defeitos genéticos já foram identificados na imunodeficiência combinada grave (por exemplo, defeitos no gene ativador da recombinase 1 ou 2, ou defeitos na cadeia alfa do receptor de interleucina 7). Um número crescente de defeitos de gene único foi descrito em pacientes com fenótipo de imunodeficiência comum variável; no entanto, há vários pacientes com imunodeficiência comum variável sem nenhum defeito de gene único identificado. Além disso, alterações no ativador de transmembrana e interador de CAML (ATIC), no receptor do fator de ativação das células B (receptor BAFF) e na proteína homóloga 5 da MutS, a MSH5, podem atuar como polimorfismos contribuintes em alguns casos originalmente diagnosticados como imunodeficiência comum variável.[15][16][17]

Hipogamaglobulinemia secundária

A hipogamaglobulinemia secundária tem várias causas relacionadas ao comprometimento da produção ou aumento da perda de imunoglobulinas.[3][18] A produção comprometida pode estar associada a neoplasia hematológica (por exemplo, mieloma, leucemia, linfoma, leucemia linfocítica crônica de células B), medicamentos (por exemplo, rituximabe, carbamazepina, fenitoína, corticosteroides, medicamentos antirreumáticos modificadores de doença, antimaláricos, terapia citotóxica ou imunossupressora), radiação ou desnutrição.[2] O aumento da perda de imunoglobulinas pode estar associado a enteropatia perdedora de proteínas (por exemplo, doença inflamatória intestinal, enteropatia autoimune, linfangiectasia intestinal) ou síndrome nefrótica grave (embora a maioria dos pacientes com síndrome nefrótica tenha seus níveis de imunoglobulinas preservados).[2]

A European Society for Immunodeficiencies publicou uma lista de diagnóstico diferencial para hipogamaglobulinemia. European Society for Immunodeficiencies: diagnostic criteria for PID Opens in new window

Fisiopatologia

As imunoglobulinas são produzidas por plasmócitos que se diferenciam a partir de linfócitos B. Existem 5 isotipos (IgM, IgA, IgG, IgE e IgD) e 4 subclasses de IgG (IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4). As respostas de anticorpos de alta afinidade no sangue geralmente são do isotipo IgG e dependem do auxílio de células T.

As síndromes de deficiência primária de anticorpos e muitas das causas secundárias de hipogamaglobulinemia podem resultar em um defeito na imunidade humoral. Isso pode causar infecções graves e/ou recorrentes, particularmente do trato respiratório superior e inferior, mas também do trato gastrointestinal, da pele e do cérebro. Infecções crônicas e recorrentes com tratamento abaixo do ideal podem causar danos permanentes, como bronquiectasias. Bactérias encapsuladas (por exemplo, Haemophilus influenzae, Streptococcus pneumoniae) são os patógenos mais comuns em pacientes com hipogamaglobulinemia, mas micoplasmas e vírus também podem estar envolvidos.

As síndromes de deficiência primária de anticorpos que predominantemente causam uma redução acentuada dos níveis de IgG incluem imunodeficiência comum variável, XLA, agamaglobulinemias autossômicas recessivas e defeitos de recombinação na troca de classes (switching) de imunoglobulinas (por exemplo, imunodeficiência ligada ao cromossomo X com hiper-IgM).

A desregulação imunológica e o consequente desenvolvimento de autoimunidade na imunodeficiência comum variável causam distúrbios autoimunes em 25% a 30% dos pacientes (geralmente, púrpura trombocitopênica imune e anemia hemolítica autoimune).[15] Pode ocorrer uma doença do tipo sarcoide com granulomas não caseosos que afeta pulmões, fígado, baço, pele, trato gastrointestinal e linfonodos, entre outros locais. Em 20% dos pacientes ocorre hiperplasia linfoide nodular, má absorção, doença inflamatória intestinal e enteropatias celíacas.[19] A vigilância imunológica pode ser reduzida na imunodeficiência comum variável como consequência da desregulação imunológica. Isso está associado ao aumento do risco de linfoma não Hodgkin, câncer gástrico e outros tipos de malignidade, dependendo do defeito imunológico subjacente.[20][21] No entanto, nem todos os estados hipogamaglobulinêmicos estão associados ao aumento do risco de neoplasia.

Nas imunodeficiências combinadas, há ambos os defeitos, celular e de anticorpos. O defeito subjacente pode afetar algumas ou todas as linhagens de linfócitos (linfócitos B, linfócitos T e linfócitos natural killer). Alguns defeitos ocorrem apenas nas células T e, como as células B precisam do auxílio de células T, isso pode resultar em hipogamaglobulinemia. A imunodeficiência tende a ser grave (por exemplo, imunodeficiência combinada grave) e as infecções geralmente se iniciam logo após o nascimento.

Doenças de imunodeficiência primária com total de IgG normal, mas com redução de componentes específicos (por exemplo, deficiência de IgA, deficiência de subclasses de IgG, produção de anticorpos específicos comprometida), muitas vezes são menos graves que aquelas associadas à redução da IgG total. Outros anticorpos presentes podem compensar.

Classificação

Erros de imunidade inatos humanos: atualização de 2022 sobre a classificação do comitê de especialistas da International Union of Immunological Societies (IUIS)[1]

Um total de 485 erros inatos de imunidade foram descritos, com fenótipos que incluíam infecção, neoplasia maligna, alergia, autoimunidade e autoinflamação. Os distúrbios de imunodeficiência primária (IDP) podem ter apresentações diversas e afetar diferentes partes do sistema imunológico, incluindo a produção de imunoglobulinas.

Existem 10 subseções da classificação de IDP da IUIS:

  • Imunodeficiências que afetam a imunidade celular e humoral.

  • Imunodeficiências combinadas com características sindrômicas ou associadas

  • Deficiências predominantemente de anticorpos

  • Doenças de desregulação imune

  • Defeitos congênitos de função ou número de fagócitos

  • Defeitos de imunidade inata e intrínseca

  • Distúrbios autoinflamatórios

  • Deficiências do complemento

  • Falência medular

  • Fenocópias de erros de imunidade inatos.

Deficiências predominantemente de anticorpos que causam hipogamaglobulinemia são agrupadas conforme os quatro tópicos a seguir.

  • Redução grave de todos os isotipos de imunoglobulinas séricas com células B ausentes ou profundamente diminuídas, agamaglobulinemia

    • Deficiência de BTK, XLA

    • Deficiência das cadeias pesadas Mu

    • Deficiência de lambda-5

    • Deficiência de imunoglobulina alfa (Ig-alfa)

    • Deficiência de imunoglobulina beta (Ig-beta)

    • Deficiência de proteína conectora de célula B

    • Deficiência de p110-delta

    • Deficiência de p85

    • Deficiência de fator de transcrição E47

    • Deficiência de SLC39A7

    • Síndrome de Hoffman/deficiência de TOP2B

    • Deficiência de FNIP1

    • Deficiência de PU1.

  • Redução grave de pelo menos 2 isotipos de imunoglobulinas séricas com números de células B normais ou baixos, fenótipo de imunodeficiência comum variável

    • Distúrbios de imunodeficiência comum variável sem defeito de gene especificado

    • Síndrome de p110-delta ativada

    • Deficiência de PTEN (perda de função)

    • Deficiência de CD19

    • Deficiência de CD81

    • Deficiência de CD20

    • Deficiência de CD21

    • Deficiência de TACI

    • Deficiência de receptor de BAFF

    • Deficiência de TWEAK

    • Deficiência de TRNT1

    • Deficiência de NFKB1

    • Deficiência de NFKB2

    • Deficiência de IKAROS

    • Deficiência de IRF2BP2

    • Deficiência de ATP6AP1

    • Deficiência de ARHGEF1

    • Deficiência de SH3KBP1

    • Deficiência de SEC61A1

    • Deficiência de rac2

    • Deficiência de manosil-oligossacarídeo glicosidase

    • Deficiência de PIK3CG

    • Deficiência de BOB1.

  • Redução grave na IgG e IgA séricas com IgM normal/elevada e valores normais de células B, hiper IgM

    • Deficiência de citidina desaminase induzida por ativação

    • Deficiência de uracila-ácido desoxirribonucleico (DNA) glicosilase

    • Deficiência de INO80

    • Deficiência de MSH6

    • Deficiência de CTNNBL1

    • Deficiência de APRIL.

  • Deficiências de isotipos, de cadeias leves ou funcionais com valores geralmente normais de células B

    • Mutações e deleções da cadeia pesada de imunoglobulina

    • Deficiência da cadeia kappa

    • Deficiência isolada de subclasse de IgG

    • Deficiência de subclasse de IgG com deficiência de IgA

    • Deficiência seletiva de IgA

    • Deficiência de anticorpos específicos com concentrações de imunoglobulinas normais e células B normais

    • Hipogamaglobulinemia transitória da primeira infância

    • CARD 11 (ganho de função)

    • Deficiência seletiva de IgM.

Hipogamaglobulinemia secundária

A hipogamaglobulinemia secundária pode ser causada pela queda da produção ou aumento da perda de imunoglobulinas.

A produção de imunoglobulinas pode ser comprometida em decorrência dos seguintes fatores:[2]

  • Neoplasia hematológica e condições pré-malignas (por exemplo, mieloma, leucemia, linfoma, leucemia linfocítica crônica de células B)

  • Medicamento (por exemplo, rituximabe, corticosteroides, medicamentos antirreumáticos modificadores de doença, anticonvulsivantes, como carbamazepina e fenitoína, antimaláricos, medicamentos citotóxicos ou imunossupressores) ou radiação

  • Desnutrição.

A perda de imunoglobulina elevada pode ser causada pelos seguintes fatores:[2]

  • Enteropatia perdedora de proteínas (por exemplo, doença inflamatória intestinal, enteropatia autoimune, linfangiectasia intestinal)

  • Síndrome nefrótica grave (embora a maioria dos pacientes com síndrome nefrótica tenha níveis de imunoglobulina preservados)

  • Queimaduras ou outros traumas que causam perda de fluidos.

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