Critérios

Critérios do King's College[64]

A ferramenta prognóstica mais amplamente aceita para pacientes com insuficiência hepática aguda (IHA). Foram desenvolvidos por meio de uma análise retrospectiva de 588 pacientes consecutivos com IHA internados na unidade de fígado do King's College Hospital entre 1973 e 1987.[64] Fatores prognósticos associados à mortalidade foram identificados e tiveram seu valor preditivo avaliado. Observe que o nível de razão normalizada internacional (INR) usado nessa ferramenta de prognóstico difere do nível de INR usado como um recurso de diagnóstico da IHA.

Embora o preenchimento desses critérios tenha uma alta especificidade para mortalidade, a sensibilidade e o valor preditivo negativo permanecem baixos. Portanto, o não preenchimento desses critérios não garante a sobrevida.[81][82][83][84][85] Os critérios do King's College têm uma sensibilidade de 68% a 69% e uma especificidade de 82% a 92%.[8] Embora os critérios do King’s College tenham sido validados em coortes de adultos com IHA, dados sugerem que eles podem não ser confiáveis para prever desfechos na população pediátrica.[86]

Em geral, esses critérios são fundamentais na seleção de pacientes com alto risco de mortalidade por IHA. No entanto, tais critérios apresentam limitações; portanto, a American Association for the Study of Liver Diseases não recomenda que os profissionais da saúde confiem em escores prognósticos para determinar se um paciente é candidato a transplante do fígado.[8]

IHA secundária a superdosagem de paracetamol:

  • pH <7.30 ou

  • razão normalizada internacional (INR) >6.5 (tempo de protrombina [TP] >100 segundos) e creatinina sérica >300 micromoles/L (>3.4 mg/dL) em pacientes com encefalopatia hepática grau 3 ou 4.

IHA não associada ao paracetamol:

  • INR >6.5 (TP >100 segundos) ou

  • qualquer um dos 3 critérios abaixo: idade <10 e >40 anos; etiologia hepatite não A e não B, ou reação idiossincrática ao medicamento; duração da icterícia antes do início da encefalopatia hepática >7 dias; INR >3.5 (TP >50 segundos); bilirrubina sérica >300 micromoles/L (>17.6 mg/dL).

Critérios de Clichy[62]

Baseados em um estudo prospectivo francês com pacientes que apresentavam hepatite viral aguda, o qual observou que pacientes identificados como tendo os menores índices de sobrevida sem transplante do fígado incluem aqueles com encefalopatia hepática e níveis baixos de fator V.[62] Esses critérios previram a mortalidade com valor preditivo positivo de 82% e valor preditivo negativo de 98% nessa coorte. No entanto, estudos subsequentes relataram valores preditivos muito menores que os apresentados pelos critérios do King's College em outras populações, incluindo IHA causada e não causada por paracetamol.[81][87]

Presença de encefalopatia hepática e nível do fator V:

  • <20% do normal em pacientes com idade <30 anos, ou

  • <30% do normal em pacientes com idade >30 anos.

Modelo para doença hepática terminal (MELD, do inglês Model End-Stage Liver Disease)[88][89]

Adotado pela United Network for Organ Sharing e pela organização Organ Procurement and Transplantation Network, o escore MELD encontra-se bem estabelecido como um modelo preditivo validado de mortalidade em curto prazo em pacientes com cirrose e é atualmente utilizado na alocação de órgãos em pacientes que aguardam o transplante de fígado nos EUA.[88][89] Vários estudos retrospectivos relataram que o escore MELD tem valor preditivo semelhante aos critérios do King's College para mortalidade associada à IHA.[90][91][92][93] Dados prospectivos obtidos pelo grupo de estudo sobre insuficiência hepática aguda (Acute Liver Failure Study Group) nos EUA revelam que um escore MELD ≥30 em pacientes com superdosagem de paracetamol apresenta um alto valor preditivo negativo de 82%, de forma que pacientes com escores MELD <30 apresentam alta probabilidade de sobrevivência. Na IHA não causada por paracetamol, um escore MELD ≥30 apresentou um valor preditivo positivo de 81%, embora esses valores não sejam mais precisos que os observados para os critérios do King's College.[8][94] Com base nos achados de uma grande metanálise, o escore MELD poderia ter um papel na predição de mortalidade hospitalar, particularmente na IHA não causada por paracetamol.[95]

Avaliação de Fisiologia Aguda e Doença Crônica (APACHE) II[96]

O escore APACHE II foi desenvolvido para predizer a mortalidade em pacientes de todas as categorias de doença internados em unidades de terapia intensiva. O escore inclui 12 parâmetros fisiológicos e laboratoriais comuns, ajustados para a idade do paciente e para problemas de saúde crônicos subjacentes.[96] Um estudo prospectivo em pacientes com superdosagem de paracetamol revelou que um escore APACHE II >15 esteve associado a altos índices de mortalidade e teve um valor preditivo semelhante ao dos critérios do King's College, enquanto outro estudo observou que um escore ≥20 era mais preditivo de mortalidade e ocasionou maior necessidade de transplantes hepáticos.[25][97]

Índice do grupo de estudos sobre insuficiência hepática aguda (Acute Liver Failure Study Group, ALFSG)[98][99]

Um índice de prognóstico foi desenvolvido utilizando uma coorte de 250 pacientes no ALFSG e, em seguida, validado em uma coorte separada de 250 pacientes. Variáveis no momento da apresentação inicial apresentam forte associação com mortalidade ou necessidade de transplante de fígado que incluíram níveis de coma avançados, bilirrubina, INR, fósforo elevado e níveis séricos do antígeno M30, um marcador de morte celular por apoptose de hepatócitos. Esse índice apresentou sensibilidade geral de 85.6% e especificidade de 64.7% sem diferença significativa no desempenho entre IHA causada e não causada por paracetamol. Apesar desse índice preditivo ser superior aos critérios do King’s College e o score do modelo para doença hepática terminal (Model End-Stage Liver Disease, MELD), a avaliação do antígeno M30 exige um teste baseado em ensaio de imunoadsorção enzimática (ELISA) e pode não estar prontamente disponível na maioria dos centros.[98]

Um modelo adicional preditivo de sobrevida sem transplante foi desenvolvido a partir da base de dados do ALFSG, envolvendo 878 pacientes, e depois validado em uma coorte de 885 pacientes. Entre as variáveis preditivas de sobrevida sem transplante estão o grau de encefalopatia hepática, etiologia de IHA, necessidade de vasopressores, bilirrubina e INR. Entre as etiologias de IHA consideradas favoráveis nesse modelo estão superdosagem de paracetamol, gravidez, isquemia ou hepatite A. O modelo foi realizado com uma sensibilidade de 37% e uma especificidade de 95% na determinação de 80% da sobrevida sem transplante na coorte de validação.[99]

Critérios de West Haven para encefalopatia hepática[49]

  • Grau 1: atenção normal sutilmente prejudicada, alterações do sono, tempo de atenção encurtado, comprometimento da adição ou subtração, humor ou ansiedade elevados, orientados no tempo e no espaço.

  • Grau 2: letargia ou apatia, desorientação em relação ao tempo, alteração de personalidade óbvia, comportamento inadequado, dispraxia, asterixis (flapping).

  • Grau 3: sonolência a semiestupor, com resposta clínica a estímulos vocais, confusão acentuada, desorientação aguda (desorientado no tempo e no espaço), comportamento bizarro. Os achados físicos podem incluir hiper-reflexia, nistagmo, clônus e rigidez.

  • Grau 4: coma.

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