Abordagem

O tratamento bem-sucedido da difteria depende da rápida neutralização da toxina livre por meio da administração imediata da antitoxina e erradicação do Corynebacterium diphtheriae com antibióticos. Além disso, a prevenção e/ou reconhecimento precoce das complicações é essencial para melhorar os desfechos.

Pacientes com difteria respiratória precisam de hospitalização, monitoramento rigoroso, tratamento imediato com antitoxina diftérica, antibioticoterapia apropriada e cuidados de suporte. O monitoramento por eletrocardiograma (ECG), oxímetro e manejo cuidadoso das vias aéreas são importantes em casos graves. O comprometimento das vias aéreas pela membrana diftérica e pelo edema faríngeo pode precisar de intubação precoce e ventilação mecânica. Pacientes com difteria cutânea geralmente têm doença leve e costumam ser tratados como pacientes ambulatoriais.

É necessário realizar swabs dos contactantes próximos de um paciente, além de tratá-los com antibióticos profiláticos e monitorá-los de maneira adequada.[27][41]

A imunidade protetora nem sempre se desenvolve após a recuperação; assim, a vacinação de pacientes, contatos e população em geral é importante para a prevenção e controle da difteria.[1]​​[32]

Terapia com antitoxina

A antitoxina diftérica é a base do tratamento e deve ser administrada imediatamente, assim que houver forte suspeita clínica de difteria respiratória.​[12]​​​[41][45]​​[50]​​​​ A confirmação laboratorial do diagnóstico não deve atrasar a administração de antitoxina, uma vez que os pacientes podem piorar rapidamente. A antitoxina consegue neutralizar somente as toxinas livres no soro, e sua eficácia diminui significativamente após o início de sintomas mucocutâneos, os quais indicam o movimento da toxina para dentro das células.

Nos EUA, a antitoxina só está disponível para médicos dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) por meio de um protocolo de novo medicamento em fase experimental da Food and Drug Administration (FDA), enquanto no Reino Unido está disponível em centros designados após discussão com a Agência de Vigilância Sanitária do Reino Unido.​[41][51]​​​​​ A antitoxina diftérica disponível atualmente é equina, embora haja esforços em andamento para desenvolver uma antitoxina de origem humana.[52] A quantidade de antitoxina necessária depende do local e do tamanho da pseudomembrana, da duração da doença e do quadro clínico global do paciente. As doses podem variar de acordo com as diretrizes, e você deve consultar as orientações locais para obter mais informações.​[45][53]

Há risco de reações adversas com a antitoxina equina, que incluem doença febril aguda autolimitada, doença do soro e rara anafilaxia de risco de vida. Antes, as diretrizes recomendavam protocolos de teste de sensibilidade cutânea, principalmente entre pacientes com história positiva de alergia animal ou antes da exposição à imunoglobulina equina, antes da administração da dose completa de antitoxina.[51][53]​​​ No entanto, um estudo que analisou os desfechos do programa de administração de antitoxina diftérica em grande escala em Bangladesh durante o surto de 2017-2018 descreveu taxas baixas de reações adversas graves, e relatou que o teste de sensibilidade cutânea foi pouco preditivo de quais pacientes reagiriam à antitoxina sistêmica; assim, o uso de rotina do teste de sensibilidade cutânea foi descontinuado nesse cenário de surto (uma equipe treinada estava presente para detectar e tratar com rapidez as reações adversas).[54]​ A Organização Mundial da Saúde (OMS) se posiciona rigorosamente contra o teste de sensibilidade de rotina para administração de antitoxina.[45]​ Pacientes identificados com alto risco de hipersensibilidade à antitoxina podem ser submetidos a um procedimento de dessensibilização antes da administração da dose completa. Isso pode ser realizado com uma série de injeções intravenosas de pequenas quantidades de soro diluído, administradas em intervalos de 15 minutos.[51][53]

A dessensibilização e a administração da dose completa de antitoxina só devem ser realizadas por profissionais familiarizados com o tratamento da anafilaxia e em uma unidade na qual medicamentos e equipamentos de ressuscitação apropriados estejam prontamente disponíveis. Alguns médicos defendem a pré-medicação com anti-histamínicos e corticosteroides orais ou parenterais.[51][53][54] Se houver sinais de anafilaxia, a administração da antitoxina deverá ser interrompida e adrenalina deverá ser administrada imediatamente.

Os pacientes devem receber a dose completa da antitoxina em dose única, ou imediatamente após a dessensibilização, para minimizar o risco de (re)sensibilização subsequente por doses repetidas de soro equino.[51][53]

Na difteria cutânea geralmente não se justifica a administração da antitoxina. No entanto, seu uso ainda pode ser considerado, pois há relatos de sequelas sistêmicas de difteria cutânea, embora sejam raros.[5]

A - antibióticos

Os antibióticos não são substitutos do tratamento com antitoxina, mas servem para evitar a produção adicional da toxina pela erradicação de C diphtheriae. Eles também tratam as infecções cutâneas localizadas. Além disso, os antibióticos evitam a transmissão da doença para contatos.

Se disponível, testes de sensibilidade antimicrobiana locais devem ser realizados para orientar o tratamento com antibióticos.[41][45]

A OMS recomenda um antibiótico macrolídeo oral (por exemplo, azitromicina, eritromicina) como tratamento de primeira linha em vez de antibióticos penicilínicos em pacientes com suspeita ou confirmação de infecção por difteria. As penicilinas eram previamente recomendadas como tratamento de primeira linha e ainda podem ser usadas quando os macrolídeos não estiverem disponíveis e a suscetibilidade À penicilina tiver sido confirmada microbiologicamente. No entanto, devido a crescentes preocupações sobre a resistência à penicilina, atualmente os macrolídeos são preferíveis como tratamento de primeira linha.[45]

As recomendações de antibióticos podem diferir entre as diretrizes. Nos EUA, atualmente o CDC recomenda apenas eritromicina ou penicilina.[43] No Reino Unido, a Health Security Agency (UKHSA) do Reino Unido recomenda todos os macrolídeos (inclusive claritromicina) para doença leve, e terapia combinada (com macrolídeo associado a penicilina intravenosa e a possibilidade de acrescentar uma terceira opção) para doença grave.[41]

Um ciclo de 14 dias de antibióticos geralmente é considerado aceitável para o tratamento da difteria respiratória ou cutânea.​[41]​​[55]​ A administração oral é preferível, a menos que os pacientes estejam gravemente doentes ou não consigam deglutir; nesse caso, a terapia parenteral pode ser administrada inicialmente. Os médicos devem consultar as diretrizes locais para obter mais informações, pois as recomendações de duração do tratamento podem variar. Por exemplo, as diretrizes do Reino Unido sugerem que um ciclo de 7 a 10 dias pode ser suficiente se a azitromicina for usada, mas recomendam 14 dias para todos os outros antibióticos.[41]

Duas culturas negativas, colhidas com pelo menos 24 horas de intervalo, indicam tratamento bem-sucedido. Se uma das culturas for positiva, um tratamento adicional de 10 dias será iniciado.​​​[41][43]​​​​ Em cenários de surto, em que instalações microbiológicas são insuficientes para permitir o processamento repetido de amostras para cultura, considera-se que os pacientes estejam suficientemente não infecciosos para suspender o isolamento e as medidas de controle de infecção após 48 horas de antibioticoterapia.[56]

Contatos próximos assintomáticos

É de alta prioridade a identificação e investigação imediatas de contactantes próximos (isto é, todos os contactantes domiciliares e aqueles que tiveram contato respiratório íntimo ou contato físico habitual com o paciente). Esses indivíduos deverão ser monitorados para a doença durante o período de incubação (até 10 dias) e deverão ser orientados a procurar atendimento médico urgente se os sintomas se desenvolverem. Além disso, devem ser realizadas as culturas de swabs do nariz, faringe e de qualquer lesão cutânea. Se as imunizações não estiverem em dia, a pessoa deverá receber uma vacina adequada à sua idade contendo o toxoide diftérico.​[32][43]

Os contatos próximos também devem receber um ciclo de antibióticos profiláticos. As diretrizes dos EUA, com base em evidências de ensaios clínicos, recomendam eritromicina oral penicilina para a quimioprofilaxia da difteria.[43]​​​​​​​ As diretrizes do Reino Unido apoiam o uso de azitromicina ou claritromicina oral, as quais são mais toleradas pelos pacientes, mais simples de administrar e não foram associadas a nenhuma falha no tratamento relatada.[41] Caso haja história de intolerância aos antibióticos orais ou preocupações relativas à adesão, uma dose única de benzilpenicilina benzatina intramuscular pode ser usada.[41]​​[43]​​​​​​ Atualmente, as diretrizes da OMS não oferecem nenhuma recomendação para a prevenção de infecção em contactantes próximos, mas recomendam macrilídeos em preferência à penicilina para o tratamento da difteria.[45]

As equipes de saúde e de assistência social que tiverem tido contato desprotegido (por exemplo, sem uso de máscara), próximo ou cara a cara com um paciente infectado ou com suas secreções devem ser tratadas como contatos próximos, com obtenção de culturas nasais e faríngeas e prescrição de antibióticos profiláticos. Os exemplos de contato próximo incluem: realização de exame físico, alimentação ou banho em um paciente; broncoscopia; intubação; ou administração de broncodilatadores. A exposição a lesões de difteria cutânea podem incluir contato desprotegido com as lesões ou sua drenagem, como a troca de curativo, ou o manuseio de secreções potencialmente infecciosas sem o uso do equipamento de proteção individual (EPI) recomendado (ou seja, avental e luvas).[57][58]​ Os trabalhadores devem ser afastados do trabalho até que os resultados da cultura sejam conhecidos; se as culturas forem negativas para C diphtheriae produtor de toxinas, eles podem retornar ao trabalho enquanto completam a antibioticoterapia pós-exposição.[58]​ Deve ser implementado monitoramento diário do desenvolvimento de sinais e sintomas de difteria em até 10 dias após a última exposição.[41]​​[43]​​​ Os contatos próximos de casos confirmados ou prováveis de difteria que trabalham em outras profissões de alto risco devem seguir as mesmas orientações dos profissionais da saúde no que diz respeito ao afastamento do trabalho. Os exemplos são aqueles que trabalham com crianças não imunizadas e aqueles envolvidos na produção de leite (risco de C ulcerans).[41]

O status da vacinação com toxoide diftérico deve ser avaliado em todos os contatos próximos. Se não estiver atualizado, a pessoa deverá receber uma vacina adequada à sua idade contendo o toxoide diftérico como reforço, ou retomar seu cronograma de imunização.​​[32][43]

Portadores assintomáticos

Contactantes próximos que não apresentam sintomas, mas que têm culturas positivas (isto é, portadores assintomáticos), são colocados em isolamento e tratados com antibióticos. As opções de tratamento com antibióticos para portadores assintomáticos são as mesmas usadas para doença aguda.​​[41] Pacientes com colonização respiratória requerem medidas de isolamento respiratório e de contato, enquanto os pacientes com colonização cutânea requerem isolamento de contato apenas. Normalmente esses pacientes são tratados em casa. O isolamento é mantido até que duas culturas sucessivas, colhidas com pelo menos 24 horas de intervalo após o fim da antibioticoterapia, sejam negativas.[43]​​​ Novamente, em cenários de surto, em que instalações microbiológicas são insuficientes para permitir o processamento repetido de amostras para cultura, considera-se que os pacientes estejam suficientemente não infecciosos para suspender o isolamento e as medidas de controle de infecção após 48 horas de antibioticoterapia.[56]

Resultados positivos de cultura pós-tratamento justificam a repetição do ciclo de tratamento com antibióticos.[41]

Uma dose de reforço apropriada à idade de toxoide diftérico também será administrada a portadores assintomáticos se eles não tiverem recebido uma dose nos últimos 5 anos.

Encaminhamentos e consultas

Deve-se encaminhar o paciente a um otorrinolaringologista imediatamente em indivíduos com comprometimento respiratório ou complicações neurológicas graves envolvendo os nervos laríngeos. O encaminhamento para um cardiologista pode ser considerado devido ao risco de cardiomiopatia tóxica e miocardite.

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