O único tratamento aceito para a doença celíaca é uma dieta rigorosa sem glúten por toda a vida.
Aconselhamento alimentar
A dieta não deve ser iniciada até que o diagnóstico definitivo tenha sido feito pela histologia do intestino delgado.
Após o diagnóstico, o paciente deve ser encaminhado a um nutricionista com formação específica em doença celíaca e dieta sem glúten. A orientação alimentar é importante, além de informações sobre uma dieta sem glúten, pois a dieta sem glúten tem sido associada a menor ingestão de fibras, bem como a deficiências de vitaminas e micronutrientes, e a uma maior ingestão de calorias, carboidratos simples e gorduras saturadas.[94]Bledsoe AC, King KS, Larson JJ, et al. Micronutrient deficiencies are common in contemporary celiac disease despite lack of overt malabsorption symptoms. Mayo Clin Proc. 2019 Jul;94(7):1253-60.
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[131]Vici G, Belli L, Biondi M, et al. Gluten free diet and nutrient deficiencies: a review. Clin Nutr. 2016 Dec;35(6):1236-41.
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Os pacientes com doença celíaca correm o risco de apresentar obesidade/sobrepeso.[132]Bascuñán KA, Vespa MC, Araya M. Celiac disease: understanding the gluten-free diet. Eur J Nutr. 2017 Mar;56(2):449-59.
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Embora uma pequena porcentagem de pessoas possa reagir à avenina ou à contaminação cruzada com outros cereais que contenham glúten, a aveia sem glúten é recomendada na dieta por seus benefícios nutricionais (fibra solúvel, óleo poli-insaturado, vitaminas do complexo B e ferro).[73]Chaudrey KH. ACG guideline: diagnosis and management of celiac disease. Am J Gastroenterol. 2023;118(1):23.
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A qualidade de vida de pacientes com doença celíaca demonstrou melhorar, mas não normalizar, com a adesão a uma dieta sem glúten.[133]Burger JPW, de Brouwer B, IntHout J, et al. Systematic review with meta-analysis: dietary adherence influences normalization of health-related quality of life in coeliac disease. Clin Nutr. 2017 Apr;36(2):399-406.
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A adesão à dieta sem glúten é difícil, com lapsos alimentares na maioria dos pacientes.[134]Hall NJ, Rubin G, Charnock A. Systematic review: adherence to a gluten-free diet in adult patients with coeliac disease. Aliment Pharmacol Ther. 2009 Aug 15;30(4):315-30.
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A importância da dieta deve ser salientada e o suporte social avaliado e incentivado na família e com participação em grupos de apoio para portadores de doença celíaca.
Suplementação
Os pacientes devem ser examinados quanto a deficiências comuns, incluindo de ferro, vitamina D, vitamina B12 e folato. A deficiência dessas vitaminas e minerais é mais comum nos indivíduos com doença celíaca, em comparação com a população em geral.[135]Wierdsma NJ, van Bokhorst-de van der Schueren MA, Berkenpas M, et al. Vitamin and mineral deficiencies are highly prevalent in newly diagnosed celiac disease patients. Nutrients. 2013 Sep 30;5(10):3975-92.
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Todos os pacientes com doença celíaca devem ser instruídos a ingerir suplementos de cálcio e vitamina D. O ferro deve ser administrado somente a indivíduos com deficiência de ferro. A deficiência de folato e de vitamina B12 (cianocobalamina) deve ser corrigida, principalmente porque a dieta sem glúten pode ter baixo teor de folato.
Consulte:
A avaliação da densidade mineral óssea é indicada nos pacientes com doença celíaca para avaliar osteopenia ou osteoporose, mas as evidências sobre o momento ideal são escassas. Em indivíduos com outros fatores de risco para osteoporose, com idade >50 anos, com atrofia vilositária grave, é indicada a análise da densidade mineral óssea no momento do diagnóstico. Algumas diretrizes recomendam a avaliação da densidade óssea no momento do diagnóstico ou após 1 ano de dieta sem glúten, pois estudos mostram que a densidade óssea pode melhorar com uma dieta sem glúten.[73]Chaudrey KH. ACG guideline: diagnosis and management of celiac disease. Am J Gastroenterol. 2023;118(1):23.
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[136]Pantaleoni S, Luchino M, Adriani A, et al. Bone mineral density at diagnosis of celiac disease and after 1 year of gluten-free diet. Scientific World Journal. 2014;2014:173082.
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Outras recomendam a avaliação até os 30-35 anos de idade, considerando evidências que mostram uma alta taxa de osteopenia nessa população de pacientes com doença celíaca.[34]Al-Toma A, Volta U, Auricchio R, et al. European Society for the Study of Coeliac Disease (ESsCD) guideline for coeliac disease and other gluten-related disorders. United European Gastroenterol J. 2019 Jun;7(5):583-613.
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[137]Mosca C, Thorsteinsdottir F, Abrahamsen B, et al. Newly diagnosed celiac disease and bone health in young adults: a systematic literature review. Calcif Tissue Int. 2022 Jun;110(6):641-8.
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Falha na resposta ao tratamento
Para indivíduos que não respondem a uma dieta sem glúten, o problema mais comum é a continuação da exposição ao glúten. Há evidências de que, em uma dieta sem glúten supostamente adequada, os pacientes consomem glúten suficiente para desencadear os sintomas.[138]Syage JA, Kelly CP, Dickason MA, et al. Determination of gluten consumption in celiac disease patients on a gluten-free diet. Am J Clin Nutr. 2018 Feb 1;107(2):201-7.
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[139]Comino I, Fernández-Bañares F, Esteve M, et al. Fecal gluten peptides reveal limitations of serological tests and food questionnaires for monitoring gluten-free diet in celiac disease patients. Am J Gastroenterol. 2016 Oct;111(10):1456-65.
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A etapa inicial na avaliação deve ser a repetição do título de imunoglobulina A-transglutaminase tecidual (IgA-tTG) e o encaminhamento a um nutricionista especialista em doença celíaca. Se não houver nenhuma evidência de ingestão continuada de glúten, é recomendado o encaminhamento a um gastroenterologista com experiência em avaliação de doença celíaca sem resposta clínica. Embora a exposição a glúten seja a causa mais comum da doença celíaca sem resposta clínica, muitas outras afecções podem explicar os sintomas, tais como a síndrome do intestino irritável, outras intolerâncias alimentares, colite microscópica ou supercrescimento bacteriano no intestino delgado.[140]Leffler DA, Kelly CP, Green PH, et al. Larazotide acetate for persistent symptoms of celiac disease despite a gluten-free diet: a randomized controlled trial. Gastroenterology. 2015 Jun;148(7):1311-9;e6.
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[141]Losurdo G, Marra A, Shahini E, et al. Small intestinal bacterial overgrowth and celiac disease: a systematic review with pooled-data analysis. Neurogastroenterol Motil. 2017 Jun;29(6):13028.
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Embora IgA-tTG positiva indique lesão intestinal e exposição ao glúten, um valor negativo não pode descartar lesão intestinal contínua.[142]Silvester JA, Kurada S, Szwajcer A, et al. Tests for serum transglutaminase and endomysial antibodies do not detect most patients with celiac disease and persistent villous atrophy on gluten-free diets: a meta-analysis. Gastroenterology. 2017 Sep;153(3):689-701;e1.
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[143]Husby S, Bai JC. Follow-up of celiac disease. Gastroenterol Clin North Am. 2019 Mar;48(1):127-36.
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Se os sintomas persistirem ou se houver recidiva sem uma explicação alternativa, devem ser realizadas novas endoscopia digestiva alta e biópsia duodenal, independentemente da sorologia.[143]Husby S, Bai JC. Follow-up of celiac disease. Gastroenterol Clin North Am. 2019 Mar;48(1):127-36.
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Doença celíaca refratária
A doença celíaca refratária é definida como a persistência de sintomas de má absorção e da atrofia vilosa, apesar da suspensão rigorosa da ingestão de glúten por 12 meses, sem evidências de outra anormalidade, incluindo linfoma manifesto. Um subgrupo de pacientes com doença celíaca refratária desenvolve complicações de jejunite ulcerativa ou linfoma de células T associado à enteropatia.[144]Rubio-Tapia A, Murray JA. Classification and management of refractory coeliac disease. Gut. 2010 Apr;59(4):547-57.
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A perspectiva para os pacientes geralmente é desfavorável. Eles devem ser atendidos em um centro especializado em doença celíaca.
Crise celíaca
A crise celíaca é rara e se manifesta com hipovolemia, diarreia aquosa intensa, acidose, hipocalcemia e hipoalbuminemia. Os pacientes podem ter um evento clínico importante desencadeante, por exemplo cirurgia abdominal recente.[145]Jamma S, Rubio-Tapia A, Kelly CP, et al. Celiac crisis is a rare but serious complication of celiac disease in adults. Clin Gastroenterol Hepatol. 2010 Jul;8(7):587-90.
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Foram relatados casos em adultos e crianças.[145]Jamma S, Rubio-Tapia A, Kelly CP, et al. Celiac crisis is a rare but serious complication of celiac disease in adults. Clin Gastroenterol Hepatol. 2010 Jul;8(7):587-90.
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[146]Mones RL, Atienza KV, Youssef NN, et al. Celiac crisis in the modern era. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2007 Oct;45(4):480-3.
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Além da reposição parenteral de fluidos, suporte nutricional e correção das anormalidades eletrolíticas, a maioria dos pacientes pode se beneficiar de um ciclo de curta duração de terapia com glicocorticoide sistêmico até que a dieta sem glúten faça efeito.[145]Jamma S, Rubio-Tapia A, Kelly CP, et al. Celiac crisis is a rare but serious complication of celiac disease in adults. Clin Gastroenterol Hepatol. 2010 Jul;8(7):587-90.
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[147]Lloyd-Still JD, Grand RJ, Khaw KT, et al. The use of corticosteroids in celiac crisis. J Pediatr. 1972 Dec;81(6):1074-81.
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Se os pacientes forem capazes de ingerir medicamentos por via oral, a budesonida pode ser usada inicialmente. Se esse medicamento não for efetivo, a prednisolona ou um corticosteroide sistêmico equivalente pode ser iniciado, e deve ser reduzido lentamente depois que o paciente for capaz de manter a hidratação e o estado nutricional sem suplementação intravenosa.