Etiologia

A etiologia do LES não é conhecida, mas a interação de um agente ambiental em um hospedeiro geneticamente suscetível é considerada fundamental. A forte preponderância feminina também sugere um envolvimento de fatores hormonais.[12][13]

Fatores genéticos

A agregação familiar e as taxas mais altas que o esperado de concordância em estudos com gêmeos sugerem que os fatores genéticos são importantes.[14][15] A hereditariedade do LES foi estimada em 43.9%.[16]

Estudos de associação genômica ampla identificaram mais de 60 loci de risco genético.[17] Genes predisponentes podem ativar a resposta imune inata ou adaptativa, ou ter um papel potencial como autoantígeno para células B autorreativas.[18] Os loci associados ao LES consistentemente relatados incluem:[19][20][21][22][23][24]

  • IRF5 (fator regulador de interferona 5), que codifica um fator de transcrição envolvido na regulação da expressão de citocinas pró-inflamatórias por vários tipos de células

  • STAT4 (transdutor de sinal e ativador da transcrição 4), que atua como ativador da transcrição; essencial para mediar as respostas à interleucina-12 em linfócitos e regular a diferenciação de células T auxiliares

  • BANK1 (proteína scaffold de células B com repetições de anquirina 1), que codifica uma proteína scaffold específica para células B; pode contribuir para o lúpus, alterando a sinalização das células B

  • ITGAM (integrina alfa M); associação significativa entre o polimorfismo do gene ITGAM e LES em múltiplas populações étnicas

  • PTPN22 (proteína tirosina fosfatase, não receptor tipo 22), um regulador da homeostase imune por meio da inibição da sinalização do receptor de células T e pela promoção seletiva das respostas da interferona tipo I; associado a doenças autoimunes; um polimorfismo de sentido incorreto de nucleotídeo único está associado ao aumento do risco de LES.

Fatores ambientais

A associação pode ser infecciosa ou não infecciosa.

Os agentes causadores não infecciosos mais importantes são os medicamentos.[25] A primeira associação relatada foi com procainamida, mas outros medicamentos comumente implicados incluem minociclina, terbinafina, sulfassalazina, isoniazida, fenitoína e carbamazepina.[26][27][28][29][30][31][32][33]

Os patógenos mais frequentemente associados ao LES incluem o vírus Epstein-Barr, parvovírus B19, citomegalovírus e vírus da imunodeficiência humana tipo 1.[34][35][36] Os mecanismos potenciais que facilitam a autorreatividade permanecem obscuros; alterações imunológicas subsequentes à infecção e mimetismo molecular foram propostas.[34] Mais estudos são necessários para determinar se os agentes infecciosos são agentes causadores.

Fisiopatologia

O LES se trata basicamente de uma doença mediada imunologicamente provocada por antígeno, caracterizada por anticorpos do tipo imunoglobulina G de alta afinidade a DNA de fita dupla, bem como por proteínas nucleares. Os genes implicados no LES podem contribuir para a patologia, violando a tolerância imunológica e promovendo a produção de autoanticorpos.[37]

A eliminação rápida de células por apoptose geralmente evita a exposição de antígenos nucleares ao sistema imunológico. No entanto, a falha desse processo, e de outros mecanismos que conferem tolerância imunológica aos antígenos nucleares, pode provocar uma resposta imunológica.[37][38] A perda de tolerância imunológica dessa maneira é evidenciada pela presença de fator antinuclear.

A NETose, morte celular na qual armadilhas extracelulares dos neutrófilos são liberadas, é cada vez mais reconhecida como uma fonte de antígenos nucleares e moléculas bioativas que podem facilitar a autoimunidade no LES.[39]

Embora os modelos animais tenham sido usados para ilustrar como os genes que afetam a depuração de autoantígenos podem promover a produção de autoanticorpos antinucleares, as evidências em humanos permanecem limitadas.

Foram propostos vários mecanismos, por meio dos quais pode surgir a desregulação das células B provocada pelas células T, resultando em autoimunidade.

Classificação

Sistema de classificação de 2019 da European League Against Rheumatism/American College of Rheumatology[1]

Critério de entrada

  • Fator antinuclear (FAN) em um título de ≥1:80 em células HEp-2 ou um teste positivo equivalente (nunca)

  • Se ausente, não classifique como LES; se presente, aplique critérios adicionais

Critérios adicionais

  • O critério adicional não deve ser contado se houver uma explicação mais provável do que LES

  • A ocorrência de um critério em pelo menos uma ocasião é suficiente

  • A classificação de LES requer pelo menos um critério clínico e ≥10 pontos

  • Os critérios não precisam ocorrer simultaneamente

  • Dentro de cada domínio, apenas o critério mais alto é contado para o escore*

Domínios clínicos e critérios

Constitucional

  • Febre, 2 pontos

Hematológica

  • Leucopenia, 3 pontos

  • Trombocitopenia, 4 pontos

  • Hemólise autoimune, 4 pontos

Neuropsiquiátrica

  • Delirium, 2 pontos

  • Psicose, 3 pontos

  • Convulsão, 5 pontos

Mucocutâneo

  • Alopecia não cicatricial, 2 pontos

  • Úlceras orais, 2 pontos

  • Lúpus cutâneo subagudo OU discoide, 4 pontos

  • Lúpus cutâneo agudo, 6 pontos

Seroso

  • Derrame pleural ou pericárdico, 5 pontos

  • Pericardite aguda, 6 pontos

Musculoesquelético

  • Envolvimento articular, 6 pontos

Renal

  • Proteinúria >0.5 g/24 horas, 4 pontos

  • Nefrite lúpica com biópsia renal classe II ou V, 8 pontos

  • Nefrite lúpica com biópsia renal classe III ou IV, 10 pontos

Domínios imunológicos e critérios

Anticorpos antifosfolipídeos

  • Anticorpos anticardiolipina OU anticorpos anti-beta2-glicoproteína 1 OU anticoagulante lúpico, 2 pontos

Proteínas do complemento

  • C3 baixo OU C4 baixo, 3 pontos

  • C3 baixo E C4 baixo, 4 pontos

Anticorpos específicos de LES

  • Anticorpo anti-DNA de fita dupla (ds)** OU anticorpo anti-Smith, 6 pontos

Escore total

Escores de 10 ou mais são classificados como lúpus eritematoso sistêmico, se o critério de entrada tiver sido atendido.

* Itens de critérios adicionais dentro do mesmo domínio não serão contados.

** Em um ensaio com ≥90% de especificidade contra controles de doenças relevantes.

Atualização de 1997 dos critérios de 1982 revisados pelo American College of Rheumatology para a classificação do lúpus eritematoso sistêmico (LES)[2][3]

Esses critérios foram inicialmente desenvolvidos para identificar pacientes para ensaios clínicos e baseados em uma população caucasiana. Para classificar um paciente como portador de LES, são necessários ≥4 dos 11 critérios. Esses critérios podem ser apresentados de maneira serial ou simultânea durante qualquer intervalo de observação.

  1. Erupção cutânea malar

    • Eritema fixo, plano ou elevado, sobre as eminências malares, tendendo a abranger os sulcos nasolabiais.

  2. Erupção cutânea discoide

    • Manchas eritematosas elevadas com descamação queratósica aderente e obstrução folicular; pode ocorrer cicatrização atrófica em lesões mais antigas.

  3. Fotossensibilidade

    • Erupção cutânea resultante de uma reação incomum à luz solar, através da história do paciente ou da observação pelo médico.

  4. Úlceras orais

    • Ulceração oral ou nasofaríngea, geralmente indolor, observada pelo médico.

  5. Artrite

    • Artrite não erosiva envolvendo ≥2 articulações periféricas, caracterizada por sensibilidade, inchaço ou efusão.

  6. Serosite (um dos critérios a seguir):

    • Pleurite: história convincente de dor pleurítica, atrito pleural na auscultação ou evidências de derrame pleural

    • Pericardite: registrada pelo eletrocardiograma (ECG), atrito pericárdico ou evidências de derrame pericárdico.

  7. Doenças renais (um dos critérios a seguir):

    • Proteinúria persistente >0.5 g/dia ou >3+ se a quantificação não for realizada

    • Cilindros celulares: podem ser de glóbulos vermelhos, de hemoglobinas, granulares, tubulares ou mistos.

  8. Transtornos neurológicos (um dos critérios a seguir):

    • Convulsões: na ausência de medicamentos desencadeantes ou de problemas metabólicos conhecidos (por exemplo, uremia, cetoacidose ou desequilíbrio eletrolítico)

    • Psicose: na ausência de medicamentos desencadeantes ou de problemas metabólicos conhecidos (por exemplo, uremia, cetoacidose ou desequilíbrio eletrolítico).

  9. Doenças hematológicas (um dos critérios a seguir):

    • Anemia hemolítica: com reticulócitos

    • Leucopenia: <4000/mm³ em ≥2 ocasiões

    • Linfopenia: <1500/mm³ em ≥2 ocasiões

    • Trombocitopenia: <100,000/mm³ na ausência de medicamentos desencadeantes.

  10. Doenças imunológicas (um dos critérios a seguir):

    • Anti-DNA: presença de anticorpos anti-DNA nativo em título anormal

    • Anti-Smith: presença de anticorpos contra o antígeno nuclear de Smith

    • Achados positivos de anticorpos antifosfolipídeos com base em:

      • Nível sérico anormal de anticorpos anticardiolipina IgG ou IgM

      • Resultado positivo do teste para anticoagulante lúpico, usando um método padrão

      • Um teste sorológico falso-positivo para sífilis, que se sabe ser positivo por, pelo menos, 6 meses e confirmado pelo teste de imobilização de Treponema pallidum ou pelo teste de absorção do anticorpo treponêmico fluorescente.

  11. Fator antinuclear (FAN)

    • Um título anormal de anticorpo antinuclear por imunofluorescência ou por um ensaio equivalente em qualquer momento e na ausência de medicamentos associados à síndrome lúpica induzida por medicamento.

Critérios de classificação de 2012 para lúpus eritematoso sistêmico do Systemic Lupus International Collaborating Clinics (SLICC)[4]

Os critérios do SLICC para classificação de LES requerem:

  1. Cumprimento de pelo menos 4 critérios, com pelo menos um critério clínico E um critério imunológico

    ou

  2. Nefrite lúpica como único critério clínico na presença de FAN ou anticorpos anti-dsDNA.

Critérios clínicos:

  • Lúpus cutâneo agudo

  • Lúpus cutâneo crônico

  • Úlceras orais: palato

  • Alopecia não cicatricial (afinamento difuso ou fragilidade do cabelo com cabelos quebrados visíveis)

  • Sinovite envolvendo duas ou mais articulações, caracterizada por edema ou derrame OU sensibilidade em duas ou mais articulações e 30 minutos ou mais de rigidez matinal

  • Serosite

  • Renal

  • Neurológica

  • Anemia hemolítica

  • Leucopenia (<4000/mm³ pelo menos uma vez)

  • Trombocitopenia (<100,000/mm³) pelo menos uma vez.

Critérios imunológicos:

  • FAN acima do intervalo de referência do laboratório

  • Anti-dsDNA acima do intervalo de referência do laboratório, exceto ensaio de imunoadsorção enzimática: duas vezes acima do intervalo de referência laboratorial

  • Anti-Smith

  • Anticorpo antifosfolipídeo: qualquer um dos seguintes

  • Complemento baixo

  • Teste de Coombs direto na ausência de anemia hemolítica.

Revisão da classificação de nefrite lúpica pela International Society of Nephrology/Renal Pathology Society: esclarecimento das definições e índices modificados de atividade e cronicidade do National Institutes of Health[5]

  • Classe I: nefrite lúpica com mínima alteração mesangial

  • Classe II: nefrite lúpica proliferativa mesangial

  • Classe III: nefrite lúpica focal

  • Classe III (A): lesões ativas - nefrite lúpica proliferativa focal

  • Classe III (A/C):

    • Lesões ativas e crônicas: nefrite lúpica proliferativa focal e esclerosante de classe III (C)

    • Lesões inativas crônicas: nefrite lúpica esclerosante focal

  • Classe IV: nefrite lúpica difusa

  • Classe V: nefrite lúpica membranosa

  • Classe VI: nefrite lúpica esclerosante avançada.

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