Etiologia
Não existe nenhum fator etiológico específico do abuso infantil; as causas e os fatores de risco são multifatoriais. As maneiras como esses fatores se inter-relacionam para contribuir para maus-tratos à criança e os motivos pelos quais alguns cuidadores, apesar da presença de fatores de risco, são resistentes e não abusam de crianças, não são bem compreendidos.
Fatores de risco relacionados aos pais (ou cuidadores)
Condição socioeconômica desfavorável (por exemplo, pobreza, baixa renda e/ou uma crise econômica na família). Outros fatores incluem cuidados inadequados à criança e má qualidade da educação dos pais.
A taxa relatada de ocorrência concomitante de violência doméstica na família ou uma relação de abuso contínuo entre parceiros em uma relação íntima violenta com abuso infantil físico varia de 22% a 67%.[13]
Problemas psicológicos como depressão, estresse ou outros problemas de saúde mental de um cuidador podem expor a criança a abuso.[6]
O abuso de substâncias pode interferir na capacidade do cuidador de reconhecer as necessidades da criança, contribuindo para a negligência, e pode causar dificuldades financeiras. Além disso, algumas crianças podem acabar desempenhando uma função de "cuidador" de adultos não funcionais, o que coloca um enorme fardo sobre elas.
Necessidades emocionais não atendidas dos pais ou do cuidador podem predispor à negligência de uma criança.
A falta de conhecimento dos pais em relação às próprias responsabilidades pode causar expectativas irreais da criança.
A exposição do pai/mãe ou cuidador a maus-tratos quando criança é um fator de risco para abuso infantil, com evidência de um padrão de abuso que atravessa gerações em algumas famílias. Acredita-se que isso decorra de estereótipos de papel sexual e de uma repetição de um padrão de violência.[14]
Fatores de risco relacionados à criança
Crianças com problemas de saúde mental ou físicos, principalmente aquelas com comportamentos desafiadores, podem estar em maior risco de sofrer abuso.[6][15] Foi observado que crianças com deficiências são duas vezes mais propensas a sofrerem abuso que crianças sem deficiência, embora os maus-tratos também contribuam para deficiências.[16]
O baixo peso ao nascer parece estar associado a um maior risco de abuso.[17]
Choro excessivo e/ou acessos de raiva frequentes foram associados a trauma cranioencefálico violento (TCV).[18]
Gêmeos e outros múltiplos apresentam aumento do risco de abuso.[19]
Algumas pesquisas sugerem que filhos de militares dos EUA são aproximadamente 3.5 vezes mais propensos a sofrer de trauma cranioencefálico violento (TCV) que filhos de pais civis americanos.[20]
Fisiopatologia
O espectro de lesões causadas por abuso físico pode incluir hematomas, fraturas, lesões orais, mordidas, lesões cranianas ou na medula espinhal, lesões abdominais e queimaduras. A fisiopatologia depende do tipo individual de lesão.
O trauma cranioencefálico violento (TCV) e lesões relacionadas podem resultar de várias forças biomecânicas, incluindo apenas agitação, agitação com impacto ou apenas impacto.[15][21] A presença de hemorragias retinianas em várias camadas da retina e que se estendam para a periferia é altamente específica de TCV, sendo observada em aproximadamente 85% dos casos.[22][23][24] Hemorragias subdurais são as lesões intracranianas mais comumente observadas no TCV, e podem ocorrer em combinação com outras hemorragias extra-axiais ou lesões do próprio cérebro, como hemorragia subaracnoide e lesão isquêmica hipóxica (edema citotóxico).[25][26][27]
As lesões abdominais decorrentes de abuso mais específicas são lesões contusas aos órgãos ocos e/ou sólidos na ausência de uma história evidente de trauma.[28]
Fraturas nas costelas em uma criança sem nenhuma doença óssea subjacente nem história explícita de trauma maior têm a especificidade mais elevada para abuso que quaisquer outras fraturas. Essas fraturas ocorrem por compressão do tórax ou por um golpe direto.[29] Fraturas de ossos longos em crianças que ainda não se movimentam sozinhas e fraturas metafisárias também são muito comuns nos casos de abuso.[30][31] Qualquer fratura de osso longo em uma criança que ainda não se movimente sozinha deve ter uma explicação acidental clara e, se não tiver, o abuso deve ser ativamente descartado. Fraturas múltiplas que ocorreram em momentos diferentes e fraturas bilaterais são mais comuns nas crianças que sofrem abuso que naquelas que não sofrem.
Lesões orais, incluindo um freio (ou frênulo) com ruptura, podem estar associadas a lesão violenta grave ou fatal (geralmente traumatismo cranioencefálico).[32][33][34] Propôs-se que a ruptura de um freio labial possa ocorrer ao se forçar a alimentação de um lactente, embora ela só tenha sido relatada conclusivamente após um golpe direto.[34][35] As lesões dentárias incluem intrusões forçadas, extrusões, remoção de dentes secundários saudáveis e microfraturas. Nenhuma dessas lesões orais é específica de abuso, e elas devem ser avaliadas considerando-se a idade de desenvolvimento da criança e uma explicação adequada para a lesão encontrada.[36] Sabe-se que alguns pais usam de força para extrair dentes saudáveis de seus filhos como "punição".[37]
Classificação
Classificação por tipo de abuso
Abuso físico
Pode envolver dano físico pelo ato de espancar, sacudir, queimar, sufocar, envenenar, morder ou arremessar a criança. Danos físicos também podem ser causados quando um pai/mãe ou cuidador falsifica ou induz deliberadamente os sintomas de uma doença.
Lesões causadas por abuso físico podem incluir hematomas, fraturas, queimaduras, lesões orais, mordidas, lesões cranianas e na medula espinhal e lesões abdominais.
O desafio para o médico é distinguir lesões intencionais de lesões acidentais.
Abuso emocional
São maus-tratos emocionais persistentes a uma criança, que causam efeitos negativos persistentes e graves no desenvolvimento emocional. Pode envolver convencer a criança de que ela é inútil, não é amada, é inadequada ou só tem valor quando atende às necessidades de outra pessoa.[1][2]
Pode incluir a imposição de expectativas inadequadas para a idade ou nível de desenvolvimento da criança. Isso pode incluir interações que estão além da capacidade de desenvolvimento da criança, superproteção e limitação da exploração e aprendizagem, ou impedir que a criança participe de interação social normal. Também pode envolver a criança observar ou ouvir os maus-tratos sofridos por outra criança ou um dos pais.
Inclui bullying (intimidação) grave, que faz com que a criança se sinta ameaçada ou em perigo, ou exploração da criança.
Algum nível de abuso emocional está envolvido em todos os tipos de maus-tratos de uma criança.[3]
Abuso sexual
O abuso sexual implica forçar ou encorajar uma criança ou jovem a participar de atividades sexuais, incluindo prostituição e pornografia, quer ela tenha ou não consciência do que está acontecendo.
As atividades podem envolver contato físico, incluindo atos com ou sem penetração.
As ações podem incluir atividades sem contato, como envolver as crianças na observação ou produção de imagens sexuais ou incentivar as crianças a se comportar de maneiras sexualmente inadequadas.[3]
Negligência
A negligência é a falha em prover as necessidades físicas e/ou psicológicas básicas de uma criança, possivelmente causando prejuízo grave à sua saúde ou ao seu desenvolvimento. Também pode incluir negligência às necessidades emocionais básicas de uma criança, ou indiferença a estas.[2]
A negligência inclui insuficiência em relação a:
Negligência também pode ocorrer durante a gestação, quando a mãe não considera as necessidades do desenvolvimento da criança.
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