Etiologia
A emergência do diabetes mellitus do tipo 2 (DMT2) na infância parece ser decorrente de uma combinação de natureza e ambiente. O principal fator etiológico é a obesidade, embora o ambiente no útero, o peso ao nascer, a nutrição na primeira infância, a puberdade, o sexo, a etnicidade e a genética também atuem no desenvolvimento da resistência insulínica e da predisposição ao DMT2 na infância.[4][28] Lactentes que nasceram pequenos para a idade gestacional e os nascidos com macrossomia também apresentam aumento do risco para o desenvolvimento de obesidade, síndrome metabólica e DMT2 na infância.[29][30]
Obesidade
O rápido aumento recente da prevalência de DMT2 em pacientes jovens muito provavelmente se deve a alterações no ambiente: mais importantemente, ao aumento na prevalência da obesidade.[28]
A maioria das crianças tem sobrepeso (índice de massa corporal [IMC] no 85º ao 95º percentil para a idade e o sexo) ou obesidade (IMC >95º percentil) no momento do diagnóstico.
As crianças com obesidade têm hiperinsulinismo, e um metabolismo da glicose estimulado por insulina aproximadamente 40% menor se comparadas com crianças sem obesidade.[31][32][33]
A obesidade total não é tão importante quanto a localização do tecido adiposo para causar resistência insulínica.[34] A gordura visceral é mais ativa metabolicamente que a subcutânea na produção de adipocinas que causam resistência insulínica.[35]
Ambiente no útero
Estudos nos índios Pima do Arizona constataram que crianças expostas a ambiente diabético intrauterino tinham risco 3.7 vezes maior de evoluir para DMT2 na infância em comparação com irmãos nascidos antes que a mãe se tornasse diabética.[36]
Peso ao nascer e nutrição na primeira infância
A associação de peso mais baixo ao nascer com o desenvolvimento posterior de resistência insulínica, intolerância à glicose ou DMT2 sugere que a programação fetal intrauterina limita a capacidade das células beta e induz a resistência insulínica nos tecidos periféricos.[37]
Também foi constatado que o rápido ganho de peso de recuperação entre o nascimento e os 2 anos de idade em bebês com baixo peso ao nascer está associado ao aumento de adiposidade central e à resistência insulínica.[38][39]
Atualmente não está claro se a associação do baixo peso ao nascer com a resistência insulínica, a intolerância à glicose e a adiposidade central é decorrente principalmente da restrição de crescimento pré-natal e dos nutrientes intrauterinos limitados, do rápido crescimento de recuperação pós-parto, ou de uma combinação de ambos os fatores.
Foi sugerido que o aleitamento materno durante a primeira infância proteja contra o desenvolvimento de DMT2 no final da infância.[40] O aleitamento materno reduz a razão de chances para a obesidade infantil em aproximadamente 20% em comparação com a alimentação com uso de mamadeira/fórmula.[41] Considera-se que essa redução ocorre, em parte, porque o aleitamento materno resulta em taxas menores de ganho de peso em lactentes, na medida em que proporciona ingestão calórica mais apropriada em um estágio crítico do desenvolvimento que a alimentação com mamadeira, que tende a estar associada a superalimentação e obesidade.
Também foi sugerida uma associação entre a alta ingestão de proteína na primeira infância e obesidade tardia.[41] A ingestão de proteína é 55% a 80% maior por quilograma de peso corporal em lactentes alimentados com mamadeira que naqueles alimentados com leite materno.[41]
Puberdade
A idade média ao diagnóstico de DMT2 em crianças/adolescentes é de 13.5 anos (isto é, durante a puberdade).[11]
Comparada com crianças pré-puberais ou adultos jovens, a puberdade está associada à resistência insulínica relativa, refletida por aumento de duas a três vezes do pico da resposta de insulina à glicose oral ou intravenosa e uso da glicose mediado por insulina 30% menor.[32]
Quando há resistência insulínica preexistente, a puberdade pode precipitar insuficiência das células beta.[32]
Sexo
Na diabetes do tipo 2 com início na juventude, as mulheres são mais afetadas que os homens.[10]
Etnia/raça
A maioria dos casos de início de DMT2 na infância ocorre em crianças com origem racial/étnica de alto risco.[10][16][17]
Embora os grupos de risco possam variar de país para país, aqueles que vivem no subcontinente indiano formam o grupo com maior risco em todo o mundo.[18] Comparadas com crianças brancas, as originárias do subcontinente indiano manifestam adiposidade, resistência insulínica e perturbações metabólicas da obesidade mais cedo na vida e têm tendência à adiposidade central mesmo com IMC similar.[19]
As diferenças étnicas na sensibilidade à insulina são indicadas por maiores respostas da insulina à glicose oral em crianças e adolescentes negros em comparação com crianças brancas, com ajuste para peso, idade e estádio puberal.
Predisposição genética
A predisposição genética subjacente é enfatizada pelo fato de que somente uma minoria das crianças com obesidade desenvolve DMT2.
Outras evidências apoiando a etiologia genética vêm das análises de agregação e segregação familiar, indicando risco 3.5 vezes maior de evoluir para DMT2 em irmãos de indivíduos afetados em comparação com a população geral, e de estudos de gêmeos monozigóticos indicando concordância de 80% a 100%.[42]
O DMT2 em crianças e adolescentes, como em adultos, é poligênico. Mais de 20 loci foram vinculados ou associados ao DMT2 em adultos, sendo o NIDDM1 o mais importante, descrito entre irmãos mexicanos-americanos em Starr County, Texas.[43]
Fisiopatologia
Citocinas e hormônios inflamatórios, secretados pelo excesso de tecido adiposo, estão associados à diminuição da capacidade de tecidos sensíveis à insulina responderem à insulina em nível celular.[34] Essa resistência insulínica é a primeira etapa no desenvolvimento do diabetes mellitus do tipo 2 (DMT2).
A gordura visceral é metabolicamente mais ativa que a subcutânea na produção de adipocinas que causam resistência insulínica. A quantidade de gordura visceral em adolescentes com obesidade se correlaciona diretamente com os níveis de insulina basal e estimulado pela glicose e inversamente com a sensibilidade à insulina.[44] A remoção de tecido adiposos subcutâneo em adultos, com lipossucção, não altera significativamente os níveis de adipocinas, a sensibilidade à insulina ou outros fatores de risco para doença coronariana (por exemplo, hipertensão, dislipidemia), enfatizando portanto a importância da localização do excesso de tecido adiposo.[45]
As células beta do pâncreas, no início da doença, compensam essa resistência insulínica celular aumentando a secreção de insulina. Em um dado momento, no entanto, a resposta compensatória das células beta falha e a intolerância à glicose se desenvolve. O fracasso das células beta na produção de insulina suficiente para permitir a utilização adequada da glicose a nível celular é a causa subjacente da transição de resistência insulínica para DMT2 clínico.
O DMT2 autoimune é observado em 15% a 30% dos casos de DMT2 clínico na infância. Os adultos com DMT2 positivos para anticorpos específicos do diabetes têm menos sobrepeso, são mais jovens e mais propensos a necessitarem de insulina que os negativos para anticorpos.
Ceramidas elevadas nos músculos esqueléticos e alanina aminotransferase hepática elevada também estão associadas a declínio na sensibilidade à insulina e desenvolvimento de DMT2.[46][47]
Devido à sobreposição na fisiopatologia entre diabetes, doença cardiovascular, obesidade e doença renal crônica, alguns grupos argumentam que essas afecções devem ser consideradas como pertencentes a um único espectro conhecido como síndrome cardiovascular-renal-metabólica. A American Heart Association, particularmente, endossou essa terminologia e defende o rastreamento a partir dos 3 anos de idade.[48] Consulte Rastreamento para obter mais informações.
Classificação
Classificação do diabetes mellitus em crianças[1][2]
Diabetes do tipo 1 (destruição celular, geralmente ocasionando a deficiência absoluta de insulina)
Mediado imunologicamente
Idiopático.
Diabetes do tipo 2 (resistência insulínica predominante com deficiência relativa de insulina ou um defeito de secreção predominante com resistência insulínica).
Outros tipos específicos
Defeitos genéticos na função celular (por exemplo, diabetes juvenil de início na maturidade)
Defeitos genéticos na ação da insulina (por exemplo, diabetes lipoatrófico)
Doenças do pâncreas exócrino (por exemplo, fibrose cística)
Endocrinopatias (por exemplo, síndrome de Cushing)
Induzido por medicamentos ou substâncias químicas (por exemplo, glicocorticoides)
Infecções (por exemplo, rubéola congênita)
Formas incomuns de diabetes mediadas imunologicamente
Outras síndromes genéticas algumas vezes associadas ao diabetes (por exemplo, síndrome de Prader-Willi)
Diabetes mellitus gestacional
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