Abordagem
A deficiência de vitamina D é o quadro clínico mais subdiagnosticado em crianças e adultos, basicamente porque em geral os pacientes só apresentam sinais e sintomas clínicos evidentes quando a deficiência se torna grave e prolongada. Nas crianças em crescimento, a deficiência de vitamina D reduzirá a deposição de minerais nos ossos (causando as manifestações esqueléticas do raquitismo), atraso no desenvolvimento e déficit no crescimento.[78] Em adultos, a deficiência de vitamina D causa um defeito na mineralização da matriz de colágeno, de modo que eles apresentam sinais e sintomas de osteomalácia (dor e sensibilidade óssea, fraqueza muscular proximal relatada como dificuldade em levantar-se da posição sentada).[2][78]
A característica básica para diagnosticar a deficiência de vitamina D é a medição de 25-hidroxivitamina D sérica.[1][2] Embora vários distúrbios hereditários e adquiridos do metabolismo de vitamina D não resultem em um nível de 25-hidroxivitamina D sérica de <50 nanomoles/L (<20 nanogramas/mL), eles ainda são considerados causas de deficiência de vitamina D e geralmente se manifestam da mesma maneira, frequentemente com doença óssea metabólica e deformidades esqueléticas mais graves.[1][5]
História
A presença de fatores de risco deve ser investigada ao se obter a história. As pessoas com maior risco de deficiência de vitamina D incluem neonatos que recebem leite materno como única nutrição sem suplementação de vitamina D, crianças e adultos com pele negra e pacientes com síndromes de má absorção (doença celíaca, fibrose cística, síndrome do intestino curto, doença inflamatória intestinal, doença de Whipple), inclusive aqueles que se submeteram à cirurgia de bypass gástrico.[2] Além disso, crianças e adultos institucionalizados, com uma exposição mínima à luz solar, que sempre usam proteção solar antes de sair ao ar livre ou vivem em climas frios (a deficiência de vitamina D é mais comum nos meses do inverno, quando ocorre pouca ou nenhuma produção de vitamina D cutânea pela exposição ao sol) correm risco.[1][21][58]Adultos >50 anos de idade têm uma capacidade sintética reduzida de produzir vitamina D na pele e, por isso, também apresentam um risco mais elevado.[58] Crianças que não recebem pelo menos 600 unidades internacionais (UI) de vitamina D ao dia pela dieta e por suplementos, e adultos que não recebem pelo menos 1000 a 2000 UI de vitamina D ao dia pela dieta e por suplementos, têm maior probabilidade de apresentar deficiência ou insuficiência de vitamina D.[2]
Crianças e adultos obesos (índice de massa corporal [IMC] >30) e aqueles com fibrose cística precisam de 2 a 3 vezes mais vitamina D que a população geral para satisfazer seus requisitos de vitamina D e, portanto, também se enquadram na categoria de risco elevado.[1][66] A história de uso de medicamentos é importante porque os pacientes em uso de glicocorticoides, medicamentos antiepilépticos, terapia antirretroviral altamente ativa, rifampicina ou erva-de-são-joão também estão propensos a desenvolver deficiência de vitamina D.[68] Histórias de doença hepática e doença renal crônica devem ser excluídas.
Na doença leve ou inicial, os pacientes podem ser inteiramente assintomáticos. O déficit do crescimento e a realização tardia de marcos motores são apresentações infantis comuns de raquitismo. Em adultos com deficiência de vitamina D grave ou prolongada, os sintomas de osteomalácia geralmente incluem desconforto ósseo com dor pulsátil que pode ser localizado ou generalizado.[78] Além disso, fatigabilidade fácil e mal-estar são sintomas comuns. Os pacientes também podem relatar dificuldade para se levantar da posição sentada (devido à fraqueza muscular) e uma marcha cambaleante.[2] Os pacientes com osteomalácia oncogênica geralmente apresentam sintomas inespecíficos de fraqueza muscular e dor óssea.[4]
Exame físico
Crianças
O raquitismo ocorre em consequência da mineralização global inadequada do esqueleto e caracteriza-se por retardo do crescimento, dor óssea e deformidade óssea.[5] Essas anormalidades geralmente manifestam-se entre 6 meses e 2 anos de idade. O tipo de deformidade depende da situação biomecânica dos membros no momento em que a fraqueza estrutural se desenvolve. Deformidades ósseas dos antebraços e arqueamento posterior da tíbia distal podem ocorrer em lactentes (devido à tensão muscular), enquanto que um arqueamento fisiológico exagerado das pernas (geno varo) é um achado em bebês que começaram a andar (devido à força da gravidade sobre os membros inferiores). Crianças mais velhas podem apresentar deformidades das pernas com geno valgo ou do tipo "varrido pelo vento" (deformidade em valgo de uma perna e em varo da outra). Outras deformidades que podem ocorrer incluem projeções em forma de nódulo ao longo da caixa torácica (rosário raquítico), bossa frontal e alargamento das extremidades dos ossos longos, especialmente dos punhos. A tração muscular na caixa torácica amolecida é responsável pela deformação do tórax causando pectus carinatum, assimetria torácica e alargamento da base torácica. O desenvolvimento dentário é prejudicado, com erupção dentária tardia e cárie dentária precoce. Sudorese na cabeça pode ser evidente devido ao aumento da atividade neuromuscular. Lactentes ou crianças pequenas podem parecer irritáveis em consequência da dor óssea associada. Características de hipocalcemia podem estar presentes como resultado de distúrbios hereditários do metabolismo de vitamina D ou da deficiência de vitamina D crônica não tratada. Elas incluem cãibras musculares, fraqueza muscular, espasmo carpopedal, dormência, parestesias, tetania e convulsões.[78][Figure caption and citation for the preceding image starts]: Arqueamento varo ou valgo das pernas é um sinal típico do raquitismo clássicoCDC [Citation ends].
Adultos
Em adultos com deficiência de vitamina D, as placas epifisárias estão fechadas e há mineral suficiente no esqueleto para evitar as deformidades esqueléticas macroscópicas observadas em crianças. O exame físico pode revelar sensibilidade óssea localizada ou generalizada. A contração por dor óssea induzida ao se pressionar o esterno, rádio e a tíbia anterior com o dedo polegar ou indicador é um sinal clássico do desconforto ósseo periosteal associado à osteomalácia.[1] A dor nos quadris pode causar marcha cambaleante e frequentemente observa-se fraqueza muscular proximal; esse diagnóstico é feito observando-se o paciente se levantar da posição sentada com dificuldade.
Investigações laboratoriais
O diagnóstico de deficiência e insuficiência de vitamina D em adultos e crianças é realizado por meio da determinação de níveis séricos de 25-hidroxivitamina D do paciente.[1][2][74] Além disso, a medição das concentrações plasmáticas de cálcio, fósforo (em jejum) e paratormônio (PTH) intacto e fosfatase alcalina podem auxiliar o diagnóstico e ajudar a determinar a causa subjacente.
Um nível de 25-hidroxivitamina D ≤50 nanomoles/L (≤20 nanogramas/mL) é considerado deficiente em vitamina D e está associado a um nível de cálcio sérico normal, fósforo sérico normal-baixo e PTH intacto normal-alto ou elevado.[2][74] Um nível de 25-hidroxivitamina D entre 52-72 nanomoles/L (21-29 nanogramas/mL) é considerado insuficiente em vitamina D.[2] Esses pacientes apresentam um nível normal de fósforo e cálcio sérico e geralmente um PTH intacto normal ou ligeiramente elevado.
A medição do nível sérico de 1,25-di-hidroxivitamina D não contribui para a determinação do nível de vitamina D porque ela circula em uma concentração 1000 vezes menor que a 25-hidroxivitamina D, tem uma meia-vida de apenas 4 horas (comparado a 2 a 3 semanas da 25-hidroxivitamina D) e o hiperparatireoidismo secundário aumenta a sua produção. Muitos médicos que obtêm um nível de 1,25-di-hidroxivitamina D sérica, o encontram normal e concluem que o paciente não tem deficiência de vitamina D. No entanto, essa medição é importante para distinguir os distúrbios hereditários ou adquiridos do metabolismo da vitamina D.[2]
Crianças
Um nível de 25-hidroxivitamina D sérica <37 nanomoles/L (<15 nanogramas/mL) geralmente está associado a manifestações esqueléticas de raquitismo por deficiência de vitamina D. O cálcio sérico pode ser normal ou baixo e o fósforo sérico geralmente é normal-baixo ou baixo. Os níveis séricos de fosfatase alcalina e PTH intacto geralmente são elevados. Uma criança com raquitismo por pseudodeficiência de vitamina D geralmente tem um nível de 25-hidroxivitamina D normal com hipocalcemia, hipofosfatemia, níveis de fosfatase alcalina e PTH intacto elevados com um nível baixo ou indetectável de 1,25-di-hidroxivitamina D. Uma criança com raquitismo por deficiência de vitamina D tem todas as manifestações bioquímicas do raquitismo por pseudodeficiência de vitamina D, com a exceção de que a 1,25-di-hidroxivitamina D sérica é acentuadamente elevada. Crianças com raquitismo hipofosfatêmico ligado ao cromossomo X e raquitismo hipofosfatêmico autossômico dominante têm uma 25-hidroxivitamina D sérica e cálcio normais, um nível baixo de fósforo sérico e um nível inadequadamente baixo ou normal-baixo de 1,25-di-hidroxivitamina D.[1][5]
Adultos
Para adultos, não há nenhuma deformidade esquelética evidente porque as placas epifisárias estão fechadas. Em vez disso, a deficiência de vitamina D causa hiperparatireoidismo secundário, com fosfatase alcalina normal ou discretamente elevada, cálcio normal e fósforo de jejum baixo ou normal-baixo. A característica básica da osteomalácia oncogênica é um nível de fósforo sérico baixo (geralmente 0.39-0.52 mmol/L [1.2-1.6 micrograma/dL]) e um nível inadequadamente baixo ou normal-baixo de 1,25-di-hidroxivitamina D.[4] Os níveis de cálcio sérico e PTH intacto são geralmente normais, enquanto o nível de 25-hidroxivitamina D é baixo ou normal.
Exames por imagem
Em pacientes assintomáticos, as radiografias simples geralmente são desnecessárias, mas radiografias dos joelhos e punhos devem ser realizadas quando há suspeita de raquitismo ou osteomalácia.[78] O alargamento da placa epifisária e a perda de definição da zona de calcificação provisória na interface epífise/metáfise são os primeiros sinais de raquitismo. Pseudofraturas de Looser perpendiculares às margens corticais com as bordas escleróticas características são um achado patognomônico na osteomalácia.[79][Figure caption and citation for the preceding image starts]: Radiografias de um punho de uma criança com raquitismo por deficiência de vitamina D antes (figura esquerda) e depois (figura direita) do tratamento com vitamina DDo acervo de M.F. Holick, PhD, MD; usado com permissão [Citation ends].[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Radiografia da haste femoral em paciente com osteomalácia demonstrando "pseudofratura" (também conhecida como zona de Looser) no aspecto medial da haste femoral médiaDo acervo de Bridget Sinnott, MD [Citation ends].
Adultos com deficiência de vitamina D crônica podem ter baixa densidade óssea, causando osteopenia e osteoporose. Por isso, deve-se realizar um exame de absorciometria por dupla emissão de raios X (DXA) para avaliar a densidade óssea; ele também é útil para acompanhar a evolução da doença.
O uso deste conteúdo está sujeito ao nosso aviso legal