Etiologia
A SHR pode se desenvolver espontaneamente em pacientes com cirrose descompensada, mas a prevalência de LRA não provocada é baixa. Com frequência, é provocada por quadros clínicos que causam alterações hemodinâmicas agudas, inclusive diurese excessiva, hemorragia digestiva, sepse por infecções como peritonite bacteriana espontânea, medicamentos ou paracentese de grande volume sem administração de albumina.[1] A SHR pode também se desenvolver em pacientes com hepatite grave relacionada ao álcool.[13]
Os fatores preditivos independentes da ocorrência de SHR são baixa concentração sérica de sódio e alta atividade de renina plasmática.[9]
Fisiopatologia
A circulação hiperdinâmica não compensada é considerada a marca registrada da SHR-LRA, mas a patogênese é complexa e envolve disfunção macro e microvascular, inflamação sistêmica e dano tubular direto.[5][14] Infecção é um dos fatores desencadeantes mais comuns da SHR.[8]
Quatro fatores primários estão envolvidos na fisiopatologia vascular da síndrome hepatorrenal (SHR):[2][15]
A vasodilatação sistêmica causa uma redução moderada da pressão arterial
A ativação do sistema nervoso simpático causa vasoconstrição renal e autorregulação renal alterada, uma vez que o fluxo sanguíneo renal é muito mais dependente da pressão arterial média
Há comprometimento relativo da função cardíaca, de modo que, embora o débito cardíaco aumente, ele não consegue aumentar de forma adequada para manter a pressão arterial. Na cirrose, essa condição é denominada cardiomiopatia cirrótica
Há um aumento na formação de vasoconstritores renais, como o tromboxano A2, os F2-isoprostanos, a endotelina 1, os cisteinil-leucotrienos, embora a sua função exata na patogênese da SHR não esteja clara.
A inflamação sistêmica pode também causar SHR.[5][16] Em um estudo prospectivo com 100 pacientes com cirrose, de cinco hospitais franceses, a síndrome da resposta inflamatória sistêmica foi observada em 41% dos pacientes, dos quais 56% tinham infecção.[16] Em pacientes com cirrose, a inflamação é causada por padrões moleculares associados a patógenos, que incluem produtos bacterianos, e por padrões moleculares associados a danos, que incluem componentes intracelulares liberados por hepatócitos lesionados.[5] Quando não há uma infecção bacteriana evidente, padrões moleculares associados a patógenos e padrões moleculares associados a danos podem causar inflamação e liberar citocinas pró-inflamatórias por meio da ativação dos receptores de reconhecimento de padrões (por exemplo, receptores do tipo Toll).[5] Essa ativação da resposta pró-inflamatória pode aumentar a produção de vasodilatadores, como o óxido nítrico, o que, por sua vez, reduz a resistência vascular sistêmica e o volume sanguíneo arterial efetivo.[5]
A coléstase grave pode comprometer ainda mais a função renal ao agravar a inflamação e a disfunção macrocirculatória ou promover dano tubular relacionado aos sais biliares.[14]
Insuficiência adrenal, cardiomiopatia cirrótica, nefropatia colêmica e pressão intra-abdominal elevada podem também contribuir para a SHR.[5]
Classificação
Classicamente, a SHR era subdividida em tipo 1 e tipo 2 pelo International Club of Ascites.[3] Resumidamente, a SHR do tipo 1 envolvia lesão renal aguda (LRA) rapidamente progressiva com aumento de duas vezes o valor da creatinina sérica inicial, para um valor >2.5 mg/dL em <2 semanas, e a SHR do tipo 2 se referia a insuficiência renal moderada que não atendia aos critérios do tipo 1. Desde então, a classificação foi atualizada para se alinhar às diretrizes do Kidney Disease Improving Global Outcomes (KDIGO).[4][5] A classificação revisada elimina o pré-requisito de dobrar os níveis de creatinina sérica para iniciar o tratamento da SHR-LRA (anteriormente denominada SHR do tipo 1), pois se constatou que os níveis de creatinina são inversamente proporcionais à reversão da SHR.[4][6][7]
Classificação revisada do International Club of Ascites
SHR-LRA[4]
Uma forma singular de LRA
Requer um diagnóstico de LRA, de acordo com os critérios do International Club of Ascites (ou seja, aumento da creatinina sérica ≥26.5 micromoles/mL (≥0.3 mg/dL) em 48 horas; ou aumento percentual da creatinina sérica ≥50% em relação à linha basal, que tenha ocorrido, de maneira comprovada ou presumida, nos 7 dias anteriores)
Anteriormente denominada SHR do tipo 1, mas elimina o limite fixado de aumento da creatinina sérica, o que pode permitir um diagnóstico mais precoce.
Comprometimento renal que preenche os critérios para SHR, mas não LRA
Anteriormente denominada SHR do tipo 2
As subcategorias são definidas pela taxa de filtração glomerular estimada e pela duração, da seguinte maneira:
SHR-doença renal aguda (SHR-DRA)
Taxa de filtração glomerular estimada <60 mL/min/1.73 m² por <3 meses, na ausência de outras possíveis causas de outras doenças renais
Aumento da creatinina sérica <50%, utilizando o último valor disponível de creatinina sérica ambulatorial em 3 meses como linha basal.
SHR-doença renal crônica (SHR-DRC)
Taxa de filtração glomerular estimada <60 mL/min/1.73 m² por ≥3 meses, na ausência de outras possíveis causas de outras doenças renais.
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