Etiologia

A MG é uma doença autoimune, órgão-específica, mediada por anticorpos. Estão presentes anticorpos na junção neuromuscular (JNM), o local da patologia.[1]

Cerca de 80% a 90% dos pacientes com MG possuem anticorpos antirreceptor nicotínico da acetilcolina (AChR) detectáveis na membrana muscular pós-sináptica da JNM.[2][5] Alguns pacientes que não apresentam anticorpos anti-AChR detectáveis por ligação padrão e ensaios de modulação mostraram apresentar anticorpos ligadores anti-AChR usando um ensaio baseado em células.[38] A remoção de anticorpos (por plasmaférese, redução por imunomodulação, inibição de mediadores patogênicos ou redução por imunossupressão) melhora os sintomas em pacientes com MG.[39][40]

Anticorpos contra outras proteínas da JNM foram detectados em pacientes com MG:[2][5][9][10][11][27][28][41]

  • Aproximadamente, 3% a 7% dos pacientes apresentam anticorpos direcionados contra a tirosina quinase músculo específica (MuSK).

  • Anticorpos contra a proteína relacionada ao receptor de lipoproteína de baixa densidade (LRP4) foram relatados; muitas vezes estes são detectados em pacientes que são negativos para anticorpos anti-AChR e anti-MuSK.

  • Anticorpos antiagrina foram demonstrados no soro de pacientes que apresentam anticorpos contra AChR (mas, até hoje, não em pacientes com anticorpos anti-MuSK) e em pacientes sem anticorpos contra AChR, MuSK ou LRP4.

  • A importância clínica dos anticorpos contra o colágeno Q e a cortactina ainda não está clara.

A etiologia para a síntese de anticorpos autoimunes permanece obscura, embora certos genótipos, particularmente vinculados ao complexo antígeno leucocitário humano (HLA), possam ser mais suscetíveis.[42][43] Polimorfismos de nucleotídeos únicos (SNPs) foram relatados em uma ampla variedade de genes em diferentes populações com MG, incluindo vários SNPs de antígeno 4 associado ao linfócito T citotóxico (CTLA-4).[44][45][46]

O timo pode estar envolvido na etiologia da MG. A MG está associada à hiperplasia folicular tímica ou ao timoma em 70% e 10% dos pacientes, respectivamente.[47] Embora quase todos os pacientes com MG e timoma tenham anticorpos anti-AChR, foram relatados MG e timoma maligno concomitantes em vários pacientes soronegativos para AChR.[48][49] Células mioides tímicas expressam AChR e podem desencadear a síntese de autoanticorpos. Por outro lado, em pacientes com MG positiva para MuSK, a histologia da glândula tímica costuma ser, mas não invariavelmente, normal, e timomas são raros.[25]

Vários estudos demonstram anormalidades no número e na função das células T e B regulatórias em pacientes com MG, que provavelmente estão envolvidas no estado de autoimunidade e doença autoimune.[50][51][52][53]

Não existem fatores de risco específicos para o desenvolvimento da MG além dos genéticos (complexo principal de histocompatibilidade e outros genes) e da presença de outras doenças autoimunes no paciente e familiares.[45][46][54][55] Um estudo realizado com 462 pacientes com MG na Espanha constatou que 16 casos (3.46%), de 8 famílias não relacionadas, eram familiares.[56]

O uso de inibidores de checkpoint na terapia do câncer tem sido associado ao desenvolvimento de doenças inflamatórias e autoimunes, incluindo MG com ou sem miosite concomitante, e agravamento de MG preexistente.[3][57][58][59][60]

Fisiopatologia

Na MG caracterizada por anticorpos contra receptores da acetilcolina (AChRs), um ataque autoimune contra AChRs frequentemente acarreta destruição mediada por complemento da membrana pós-sináptica.[23] Os anticorpos contra AChR podem aumentar a endocitose de AChR ou bloquear os sítios de ligação da acetilcolina.[61] O número reduzido de sítios de ligação disponíveis para a acetilcolina causa geração inconsistente de potenciais de ação na fibra muscular, que se manifesta como fraqueza muscular esquelética.

A tirosina quinase músculo específica (MuSK) é uma proteína dependente da agrina, localizada nas membranas musculares, com função essencial na ancoragem de AChR nas pontas das dobras pós-sinápticas. Anticorpos anti-MuSK no plasma, isolados de pacientes com MG positiva para MuSK, inibiram fortemente o agrupamento de AChR em células musculares cultivadas.[62]

Anticorpos contra a LRP4 e contra agrina modificam a atividade da junção pós-sináptica in vitro.[11][28] A sensibilização de animais com LRP4 resulta em miastenia gravis experimental, e anticorpos anti-LRP4 transferem o bloqueio neuromuscular para animais virgens de tratamento.[63] Há relatos de indução experimental da MG autoimune em camundongos após a imunização com agrina.[64] Há evidências de que anticorpos anti-LRP4 humano e provavelmente antiagrina causam inibição da transmissão neuromuscular em camundongos.[61][65] O estado da placa terminal em pacientes com MG com anticorpos anti-LRP4 e antiagrina é desconhecido.

A função, se houver, dos anticorpos a componentes citoplasmáticos, inclusive a titina e outros anticorpos com estriações transversais, rapsina e rianodina, não é claramente compreendida. Eles podem afetar a intensidade, mas não causam deficits na transmissão neuromuscular.

Classificação

Classificação clínica da miastenia gravis pela Myasthenia Gravis Foundation of America[4]

Classe I: qualquer fraqueza da musculatura ocular; possível ptose; força muscular normal em todos os outros músculos

Classe II: fraqueza leve de outros músculos; pode ocorrer fraqueza da musculatura ocular de qualquer intensidade

  • IIa: predominantemente em músculos dos membros e/ou axiais

  • IIb: predominantemente em músculos orofaríngeos e/ou respiratórios

Classe III: fraqueza moderada de outros músculos; pode ocorrer fraqueza da musculatura ocular de qualquer intensidade

  • IIIa: predominantemente em músculos dos membros e/ou axiais

  • IIIb: predominantemente em músculos orofaríngeos e/ou respiratórios

Classe IV: fraqueza intensa de outros músculos; pode ocorrer fraqueza da musculatura ocular de qualquer intensidade

  • IVa: predominantemente em músculos dos membros e/ou axiais

  • IVb: predominantemente em músculos orofaríngeos e/ou respiratórios; uso de sonda alimentar sem intubação

Classe V: intubação necessária para manutenção de vias aéreas

Presença de anticorpos antitirosina quinase músculo-específica (MuSK)[5][6][7]

  • MG negativa para MuSK: ausência de anticorpos anti-MuSK

  • MG positiva para MuSK: presença de anticorpos anti-MuSK

Esses tipos frequentemente apresentam diferentes características epidemiológicas e clínicas.

Pacientes com MG podem raramente apresentar anticorpos contra ambos, receptor da acetilcolina (AChR) e MuSK.

Presença de anticorpos direcionados contra LRP4, agrina, colágeno Q ou cortactina

Não há informações suficientes para saber se existem fenótipos clínicos específicos associados a anticorpos anti-proteína 4 relacionada ao receptor da lipoproteína de baixa densidade (LRP4), agrina, colágeno Q ou cortactina, ou se esses anticorpos podem também ser raramente observados em outras doenças.[8]

LRP4[9][10]

  • Alguns pacientes com anticorpos contra LRP4 parecem não apresentar anticorpos detectáveis anti-AChR ou anti-MuSK.

Agrina[10][11][12][13][14]

  • Alguns pacientes com anticorpos antiagrina também apresentam anticorpos anti-AChR; alguns não apresentam anticorpos detectáveis anti-AChR, anti-MuSK ou anti-LRP4; e alguns apresentam anticorpos a outro antígeno da junção neuromuscular.

Colágeno Q[15][16]

  • A importância clínica dos anticorpos contra o colágeno Q ainda não está clara. Como o colágeno Q é uma proteína que ancora a acetilcolinesterase na junção neuromuscular, os anticorpos podem afetar a transmissão neuromuscular.

  • Um estudo constatou que 3% (12/415) de amostras de soro de pacientes com MG tinham anticorpos ao colágeno Q em comparação com 2% dos controles (1/43). Dos 12 pacientes com MG positivos para anticorpos do colágeno Q, 5 também eram positivos para anticorpos anti-AChR e 2 eram positivos para anticorpos anti-MuSK. Não está claro se esses anticorpos afetam a resposta à acetilcolinesterase nesses pacientes.

Cortactina[17][18][19][20][21]

  • Há estudos que relataram anticorpos reativos com a cortactina em pacientes com MG. A importância clínica desses anticorpos ainda não está estabelecida, e a presença de tais anticorpos não é específica para MG. A cortactina interage com a actina e pode estar envolvida na contração das células musculares. No entanto, como é uma proteína intracelular, os anticorpos anticortactina provavelmente não veriam seu antígeno-alvo no músculo intacto.

  • Até o momento, foram observados anticorpos anticortactina em pacientes que também apresentam anticorpos anti-AChR, mas não anti-MuSK, bem como em pacientes "duplamente soronegativos" (ou seja, sem anticorpos detectáveis anti-AChR usando ensaios padrão ou anti-MuSK).

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