Abordagem
O tratamento definitivo da tetralogia de Fallot é o reparo cirúrgico completo. Todos os pacientes pré-operatórios com tetralogia de Fallot precisam de acompanhamento cuidadoso com seu médico de atenção primária e um cardiologista pediátrico. A atenção para o ganho de peso é mandatória. Deve ser observada progressão da cianose. Os pais devem ser aconselhados a alertar seus médicos se eles notarem o início de crises hipercianóticas, pois elas podem ser uma indicação de intervenção cirúrgica urgente.
Tratamento de crises hipercianóticas
Uma criança com tetralogia de Fallot e crises hipercianóticas é uma emergência médica, pois uma crise hipercianótica prolongada pode provocar isquemia cerebral e óbito.[17]
O tratamento de uma crise hipercianótica consiste em acalmar a criança e realizar manobras para aumentar a quantidade de sangue que sai do ventrículo direito para a vasculatura pulmonar em vez de para a aorta. Geralmente, o melhor lugar para a criança é nos braços dos pais. Inicialmente, a criança deve ser posicionada com os joelhos no peito, pois isto aumenta o retorno venoso para o coração (pré-carga) e a pós-carga sistêmica.
Deve-se administrar oxigênio, mas com cuidado para não estimular demais a criança. Se a criança ainda estiver profundamente cianótica, irá ocorrer acidose.
Se essas medidas não forem bem-sucedidas, a terapia medicamentosa inclui:
Medidas de suporte adjuvantes, como reposição volêmica, reversão da acidose ou morfina
Betabloqueadores para relaxar o infundíbulo contraído e para permitir mais tempo para o enchimento do ventrículo direito, melhorando o fluxo sanguíneo pulmonar
Fenilefrina como a última opção clínica para aumentar a resistência venosa sistêmica e forçar mais sangue aos pulmões.
Os neonatos com fluxo sanguíneo pulmonar gravemente limitado causando cianose profunda podem se beneficiar de prostaglandinas (por exemplo, alprostadil) para manter a patência do canal arterial. Isso proporciona uma fonte alternativa de fluxo sanguíneo pulmonar enquanto a criança aguarda uma intervenção urgente.
Se todas as terapias medicamentosas não resolverem uma crise e o neonato ou bebê permanecer gravemente cianótico, será necessária uma intervenção urgente. As opções incluem balonamento ou colocação de stent na via de saída do ventrículo direito por cateter, cirurgia de derivação de Blalock-Taussig (um pequeno tubo GORE-TEX é colocado a partir de uma artéria sistêmica até as artérias pulmonares para aumentar o fluxo sanguíneo pulmonar), colocação de stent em uma persistência do canal arterial, reparo completo imediato ou oxigenação por membrana extracorpórea.[22][25][26]
O propranolol foi usado no passado em pacientes ambulatoriais pediátricos em crise para atrasar a cirurgia. Uma criança com uma única crise é considerada uma indicação para reparo cirúrgico urgente, mas o propranolol pode ser usado até que a cirurgia seja providenciada.[27]
Tratamento cirúrgico
Nos últimos 10 a 15 anos, houve uma tendência de reparo neonatal tanto de crianças cianóticas quanto acianóticas com tetralogia de Fallot, mas isso é geralmente determinado por sua anatomia pulmonar.[27]
Em pacientes acianóticos sem crises, o reparo em geral é realizado no primeiro ano de vida e apresenta morbidade e mortalidade muito baixas.[26][28]
Os pacientes com tetralogia de Fallot com estenose pulmonar grave podem ser submetidos a reparo neonatal completo em algumas instituições ou, alternativamente, podem ser submetidos a uma derivação de Blalock-Taussig ou colocação de stent em uma persistência do canal arterial no período neonatal antes do reparo completo.[25][26]
Foram relatados excelentes resultados com o reparo completo no período neonatal, com uma coorte relatando uma taxa de sobrevida de 5 anos em 93% dos pacientes com tetralogia de Fallot que foram submetidos ao reparo completo no período neonatal.[27][29]
Os pacientes que tiverem sido submetidos a reparo na infância devem ser aconselhados sobre a possível necessidade de uma futura intervenção cirúrgica ou transcateter. Em particular, se o alívio da obstrução pulmonar precisar de um remendo transanular, é provável que haja uma quantidade significativa de regurgitação pulmonar pós-operatória. Existe uma preocupação cada vez maior com a necessidade de se monitorar os pacientes quanto à dilatação progressiva do ventrículo direito decorrente da regurgitação pulmonar de longa duração, e com a necessidade de substituição da valva pulmonar nesse cenário. Normalmente, as medições por ressonância nuclear magnética são usadas para quantificar a regurgitação pulmonar e o tamanho do ventrículo direito. Um grupo sugeriu que a substituição da valva antes que o volume diastólico do ventrículo direito atinja 160 mL/m² permite a normalização dos volumes do ventrículo direito.[30] Outro grupo descobriu que nenhum paciente com volume do ventrículo direito >170 mL/m² apresentou normalização dos volumes do ventrículo direito após a substituição da valva.[31] Embora não exista um consenso sobre os critérios exatos para o momento da substituição da valva pulmonar, uma revisão sugere usar os seguintes critérios:[32]
Tetralogia de Fallot reparada ou fisiologia semelhante com regurgitação pulmonar moderada ou grave (fração de regurgitação ≥25% medida por ressonância nuclear magnética cardiovascular) e 2 ou mais dos seguintes critérios:
Índice de volume diastólico final no ventrículo direito ≥160 mL/m² (Z-score >5)
Índice de volume sistólico final no ventrículo direito ≥70 mL/m²
Índice de volume diastólico final do ventrículo esquerdo ≤65 mL/m²
Fração de ejeção do ventrículo direito ≤45%
Aneurisma na via de saída do ventrículo direito
Critérios clínicos: intolerância a exercício, sintomas e sinais de insuficiência cardíaca, medicações cardíacas, síncope ou taquicardia ventricular sustentada.
Outras lesões hemodinamicamente significativas, como regurgitação tricúspide moderada ou grave, defeito do septo ventricular ou atrial residual e regurgitação aórtica grave podem desencadear o encaminhamento para cirurgia em pacientes com regurgitação pulmonar moderada ou grave. Na ausência dos 6 critérios acima, a substituição da valva pulmonar deve ser considerada com base em cada caso.
Devido a um maior risco de desfechos clínicos adversos em pacientes que se submeteram ao reparo da tetralogia de Fallot com idade ≥3 anos, a substituição da valva pulmonar pode ser indicada antes e na presença de disfunção e dilatação do ventrículo direito menos grave.
Profilaxia da endocardite infecciosa
É recomendada no período pré-operatório e deve ser usada durante 6 meses após o reparo. Aqueles pacientes que possuem defeitos residuais no local ou adjacente ao local de um remendo protético ou dispositivo protético devem continuar a receber profilaxia da endocardite infecciosa ao longo da vida sempre que se submeterem a um procedimento invasivo (por exemplo, procedimento dentários, procedimentos no trato respiratório ou infecção na pele, nas estruturas cutâneas ou no tecido musculoesquelético).[33] As diretrizes europeias recomendam as modalidades de imagem avançadas, incluindo ecocardiografia, tomografia computadorizada (TC), ressonância nuclear magnética (RNM) e, particularmente, imagens PET/CT para o diagnóstico de endocardite infecciosa nos pacientes com tetralogia de Fallot, devido à sua maior suscetibilidade a uma endocardite pós-intervenção.[34]
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