Etiologia
Os cálculos biliares e o abuso de álcool representam pelo menos metade dos casos de pancreatite aguda.[15][16][17] A hipertrigliceridemia e os tumores pancreáticos representam um número de casos muito menor. Determinar a etiologia é importante para prevenir a recorrência. Muitos pacientes têm um ataque inicial de doença leve apenas e sofrem uma recorrência de pancreatite aguda até um ano após receberem alta; esses pacientes podem apresentar uma forma mais grave da doença, como necrose pancreática, falência de órgãos e/ou morte. Os pacientes com hipertrigliceridemia e transtornos decorrentes do uso de bebidas alcoólicas podem se beneficiar do tratamento para reduzir o risco de doença recorrente. Deve-se obter os triglicerídeos séricos dos pacientes com pancreatite aguda. Caso o triglicerídeo esteja acima de 11.3 mmol/L (1000 mg/dL), isso deve ser considerado ou fator causador.
Embora a maioria dos pacientes com pancreatite aguda apresente história de abuso de álcool, cálculos biliares, hipertrigliceridemia ou neoplasia maligna pancreática, a etiologia continua indefinida em aproximadamente um terço dos pacientes.[14] Esses casos costumam ser classificados como "idiopáticos". A presença da microlitíase ou sedimento biliar engloba muitos pacientes que provavelmente têm pancreatite idiopática. Qualquer pessoa com mais de 40 anos de idade que acredita ter pancreatite idiopática deve fazer novos exames de imagem de forma ambulatorial (por exemplo, após 4 a 6 semanas) para descartar tumor (de preferência colangiopancreatografia por ressonância magnética).[8][18]
Outras causas incluem:
Hipercalcemia
Pós-colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) (2% a 3%)
Trauma
Infecções (caxumba, micoplasma, vírus Epstein-Barr, Ascaris lumbricoides, coinfecções relacionadas ao vírus da imunodeficiência humana [HIV])
Condições autoimunes (doenças vasculares do colágeno)
Pancreas divisum
Neoplasia mucinosa papilar intraductal
Disfunção no esfíncter de Oddi
Pancreatite aguda autoimune esclerosante (relacionada à imunoglobulina G4)
Os médicos devem ser cautelosos ao atribuir a pancreatite aguda a causas raras descritas nos relatos de casos quando não houver evidências substanciais, e outros fatores puderem estar envolvidos. Por exemplo, a anormalidade congênita pancreas divisum é observada em 10% a 15% dos indivíduos normais e não demonstrou aumentar o risco de pancreatite aguda em grandes estudos observacionais de base populacional. No entanto, anomalias genéticas podem explicar por que determinados pacientes com pancreas divisum desenvolvem pancreatite aguda, enquanto outros não.[21]
Embora ensaios clínicos randomizados forneçam evidências de que a 6-mercaptopurina e a azatioprina podem causar pancreatite aguda, muitos outros medicamentos associados à pancreatite aguda são descritos apenas em relatos de casos e não apresentam evidências de alta qualidade para embasar uma associação.[22][23][24]
Fisiopatologia
O mecanismo exato pelo qual a pancreatite ocorre é desconhecido, embora existam evidências sugerindo que o acúmulo anormal de cálcio intracelular seja uma etapa importante na fisiopatologia molecular de desenvolvimento da pancreatite aguda. O aumento transitório do cálcio potencializa a colocalização de grânulos de zimogênio e lisossomo e, por fim, causa ativação enzimática prematura.[25]
A pancreatite induzida por etanol possui mecanismos fisiopatológicos diferentes. Estudos descreveram que o etanol é um irritante tóxico direto para a célula acinar, causando inflamação e destruição da membrana. Outros mecanismos incluem a disfunção do esfíncter de Oddi, a indução da hipertrigliceridemia ou a formação de radicais livres de oxigênio.[26] Alguns estudos demonstraram que o etanol causa aumento da pressão ductal em decorrência da deposição de proteína dentro do ducto pancreático, favorecendo o fluxo retrógrado e a ativação enzimática intrapancreática.[1]
Classificação
Classificação de Atlanta revisada[2]
A classificação revisada da pancreatite aguda identifica uma fase inicial e tardia da doença. A gravidade é classificada como leve, moderada ou grave.[2]
Pancreatite aguda leve: a forma mais comum, não apresenta falência de órgãos nem complicações locais ou sistêmicas, e geralmente remite na primeira semana.
Pancreatite aguda moderadamente grave: presença de falência transitória de órgãos (resolve dentro de 48 horas) e/ou complicações locais ou exacerbação de comorbidades.
Pancreatite aguda grave: falência persistente de órgãos (>48 horas). As complicações locais são comuns e incluem as coleções peripancreáticas de fluidos, a necrose pancreática e peripancreática (estéril ou infectada), os pseudocistos e a necrose delimitada (estéril ou infectada).
Classificação de Balthazar
Esta é uma classificação radiológica, normalmente baseada na tomografia computadorizada com contraste intravenoso, que foca na extensão da inflamação pancreática e na presença ou ausência de coleção de fluidos ou gás sugerindo necrose.[3]
A: normal
B: aumento focal ou difuso da glândula; pequena coleção de fluidos intrapancreáticos
C: qualquer uma das anteriores além de alterações inflamatórias peripancreáticas e <30% de necrose da glândula
D: qualquer uma das anteriores além de coleção única de fluidos extrapancreáticos e 30% a 50% de necrose da glândula
E: qualquer uma das anteriores além de coleção de fluidos extrapancreática extensa, abscesso pancreático e >50% de necrose glandular
Classificação patológica geral
Os textos cirúrgicos normalmente distinguem entre pancreatite edematosa e hemorrágica, com base nas características patológicas/histológicas:
Pancreatite edematosa: o parênquima pancreático e as estruturas retroperitoneais ao redor estão ingurgitados com líquido intersticial e infiltração de células inflamatórias.[4][5]
Pancreatite hemorrágica: sangramento para o parênquima e estruturas retroperitoneais ao redor com necrose pancreática extensa.[4][5]
A utilidade desse sistema de classificação no cenário clínico não está clara. O tratamento da hemorragia nos pacientes com pancreatite varia e depende da causa (por exemplo, pseudoaneurisma, necrose pancreática, haemosuccus pancreaticus ou outra hemorragia digestiva). Por esse motivo, o termo "pancreatite hemorrágica" deve ser evitado no cenário de manejo dos quadros agudos.
O uso deste conteúdo está sujeito ao nosso aviso legal