Abordagem

Apesar dos avanços tecnológicos, o diagnóstico é essencialmente clínico, sustentado por exames auxiliares como ECG, radiografia torácica, peptídeo natriurético do tipo B (PNB) e ecocardiografia.[1][2][31]​​ A sensibilidade da avaliação clínica na identificação da disfunção sistólica ventricular esquerda é de aproximadamente 81%, mas a especificidade é de apenas 47%. A especificidade desse diagnóstico é melhorada em 69% pela adição de um ECG, e em 92% pela adição de uma radiografia torácica.[32] A ultrassonografia pulmonar no local de atendimento pode ser usada como uma alternativa à radiografia torácica em um cenário de emergência, em conjunto com a história médica e o exame físico.[33][34]

Outros testes (por exemplo, cateterismo cardíaco com medições hemodinâmicas, tomografia computadorizada [TC] e ressonância nuclear magnética cardíaca [RNMC]) podem ser utilizados quando testes não invasivos e imagens ecocardiográficas são subótimos ou quando houver suspeita uma causa incomum de insuficiência cardíaca, e também para o diagnóstico de cardiomiopatias específicas.[1][35]

História e fatores de risco

Uma história minuciosa deve ser colhida sobre as causas da insuficiência cardíaca aguda, como isquemia miocárdica, hipertensão descontrolada, valvopatias significativas (tanto estenose como regurgitação, ou endocardite), arritmias, infecção, anemia, hiper ou hipotireoidismo, embolia pulmonar e fatores desencadeadores que causam exacerbação da insuficiência cardíaca crônica, como indiscrição alimentar com ingestão excessiva de sal, não adesão ao esquema medicamentoso, uso de medicamentos com efeito inotrópico negativo (por exemplo, verapamil, diltiazem) ou medicamentos que promovem a retenção de sódio, e consumo excessivo de bebidas alcoólicas ou drogas.[2] Um escore clínico pode ser útil para o diagnóstico de insuficiência cardíaca aguda.[35]

Sintomas

A insuficiência cardíaca apresenta-se com dispneia (incluindo ortopneia ou dispneia paroxística noturna), tolerância reduzida a exercícios, edema nos membros inferiores, fadiga e fraqueza generalizada. Às vezes o paciente pode apresentar-se predominantemente com sintomas da condição subjacente, como dor torácica, síncope, palpitações ou pródromo viral.

Sinais

Os sinais comuns incluem cianose central, taquicardia, pressão venosa jugular elevada, ictus cordis deslocado, presença de terceira bulha (B3), crepitações ou derrame pleural, hepatomegalia, ascite e edema. A presença desses sinais depende da duração, severidade e causa subjacente da insuficiência cardíaca.[36] Pacientes com insuficiência cardíaca em estágio terminal podem exibir a maioria desses sinais, enquanto que aqueles na fase inicial da doença podem ter um mínimo de sinais.

Pacientes com insuficiência cardíaca avançada podem ser classificados em quatro perfis hemodinâmicos.[37] Esses perfis, baseados nos princípios hemodinâmicos de presença ou ausência de pressão de enchimento elevada (congesto ou seco) e de perfusão adequada ou criticamente limitada (quente ou fria), incluem:[1]

  • Quente e seco

  • Quente e congesto

  • Frio e seco

  • Frio e úmido

Os pacientes com edema pulmonar apresentam desconforto respiratório grave com saturação de oxigênio reduzida (geralmente <90% em ar ambiente) e estertores ou sibilos ao exame pulmonar ("úmido"), mas podem ou não estar hemodinamicamente comprometidos ("frio" ou "quente"). Os pacientes com comprometimento hemodinâmico, PA sistólica <90 mmHg ou queda da pressão arterial média >30 mmHg com frequência de pulso >60 bpm e/ou baixo débito urinário (<0.5 mL/kg/hora), com ou sem evidência de congestão orgânica, são considerados em choque cardiogênico (“frio”), mas podem ou não apresentar edema pulmonar agudo concomitante (“úmido” ou “seco”).

Investigações imediatas

O ECG e a radiografia torácica devem ser realizados imediatamente em todos pacientes com suspeita de insuficiência cardíaca aguda.[2] Os achados eletrocardiográficos estão comumente relacionados às patologias subjacentes e incluem a presença de ondas Q, alterações em ST-T, hipertrofia ventricular esquerda (HVE), bloqueio de ramo e fibrilação atrial. Anormalidades eletrocardiográficas são encontradas em quase todos os casos de insuficiência cardíaca. Se o ECG estiver completamente normal, deve-se considerar um diagnóstico alternativo.[38][Figure caption and citation for the preceding image starts]: ECG que mostra hipertrofia ventricular esquerda com taquicardia sinusalDos acervos particulares de Syed W. Yusuf, MBBS, MRCPI e Daniel Lenihan, MD; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@1de38572

A radiografia torácica pode mostrar aumento cardíaco (índice cardiotorácico [ICT] >50%); no entanto, existe pouca correlação entre o ICT e a presença de insuficiência cardíaca, já que o tamanho do coração pode estar normal em pacientes com disfunção diastólica, regurgitação valvar aguda como parte de endocardite infecciosa, ou infarto agudo do miocárdio. Um ICT aumentado também pode ser observado na ausência de insuficiência cardíaca (por exemplo, derrame pericárdico e HVE).

Na maioria dos casos, a avaliação dos campos pulmonares mostrará sinais de congestão pulmonar, inicialmente nas zonas superiores, depois nas fissuras horizontais seguidas por edema pulmonar e derrame pleural.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Radiografia torácica de edema pulmonar agudo mostrando aumento dos marcadores alveolares, fluido na fissura horizontal e redução dos ângulos costofrênicosDos acervos particulares de Syed W. Yusuf, MBBS, MRCPI e Daniel Lenihan, MD; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@49a69537[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Radiografia torácica mostrando edema pulmonar agudo com marcadores alveolares aumentados e derrames pleurais bilateraisDos acervos particulares de Syed W. Yusuf, MBBS, MRCPI e Daniel Lenihan, MD; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@5af33b9e

Os achados de raios-x devem ser considerados de acordo com o quadro clínico, pois infiltrados pulmonares e congestão podem ocorrer, em alguns casos, devido a causas não cardíacas, como a síndrome do desconforto respiratório agudo ou hemorragia alveolar.

As radiografias torácicas, mais raramente, podem mostrar calcificação pericárdica, valvas protéticas ou calcificação valvar. Nestas situações ele pode ajudar a identificar possíveis etiologias subjacentes a uma insuficiência cardíaca.

A ultrassonografia pulmonar no local de atendimento pode ser usada como alternativa à radiografia torácica quando um equipamento estiver disponível e os médicos forem proficientes em seu uso, juntamente com a história médica e o exame físico.[33][39]

Os seguintes exames de sangue devem ser solicitados quando os pacientes apresentam suspeitas de insuficiência cardíaca aguda:[2]

  • Hemoglobina: pode identificar uma anemia como um fator contribuinte.

  • Testes de função tireoidiana: tanto o hipotireoidismo como o hipertireoidismo podem causar insuficiência cardíaca.

  • Peptídeo natriurético do tipo B (BNP): a medição do nível sérico de peptídeo natriurético do tipo B em pacientes com insuficiência cardíaca é útil para dar suporte ou descartar o diagnóstico, e é recomendada para pacientes hospitalizados com insuficiência cardíaca para estabelecer um prognóstico.[2] A adição dos níveis de PNB ou fragmento N-terminal do peptídeo natriurético do tipo B (NT-proPNB) para avaliação clínica reforçam significativamente a exatidão do diagnóstico e a eficácia do manejo do quadro agudo.[40][41]​ O peptídeo natriurético do tipo B também ajuda na diferenciação entre as causas cardíaca e pulmonar da dispneia.[42] Um nível elevado de PNB é um preditor de mortalidade intra-hospitalar de pacientes com insuficiência cardíaca aguda descompensada.[43] No entanto, um nível elevado de PNB só deve considerado no contexto do quadro clínico, pois pode estar aumentado por várias outras condições, como fibrilação atrial, embolia pulmonar ou sepse.[44] Em pacientes com suspeita de insuficiência cardíaca aguda, um achado de PNB 11.8 pmol/L (<100 pg/mL), NT-proPNB <35.5 pmol/L (<300 pg/mL) e peptídeo natriurético atrial MR (MR-proANP) <14.2 pmol/L (<120 pg/mL) torna improvável o diagnóstico de insuficiência cardíaca aguda.[1]​ A acurácia diagnóstica pode ser melhorada ao se combinar a avaliação do NT-proPNB com outras variáveis clínicas pelo uso de uma ferramenta validada de suporte à decisão clínica. CODE-HF tool Opens in new window[45]

  • Enzimas cardíacas: >50% dos pacientes com edema pulmonar cardiogênico (mas sem indícios de infarto do miocárdio) têm níveis elevados de troponina T.[1][46] Níveis elevados de troponina T em pacientes com insuficiência cardíaca aguda podem refletir uma isquemia subendocárdica devido à elevação da pressão diastólica final do ventrículo esquerdo. Em pacientes com edema pulmonar cardiogênico agudo, o nível de ≥0.1 micrograma/L (≥0.1 ng/mL) de troponina T é um potente preditor e está associado a uma má sobrevida no longo prazo.[46] Uma revisão sistemática e metanálise evidenciou uma forte associação entre troponina cardíaca de alta sensibilidade e o desenvolvimento de insuficiência cardíaca incidente.[47]

  • Os outros exames de sangue iniciais recomendados como base incluem eletrólitos séricos, ureia, creatinina sérica, glicose, perfil lipídico, testes da função hepática (incluindo albumina) e perfil de ferro.[1][2][48]

Investigações subsequentes

A ecocardiografia é uma parte integrante da avaliação de um paciente com insuficiência cardíaca aguda e deve ser realizada o mais rápido possível.[2] É exigida a avaliação de tamanho da câmara, função ventricular (sistólica e diastólica), espessura da parede ventricular, função valvar e pericárdio.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Imagem sistólica do ventrículo esquerdo dilatado (seta); note que não há mudança da imagem diastólicaDos acervos particulares de Syed W. Yusuf, MBBS, MRCPI e Daniel Lenihan, MD; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@6f87813b[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Imagem diastólica do ventrículo esquerdo dilatadoDos acervos particulares de Syed W. Yusuf, MBBS, MRCPI e Daniel Lenihan, MD; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@31a4ee0

O cateterismo cardíaco esquerdo (angiografia coronariana) é necessário em casos em que acredita-se que a doença arterial coronariana seja um fator contribuinte.[2] O uso rotineiro de monitoramento por cateterismo cardíaco direito e cateter arterial pulmonar não é recomendado. No entanto, o monitoramento ou a avaliação hemodinâmica invasiva são úteis caso:[2] 

  • A pressão arterial sistólica (PAS) permaneça baixa ou os sintomas persistam apesar do tratamento

  • O estado hídrico, a perfusão ou a resistência vascular pulmonar ou sistêmica sejam incertos

  • A função renal se agrave com a terapia

  • Forem necessários agentes vasoativos parenterais

Uma angiotomografia de coronárias é uma técnica não invasiva para visualização da anatomia coronariana em pacientes com insuficiência cardíaca e probabilidade baixa a intermediária pré-teste de doença arterial coronariana, ou naqueles com teste de estresse não invasivo equívoco, para exclusão do diagnóstico de doença arterial coronariana.

A biópsia endomiocárdica não é recomendada para a avaliação de rotina da insuficiência cardíaca aguda, mas é indicada para pacientes com insuficiência cardíaca clínica de evolução rápida ou agravamento da disfunção ventricular que persiste apesar do tratamento medicamentoso adequado, em que os achados clínicos sugerem miocardite aguda, ou em caso de suspeita de processo de infiltração miocárdica (por exemplo, amiloidose de cadeia leve) ou rejeição cardíaca após transplante de coração.[2]

A ressonância magnética cardiovascular (RNMC) pode ser usada quando testes não invasivos e imagens ecocardiográficas estiverem abaixo do ideal ou quando houver suspeita de uma causa incomum de insuficiência cardíaca, e também para o diagnóstico de cardiomiopatias específicas.[1][2][35]

A TC por emissão de fóton único (SPECT) ou a tomografia por emissão de pósitrons (PET) podem ser úteis na avaliação da isquemia e da viabilidade miocárdica. Uma cintilografia com 3,3-difosfono-1,2-ácido propanodicarboxílico (DPD) pode ser útil para a detecção da amiloidose de transtirretina cardíaca.[1][2]

A medição da concentração de alguns biomarcadores pode fornecer informações importantes sobre a gravidade da doença e ajuda na detecção e no diagnóstico da insuficiência cardíaca, bem como no tratamento e no prognóstico. Além de peptídeos natriuréticos e troponina, os biomarcadores úteis incluem supressor de tumorigenicidade solúvel 2, interleucina 6, cistatina C, galectina 3 e procalcitonina.[49]


Como realizar uma demonstração animada do ECG
Como realizar uma demonstração animada do ECG

Como registrar um ECG. Demonstra a colocação de eletrodos no tórax e nos membros.



Inserção de cateter venoso central – Vídeo de demonstração
Inserção de cateter venoso central – Vídeo de demonstração

Inserção guiada por ultrassom de um cateter venoso central (CVC) não tunelizado na veia jugular interna direita, usando a técnica de inserção de Seldinger.


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