Etiologia

Embora a causa da fibromialgia permaneça obscura, acredita-se que seja um dos muitos distúrbios de dor crônica que se agregam fortemente em indivíduos e famílias, incluindo síndrome do intestino irritável, disfunção temporomandibular, cistite intersticial, vulvodinia e cefaleias tensionais. Os termos preferenciais para essas afecções são "síndrome de sensibilização central" e afecções dolorosas crônicas sobrepostas (COPCs).

O mecanismo subjacente da dor que se origina no sistema nervoso central agora é chamado de dor nociplástica. Os indivíduos às vezes só apresentam uma dessas síndromes de dor "idiopática" ao longo da vida, mas, com mais frequência, as pessoas com uma dessas entidades, e seus familiares, estão mais suscetíveis a ter várias dessas afecções.[16][17]​ Diversas afecções dolorosas crônicas são extremamente familiares, e polimorfismos genéticos específicos que aumentam ou diminuem o processamento da dor estão sendo rapidamente identificados.[18][19][20]

Alguns pacientes podem ter comorbidades psiquiátricas, sendo a mais comum depressão/transtorno depressivo maior.[21]​ Entretanto, os estudos demonstram que essas síndromes dolorosas são distintas e independentes da depressão e da ansiedade, e têm fortes bases genéticas.[22][23][24][25]

As mulheres têm maior probabilidade de apresentar esses distúrbios que os homens (cerca de 1.5 vez mais chances), mas a diferença entre os sexos é muito mais pronunciada na fibromialgia que em outras afecções dolorosas crônicas em decorrência de consequências não intencionais da exigência de um determinado número de pontos sensíveis à palpação nos critérios de 1990 do American College of Rheumatology. Além disso, as amostras clínicas (especialmente na atenção terciária) tendem a super-representar as mulheres em comparação com amostras de base populacional.[26][27]

Fisiopatologia

A fisiopatologia da fibromialgia permanece obscura e é improvável que exista uma causa única. As evidências dão suporte ao envolvimento do sistema nervoso central, sistema nervoso autônomo, sistema nervoso periférico, alterações neuroendócrinas, alterações do sono, alterações imunológicas e alterações genéticas.

Sistema nervoso central

As evidências sugerem que pacientes com fibromialgia apresentam alteração no processamento da dor, levando à soma temporal da dor, diminuição da inibição endógena da dor e aumento dos receptores de dor e neuropeptídeos relacionados à dor, levando à alteração da função dos neurotransmissores, alterações no fluxo sanguíneo e, eventualmente, hipersensibilidade geral.[28][29][30][31][32][33][34]

Estudos demonstraram aumento da sensibilidade à dor, hipersensibilidade a estímulos sensoriais visuais, auditivos e olfativos em pacientes com fibromialgia.[35][36]

Alterações no sono

Exames de imagem cerebral sugerem que o sono, humor/emoção e distúrbios cognitivos estão conectados e podem estar relacionados com a intensidade da dor em pacientes com fibromialgia.[37][38][39][40][41]

Estudos demonstram que padrões de distúrbio do sono precedem o desenvolvimento de dor e que o sono anormal e a dor podem predizer sintomas depressivos.[42][43]​​​[44][45] Foi sugerido que pacientes com fibromialgia sofrem de um estado generalizado de hiperexcitação.[46]

Em comparação com pacientes com osteoartrite, os pacientes com fibromialgia apresentam qualidade do sono significativamente mais baixa e níveis consideravelmente mais altos de ansiedade e depressão.[47] Dados longitudinais prospectivos inferem uma associação dose-dependente entre o risco de fibromialgia e distúrbios do sono em mulheres com fibromialgia.[48]

Alterações neuroendócrinas

​Foi proposto que pacientes com fibromialgia apresentam desregulação do cortisol. Estudos sugerem que os pacientes com fibromialgia apresentam nível mais alto de cortisol, e alguns deles demonstraram uma associação entre o grau de elevação de cortisol e a dor.[49][50]​​​ Os resultados de uma metanálise que avaliou a relação entre a reatividade do cortisol e os sintomas de dor em pacientes com fibromialgia indicam alguns efeitos individuais das intervenções terapêuticas tanto nos níveis de cortisol como em várias medidas de dor, embora os tamanhos dos efeitos globais não tenham sido significativos.[51]

Disfunção do sistema nervoso autônomo

Anormalidades do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal encontradas em pacientes com fibromialgia sugerem hiperatividade da resposta ao estresse.[52][53][54]

Outras medidas de disfunção do sistema nervoso autônomo em pacientes com fibromialgia foram demonstradas por estudos que medem os níveis de catecolaminas, os níveis de hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) e a variabilidade da frequência cardíaca (VFC) noturna. Descobriu-se que os níveis urinários e plasmáticos de catecolaminas e os níveis de ACTH estão mais baixos em pacientes com fibromialgia, em comparação com controles saudáveis correspondentes.[55][56]

A VFC é harmonizada pelo efeito dos ramos simpático e parassimpático do sistema nervoso autônomo no nó sinusal. Em condições de repouso, uma VFC mais baixa reflete a predominância simpática no nó sinusal. A predominância simpática significa maior atividade simpática ou diminuição da atividade parassimpática, ou ambas.[57]​ Descobriu-se que a VFC noturna de pacientes com fibromialgia é significativamente menor em comparação com controles saudáveis correspondentes.[58] Uma metanálise subsequente comparando a VFC em pacientes com sintomas físicos inexplicáveis do ponto de vista médico, incluindo pacientes com fibromialgia, com controles saudáveis concluiu que a desregulação do sistema nervoso autônomo, particularmente a menor atividade parassimpática, pode desempenhar um papel em pacientes com sintomas físicos inexplicáveis do ponto de vista médico.[59]

Disfunção do sistema nervoso periférico

As pequenas fibras de nervos periféricos podem estar anormais (isto é, diminuição do número, aumento da tortuosidade) em alguns indivíduos com fibromialgia, ou que possam haver anomalias estruturais do cérebro.[60][61][62]​​​​[63] Esta teoria alinha-se com outras evidências no campo da dor, sugerindo que a dor crônica pode estar associada a uma neuroplasticidade significativa.[64] Muitos grupos têm usado tanto as imagens de morfometria baseada em voxel quanto as de tensor de difusão para identificar anormalidades na estrutura cerebral em pessoas com fibromialgia.[65][66][67][68][69]​​​ No maior desses estudos, algumas destas anormalidades podem decorrer de comorbidades frequentemente psiquiátricas que sabidamente demonstram as mesmas mudanças.[70] Seria difícil para essas alterações explicarem a dor generalizada observada em pacientes com fibromialgia. Assim, se existirem anormalidades estruturais ou danos aos tecidos na fibromialgia, a maior parte das evidências para isso indica o envolvimento de tecidos nervosos e não as regiões do corpo onde as pessoas com esta afecção sentem dor.

Alteração imune

Há um crescente conjunto de evidências que propõem que a fibromialgia é um distúrbio mediado imunologicamente, embora um padrão pró ou anti-inflamatório distinto ainda não tenha sido encontrado.[71][72][73]​​​​ As evidências dão suporte ao papel dos mastócitos na manutenção de condições de dor, como dor musculoesquelética e sensibilização central, ou seja, os mastócitos podem mediar a ativação da microglia através da produção de citocinas pró-inflamatórias, como interleucina (IL)-1-beta, IL-6 e fator de necrose tumoral (TNF)-alfa.[72] Além disso, os níveis de quimiocinas e citocinas pró-inflamatórias estão aumentados no soro e podem contribuir para a inflamação em nível sistêmico.[72]

Genética

Uma potencial base genética para a fibromialgia foi identificada por estudos familiares que relatam uma forte agregação familiar para a fibromialgia e condições relacionadas.[16][74]​​[75][76][77]​​​ Embora o modo de hereditariedade da fibromialgia seja desconhecido, acredita-se que seja poligênico.[76]

Foi sugerido um papel para polimorfismos de genes nos sistemas serotoninérgico, dopaminérgico e catecolaminérgico na patogênese da fibromialgia.[77][78][79][80]​​​[81]

Classificação

Classificação clínica

  1. Fibromialgia primária é a forma mais comum de fibromialgia, na qual nenhuma outra causa de dor é encontrada.[1]

  2. Fibromialgia secundária ou concomitante ocasionalmente é u m termo usado para se referir à fibromialgia que acompanha outro distúrbio doloroso ou que sucede um evento desencadeante.[1] Alguns não recomendam o uso dessa denominação porque não há evidências de que a fisiopatologia seja diferente nesses pacientes, exceto em que o tratamento da causa básica do problema (por exemplo, uma doença reumática como comorbidade ou "gerador de dor periférica") pode melhorar a fibromialgia propriamente dita.

    Os estressores que podem desencadear a fibromialgia incluem:

    1. Infecção significativa (por exemplo, infecção por vírus Epstein-Barr [EBV], doença de Lyme)

    2. Lesões, trauma físico como colisão com veículo automotor

    3. Trauma emocional ou participação em guerra

    4. Procedimentos cirúrgicos maiores

    5. Síndromes de dor periférica, como osteoartrite, artrite reumatoide.

O uso deste conteúdo está sujeito ao nosso aviso legal