Abordagem

A anemia deve ser considerada em pacientes com fadiga, baixo nível de energia, palidez, dispneia ao esforço ou pica, bem como em crianças com retardo de crescimento.

Os fatores de risco universais incluem gestação, dieta vegetariana/vegana, menorragia, infecção por ancilostomídeo, doença renal crônica, insuficiência cardíaca crônica, doença celíaca, gastrectomia/acloridria e uso de anti-inflamatório não esteroidal. Prematuridade ou baixo peso ao nascer e alimentação do lactentes com leite de vaca são fatores de risco em crianças.

Pacientes submetidos a cirurgia com suspeita de sangramento moderado ou intenso (>500 mL) e pacientes com anemia identificada no pré-operatório devem ser investigados para anemia.[71]

Avaliação clínica

Os aspectos principais na história que são específicos para ADF incluem fissuras incomuns por gelo ou produtos não alimentares (isto é, pica) e a síndrome das pernas inquietas.

Os achados do exame físico incluem glossite, estomatite angular e alterações ungueais (por exemplo, afinamento, achatamento, coiloníquia). Os achados inespecíficos sobre a história e o exame físico incluem dispneia, fadiga, palidez, disfagia, intolerância ao exercício, comprometimento do desempenho muscular, retardo de crescimento, dispepsia, queda de cabelos e problemas cognitivos ou comportamentais.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: CoiloníquiaReproduzido com permissão de Bickle Ian. Clinical exam skills: Hand signs BMJ 2004; 329 :0411402 [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@162eae1f

Avaliação laboratorial inicial com hemograma completo e esfregaço de sangue periférico

Os exames laboratoriais iniciais devem incluir um hemograma completo (incluindo hemoglobina e hematócrito, contagem plaquetária, volume corpuscular médio [VCM], hemoglobina corpuscular média [HCM], concentração média de hemoglobina corpuscular [CHCM], amplitude de distribuição do tamanho dos eritrócitos) com esfregaço de sangue periférico, contagem de reticulócitos e perfil de ferro.

O hemograma e o esfregaço mostrarão uma anemia microcítica (baixo VCM), hipocrômica (aumento da palidez central).

A Organização Mundial da Saúde define a anemia como: hemoglobina <130 g/L (13 g/dL) em homens com ≥15 anos; <120 g/L (12 g/dL) em mulheres não gestantes ≥15 anos; e <110 g/L (11 g/dL) em gestantes.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Esfregaço de sangue periférico demonstrando algumas mudanças muitas vezes observadas na anemia ferropriva. Observe que muitos dos eritrócitos são microcíticos (compare o tamanho dos glóbulos vermelhos com o núcleo dos linfócitos) e hipocrômicos (palidez ampla central). Há algumas formas em lápisDo acervo pessoal da Dra. Rebecca Fischer Connor; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@577db127 A anemia hipocrômica microcítica também pode ser observada na talassemia e outras causas de anemia; por conseguinte, é necessária a avaliação do perfil de ferro para identificar a deficiência de ferro como causa da anemia.

Uma contagem de reticulócitos é essencial para a investigação de todas as anemias. Ela determina o número de eritrócitos jovens que estão sendo produzidos e liberados pela medula óssea. A contagem de reticulócitos é baixa na anemia ferropriva (ADF).

Avaliação do perfil de ferro

O seguinte perfil de ferro é consistente com ADF:[12][72][73][74]

  • Ferro sérico baixo

  • Aumento da capacidade total de ligação do ferro

  • Saturação de transferrina menor que 16%

  • Ferritina sérica baixa (menos de 12 nanogramas/mL geralmente é considerado diagnóstico de ADF, mas os limites variam entre as diretrizes).

Os pacientes com esse perfil de ferro não precisam de testes de ferro adicionais.

Comentários sobre a avaliação laboratorial

Muitos desses exames podem ser afetados por outros distúrbios. Por exemplo, a ferritina, um reagente de fase aguda, pode estar elevada em pacientes com infecção ou doença crônica (por exemplo, câncer, distúrbios autoimunes), o que pode complicar o diagnóstico.[74]

A American Gastroenterological Association (AGA) recomenda valores de corte de ferritina de 45 ng/mL (em vez de 15 ng/mL) quando a ferritina for usada para diagnosticar deficiência de ferro.[75] O limiar elevado de ferritina pode ajudar a identificar pacientes com ADF, em quem a inflamação decorrente de doença reumática, infecções crônicas ou neoplasia maligna causa o aumento dos níveis de ferritina )>15 ng/mL). O painel de revisão técnica da AGA concluiu que a relação entre maior sensibilidade e menor especificidade usando o limiar mais alto de 45 ng/mL proporciona um equilíbrio aceitável entre os benefícios (redução de erros diagnósticos) e os potenciais riscos (avaliações diagnósticas adicionais).[75]

O índice receptor de transferrina-ferritina também pode ajudar a diagnosticar ADF em pacientes com infecção ou doença crônica.[76][77] A concentração do receptor de transferrina aumenta na deficiência de ferro e apresenta alta sensibilidade e especificidade para a ADF.[76][77]

A biópsia de medula óssea é o exame mais específico e sensível para ADF, mas não é necessária na maioria dos casos, nem está totalmente livre de erros.[4][12] É geralmente reservada para pacientes com estudos séricos indeterminados para diferenciar a ADF da anemia de doença crônica.

Avaliação clínica de acompanhamento

A causa subjacente da ADF deve sempre ser avaliada. Sorologia celíaca, urinálise e teste de Helicobacter pylori são recomendados para todos os pacientes.

  • Se a sorologia celíaca for positiva ou houver suspeita de doença celíaca, a confirmação deve ser feita por meio de biópsia do intestino delgado.[78]

  • A urinálise é feita rotineiramente em todos os pacientes para avaliar o sangramento do trato renal.

  • Um teste positivo de H pylori (isto é, presença de anticorpos IgG ou antígeno fecal associado ao H pylori) deve ser confirmado com um teste respiratório da urease ou endoscopia com biópsia.[79]

Investigações do trato gastrointestinal

A maioria dos pacientes com ADF e sem causa óbvia precisará de investigações do trato gastrointestinal.[78] As exceções podem incluir:

  • mulheres que menstruam

  • pacientes com história de sangramento óbvio de outro sistema

  • pacientes com anemia hipocrômica e microcítica cuja etnia aumenta o risco de talassemia, e em quem a eletroforese de hemoglobina demonstra talassemia.

A endoscopia digestiva alta e baixa é recomendada como investigação de primeira linha para homens e para mulheres menopausadas com ADF recém-diagnosticada.[75][78]

  • Caso o paciente apresente sintomas digestivos altos ou baixos, a parte sintomática do trato gastrointestinal deve ser investigada primeiro.

  • Se o paciente for assintomático, ambas são indicadas.

  • Um exame retal é importante e pode ser feito juntamente com a endoscopia gastrointestinal inferior. A presença de hemorroidas como um local aparente de sangramento não exclui o exame gastrointestinal mais aprofundado, que deve ser realizado para procurar outras lesões proximais (por exemplo, uma neoplasia) no trato gastrointestinal.[80]

  • A colonografia por tomografia computadorizada pode ser realizada se a coloscopia não estiver disponível ou não for adequada para o paciente.[78]

  • A biópsia do intestino delgado é aconselhada durante a endoscopia digestiva alta (caso seja feita) independente do resultado da sorologia celíaca. No entanto, pode não ser necessária para todos os pacientes. Por exemplo, se for encontrada uma grande fonte de sangramento na colonoscopia, então a biópsia do intestino delgado provavelmente será de menor valor. Seu uso deve ser determinado pelo gastroenterologista.

Deve-se realizar um teste sorológico em caso de suspeita de gastrite autoimune. Pacientes com teste positivo para anticorpos anticélulas parietais ou antifator intrínseco devem ser encaminhados para avaliação endoscópica.[79]

Geralmente, os exames de sangue oculto nas fezes não são úteis na ADF.[78] Se já ficou demonstrado que o paciente tem deficiência de ferro, o local do provável sangramento deverá ser procurado através da endoscopia. No entanto, um exame de sangue oculto nas fezes pode ser útil em pacientes para fazer o rastreamento de sangramento gastrointestinal e evitar exames invasivos desnecessários.[81]

A ADF em mulheres na pré-menopausa não é investigada mais a fundo com a endoscopia digestiva, a menos que a paciente tenha >50 anos; não menstrue (por exemplo, após histerectomia); tenha sintomas gastrointestinais ou história familiar sólida de câncer colorretal; ou tenha ADF recorrente ou persistente.[78] O encaminhamento a um ginecologista pode ser necessário para a avaliação das causas do sangramento vaginal.

Novos exames

A hepcidina urinária está sendo avaliada como ferramenta diagnóstica não invasiva para ADF em crianças.[82][74]

A porcentagem de eritrócitos hipocrômicos, como a diminuição da HCM, é um achado tardio da ADF, e o seu cálculo manual pode ser demorado. Por outro lado, o conteúdo de hemoglobina dos reticulócitos diminui nos primeiros dias da ADF. Há estudos em andamento para determinar o papel do conteúdo de hemoglobina dos reticulócitos como biomarcador de ADF.[83][84]

A protoporfirina eritrocitária é a precursora imediata da hemoglobina e seus níveis aumentam quando não há ferro suficiente disponível para a produção da hemoglobina.[8] O papel da protoporfirina eritrocitária como ferramenta de rastreamento para deficiência de ferro está sendo analisado.[85]

O uso deste conteúdo está sujeito ao nosso aviso legal