Abordagem

A investigação diagnóstica da macroglobulinemia de Waldenström (MW) inclui uma história completa e exame físico, exames laboratoriais (incluindo estudos para detectar e quantificar a imunoglobulina M [IgM] monoclonal sérica), avaliação da medula óssea (incluindo análise morfológica, imunofenotípica e genética) e exames de imagem.

História

Uma história cuidadosa deve ser colhida para identificar sinais/sintomas associados à MW, especialmente porque estes podem ser inespecíficos. É importante obter uma história familiar completa, pois o agrupamento familiar foi observado.[11][26]

Os pacientes podem ser assintomáticos ou apresentar sinais/sintomas associados à infiltração tumoral (na medula óssea ou outros órgãos) e/ou IgM monoclonal.

Os sinais/sintomas comuns de apresentação incluem:[4][29][30][31]

  • Fadiga, fraqueza e dispneia (devido à anemia causada pela infiltração da medula óssea ou, menos comumente, anemia hemolítica a frio [doença por crioaglutininas] causada pela atividade autoimune da IgM monoclonal nos eritrócitos em temperaturas mais baixas)

  • Anorexia

  • Infecções

  • Neuropatia periférica

Fadiga e anorexia são os sintomas de apresentação mais comuns da MW.[4]

Sinais/sintomas de apresentação menos comuns incluem:

  • Sintomas B (perda de peso, febre, sudorese noturna)

  • Hiperviscosidade (por exemplo, sangramento da pele e/ou mucosa, cefaleia, visão turva, tontura, vertigem, zumbido, trombose [AVC, angina, infarto do miocárdio, embolia pulmonar, trombose venosa profunda]).

​A viscosidade sérica aumenta em pacientes com MW devido à elevação da IgM no soro.[30][32]​​​​[33]​​ No entanto, os sintomas de hiperviscosidade são observados na minoria dos pacientes no diagnóstico e, geralmente, aparecem quando o nível sérico de IgM está ≥3 g/dL.[34]

Outras características da apresentação

A interação de IgM com fatores de coagulação pode perturbar os tempos de coagulação e sangramento (por exemplo, resultando na doença de von Willebrand adquirida). A IgM também pode revestir as plaquetas, comprometendo, assim, sua função. Isso pode causar sangramento pelas membranas mucosas.[32]

Síndrome de Raynaud, artralgia, púrpura e úlceras cutâneas podem ocorrer devido à crioglobulinemia causada pela precipitação de IgM circulante em temperaturas mais baixas. Crioglobulinas podem ser detectadas em 20% dos pacientes com MW, mas menos de 5% dos pacientes apresentam sintomas.[32]​ A síndrome de Raynaud também pode estar associada à anemia hemolítica a frio (doença por crioaglutininas).

Pode-se desenvolver insuficiência cardíaca de alto débito em virtude do volume de plasma expandido que surge em decorrência do aumento da pressão osmótica, mas é raro.

A deposição de IgM pode ocorrer nas alças glomerulares (apresentando-se como proteinúria), nos intestinos (apresentando-se como diarreia) e na pele (apresentando-se como pápulas e nódulos característicos de macroglobulinemia cutis), mas é rara. A amiloidose primária (devido à deposição de cadeias leves monoclonais em tecidos e órgãos) é rara e ocorre principalmente no coração, nervos periféricos, rins, tecidos moles, fígado e pulmões (em ordem decrescente de frequência).

Exame físico

Embora inespecíficos, os achados físicos que dão suporte ao diagnóstico de MW incluem:[35]

  • Linfadenopatia, geralmente de baixo volume (isto é, não volumosa)

  • Alterações retinais causadas por hiperviscosidade (por exemplo, hemorragias dot and blot [ponto e borrão], vasos sanguíneos tortuosos, espessamento dos vasos e/ou edema do disco óptico).

  • Hepatomegalia (a hepatomegalia clinicamente significativa é rara)

  • Esplenomegalia (raramente palpável)

  • Púrpura (incomum)

Investigação laboratorial inicial

Os seguintes exames laboratoriais de linha basal são recomendados:[30][36][37]

  • Hemograma completo com diferencial: inclui avaliação do volume corpuscular médio (VCM) e contagem de reticulócitos para evidência de hemólise autoimune.

  • Avaliação de hematínicos (níveis de ferro, vitamina B12 e folato): para descartar outras causas comuns de anemia.

  • Esfregaço de sangue periférico.

  • Perfil metabólico completo (incluindo ureia, creatinina sérica, eletrólitos, albumina sérica e testes da função hepática [TFHs]).

  • Lactato desidrogenase (LDH) sérica.

  • Microglobulina beta-2 sérica.

  • Ácido úrico sérico.

Esses exames de linha basal podem ajudar a orientar o diagnóstico e informar o prognóstico e a estratificação de risco.

Marcadores prognósticos importantes usados para a estratificação de risco incluem albumina sérica, LDH sérica e beta-2-microglobulina sérica. Consulte Critérios.

Exames diagnósticos confirmatórios

O diagnóstico definitivo de MW requer confirmação de IgM monoclonal no soro (qualquer concentração) e infiltração da medula óssea por células linfoplasmocitárias malignas.[38]

Os seguintes exames laboratoriais devem ser realizados para confirmar IgM monoclonal no soro:

  • Imunoglobulinas quantitativas séricas: para quantificar a quantidade de imunoglobulinas no soro. A concentração de IgM sérica não é, por si só, um critério para diagnóstico, mas pode orientar o diagnóstico e deve ser interpretada no contexto de outros achados clínicos e laboratoriais.

  • Eletroforese de proteínas séricas com imunofixação: para detectar e confirmar IgM monoclonal (e o tipo de cadeia leve: kappa ou lambda) no soro.

Avaliação da medula óssea

Deve ser realizado aspirado e biópsia da medula óssea, seguido por uma avaliação morfológica cuidadosa e análise imunofenotípica das amostras da biópsia (usando citometria de fluxo e imuno-histoquímica).

O diagnóstico é confirmado se houver infiltração da medula óssea por linfócitos malignos com características morfológicas e imunofenotípicas consistentes com linfoma linfoplasmacítico (LPL).[1][2][39][40]

Os diagnósticos de LPL e MW se sobrepõem, com a presença de IgM monoclonal no soro diferenciando a MW do LPL (de acordo com a classificação da OMS). Consulte Classificação.

As características morfológicas de LPL/MW incluem infiltração de pequenos linfócitos, linfoplasmócitos e plasmócitos.[39][40][41]​ O padrão da infiltração da medula óssea pode ser difuso, intersticial ou nodular, e geralmente é intertrabecular.

Os marcadores imunofenotípicos típicos incluem: CD5±, imunoglobulina de superfície (sIgM)+/intermediário, CD20+, CD19+, CD22+, CD23-, CD10-, CD38+, CD25+, CD27+, FMC7+, CD103- e CD138-.[30][37]​​​ Em virtude da ambiguidade do CD5, deve-se tomar um cuidado especial para descartar as entidades com CD5+, como a leucemia linfocítica crônica e o linfoma de células do manto.[38][42]

Teste de mutação genética

O teste de amostras de biópsia para a mutação MYD88 L265P (por exemplo, usando reação em cadeia da polimerase específica do alelo) é recomendado em todos os pacientes, pois tem implicações diagnósticas, prognósticas e terapêuticas.[36][37]​​[43]​​​ Essa mutação ocorre em mais de 90% dos pacientes com MW e pode ser usada para diferenciar a MW de outros linfomas de células B.[17][24]​​​[43]​​ A minoria de pacientes que não apresentam a mutação MYD88 tem um prognóstico mais desfavorável e apresentam menor resposta clínica ao tratamento com inibidores da tirosina quinase de Bruton (BTK) (por exemplo, ibrutinibe, zanubrutinibe).[18][24]

O teste para a mutação CXCR4 pode ser considerado se o tratamento com um inibidor de BTK for planejado.[36][37]​ Essa mutação ocorre em aproximadamente 30% dos pacientes com MW.[20][22]​​ É considerada uma mutação ativadora na MW, e é encontrada em pacientes com MW que têm uma mutação MYD88.[21] Pacientes com a mutação MYD88 sem a mutação CXCR4 podem apresentar a melhor resposta aos inibidores de BTK.[18]

Exames por imagem

Tomografias computadorizadas do tórax, abdome e pelve devem ser obtidas no diagnóstico para detectar esplenomegalia e linfadenopatia, e para estadiar o paciente.[36][37]

A PET-CT com 18F-fluordesoxiglucose do tórax, abdome e pelve é valiosa na avaliação de pacientes com suspeita de transformação de alto grau onde a captação ávida de PET é observada em locais de possível doença transformada; no entanto, uma biópsia é necessária para confirmar a transformação da doença. Também pode ser usado para determinar melhor a carga tumoral e monitorar a resposta à terapia.[44]

As radiografias de esqueleto e as cintilografias ósseas não são necessárias na ausência de sintomas, pois lesões ósseas líticas não são uma característica de MW.[35]

Exames adicionais a serem considerados

Os seguintes exames podem ser considerados como parte da investigação diagnóstica:[35][36][37]

  • Urina de 24 horas para proteína total e eletroforese de proteínas urinárias com imunofixação, se houver suspeita de disfunção renal ou amiloidose

  • Técnica de detecção de cadeias leves livres no soro, se houver suspeita de disfunção renal (por exemplo, nefropatia por cilindros) ou amiloidose

  • Viscosidade sérica, se houver sintomas de hiperviscosidade ou se a IgM estiver alta

  • Aglutininas a frio e crioglobulinas, se houver suspeita clínica

  • Sorologia viral para hepatite B e C e HIV. É importante fazer exames para essas infecções antes de iniciar o tratamento com quimioterapia e terapias direcionadas (por exemplo, rituximabe, ibrutinibe), porque esses tratamentos podem levar à reativação da hepatite e piorar o risco de infecção por HIV.

  • Testes de anticorpos neurológicos (incluindo anticorpos antiglicoproteína associada à mielina [anti-MAG], anticorpos anti-gangliosídeo M1 [anti-GM1], anticorpos IgM anti-sulfatida), estudos de condução nervosa/eletromiografia e encaminhamento a um neurologista são indicados se houver suspeita de neuropatia periférica. A presença de anticorpos IgM anti-MAG, anti-GM1 ou anti-sulfatida dá suporte ao diagnóstico de neuropatia relacionada à IgM. A ausência não descarta o diagnóstico.

  • Biópsia do coxim gorduroso com coloração com vermelho congo, se houver suspeita de amiloidose (por exemplo, aqueles que apresentam problemas cardíacos inexplicáveis, neuropatia, disfunção renal). A tipagem amiloide (por exemplo, usando espectrometria de massa) pode ser necessária para confirmar o tipo de amiloide. Consulte Amiloidose.

  • Fundoscopia, se o nível de IgM for ≥3.0 g/dL ou se houver suspeita de hiperviscosidade.

  • Ensaios de coagulação (incluindo tempo de protrombina e tempo de tromboplastina parcial ativada) para avaliar a doença de von Willebrand adquirida, se houver hematomas ou sangramento significativos.

  • Biópsia de linfonodos, se houver preocupação com transformação de alto grau.

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