Abordagem

O tratamento dos gliomas depende do tipo, grau, localização e perfil molecular do tumor.[20][21][22][24][27][39][40]

Se o tumor for considerado acessível, a máxima ressecção cirúrgica segura é realizada independentemente da histologia, e as amostras são enviadas para confirmação histológica e análise de marcadores moleculares antes de se iniciar o tratamento complementar. Os astrocitomas circunscritos (astrocitoma pilocítico/pilomixoide, astrocitoma subependimário de células gigantes e xantoastrocitoma pleomórfico) podem ser curados apenas com cirurgia.[24]

Se o tumor não puder ser ressecado com segurança, indica-se uma biópsia para permitir o diagnóstico e o manejo adequado.

Tratamento de emergência

Se houver suspeita de diagnóstico de glioma com base em achados clínicos e radiográficos, o paciente deve inicialmente ser encaminhado para neurocirurgia para ressecção ou biópsia. Determinadas manifestações exigem tratamento de emergência.

Convulsões[27][41][42]

  • Os pacientes que apresentarem epilepsia relacionada ao tumor deverão ser tratados com um medicamento anticonvulsivante.

  • O levetiracetam, a lacosamida e a lamotrigina são preferidos aos anticonvulsivantes mais antigos (por exemplo, fenitoína, fenobarbital, ácido valproico), pois são mais bem tolerados e têm menos potencial de interações medicamentosas.

  • Os pacientes sem convulsões não devem receber prescrição de anticonvulsivantes para reduzir o risco de convulsões.

  • O tratamento anticonvulsivante profilático pode ser usado no período perioperatório, mas as evidências da efetividade são limitadas.[41]

Edema vasogênico e hipertensão intracraniana[27][42][43]

  • Se o paciente apresentar, nos exames de imagem, evidências de edema vasogênico que cause deficits neurológicos, a dexametasona é recomendada.

  • Os sintomas de apresentação indicativos de hipertensão intracraniana podem incluir torpor, cefaleia, náusea, vômitos e visão dupla, ou, nos casos mais graves, paralisia do sexto (VI) nervo e papiledema.

  • Para sintomas sugestivos de hipertensão intracraniana grave, o manitol intravenoso deve ser adicionado a altas doses de dexametasona intravenosa.

  • Se um paciente com hipertensão intracraniana grave estiver comatoso e intubado, pode ser necessária uma hiperventilação temporária.

  • É recomendada uma consulta de emergência com neurocirurgião para uma possível cirurgia de descompressão para esses pacientes.

Gliomas circunscritos: recém-diagnosticados

A ressecção segura máxima é a base do tratamento. Caso isso seja possível, a cura pode ser obtida e a vigilância é recomendada.[21][24] Para uma lesão cirurgicamente inacessível em pacientes assintomáticos, o monitoramento com uma ressonância nuclear magnética (RNM) do crânio pelo menos a cada 6 meses é recomendada.[21] Para pacientes sintomáticos nos quais a ressecção não puder ser feita por causa da localização, as modalidades de tratamento incluem quimioterapia, terapias direcionadas e radioterapia. Diretrizes recomendam a quimioterapia ou terapias direcionadas, se opções adequadas estiverem disponíveis, a fim de minimizar os efeitos da radiação em longo prazo.[21][24][28]

Astrocitoma pilocítico/pilomixoide, grau 1 da Organização Mundial da Saúde (OMS)

A resseção segura máxima é realizada, se possível. Se a lesão for inacessível e o paciente estiver assintomático, recomenda-se observação. No tronco encefálico, particularmente na placa tectal do mesencéfalo, a hidrocefalia obstrutiva pode ser tratada com um procedimento de derivação do líquido cefalorraquidiano. Se houver progressão, ou outros sintomas além da obstrução do líquido cefalorraquidiano se desenvolverem, tratamentos como terapia sistêmica direcionada (por exemplo, inibidores do BRAF e/ou da proteína quinase ativada por mitógenos [MEK] se houver alterações que possam ser direcionadas) e radioterapia são apropriados.[21][24]

Astrocitoma subependimário de células gigantes, grau 1 da OMS

Os astrocitomas subependimários de células gigantes são encontrados apenas em pacientes com complexo da esclerose tuberosa. Se o paciente estiver assintomático, a observação é aconselhável.[6][21] Normalmente, os astrocitomas subependimários de células gigantes são acessíveis cirurgicamente. Os inibidores de mTOR (alvo da rapamicina em mamíferos), como o everolimo e o sirolimo, podem ser usados para induzir a remissão do tumor ou a redução do tamanho antes da ressecção, ou como tratamento de primeira linha se a ressecção cirúrgica não for possível ou se os pacientes preferirem tratamento clínico.[21]

Consulte Complexo da esclerose tuberosa.

Xantoastrocitoma pleomórfico, grau 2 da OMS

Esses tumores são quase sempre acessíveis. Para tumores com alta taxa mitótica, ou se a ressecção inicial for subtotal, recomenda-se o tratamento com terapia direcionada, radioterapia ou radiocirurgia.[21][24]​ Se o paciente apresentar epilepsia intratável por causa de focos epileptogênicos, a eletrocorticografia intraoperatória poderá ser usada para guiar a ressecção completa da área epileptogênica.[25]

Gliomas circunscritos: recorrentes

Se houver recorrência após a terapia inicial, deve-se repetir a ressecção máxima segura, se possível. Se a ressecção completa não for possível, a radioterapia é considerada o tratamento padrão.[24] A radiocirurgia pode ser considerada se o tamanho e a localização do tumor forem apropriados.[24] As terapias direcionadas (por exemplo, inibidores de BRAF e/ou MEK) podem ser consideradas se mutações que puderem ser direcionadas tiverem sido identificadas no tecido da ressecção inicial.[24]

Gliomas infiltrantes difusos: recém-diagnosticados

Os tipos de tumor são astrocitoma difuso, com mutação na isocitrato desidrogenase (IDH) (graus 2-4), oligodendroglioma, com mutação na IDH, codeleção de 1p/19q e glioblastoma, com IDH do tipo selvagem (grau 4).[1] O tratamento depende do tipo e do grau do tumor.[20][21][22][27][28][44]

A máxima ressecção segura é o tratamento primário se o tumor for cirurgicamente acessível. No entanto, prevenir novos deficits neurológicos permanentes que possam afetar a independência do paciente, reduzir sua qualidade de vida ou aumentar o risco de complicações que possam comprometer a continuação da terapia é mais importante do que a extensão da ressecção.[45] Vários adjuntos cirúrgicos podem ser usados para maximizar a ressecção e minimizar o risco de incapacidade pós-operatória.[20][21][22][28][46]

Se a ressecção segura não for possível (por exemplo, por causa da localização do tumor ou se o paciente não for candidato à cirurgia por causa de comorbidades), deve-se realizar uma biópsia estereotáxica.[22]

A quimioterapia deve ser oferecida conforme indicada. Quando disponível, os ensaios clínicos ou terapias em estudo devem ser considerados como opção terapêutica inicial, uma vez que nenhuma das terapias disponíveis é curativa e o prognóstico é desfavorável.[21][22][27]​ ​Consulte Novos tratamentos.

Tumores de grau 2

Após a cirurgia, o tratamento complementar poderá ser adiado em alguns pacientes de baixo risco (ou seja, com menos de 40 anos com ressecção completa do tumor, conforme indicado pelo sinal hiperintenso de recuperação da inversão atenuada por fluidos T2 [FLAIR]) até que haja sinais de progressão da doença.[21][22][40][47][48]

Para pacientes de alto risco após a cirurgia (isto é, com idade igual ou superior a 40 anos ou ressecção subtotal) e todos os pacientes nos quais a cirurgia não for viável, o padrão de assistência é uma combinação de radioterapia e quimioterapia.[21][48][49]​ É importante levar em consideração os efeitos adversos da radioterapia e da quimioterapia no longo prazo (por exemplo, sobre a neurocognição).[7][48][50][51]

O esquema quimioterápico recomendado é o PCV (procarbazina, lomustina e vincristina).[21][22][40][52] A temozolomida pode ser usada como alternativa, com base nos dados de efetividade em gliomas de alto grau e um melhor perfil de efeitos colaterais.[7]

Tumores de graus 3 e 4

Além da cirurgia (ou sem cirurgia, se o tumor for inacessível), o padrão de assistência envolve a radioterapia e a quimioterapia.[20][21][22][27][28][40][48]

  • Para o astrocitoma difuso, com mutação em IDH, grau 3, o tratamento recomendado após a ressecção segura máxima é a radiação seguida por 12 ciclos de temozolomida adjuvante.[53]

  • Para o oligodendroglioma, com mutação em IDH, codeleção de 1p/19q, grau 3, recomenda-se radiação seguida de quimioterapia com PCV. A temozolomida é uma alternativa.[40]

  • Para astrocitoma difuso, com mutação em IDH, grau 4, e glioblastoma, do tipo selvagem de IDH, grau 4, o tratamento recomendado é a radiação com temozolomida concomitante seguida de 6 ciclos de temozolomida adjuvante.[40]

Pacientes mais velhos e/ou aqueles com baixa capacidade funcional podem receber radioterapia hipofracionada (isolada ou com temozolomida), temozolomida isolada ou os melhores cuidados de suporte.[20][21][40][54]

Em pacientes com glioblastoma com IDH do tipo selvagem, o estado de metilação do promotor MGMT é um biomarcador preditivo do benefício da quimioterapia alquilante: acredita-se que os pacientes com tumores metilados do promotor MGMT obtenham maior benefício do tratamento com temozolomida.[20][21][22]

A terapia de campo elétrico alternado pode ser considerada na fase de quimioterapia adjuvante do tratamento para tumores de grau 4.[21][40][55]

Se a ressecção total macroscópica for possível e a cavidade cirúrgica não estiver em contato com o sistema ventricular, existe a opção de colocação de wafers biodegradáveis de carmustina no momento da cirurgia. No entanto, as evidências de efetividade são ambíguas, é muito difícil avaliar a progressão em exames de imagem e os pacientes com wafers de carmustina geralmente não são elegíveis para ensaios clínicos à progressão.[21][22][56]

Glioma de linha média difuso, com alteração em H3 K27M

O glioma de linha média difuso, com alteração em H3 K27M, grau 4 (anteriormente chamado de glioma pontino intrínseco difuso) é um tipo raro de astrocitoma, encontrado principalmente em crianças, com alta taxa de recorrência pela sua capacidade de invasão do tecido cerebral adjacente. O tumor é sempre inacessível. Portanto, a ressecção não é possível, mas a biópsia deve ser realizada para se confirmar o diagnóstico.

Os ensaios clínicos ou terapias em estudo devem ser considerados como terapia de primeira linha, dada a natureza agressiva da doença e seu prognóstico muito desfavorável. Consulte Novos tratamentos.

Quando ensaios clínicos ou terapias em estudo não estiverem disponíveis, o tratamento consiste em radioterapia e quimioterapia, como para os outros gliomas de grau 4.[21][22][40][57]

Gliomas infiltrativos difusos: doença progressiva

Com evidências radiográficas de progressão da doença, as terapias padrão devem ser consideradas, inclusive repetição da ressecção segura máxima, se possível, para citorredução tumoral e caracterização de novos fatores genômicos de progressão no tumor.[58][59][60]

Quando disponíveis, ensaios clínicos ou terapias em estudo devem ser considerados como tratamento de primeira linha.[21][40]​​​ Consulte Novos tratamentos.

Se não houver ensaios clínicos ou terapias em estudo disponíveis, pode-se considerar a repetição da radioterapia, dependendo do tempo desde o tratamento anterior e da localização do tumor, mas é preciso levar em consideração os efeitos adversos neurocognitivos e os riscos de radionecrose.[20][21][22][27][40][50][61][62]

Não há boas evidências para recomendar nenhum esquema de quimioterapia específico em detrimento de outro no momento da progressão da doença. Os médicos devem levar em consideração fatores como tempo desde o último tratamento, características moleculares do tumor, capacidade funcional e preferência do paciente. As opções incluem esquemas à base de nitrosoureia (CCNU) e temozolomida. Os esquemas à base de platina não são recomendados.[21][22][27][61][63][64]

As terapias direcionadas (por exemplo, inibidores de BRAF/MEK) podem ser consideradas se as alterações que puderem ser direcionadas forem identificadas após a caracterização molecular das amostras tumorais.[21][22][27]

O anticorpo monoclonal bevacizumabe pode ser considerado para o tratamento do glioma recorrente, embora as evidências de efetividade sejam limitadas.[21][22][27][40][61]​​​​​[64][65]

Planejamento antecipado de cuidados e cuidados paliativos

Para pacientes com prognóstico desfavorável e aqueles que não desejam se submeter a tratamento adicional, os cuidados paliativos ativos podem ser a abordagem mais adequada.[20][28][66]

As discussões sobre o planejamento antecipado dos cuidados médicos com o paciente e a família devem começar logo após o diagnóstico, antes que o paciente perca a capacidade cognitiva. A consulta precoce sobre cuidados neuropaliativos é recomendada para maximizar o manejo dos sintomas.[27][66]

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