Abordagem

O tratamento da regurgitação tricúspide (RT) é guiado pela etiologia subjacente e pela patologia da valva tricúspide. Um melhor entendimento do impacto negativo da regurgitação tricúspide isolada no prognóstico em longo prazo aumentou a importância da correção cirúrgica. Na RT primária, a cirurgia pode ser uma opção em todos os casos. O reparo ou substituição valvar tricúspide é recomendado para RT grave no momento da cirurgia valvar do lado esquerdo e para RT sintomática grave isolada na ausência de disfunção ventricular direita significativa. A cirurgia deve ser considerada em todos os outros casos (RT moderada ou RT com aumento anelar no momento da cirurgia valvar esquerda; RT grave em pacientes assintomáticos com evidência de disfunção do ventrículo direito; RT sintomática grave após cirurgia esquerda na ausência de hipertensão pulmonar).[2][5]

Todos os pacientes com níveis significativos de RT (moderada ou pior) ou que podem ter hipertensão arterial pulmonar devem ser tratados em conjunto com um especialista.

Tratamento clínico

O tratamento clínico dos pacientes com doença da valva tricúspide pode ser dividido em 2 partes. A primeira parte é o tratamento da causa subjacente da doença tricúspide. A segunda parte é o tratamento clínico da insuficiência cardíaca congestiva e inclui o uso de agentes inotrópicos, diuréticos, betabloqueadores e agentes vasodilatadores (por exemplo, inibidores da ECA e antagonistas do receptor de angiotensina II).[16][18]

Modificação dos fatores de risco

Em pacientes com insuficiência cardíaca, o sucesso da terapia farmacológica está fortemente relacionado com, e é alcançado de forma ideal por, incentivar o paciente e sua família a participarem de várias estratégias complementares de tratamento não farmacológico. Elas incluem principalmente mudanças de estilo de vida, modificações alimentares e nutricionais, treinamento com exercícios e manutenção da saúde.

  • A ingestão alimentar de sódio é um fator facilmente modificável que complementa a terapia farmacológica para insuficiência cardíaca. Portanto, o paciente e a família são aconselhados a seguir uma ingestão alimentar diária de 2 a 3 g de sódio. A restrição adicional para 1 a 2 g/dia pode ser necessária em pacientes com sintomas avançados refratários à terapia.

  • A restrição de líquidos é usada principalmente como uma medida complementar em hospital em casos de exacerbação aguda. Além disso, a restrição de líquidos pode ser justificada em casos de hiponatremia grave. No entanto, seria importante aconselhar o paciente a manter um equilíbrio de ingestão/excreção diária em casa. Os pacientes são aconselhados a monitorar o peso diariamente e entrar em contato com o seu profissional de saúde imediatamente se houver uma alteração especificada no peso.

  • Os pacientes com insuficiência cardíaca precisam de monitoramento contínuo e rigoroso de sua saúde. Uma variedade de programas demonstraram a diminuição da morbidade e das reinternações hospitalares nesse contexto, incluindo serviços de enfermagem em domicílio, aconselhamento/triagem por telefone, serviços de telemedicina e assistência especializada com base em clínicas para insuficiência cardíaca.[19]

  • Os exercícios também se mostraram benéficos.[20][21]

Além disso, o controle da pressão arterial e da glicemia deve ser mantido nos limites recomendados; deve-se estimular a perda de peso em pacientes com sobrepeso e recomendar o abandono de tabaco e bebidas alcoólicas.[22] Podem ser usadas estatinas ou aspirina no tratamento de pacientes com doença arterial coronariana ou isquemia associadas.[23]

Nas pessoas com fibrilação atrial (FA), a aspirina não é mais recomendada para a prevenção do AVC, independentemente do risco de AVC.[24][25]​​​​ A prevenção de AVC na FA é orientada principalmente pelo escore CHA₂DS₂-VA, com foco em fatores de risco não baseados no sexo para estimar o risco de AVC tromboembólico.[24]

A anticoagulação, normalmente com anticoagulantes orais diretos ou varfarina, continua sendo a principal abordagem para a prevenção do AVC em pessoas com FA, dependendo da elegibilidade e de fatores clínicos. Para o manejo dos sintomas, são consideradas estratégias de controle de frequência e do ritmo cardíacos, com a escolha da abordagem sendo individualizada para a condição de cada paciente. Consulte Fibrilação atrial estabelecida e Novo episódio de fibrilação atrial.

Indicações para tratamento operatório

As recomendações das diretrizes dos EUA e da Europa são:[2][5]

  • O reparo da valva tricúspide é benéfico para RT grave em pacientes com doença da valva mitral que precisam de operação da valva mitral.

  • O reparo da valva tricúspide é razoável para pacientes com RT grave submetidos à implantação de um dispositivo de assistência ventricular esquerda.

  • A substituição da valva tricúspide ou anuloplastia é razoável para RT primária grave, quando sintomática.

  • A substituição da valva tricúspide é razoável para RT grave decorrente de folhetos da valva tricúspide doentes/anormais que não podem ser corrigidos por anuloplastia ou reparo.

  • A anuloplastia da valva tricúspide pode ser considerada para RT menos que grave em pacientes que se submetem à cirurgia da valva mitral quando há hipertensão pulmonar ou dilatação do anel tricúspide (>40 mm ou >21 mm/m² de área de superfície corporal).

  • A substituição da valva tricúspide ou anuloplastia não é indicada em pacientes com RT primária leve.

  • A cirurgia pode ser considerada em pacientes com RT grave assintomática com evidência de aumento ou disfunção do ventrículo direito.

Escolha da operação: reparo versus substituição da valva

A decisão de reparar ou substituir a valva tricúspide depende da etiologia da regurgitação da valva, do grau de disfunção do folheto e/ou da corda (isto é, imobilização) e da presença ou significância da hipertensão pulmonar.[2][5][6]​ A maioria das valvas é avaliada com um plano para reparo valvar. As indicações para substituição em vez de reparo da valva incluem doença subvalvar grave que afeta a mobilidade do folheto, dilatação anelar grave, disfunção do ventrículo direito ou hipertensão pulmonar. Foi demonstrado que o reparo da valva tricúspide tem reduzido as taxas de mortalidade a 1 mês e a 10 anos em comparação com a substituição da valva.[26][27]

Reparo da valva tricúspide

As operações mais praticadas para reparo da valva tricúspide reduzem a circunferência anelar sem manipulação do aparato subvalvar (por exemplo, uma valva morfologicamente normal). As técnicas incluem bicuspidização por sutura (anuloplastia de Kay), anuloplastia de DeVega, reparo completo e anuloplastia do anel (ou banda).[28] A última é a técnica preferida dos autores. Todas as técnicas reconhecem que o folheto septal está intimamente relacionado ao esqueleto fibroso central do coração e, assim como a área intertrigonal do folheto mitral anterior, não é propenso à dilatação. Desse modo, o folheto septal não é incluído no reparo anelar tricúspide. Um benefício adicional desses reparos é o fato de que eles deixam uma lacuna na região do nó atrioventricular e no tecido de condução associado, evitando dessa forma o bloqueio atrioventricular total. A anuloplastia não deve reduzir o anel da valva tricúspide para um diâmetro <25 mm, pois uma redução anelar maior pode causar estenose da valva tricúspide.

Opções de valva para substituição

A escolha da valva depende de muitos fatores: idade, gravidade da doença cardíaca e esperança de vida, uso concomitante de próteses mecânicas para substituição da valva esquerda, necessidade de terapia anticoagulante crônica, sexo, etiologia da RT (anomalia de Ebstein, patologia reumática, endocardite) e função do ventrículo direito têm afetado a morbidade e a mortalidade da substituição da valva tricúspide. O tecido nativo do folheto da valva tricúspide é preservado o máximo possível. Não existe nenhum consenso definitivo sobre qual prótese é melhor com relação à substituição da valva tricúspide. A escolha protética fica a critério clínico do cirurgião, levando em consideração as características e necessidades de cada paciente.

Os fatores que favorecem o uso de uma bioprótese são idade >65 anos, expectativa de vida curta (<5 anos), operação para endocardite, sexo masculino, função do ventrículo direito ruim/átrio direito grande e anticoagulação não necessária.

Fatores que favorecem o uso de uma prótese mecânica são idade <65 anos, expectativa de vida maior (>5 anos), uso concomitante de uma valva mecânica no lado esquerdo, sexo feminino, função do ventrículo direito boa/átrio direito pequeno e necessidade de anticoagulação crônica.[29]

Terapia de marca-passo subsequente

Fios temporários de marca-passo ventricular são recomendados em todos os pacientes. Além disso, alguns cirurgiões defendem a colocação de rotina de fios permanentes de marca-passo ventricular epicárdicos enroscados no momento da operação da valva tricúspide, pois a colocação do fio do marca-passo permanente em um reparo está associada à falha do reparo.[30]

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