Abordagem

O diagnóstico geralmente é feito clinicamente, com os pacientes apresentando início rápido dos sintomas.[3]

Anamnese e exame físico

As diretrizes nacionais dos EUA afirmam que o diagnóstico de otite externa aguda (OEA) requer a presença de início rápido (geralmente em 48 horas) dos sintomas nas últimas 3 semanas, juntamente com sinais de inflamação do meato acústico externo.[1] Os sintomas de inflamação do meato acústico externo incluem dor de orelha (que pode ser grave), prurido e plenitude, com ou sem diminuição da audição ou dor no meato acústico externo e na articulação temporomandibular intensificada pelo movimento da mandíbula. Os sinais de inflamação do meato acústico externo incluem sensibilidade ao longo do trago, da pina ou de ambos.[1] A manipulação do meato acústico externo geralmente é dolorosa. A pele do meato acústico externo apresenta graus variáveis de edema difuso, eritema e inchaço. Pode haver otorreia ou celulite da pina e pele adjacente. A otoscopia é recomendada para examinar o estado da membrana timpânica.


Como examinar a orelha
Como examinar a orelha

Como realizar um exame da orelha.


Em alguns casos o canal está bem edemaciado, e isso dificulta o exame da membrana timpânica. O exame otoscópico mostra quantidades variáveis de drenagem e detritos. A membrana timpânica pode ser eritematosa. Em alguns casos, pode haver linfadenopatia cervical.

[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Meato acústico externo edemaciado, quase completamente fechado em razão de otite externa agudaDo acervo do Dr. Richard Buckingham; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@3b57a1d[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Detritos purulentos brancos podem ser observados no meato acústico externoBarry V et al. BMJ 2021;372:n714; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@41ef7b97[Figure caption and citation for the preceding image starts]: O meato acústico externo é estreitado, fazendo com que fique mais parecido com uma fenda, com detritos brancos na parede do canalBarry V et al. BMJ 2021;372:n714; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@10c93b32

Otoscopia pneumática e/ou timpanometria

Pode-se fazer uma otoscopia pneumática ou timpanometria para auxiliar no diagnóstico.[1] A otoscopia pneumática mostra o movimento normal da membrana timpânica, que pode estar ausente nos pacientes com otite média aguda associada. De forma semelhante, em pacientes otite externa aguda (OEA), a timpanometria será normal; entretanto, mostrará curva achatada (tipo B) em pacientes com otite média aguda associada. A timpanometria pode causar desconforto e dor em pacientes com OEA.

Cultura e microscopia

Culturas da orelha são obtidas principalmente de pacientes que não melhoram com terapia medicamentosa. Culturas geralmente são desnecessárias na visita inicial ou no momento do diagnóstico, mas podem ser obtidas, se desejável.[3] Os organismos mais comumente presentes nas culturas são espécies de Pseudomonas e Staphylococcus.[1] Em alguns casos são obtidas culturas negativas de pacientes em tratamento com antibiótico tópico ou sistêmico. Culturas positivas para espécies de fungos são encontradas em pacientes como otite externa fúngica.

A microscopia de exsudatos/detritos do meato acústico externo pode evidenciar infecções fúngicas. Hifas filamentosas brancas são observadas na otite externa fúngica (otomicose). A presença de esporos pretos indica que o organismo causador é o Aspergillus niger.[1][3]

Radiologia

A tomografia computadorizada (TC) do osso temporal com e sem contraste é recomendada nos pacientes que apresentarem dor e plenitude intensas e persistentes na orelha apesar de uma terapia medicamentosa adequada com antibióticos tópicos e orais. Isto é para descartar otite externa necrotizante. As características clínicas que sugeririam a necessidade de uma tomografia computadorizada incluem dor desproporcional aos achados clínicos e pacientes com tecido de granulação ao longo do assoalho do meato acústico externo, especialmente em pacientes com diabetes ou naqueles imunocomprometidos.[1] A presença de neuropatias cranianas também exige avaliação radiológica. Em situações similares e se a TC mostrar destruição óssea, é feita uma ressonância nuclear magnética (RNM) dos canais auditivos internos e da base do crânio para delinear melhor a extensão da infecção. Pacientes com diabetes mellitus e outras condições imunodepressoras são particularmente susceptíveis à otite externa necrotizante e necessitam de avaliação radiológica em caso de suspeita de tal condição.

Reavaliação da condição em pacientes refratários ao tratamento

Pacientes que não respondam ao tratamento convencional para OEA devem ser reavaliados para se descartar a possibilidade de otite externa fúngica, otite externa necrotizante, ou simplesmente não adesão ao tratamento. Podem-se obter culturas e microscopia, e estas podem revelar hifas filamentosas e/ou esporos indicativos de infeção por fungos. Deve-se investigar a possibilidade de uma otite externa necrotizante nos pacientes que não respondem ao tratamento clínico e que apresentam otalgia persistente apesar do tratamento mais potente disponível. Recomenda-se avaliação radiológica com TC ou RM.

Otite externa necrotizante

A otite externa necrosante (também chamada de otite externa maligna) é uma forma de otite externa mais comum em pacientes idosos com diabetes não controlado ou em pacientes com imunodeficiência.[1][4]​ Na otite externa necrotizante, a infecção e os processos inflamatórios envolvem não apenas a pele e os tecidos moles do meato acústico externo, mas também o tecido ósseo do osso temporal.[5] Os primeiros sinais e sintomas são iguais aos da OEA, mas, se não tratada, pode ocorrer osteomielite da parte petrosa do osso temporal e/ou da base do crânio, que pode invadir tecidos moles, orelha média, orelha interna ou cérebro.[1][5][6]​ O nervo facial pode ser afetado e, menos frequentemente, os nervos glossofaríngeo e acessório espinhal.[1]

A otite externa necrotizante é uma emergência médica.[7]

A pseudomonas aeruginosa está implicada na maioria dos pacientes.[1][7]​​ Os pacientes geralmente apresentam otalgia intensa, otorreia, plenitude auricular e não respondem ao tratamento convencional para OEA. Dependendo do estágio de apresentação e da extensão da invasão, os pacientes podem apresentar fraqueza facial e outras anomalias do nervo craniano.[1] Ao exame físico, o meato acústico externo está edemaciado, com evidência de tecido de granulação no assoalho do canal e na junção osteocartilaginosa.[1]

O diagnóstico geralmente é feito por tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética, que mostram presença de destruição óssea e de tecidos moles.[5] Os exames de imagem com tecnécio-99 ou gálio mostrarão aumento da captação de radioisótopos no osso temporal e/ou base do crânio, embora esses estudos não sejam indicados rotineiramente para pessoas com suspeita de otite externa necrotizante.[20]​ A tomografia por emissão de pósitrons-TC também documentará aumento do sinal na base do crânio.[21]​ A velocidade de hemossedimentação (VHS) do paciente também pode estar elevada na otite externa necrotizante.[1][12]​​

Um estudo recrutou 74 médicos do Reino Unido e utilizou o método Delphi para chegar a definições e declarações consensuais para otite externa necrotizante.[22]​ As seguintes definições e declarações principais de consenso foram propostas.

  • Diz-se que a otite externa necrotizante definitiva está presente quando todos os seguintes sintomas existem: otalgia associada a otorreia ou otalgia associada a história de otorreia, granulação ou inflamação do meato acústico externo, exclusão histológica de neoplasia maligna nos casos em que há suspeita, e características radiológicas consistentes com otite externa necrotizante (achados de TC e RNM).

  • Possível otite externa necrotizante: infecção grave do meato acústico externo sem presença de erosão óssea do meato acústico externo na TC ou ausência de alterações consistentes com otite externa necrotizante na RNM e que apresente todas as seguintes características:

    • Otalgia e otorreia ou otalgia e história de otorreia

    • Granulação ou inflamação do meato acústico externo

    • Qualquer uma das seguintes características: imunodeficiência, dor noturna, marcadores inflamatórios elevados (velocidade de hemossedimentação/proteína C-reativa) na ausência de outra causa plausível ou falha em responder a >2 semanas de medicamentos anti-infecção tópicos e cuidados auriculares.

  • A "otite externa necrotizante" é a terminologia de preferência em relação à "otite externa maligna".

  • Um caso de suspeita de otite externa necrotizante deve ser avaliado principalmente com uma TC.

  • Após o diagnóstico confirmado de otite externa necrotizante, uma avaliação especializada deve ser agendada.

Otite externa fúngica

A otomicose é uma infecção fúngica do meato acústico externo causada por fungos e leveduras.[8]​ A otite externa fúngica é responsável por aproximadamente 9% do total de otite externa.[8]​ Apresenta-se de forma semelhante à otite externa bacteriana aguda, com dor de orelha, prurido, plenitude aural e otorreia. É comum em países tropicais, locais úmidos, após antibioticoterapia tópica de longo prazo e em pessoas com diabetes, HIV/AIDS ou outros estados imunocomprometidos.[1] Os patógenos fúngicos mais comuns são as espécies de Aspergillus (60% a 90%) e espécies de  Candida (10% a 40%).[1] A reação em cadeia da polimerase multiplex passo a passo é mais sensível, rápida e eficiente do que a técnica de cultura na diferenciação da otite externa bacteriana da otite externa fúngica.[9]

A perfuração da membrana timpânica pode ocorrer secundária à otite externa fúngica; foi relatada uma taxa de perfuração de 6.75%.[8][10]​​​​​A perfuração é comum na otomicose causada por Aspergillus flavus, Aspergillus tubingensis e Candida albicans.[8]​ A perfuração da membrana timpânica devido à otite externa fúngica é menor e pode resolver com tratamento. Alguns casos podem exigir timpanoplastia.​[10]

No exame físico, a pele do meato acústico externo se apresenta edemaciada e observa-se corrimento. A otorreia pode ser mais espessa e preta, cinza, verde azulada, amarela ou branca.[1] A presença de esporos pretos indica que o organismo causador é o Aspergillus niger.[1][3]​ Em geral, observam-se hifas filamentosas brancas. O exame microscópico e as culturas da orelha podem ajudar a estabelecer o diagnóstico definitivo de otomicose. Deve-se suspeitar de otomicose nos pacientes que não responderem a tratamento com agentes antibacterianos.[3] O surgimento de infecção fúngica secundária do meato acústico externo após tratamento prolongado com agentes antibacterianos é bem conhecido.[11]

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