Etiologia

O risco de câncer esofágico aumenta com a idade.[19]

O sexo masculino é um fator de risco tanto para o carcinoma de células escamosas esofágico (CCEO) quanto para o adenocarcinoma esofágico (ACE).[20][21]​ Aproximadamente 70% dos casos ocorrem em homens.[6]​​[7]​ A diferença não pode ser originária de outros fatores de risco (por exemplo, doença do refluxo gastroesofágico [DRGE], obesidade), pois estes estão igualmente divididos entre os sexos.[22]

A acalasia está associada a aumento dos riscos de ACE e CCEO.[23][24]

O tabagismo aumenta muito o risco de CCEE e aumenta moderadamente o risco de ACE.[25] Fumantes atuais apresentam um aumento do risco de nove vezes de CCEO em comparação com não fumantes.[26] O tabagismo aumenta o risco de ACE e adenocarcinoma da junção esofagogástrica em aproximadamente duas a três vezes.[26][27]

O nível socioeconômico mais baixo está associado a um aumento de duas a quatro vezes no risco de câncer esofágico.[25]

Fatores associados ao desenvolvimento de ACE

esôfago de Barrett

  • Metaplasia da mucosa do esôfago distal causada por refluxo gastroesofágico de longa duração. O esôfago de Barrett é uma condição pré-maligna para o desenvolvimento de ACE.[28]​ Indivíduos com esôfago de Barrett têm risco de 30 a 60 vezes maior de desenvolver ACE, em comparação com a população em geral.[29]

  • O risco de evolução do esôfago de Barrett para ACE está correlacionado com o grau de displasia presente. A taxa de progressão anual de displasia de baixo grau para displasia de alto grau ou ACE é de 4%; o risco anual de progressão de displasia de alto grau para ACE é de 25%.[30]

  • Foi descrita uma forma familiar do esôfago de Barrett, com múltiplos relatos de agrupamentos familiares de pacientes com essa afecção. Em uma análise do banco de dados de pacientes diagnosticados com esôfago de Barrett ou ACE nos Países Baixos, 7% dos casos foram familiares. Nesses casos, a idade média dos pacientes é menor no início dos sintomas de refluxo e no diagnóstico de ACE, em comparação com os casos não familiares, o que sugere uma possível predisposição hereditária para esôfago de Barrett e/ou ACE em alguns indivíduos.[31]

Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE)

  • Um estudo tipo caso-controle de base populacional revelou que pessoas com DRGE tiveram um aumento de sete vezes no risco de desenvolvimento de ACE, em comparação com pessoas sem DRGE.[32] Sintomas mais frequentes, mais graves e duradouros foram associados a um maior risco de câncer.[32]

  • O uso de teofilinas ou medicamentos anticolinérgicos para relaxar o esfíncter esofágico inferior tem sido associado a um aumento modesto do risco de ACE, embora a associação possa ser confundida pela presença de asma ou doença pulmonar obstrutiva crônica concomitantes.[33]

Hérnia de hiato

  • A presença de hérnia de hiato aumenta o risco de ACE de duas a seis vezes, mais provavelmente em virtude do aumento do refluxo gastroesofágico.[25]

Índice de massa corporal (IMC)

  • O IMC elevado é um fator de risco para ACE, independentemente da presença de DRGE.[34][35][36][37]

  • Estudos tipo caso-controle demonstram uma relação dose-dependente entre o aumento do IMC e o risco de ACE.[37][38]

  • Uma associação inversa entre IMC e risco para CCEO foi relatada.[34][36][39][40]

Fatores relacionados à dieta

  • Dietas ricas em gorduras totais, gorduras saturadas e colesterol parecem estar associadas a um maior risco de ACE.[41][42]

Fatores associados ao desenvolvimento de CCEO

Consumo de bebidas alcoólicas

  • O risco relativo (RR) de CCEE é maior em etilistas, em comparação com indivíduos que não bebem ou que bebem ocasionalmente (RR 4.95, IC de 95% 3.86 a 6.34).[43]

  • Parece haver um efeito sinérgico na presença de fumaça de tabaco.[44][45]

Papilomavírus humano (HPV)

  • Metanálises relatam uma associação entre a infecção por HPV (sorotipos 16 e 18) e a incidência de CCEE.[46][47][48][49]

  • Não foi demonstrada uma associação etiológica entre a infecção por HPV e o câncer esofágico.[50][51]

Deficiências de vitaminas e minerais

  • A deficiência de vitaminas e minerais pode contribuir para o aumento do risco de câncer esofágico em algumas regiões.[52][53]

Raça

  • Relatou-se que a incidência de CCEO é maior em indivíduos não brancos.[16][17]

  • Nos EUA, o carcinoma de células escamosas é mais comum que o adenocarcinoma na população negra, com uma incidência entre homens negros 4.5 maior que entre homens brancos.[10][18]

História familiar de câncer esofágico ou outro

  • Em um estudo de coorte populacional de controle, o risco cumulativo de câncer esofágico até os 75 anos foi de 12.2% em parentes de primeiro grau de indivíduos com CCEO e de 7.0% no grupo de controle (razão de riscos [RR] 1.91, IC de 95% 1.54 a 2.37).[54]

  • O aumento do risco de CCEE foi associado com a história familiar de qualquer tipo de câncer.[55]

Consumo de mate

  • Beber mate, uma infusão de ervas, está associado a um aumento do risco de CCEO.[56][57] Hidrocarbonetos aromáticos policíclicos e lesão térmica foram implicados.[25]

Bebidas quentes

  • O consumo habitual de bebidas muito quentes (como ocorre em algumas culturas do Irã, China, Quênia e outros lugares) foi associado com o aumento do risco de CCEO, por lesões térmicas repetidas.[58][59][60][61]

Higiene bucal ineficiente

  • Estudos tipo caso-controle demonstraram uma associação entre CCEO e higiene bucal insatisfatória, independentemente do uso de álcool e tabaco.[62][63][64]

Síndromes de cânceres hereditários

  • A tilose (também conhecida como queratoderma palmoplantar não epidermolítico, ou síndrome de Howel-Evans) é uma síndrome autossômica dominante causadas por mutações na linha germinativa do gene RHBDF2. Ela está associada a aumento do risco vitalício de desenvolvimeto de CCEO, com uma idade média de 45 anos ao diagnóstico. O rastreamento de rotina por endoscopia digestiva alta é recomendado para pacientes e seus familiares a partir de 20 anos de idade.[15]

  • A síndrome de Bloom é um distúrbio autossômico recessivo raro, causado por uma mutação no gene BLM, que codifica a enzima de reparo do DNA RecQL3 helicase.[65]​ Está associada ao aumento do risco de desenvolvimento de múltiplos cânceres, especialmente linfoma e leucemia mieloide aguda, neoplasias dos tratos gastrointestinais inferior e superior (inclusive CCEO), câncer de pele e cânceres da genitália e do trato urinário.[65] Pode-se considerar o rastreamento para DRGE (com ou sem endoscopia para detectar câncer esofágico inicial).[15]

  • A anemia de Fanconi (AF) é uma condição autossômica recessiva causada por mutações na linha germinativa de qualquer um dos pelo menos 21 genes associados com a via da AF, a qual tem um papel na reparação do DNA. Ela se apresenta com anormalidades congênitas, pancitopenia progressiva e predisposição para o câncer (neoplasias hematológicas e tumores de órgãos sólidos, particularmente carcinomas de células escamosas, inclusive CCEO).[66]​ A endoscopia digestiva alta pode ser considerada como uma estratégia de rastreamento.[15]

Fisiopatologia

O câncer esofágico surge na mucosa do esôfago. Em seguida, ele progride localmente para invadir a submucosa e a camada muscular. A metástase ocorre tipicamente para os linfonodos periesofágicos, o fígado e os pulmões.

O carcinoma de células escamosas afeta principalmente as porções superior e média do esôfago. Os cânceres da porção inferior do esôfago e da junção gastroesofágica são tipicamente adenocarcinomas.[3]

Os mecanismos fisiopatológicos de várias causas ainda não estão completamente esclarecidos e são motivo de pesquisa ativa. No entanto, têm sido propostos mecanismos para alguns desses fatores etiológicos.

Bebidas alcoólicas

  • O mecanismo exato pelo qual as bebidas alcoólicas causam câncer esofágico ainda não é conhecido. O álcool, por si só, não se liga ao ácido desoxirribonucleico (DNA), não é mutagênico e não causa câncer em animais. Entretanto, ele pode agir por meio de sua conversão em acetaldeído (um carcinógeno conhecido), agindo como um solvente para outros carcinógenos e causando deficiências nutricionais.

  • Após a ingestão, o etanol é transformado em acetaldeído pela enzima álcool desidrogenase (ADH) e, em seguida, em acetato pela acetaldeído desidrogenase (ALDH).

  • Em associação com a absorção sistêmica e o metabolismo, nos etilistas pesados (>40 g/dia) o álcool presente na saliva também é oxidado em acetaldeído pelos diversos micróbios da boca e pelas glândulas salivares e mucosas. Esse processo é intensificado nos indivíduos com higiene bucal inadequada e alta carga bacteriana. Entretanto, a desintoxicação na boca é limitada, acarretando concentrações extremamente elevadas de acetaldeído carcinogênico. A saliva é deglutida, expondo a mucosa esofágica.[45]

  • In vitro, o acetaldeído causa mutações pontuais em linfócitos humanos, a troca de cromátides irmãs e a proliferação celular, além de inibir o reparo do ácido desoxirribonucleico (DNA).

Tobacco

  • O tabagismo expõe o corpo a um grande número de carcinógenos, como hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, nitrosaminas e acetaldeído, que estão presentes na fumaça do tabaco.

Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) e esôfago de Barrett

  • A DRGE crônica causa metaplasia (esôfago de Barrett), em que o epitélio escamoso estratificado que reveste normalmente o esôfago distal é substituído por epitélio colunar anormal. Embora isso possa parecer uma adaptação favorável ao refluxo crônico (uma vez que o epitélio colunar parece mais resistente a lesões induzidas por refluxo), essas células metaplásicas podem se tornar displásicas e, por fim, malignas, por meio de alterações genéticas que ativam proto-oncogenes e/ou desativam genes supressores de tumores.

  • Fatores que aumentam os danos do refluxo gastroesofágico, como hérnia de hiato, acalásia, obesidade ou medicamentos que diminuem o tônus do esfíncter esofágico inferior, podem aumentar ainda mais o risco de carcinoma esofágico.[33][67][68]​ No entanto, estudos não conseguiram demonstrar de maneira consistente aumentos do risco associados a medicamentos específicos.[33]

Classificação

Classificação histológica

O diagnóstico deve se basear nas biópsias endoscópicas, com o tipo de tumor histológico classificado de acordo com os critérios da Organização Mundial da Saúde (OMS).[1]​ Os dois principais tipos histológicos são o carcinoma de células escamosas esofágico (CCEE) e o adenocarcinoma esofágico (ACE) que, em conjunto, são responsáveis por >95% dos casos. Nos EUA, aproximadamente 70% dos casos são adenocarcinomas (tipicamente emergindo do esôfago de Barrett).[2] O adenocarcinoma esofágico (ACE) ocorre principalmente no esôfago distal e na junção gastroesofágica, ao passo que o carcinoma de células escamosas oral (CCEO) tende a afetar as porções superior e média do esôfago.[3]​ Raramente, outros tipos histológicos, como melanoma, sarcoma, carcinoma de pequenas células ou linfoma, podem ocorrer no esôfago.

Classificação de Siewert

O tipo de tumor de Siewert deve ser avaliado em todos os pacientes com adenocarcinoma esofágico (ACE) que envolva a junção gastroesofágica.[4][5]​​ A classificação pode ser realizada com base em uma endoscopia cuidadosa com descrição adequada do comprimento do tumor em relação aos marcos anatômicos. A classificação de Siewert possibilita a comparação de dados entre vários centros e facilita a escolha da terapia cirúrgica. Os tumores são classificados em três tipos:

  • Siewert Tipo 1: tumor da porção inferior do esôfago com epicentro localizado de 1-5 cm acima da junção gastroesofágica anatômica

  • Siewert Tipo 2: carcinoma real da cárdia com epicentro do tumor até 1 cm acima e 2 cm abaixo da junção gastroesofágica.

  • Siewert Tipo 3: carcinoma subcárdico com epicentro do tumor entre 2 cm e 5 cm abaixo da junção gastroesofágica, que infiltra a junção gastroesofágica e a porção inferior do esôfago a partir de baixo.

Os tumores Siewert Tipoa 1 e 2 são tratados como câncer esofágico, enquanto os tumores Siewert Tipo 3 são tratados de acordo com as diretrizes para câncer gástrico.

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