Abordagem

Aproximadamente 90% das infecções são assintomáticas ou resultam em doença leve similar à gripe (influenza-símile).[11]​ Para pacientes imunocompetentes com sintomas tipo gripe leves, no cenário epidemiológico adequado, o diagnóstico de histoplasmose pode ser óbvio.

No entanto, para outros pacientes que apresentarem sintomas respiratórios mais persistentes ou para pacientes imunocomprometidos, deve-se buscar uma avaliação abrangente que inclua história, exame físico e avaliação de evidências clínicas, radiológicas e laboratoriais de disseminação.

História

Deve-se obter uma detalhada história social e ocupacional detalhada. O Histoplasma capsulatum é endêmico nos vales dos rios Ohio, Mississípi e Missouri, nos EUA, na América Central e América do Sul.[3][4][16]​ Exploração de cavernas, proximidade de abrigos de pássaros ou morcegos, demolição e escavação, apanhar e cortar lenha são atividades associadas com a infecção. Essas informações auxiliam no estabelecimento da quantidade de exposição aos esporos fúngicos, embora uma história de exposição nem sempre esteja presente nos indivíduos afetados. À luz da crescente disseminação deste organismo fora de seus limites geográficos atuais, um diagnóstico de histoplasmose deve ser considerado no contexto clínico apropriado, mesmo na ausência de um histórico de viagens recentes típico.[6]

O paciente pode apresentar uma história de medicamentos ou de comorbidade clínica que pode contribuir para um estado imunocomprometido.

O paciente pode apresentar uma doença pulmonar subjacente (por exemplo, enfisema). A doença pulmonar crônica é um fator de risco para desenvolvimento de histoplasmose pulmonar crônica.[26][27]

Tendo em vista suas altas morbidade e mortalidade, deve-se considerar a possibilidade de uma infecção fúngica disseminada no início da evolução da doença em pacientes com comprometimento da imunidade celular subjacente (por exemplo, síndrome de imunodeficiência adquirida [AIDS]/infecção por vírus da imunodeficiência humana [HIV], terapia imunossupressora crônica, como antagonistas do fator de necrose tumoral [TNF]-alfa e corticosteroides), neutropenia, idade <2 anos, doença pulmonar crônica e doença do enxerto contra o hospedeiro, além de receptores de transplantes de célula-tronco e de órgão sólido.[19][20][21]

Exame físico

Histoplasmose pulmonar assintomática latente

  • É clinicamente silenciosa e pode ser descoberta apenas acidentalmente em uma biópsia ou autópsia, quando granulomas localizados podem ser detectados nos pulmões.

Histoplasmose respiratória aguda (sintomas <4 semanas)

  • Os pacientes apresentam sintomas tipo gripe (influenza) (por exemplo, febre, cefaleia, mal-estar, dor abdominal, perda de peso, tosse seca ou não produtiva, dor torácica, fadiga, artralgias).[1]

  • Os achados no exame físico geralmente não apresentam nada digno de nota. A ausculta torácica pode ser normal; podem-se ouvir estertores dispersos e sopro tubário em alguns pacientes.

Histoplasmose respiratória aguda (sintomas >4 semanas)

  • Se os sintomas persistirem por >4 semanas, isso pode indicar que o paciente está desenvolvendo doença disseminada progressiva, que pode ser interrompida por terapia eficaz.

  • Nos pacientes com sintomas respiratórios mais graves, pode-se ouvir murmúrio vesicular diminuído à ausculta de uma cavidade pulmonar.

Histoplasmose pulmonar crônica

  • Isso ocorre em pacientes com doença pulmonar subjacente (por exemplo, enfisema).

  • Pode ocorrer infiltração dos lobos superiores de um ou dos dois pulmões com cavitação.

  • As manifestações mais comuns são tosse produtiva, perda de peso, febres, mal-estar e possível hemoptise.

  • A doença pulmonar crônica se assemelha à tuberculose e pode piorar com o passar de meses ou de anos.

Histoplasmose mediastinal

  • Resulta do envolvimento dos linfonodos mediastinais, que coalescem para formar lesões semelhantes a massas.

  • Frequentemente assintomática, embora os sintomas possam resultar de pinçamento de estruturas mediastinais, como esôfago e brônquios.

  • A fibrose do mediastino pode ocorrer como uma complicação tardia em alguns pacientes, com invasão de estruturas vitais associada.

Histoplasmose disseminada

  • Ocorre principalmente em pacientes imunocomprometidos, sobretudo naqueles com infecção por HIV.[1]

  • O comprometimento da imunidade celular por imunodeficiência primária, ou secundário a terapia com antagonistas do TNF-alfa ou a terapia imunossupressora, aumenta o risco de histoplasmose progressiva, disseminada e com risco de vida.[14][18]

  • Febre é o sintoma mais comum; no entanto, cefaleia, anorexia, perda de peso e mal-estar são queixas frequentes.

  • As manifestações extrapulmonares podem ser variadas, incluindo lesões cutâneas, hepatoesplenomegalia, enzimas hepáticas anormais, pancitopenia, comprometimento gastrointestinal e uma síndrome similar à sepse.[2]

  • A disseminação da doença para o sistema nervoso central pode se apresentar como uma lesão cerebral ou como meningite.

  • Em pacientes com HIV/AIDS avançado, a pneumonia por histoplasmose geralmente ocorre em conjunto com uma doença disseminada e apresenta sintomas de infecção pulmonar que são mais agudos e mais graves que os observados em outros grupos de pacientes.

Investigações

Radiografia torácica

  • Deve ser realizada em todos os pacientes. Mesmo com doença leve, a radiografia torácica auxilia na determinação da extensão do comprometimento pulmonar e ajuda a distinguir a doença da gripe (influenza) e da pneumonia adquirida na comunidade.

  • Podem-se observar granulomas calcificados; eles representam focos cicatrizados de infecção prévia pelo fungo (infiltrados focais).

  • Infiltrados intersticiais ou reticulonodulares unilaterais ou bilaterais, nódulos, linfadenopatia mediastinal ou hilar e lesões cavitárias são achados comuns. Os derrames pleurais são incomuns.

  • Pacientes infectados com HIV e imunocomprometidos com histoplasmose pulmonar podem apresentar infiltrados reticulonodulares bilaterais difusos indistinguíveis da pneumonia por Pneumocystis.[2] Tanto em pacientes imunocomprometidos quanto imunocompetentes, a presença de infiltrados intersticiais difusos na radiografia torácica justifica avaliação em busca de histoplasmose fúngica disseminada.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Radiografia torácica de um paciente com histoplasmose, demonstrando infiltrados reticulonodulares difusos bilateraisDo acervo pessoal do Dr. David L. Goldman [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@3fbcf0db

Tomografia computadorizada (TC)

  • Em pacientes imunossuprimidos, nos quais o índice de suspeita para um processo fúngico é alto e a radiografia torácica é normal, a TC torácica deve fazer parte da avaliação inicial.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Tomografia computadorizada (TC) pulmonar mostrando aparência clássica de "nevasca" de histoplasmose agudaPublic Health Image Library, Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@6546ad34

  • A TC auxilia na determinação da extensão da disseminação.

Exames laboratoriais podem servir de base para o diagnóstico com achados clínicos e radiográficos compatíveis. Cada teste tem algumas limitações que devem ser reconhecidas antes de seu uso. Devem-se colher amostras de escarro, urina, soro, lavagem broncoalveolar (LBA) ou líquido cefalorraquidiano (LCR). Geralmente, utilizam-se escarro, urina e soro, mas caso uma doença grave seja indicada clinicamente e os resultados laboratoriais iniciais sejam dúbios, podem-se utilizar amostras do LBA e do LCR para confirmar o diagnóstico.

Cultura

  • As culturas fúngicas são o teste padrão-ouro para confirmar o diagnóstico, mas podem ser tecnicamente desafiadoras e demoradas.[28]

  • A cultura é mais útil nos pacientes com histoplasmose pulmonar crônica ou doença disseminada. Os pacientes com pneumonia difusa aguda e histoplasmose disseminada apresentam uma carga fúngica elevada; as culturas fúngicas de escarro geralmente são positivas em 60% a 85% dos casos.[29][30]Por outro lado, os pacientes com doença pulmonar localizada aguda têm uma baixa carga fúngica; nesses pacientes, a cultura de escarro tem uma sensibilidade de apenas 15%.

  • O fungo cresce lentamente e pode levar de 4 a 6 semanas para crescer na cultura. Podem ser colhidas amostras de escarro ou LBA.

  • Nos pacientes com doença disseminada (por exemplo, pacientes com AIDS), a hemocultura com uso de recipientes de lise-centrifugação aumenta a sensibilidade diagnóstica, em comparação com as técnicas de cultura padrão. A cultura da medula óssea também pode ser útil nos pacientes com doença disseminada.[25][Figure caption and citation for the preceding image starts]: Culturas inclinadas com crescimento de colônias de Histoplasma capsulatum em 2 tipos diferentes de ágarDr. Lenore Haley, Public Health Image Library, Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@3c3439fa

  • A cultura do LBA tem uma sensibilidade de 89% em pacientes com AIDS.[31]

Detecção de antígeno: imunoensaio enzimático

  • Esse exame fornece um diagnóstico rápido e é baseado na detecção do antígeno galactomanana do H capsulatum. É útil para pacientes que estão gravemente doentes.[32]​ Ele pode utilizar amostras de soro, urina, LBA e LCR. O teste de antígeno urinário ou sérico é recomendado para o diagnóstico rápido de histoplasmose pulmonar aguda e disseminada suspeitada; nesse caso, o início imediato do tratamento é essencial para melhorar os desfechos.[4][28][32][33]​​​[34][35]​​

  • Pacientes com pneumonia difusa aguda e histoplasmose disseminada apresentam uma carga fúngica elevada, e o teste de antígenos na urina é positivo em 75% dos pacientes.[29][30]​ Por outro lado, os pacientes com doença pulmonar localizada aguda têm uma baixa carga fúngica, e o teste de antígenos na urina é positivo apenas em aproximadamente 30% dos pacientes.[36]

  • A sensibilidade da detecção dos antígenos na urina é similar ou melhor que no soro.[37] Ela é especialmente útil para a realização do diagnóstico em pacientes imunocomprometidos ou naqueles que estão gravemente doentes e podem não ter desenvolvido uma resposta de anticorpos.[36]

  • A detecção de antígeno tem uma sensibilidade de 85% e uma especificidade de 92% em espécimes de LBA.[38]​ Para pacientes com AIDS e histoplasmose disseminada, a sensibilidade da detecção do antígeno no líquido de LBA parece ser comparável à do sangue.[31]

  • Os níveis de antígeno sérico diminuem nas 2 primeiras semanas de terapia, enquanto os níveis de antígenos da urina podem persistir em baixas concentrações por muitos meses antes de desaparecerem.[39] Os níveis antigênicos podem ser usados para monitorar a evolução do paciente enquanto recebe terapia antifúngica; os níveis de antigênicos diminuem com a terapia eficaz, enquanto um aumento indica recidiva.[28]

Sorologia (detecção de anticorpo): teste de precipitina (imunodifusão)

  • A testagem de anticorpos é recomendada para os pacientes imunocompetentes com suspeita de histoplasmose pulmonar.[28]

  • O resultado é positivo em 90% dos pacientes sintomáticos com histoplasmose pulmonar aguda e em quase 100% dos pacientes com histoplasmose pulmonar crônica. Esse teste é relativamente sensível, mas tem algumas limitações por conta de reatividade cruzada.

  • Os anticorpos mensuráveis aparecem 4 a 8 semanas após a infecção aguda e duram de 12 a 18 meses. Isso pode explicar porque a sorologia pode ser negativa inicialmente, mas positiva 1 mês depois.

  • O histórico de soropositividade em áreas endêmicas é baixo; assim, o teste de imunodifusão tem alta sensibilidade e especificidade mesmo em regiões endêmicas.[40]

  • O resultado é reportado como a presença de bandas M ou H.[29] Os antígenos H e M são glicoproteínas liberadas pelo fungo. A banda M é encontrada em aproximadamente 76% dos pacientes com histoplasmose pulmonar aguda. A banda H é observada em apenas 20% dos pacientes infectados, mas está associada à histoplasmose pulmonar aguda grave, à infecção disseminada e à doença cavitária.[29] A banda M tende a persistir por mais tempo do que a banda H. Sua presença pode ser indicativa de infecção aguda, crônica ou resolvida.

  • Em pacientes com AIDS, a sensibilidade dos testes sorológicos, incluindo o teste de imunodifusão, é reduzida para 70%.[2] Da mesma forma, é provável que a sensibilidade da sorologia seja reduzida em outras doenças associadas à imunossupressão (por exemplo, transplante de órgãos ou administração crônica de corticosteroides).

Sorologia (detecção de anticorpo): ensaio de fixação do complemento

  • A testagem de anticorpos é recomendada para os pacientes imunocompetentes com suspeita de histoplasmose pulmonar.[28][32]

  • Esse teste é mais rápido e mais sensível que o teste de imunodifusão (95% contra 90%), mas tem uma especificidade menor por causa da reatividade cruzada dos anticorpos induzida por outras infecções micóticas (por exemplo, coccidioidomicose, blastomicose).[40]

  • Ele usa leveduras de H capsulatum e antígenos miceliais.

  • A sensibilidade pode ser reduzida em indivíduos imunocomprometidos.[32]

  • Títulos entre 1:8 e 1:16 são considerados baixos positivos e devem ser interpretados em um contexto clínico. Títulos ≥1:32 ou um aumento de quatro vezes no título são diagnósticos de infecção aguda.[41]

Sorologia (detecção de anticorpo): ensaio imunoenzimático

  • A testagem de anticorpos é recomendada para os pacientes imunocompetentes com suspeita de histoplasmose pulmonar.[28][32]

  • Ensaio comercialmente disponível que fornece medição quantitativa dos níveis de imunoglobulina (Ig) G e IgM específicos para histoplasmose.

  • Em um estudo clínico limitado, este ensaio foi relatado como sendo mais sensível do que os ensaios de fixação de complemento e imunodifusão no diagnóstico da histoplasmose pulmonar aguda.[42]

  • O uso combinado deste ensaio com a detecção de antígenos pode melhorar o diagnóstico da histoplasmose pulmonar aguda.[32][42]

  • As limitações incluem a reatividade cruzada com anticorpos para outros fungos e a diminuição da sensibilidade nos indivíduos imunocomprometidos.[32]

Hemograma completo

  • O resultado auxilia na confirmação ou rejeição da possibilidade de uma doença disseminada.

  • Pacientes imunocompetentes com pneumonia por histoplasmose podem demonstrar apenas uma anemia leve.

  • Pacientes com histoplasmose disseminada progressiva podem ter evidências de anemia, neutropenia, pancitopenia e trombocitopenia decorrentes de infecção disseminada envolvendo o sistema reticuloendotelial.

Testes da função hepática

  • São úteis na linha basal caso o tratamento a ser instituído seja à base de antifúngicos azólicos, devido ao risco de hepatotoxicidade desses medicamentos.

  • Testes da função hepática elevados no quadro de infecção por histoplasmose sugerem a presença de doença disseminada.

Biópsia

  • Deve-se obter tecido sempre que possível, para possibilitar um diagnóstico histopatológico via coloração fúngica e cultura fúngica.[4] Ao exame, o H capsulatum aparece como uma levedura ovoide intracelular relativamente pequena (2-4 mícrons). A inflamação granulomatosa pode ser caseosa ou não caseosa.

  • Coloração de prata em ácido periódico de Schiff ou metenamina de Grocott pode ser usada.[4]

  • A sensibilidade da histopatologia varia de acordo com a carga de doença e o grau de imunossupressão.[4][Figure caption and citation for the preceding image starts]: Coloração de prata metenamina revelando fungos Histoplasma capsulatum no tecido pulmonarDr. Edwin P. Ewing, Jr, Public Health Image Library, Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@1cddd90[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Alterações histopatológicas associadas à histoplasmose pulmonarDr. Martin Hicklin, Public Health Image Library, Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@6f0176b5

Achados laboratoriais típicos

Histoplasmose pulmonar aguda (sintomas <4 semanas)

  • A carga fúngica é baixa. O ensaio imunoenzimático irá detectar o antígeno na urina em aproximadamente 30% dos pacientes. A cultura de escarro tem uma sensibilidade de 15%. A sorologia é positiva na maioria dos casos.

Histoplasmose pulmonar aguda (sintomas >4 semanas)

  • A carga fúngica é alta. Os testes de antígeno e as culturas muitas vezes são positivos. A sorologia pode ser negativa inicialmente, mas positiva 1 mês depois.

Histoplasmose pulmonar crônica

  • A sorologia é positiva na maioria dos casos, e os títulos de fixação do complemento muitas vezes são altos.

Doença disseminada

  • As culturas fúngicas do escarro são positivas em 60% a 85% dos casos. A sorologia é positiva na maioria dos casos, embora a sensibilidade possa estar prejudicada nos pacientes imunocomprometidos. A detecção de antígenos tem sensibilidade superior a 90% para a doença disseminada nos pacientes imunocomprometidos.[43] O exame da medula óssea pode fornecer um método rápido de diagnóstico nos pacientes com doença disseminada, especialmente os pacientes com AIDS.[25]

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