Etiologia

Na maioria das crianças, não é encontrado nenhum fator etiológico, e o termo "obstipação funcional" é usado com frequência.

A constipação na infância muitas vezes resulta de uma combinação de defecação dolorosa (de qualquer causa) e um reto com capacidade suficiente para permitir que as fezes sejam retidas.[16] A sequência provável de eventos segue fezes inicialmente duras, geralmente devido a baixa ingestão de fibras, deficits de nutrientes, e/ou ingestão de água insuficiente ou, com menos frequência, devido a motilidade colônica protelada. O tempo colônico excessivo para o transporte das fezes causa altos níveis de reabsorção cólica de água e endurecimento adicional das fezes. Inicia-se geralmente como um problema agudo, que pode evoluir para:

  • Dor na passagem das fezes, que causa a contração involuntária e, posteriormente, intencional do esfíncter (comportamento de retenção) para evitar o desconforto

  • Maior espaçamento entre os episódios de defecação, levando a aumento do volume de fezes residual no reto

  • Aumento adicional no tamanho da carga retal e uma tática de retenção mais eficaz

  • Aumento na dor e no medo, pois as fezes proteladas são cada dia maiores e, portanto, ainda mais dolorosas

  • Por fim, a incontinência fecal por transbordamento, que ocorre quando as fezes estimulam as contrações retais e o esfíncter interno relaxa temporariamente, com a passagem de fezes mais moles circulando por fragmentos endurecidos retidos.

A tendência a desenvolver a constipação parece ser familiar, com uma história familiar positiva em aproximadamente metade de todos os casos graves.[17]

Embora a etiologia da constipação em 90% a 95% das crianças seja funcional, várias causas orgânicas têm sido identificadas. ​[1]​ Foi constatado que a infecção perianal por estreptococos do grupo A que causa defecação dolorosa é um forte precipitador em um pequeno, porém facilmente tratável, subgrupo de crianças com constipação.[18] Existem casos em que uma intolerância alimentar (particularmente alergia a leite de vaca) pode levar a proctite e subsequente desconforto na defecação, causando constipação.[19][20][21]​​ Líquen escleroso e trauma no ânus podem também causar dor na defecação, causando a constipação. O trauma direto acidental do ânus é incomum e qualquer evidência de trauma anal deve causar suspeita de abuso sexual infantil.[22] A recusa para defecar pode ser uma apresentação de problemas psicológicos complexos, como distúrbios de comunicação que estejam dentro do espectro autista.[2] Além disso, o transtorno de deficit da atenção com hiperatividade (TDAH) tem sido relatado como associado à constipação.[3]​​ Causas mais raras de constipação incluem aquelas que se apresentam nas primeiras semanas de vida, como doença de Hirschsprung ou anomalias anorretais. Anomalias na medula espinhal, incluindo síndrome da medula presa, podem levar à constipação tipicamente presente na primeira infância. A disfunção urinária também pode estar presente nesses casos.

A retenção fecal volitiva excessiva e a natureza angustiante da incontinência fecal podem causar uma dissociação psicológica e negação dos sintomas ou de sua importância.[23]

Fisiopatologia

Defecação dolorosa pode causar retenção fecal. Como em outros órgãos ocos em que o esvaziamento é ineficaz (isto é, bexiga obstruída, estenose pilórica obstrutiva congênita), com a constipação na infância prolongada existe uma dilatação considerável do reto e de suas camadas musculares. Isso, por sua vez, leva ao desenvolvimento de um aumento cada vez maior na capacidade do reto (megarreto) até o ponto em que as fezes sejam muito grandes para passarem através do canal anal, sobrando apenas o transbordamento contínuo de material fecal e incontinência fecal. As consequências sociais e psicológicas da incontinência exacerbam o problema. A massa fecal retida parece estar em movimento constante, não propulsivo. Isso tende a moldar as fezes em uma bola que é difícil de passar e mais fácil de reter. Todos esses fatores causam um ciclo de medo e retenção adicional. Além disso, pode ocorrer constipação de trânsito lento em decorrência de função propulsiva colônica baixa, e constipação de obstrução da saída, geralmente devido a coordenação muscular do assoalho pélvico anormal, pode contribuir para os sintomas.

Novas pesquisas também sugerem um papel para a disbiose no microbioma intestinal. Estudos que avaliam o microbioma intestinal de crianças com constipação encontraram níveis mais baixos de micro-organismos, inclusive lactobacilos, em comparação com os controles. Existe a hipótese de que esses distúrbios podem afetar a fisiologia e a motilidade intestinal, contribuindo para o desenvolvimento da constipação, embora ainda haja muito a ser compreendido sobre o papel do microbioma.[24]

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