Abordagem

A abordagem para tratamento de síndromes de dor crônica inclui os tratamentos:

  • Criados para aliviar ou minimizar dores de longa duração

  • Para prevenir a ocorrência/recorrência futura de dor

  • Para aumentos graves no nível da dor.

Esses tratamentos requerem uma abordagem multidisciplinar e uma perspectiva biopsicossocial, que leve em consideração como a dor afeta a qualidade de vida do paciente e como aspectos da sua vida podem afetar a dor que sente. Um plano bem definido de gestão do tratamento deve ser discutido e acordado com o paciente.[42][49][50][51][52]​ O médico da atenção primária deve considerar o encaminhamento para um especialista para os pacientes com:

  • Dor persistente e incapacitante apesar do tratamento

  • Dor progressiva

  • História de abuso de álcool ou drogas

  • Necessidade de altas doses ou uso prolongado de analgésicos opioides

  • Pacientes causando divergências entre a equipe

  • Sintomas de cefaleia preocupantes

  • Envolvimento ocular com neuralgia pós-herpética.

Geralmente, é necessário fazer ajustes das doses farmacoterapêuticas em pacientes idosos por causa da redução do metabolismo dos medicamentos, da politerapia (com risco associado de interações medicamentosas) e da sensibilidade aos efeitos adversos. As doses iniciais recomendadas para medicamentos comuns para a dor foram publicadas pela American Geriatric Society.[53]

O guia de recursos da American Chronic Pain Association para o tratamento de dor crônica incorpora uma abordagem multimodal baseada em terapias clínicas, intervencionistas, comportamentais, farmacológicas e de reabilitação para tratar a dor crônica.[50]

Terapias não farmacológicas e terapias farmacológicas sem opioides são preferíveis para o controle da dor crônica. A terapia com opioides só deve ser considerada após tentar outras opções, e quando for previsto que os benefícios esperados superem os riscos para o paciente.[42]

Consulte a abordagem de manejo em: Osteoartrite, Artrite reumatoide, Dor musculoesquelética na coluna lombar, Síndrome da dor regional complexa, Neuropatia diabética, Infecção por herpes-zóster, Fibromialgia, Cefaleia enxaquecosa em adultos, Cefaleia em salvas e Cefaleia do tipo tensional.

Terapias não farmacológicas

As terapias não farmacológicas podem ser usadas isoladamente ou em combinação com outros tratamentos para os pacientes com dor crônica.[50]

Fisioterapia e atividade física

  • As terapias devem ser adaptadas à condição específica (veja abaixo), tais como treinamento postural, exercícios de alongamento, exercícios ativos para a amplitude de movimento (ADM), redução de peso e hidroterapia.

  • Os programas de exercícios devem ser adaptados à capacidade física e ao estilo de vida do paciente.[50][51][54]

Terapia ocupacional

  • Os pacientes com dificuldade nas atividades da vida diária, profissionais ou sociais em decorrência da dor podem se beneficiar de um treinamento sobre controle da dor e modificações no trabalho.

Psicologia de controle da dor

  • Pacientes com dor crônica podem se beneficiar de terapias psicológicas, como terapia cognitivo-comportamental (TCC; incluindo TCC fornecida pela Internet), terapia de aceitação e comprometimento, terapia comportamental, terapia de relaxamento, gerenciamento do estresse e habilidades de enfrentamento.[50][51][52][55][56][57][58] [ Cochrane Clinical Answers logo ]

Tratamento da dor miofascial

Todos os pacientes com dor miofascial devem ser tratados principalmente com fisioterapia, com a adição de anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs), se necessário (particularmente, durante as exacerbações dos sintomas).

Os pacientes provavelmente precisarão ir várias vezes por semana ao fisioterapeuta inicialmente para receber instruções sobre as técnicas (tais como treinamento postural, alongamento e exercícios ativos para ADM), devendo praticá-las em casa entre as sessões. O objetivo da terapia é que o paciente desenvolva um programa doméstico que possa continuar de forma independente duas vezes ao dia em longo prazo.

A terapia ocupacional e a terapia psicológica para o controle da dor devem ser fornecidas a todos os pacientes cuja dor miofascial tenha impacto negativo sobre as atividades diárias ou o humor.

Medicamentos adicionais, como paracetamol, podem ser necessários para pacientes que não obtêm alívio da dor satisfatório com fisioterapia e AINEs. Codeína ou tramadol pode ser usado (na menor dose eficaz) por um período limitado, se for previsto que os benefícios superem os riscos para o paciente.[42] As injeções em pontos-gatilho podem ser usadas como opção para o tratamento da dor miofascial em alguns pacientes; revisões sistemáticas que incluem estudos sobre a dor miofascial indicam que os desfechos são semelhantes, independentemente do tipo de injetável usado.[59][60] Técnicas como acupuntura e agulhamento seco são úteis para a liberação de pontos-gatilho e podem ser usadas no contexto mais amplo de uma abordagem de reabilitação/controle da dor.[61] Os pacientes com dor miofascial intensa que não responderem à fisioterapia poderão se beneficiar do uso adicional de um relaxante muscular, como a tizanidina.[62]

Tratamento da dor musculoesquelética

A fisioterapia é a base do tratamento da dor mecânica. Todos os pacientes devem ser considerados para o manejo do peso (conforme o caso) e fisioterapia com ou sem adição de hidroterapia, conforme disponíveis. Os pacientes cuja dor afete as atividades da vida diária, profissionais ou sociais devem ser avaliados por um terapeuta ocupacional e um psicólogo da dor. Paracetamol e AINEs, isoladamente ou em combinação, podem ser usados para as exacerbações da dor musculoesquelética.[63]

Pacientes com osteoartrite com intensificação súbita da dor (consulte Osteoartrite):[63]

  • Os medicamentos são fornecidos conforme a necessidade, com analgesia tópica e/ou oral (por exemplo, capsaicina, AINEs, paracetamol)

  • Injeções intra-articulares de corticosteroides podem ser úteis.

Pacientes com artrite reumatoide (AR) (consulte Artrite reumatoide):[64]

  • Todos os pacientes com AR devem ser avaliados inicialmente por um reumatologista, devendo-se oferecer um tratamento com medicamentos antirreumáticos modificadores de doença (MARMD), a fim de minimizar a destruição da articulação em longo prazo. Os pacientes com doença leve a moderada geralmente iniciam com um único MARMD, a menos que haja contraindicações específicas

  • Os pacientes que não obtiverem benefício suficiente com MARMDs sintéticos convencionais poderão receber um agente biológico (como um inibidor de TNF-alfa) ou um MARMD sintético direcionado, isolado ou combinado com um MARMD sintético convencional.[64]

Tratamento da dor neuropática

Os medicamentos são usados como tratamento de primeira linha para a dor neuropática, com o objetivo de reduzir os sintomas de desconforto. Anticonvulsivantes estabilizadores da membrana (por exemplo, gabapentina, pregabalina) e antidepressivos tricíclicos (ADTs; por exemplo, amitriptilina) são eficazes.[65][66][67][68][69] A duloxetina, um inibidor da recaptação de serotonina-noradrenalina (SNRI), pode ser benéfica nos pacientes que não toleram ADTs.

Terapias de segunda linha incluem capsaicina tópica (creme ou adesivo) ou um adesivo de lidocaína.[70] As evidências a favor da capsaicina de dose baixa (ou seja, 0.025% ou 0.075%) são deficientes, mas ela pode ser considerada em alguns casos.[71]

Todos os pacientes com comprometimento significativo das atividades diárias, trabalho, atividades sociais ou do humor em decorrência de dor neuropática devem ser avaliados por fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e psicólogos. A fisioterapia deve incluir treinamento postural, exercícios de alongamento e exercícios ativos para a ADM.[72] 

A neuroestimulação invasiva e não invasiva pode ser usada para tratar a dor neuropática crônica. As técnicas com algumas evidências de benefício incluem estimulação da medula espinhal, estimulação do córtex motor epidural, estimulação magnética transcraniana repetitiva e estimulação elétrica transcraniana direta.[73][74][75][76] Às vezes, a estimulação elétrica transcutânea do nervo (TENS) é também usada para tratar a dor neuropática, mas não está claro se ela é eficaz, por causa da baixa qualidade das evidências.[77] Não há evidências suficientes que respaldem ou refutem o uso da acupuntura no tratamento da dor neuropática.[78]

A dor neuropática devida a neuropatia diabética requer o controle da glicose. Consulte Neuropatia diabética.

A neuralgia pós-herpética ocorre em cerca de 30% dos pacientes com herpes-zóster, e o risco pode ser minimizado pelo tratamento precoce com agentes antivirais.[19] Os pacientes com neuralgia pós-herpética e envolvimento ocular devem ser encaminhados para um oftalmologista. Consulte Infecção por herpes-zóster.

A síndrome da dor regional complexa (CRPS) é manejada com fisioterapia agressiva e terapia medicamentosa. Os pacientes com CRPS devem ser prontamente encaminhados para uma clínica da dor. Consulte Síndrome da dor regional complexa.

Tratamento da fibromialgia

Por causa da natureza multissintomática da fibromialgia e da alta incapacidade nesta população, a maioria dos pacientes com fibromialgia recebem tratamento abrangente e multidisciplinar, com o objetivo predominante de melhorar a qualidade de vida relacionada à saúde.[79] O encaminhamento para um psicólogo é adequado no diagnóstico inicial. 

As terapias não farmacológicas com algumas evidências de benefício incluem terapia com exercícios, hidroterapia, habilidades psicológicas de controle da dor (por exemplo, terapia cognitivo-comportamental) e terapia ocupacional.[79][80][81][82][83] [ Cochrane Clinical Answers logo ]

As terapias farmacológicas com alguma evidência de benefício incluem os ADTs, inibidores da recaptação de serotonina-noradrenalina (IRSNs) e o tramadol. Os AINEs e os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRSs) não demonstraram ser eficazes no tratamento da dor da fibromialgia. Os opioides fortes não devem ser usados por causa do alto risco de efeitos adversos.[42][79]

Consulte Fibromialgia.

Tratamento da cefaleia crônica

O tratamento da cefaleia varia com base no diagnóstico. Ataques agudos e infrequentes ocorrendo até 3 dias por semana são manejados usando terapia aguda com analgésicos orais.

Certifique-se de que o diagnóstico da cefaleia esteja correto antes de iniciar o tratamento.[2]

  • A cefaleia pós-traumática (ou seja, cefaleia por trauma ou lesão na cabeça e/ou pescoço) é tratada da mesma forma que a cefaleia do tipo tensional.

  • Cefaleia em salvas: muitas vezes, é necessário encaminhamento para um especialista, para discutir as opções de tratamento. As cefaleias crônicas em salvas são tratadas principalmente com terapia preventiva (por exemplo, bloqueadores dos canais de cálcio). A terapia de resgate (por exemplo, um triptano subcutâneo ou oxigênio) pode ser tentada durante o episódio de cefaleia em salvas.

  • Cefaleia enxaquecosa: evitar os gatilhos (por exemplo, álcool, cafeína) é importante; para facilitar, pode-se manter um diário da enxaqueca. O tratamento medicamentoso para alívio dos sintomas (por exemplo, AINEs, paracetamol, triptano) deve ser iniciado assim que o paciente reconhecer que um ataque típico de enxaqueca está começando, mesmo que os sintomas sejam leves. Tratamentos preventivos (por exemplo, anticonvulsivantes, betabloqueadores, antidepressivos, bloqueadores dos canais de cálcio ou antagonistas peptídicos relacionados ao gene da calcitonina) devem ser considerados para as pessoas com ataques de enxaqueca frequentes e incapacitantes, quando os tratamentos agudos forem ineficazes ou contraindicados, ou quando os ataques causarem sequelas neurológicas.

  • Cefaleia por uso excessivo de medicamentos: tratada com a suspensão do medicamento usado em excesso, com suporte de tratamento sintomático, tratamento preventivo para o distúrbio de cefaleia primário e educação do paciente e da família.

Consulte Cefaleia enxaquecosa em adultos, Cefaleia em salvasCefaleia tensional e Cefaleia por uso excessivo de medicamentos.

Opioides

Os opioides (como codeína e tramadol) têm sido comumente usados no controle da dor. No entanto, em muitos casos, o efeito analgésico diminui com o tempo, e o paciente passa a necessitar de doses mais altas de opioides para manter o mesmo nível de alívio da dor. Doses maiores provocam aumento do risco de eventos adversos, incluindo superdosagem, uso indevido, fraturas ocasionadas por quedas, alterações hormonais e maior sensibilidade à dor. Portanto, as terapias sem opioides são preferíveis para tratar a dor crônica.[42]

As evidências sobre a eficácia da terapia com opioides em longo prazo para dor crônica são muito limitadas, mas os dados sugerem aumento do risco de danos graves que parecem ser dose-dependentes.[42][84][85][86] Os médicos devem considerar não apenas a dose diária prescrita, mas também a duração da ação do opioide (que está relacionada ao risco de lesão por superdosagem não intencional), favorecendo os agentes de curta duração e de liberação imediata sempre que possível, especialmente durante as 2 primeiras semanas de terapia.[42][87]

A orientação dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA para prescrição de opioides em casos de dor crônica aborda as discussões do paciente, o estabelecimento de metas de tratamento, início, seleção e posologia do medicamento, acompanhamento, continuação, avaliação do risco, análise de danos potenciais e a descontinuação. A orientação enfatiza que os opioides não são uma terapia de primeira linha ou de rotina para a dor crônica.[42] A Medicines and Healthcare Products Regulatory Agency do Reino Unido recomenda que, antes de prescrever opioides, os médicos devem discutir os riscos e as características de tolerância e dependência com os pacientes e acordar, conjuntamente, uma estratégia e um plano de tratamento para o fim do tratamento.[88]

Se forem prescritos, os opioides deverão ser iniciados com uma dose baixa. A dose deve ser aumentada gradualmente, com monitoramento frequente da eficácia e dos efeitos adversos. Se os eventos adversos forem inaceitáveis ou a eficácia for insuficiente, o tratamento com opioides deverá ser interrompido (com redução gradual, se apropriada).[42][88]

Os médicos de atenção primária deverão encaminhar para avaliação por um especialista os pacientes que necessitarem de altas doses e/ou terapia prolongada com opioides.

A prescrição concomitante de benzodiazepínicos com opioides deve ser evitada por causa do aumento do risco de morte por superdosagem de medicamentos de forma dependente da dose.[42][89]

Consulte Transtorno relacionado ao uso de opioides

Considerações na gestação

As terapias não farmacológicas são especialmente apropriadas para as mulheres grávidas ou que estiverem tentando engravidar.

Nenhum medicamento é completamente livre de riscos na gravidez, e as decisões devem ser tomadas caso a caso, ponderando o risco da dor crônica como uma ameaça à saúde da mãe e do feto e o risco do tratamento.

O paracetamol é a opção farmacológica preferida para o tratamento da dor durante a gravidez.[90][91]

Medicamentos com valproato são contraindicados durante a gravidez, em razão do risco de malformações congênitas e de problemas de desenvolvimento no lactente/criança.[92] Tanto nos EUA como na Europa, o valproato e seus análogos não devem ser usados em pacientes do sexo feminino em idade fértil, a menos que exista um programa de prevenção da gravidez e certas condições sejam atendidas.[92] A segurança de outros medicamentos anticonvulsivantes durante a gravidez foi revisada pela Medicines and Healthcare Products Regulatory Agency do Reino Unido.[93] O uso de antidepressivos com efeitos sobre a recaptação da serotonina durante a gravidez para tratar a depressão tem sido associado ao risco de malformações congênitas graves.[94]

Medição dos desfechos do tratamento

O desfecho do tratamento pode ser avaliado prontamente pela comparação dos desenhos da localização da dor antes e depois do tratamento e os escores de intensidade da dor. Uma classificação de intensidade da dor de 11 pontos (0 = sem dor, 10 = excruciante) é prontamente entendida pelos pacientes e está correlacionada com as avaliações de melhora global.[95] Uma redução da dor de pelo menos 2 nessa escala significa uma melhora significativa, classificada pelos pacientes como melhora boa ou melhora muito boa.

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