Abordagem
O manejo inicial inclui medidas educacionais, comportamentais e de modificação do estilo de vida. Isso pode ser acompanhado por tratamentos adicionais com objetivo de melhorar os limiares do despertar e/ou conciliar a produção noturna de urina à capacidade de armazenamento vesical.
Educação, motivação e mudanças de estilo de vida
Geralmente, crianças com menos de 7 anos de idade não são ativamente tratadas e a família é tranquilizada. Manejo ativo é oferecido para crianças ≥7 anos. É muito importante que a família e o paciente sejam participantes dispostos, em um ciclo de tratamento que provavelmente será longo. A educação sobre a história natural da doença também é importante, ressaltando que a resolução ocorre a uma taxa de 5% a 10% ao ano.[1] Desse ponto em diante, o paciente deve ser apoiado emocionalmente e encorajado quando houver progresso positivo e não se sentir envergonhado ou punido por quaisquer retrocessos. Uma recompensa ou um gráfico com estrelas, para com uma estrela registrar os dias e noites em que o paciente fica seco, pode ser útil.
Hábitos miccionais regulares devem ser desenvolvidos durante o dia, além de instruir o paciente a limitar a quantidade de líquidos ingeridos, especificamente os cafeinados, nas horas antes de dormir; isso pode ser complementado por urinar imediatamente antes de deitar. Essas medidas educacionais, comportamentais e de modificação do estilo de vida devem continuar, mesmo que outras terapias sejam iniciadas.
O tratamento de treinamento da bexiga (uroterapia) pode ser usado como parte dessas medidas comportamentais iniciais. Ele envolve uma combinação de educação, programação rigorosa de dieta e hábitos miccionais e apoio psicológico. É mais útil em crianças que apresentam sinais e sintomas de disfunção miccional diurna, como urgência, polaciúria ou micção infrequente. É mostrado à criança que ela pode assumir o controle de sua bexiga e que, ao fazer isso, pode evitar os acidentes noturnos. Isso deve ser feito sob a supervisão de um uroterapeuta treinado, e foi mostrado que cura a enurese em até 90% dos pacientes adequadamente selecionados.[31] Com essa alta taxa de sucesso, alguns propuseram que todas as crianças enuréticas começassem o tratamento com o treinamento da bexiga, antes de qualquer farmacoterapia ou regimes de alarme. Isso ainda deve ser estudado rigorosamente e sua ampla utilização ainda é considerada experimental.[32]
Houve recomendações históricas para acordar ou levar a criança ao banheiro à noite para urinar, a fim de antecipar-se à enurese; no entanto, essa prática tem pouca eficácia na resolução da enurese subjacente. Isso pode resolver temporariamente o problema e manter a cama seca até que a criança se livre da enurese espontaneamente.
Avaliação e tratamento de outras afecções
Muitas dessas crianças também terão constipação e, apenas com a remissão desta, até 60% das crianças terão uma melhora na enurese.[33] Quaisquer sinais ou sintomas de obstrução das vias aéreas superiores devem ser avaliados e, se apropriado, o paciente deve ser encaminhado para o departamento de otorrinolaringologia ou para um especialista em distúrbios respiratórios do sono.
Tratamentos
O tratamento inicial (depois que as medidas educacionais, comportamentais e de modificação do estilo de vida foram empregadas) é a terapia de alarme. Um alarme de enurese é um dispositivo que produz um som alto ou vibra assim que um sensor de umidade detecta uma pequena quantidade de urina. Isso acorda a criança para que seja levada ao banheiro para urinar. Esse tratamento é o mais estudado, dentre todas as opções, para a enurese noturna, e a literatura mostra um aumento significativo da capacidade vesical nesses pacientes após o tratamento com alarme.[11]
Os dados para o sucesso da terapia com alarme são fortes, com várias metanálises geralmente concluindo que a terapia com alarme pode ser mais efetiva que a ausência de tratamento na redução da enurese em crianças, e provavelmente tem um risco menor de eventos adversos do que a desmopressina.[34]
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Os sinais de sucesso no tratamento com a terapia de alarme podem demorar a aparecer, especialmente em comparação com a desmopressina.[35] É vital que as famílias sejam informadas já no início de que a terapia de alarme precisa ser contínua por até 12 semanas antes da reavaliação. A frustração decorrente da falta de sucesso imediato pode ocasionar a desistência de alta porcentagem de pacientes, o que dificulta a análise da literatura sobre a terapia de alarme.[35] O outro inconveniente da terapia de alarme é que ela é socialmente incômoda, especialmente durante os eventos noturnos; nesse caso, o tratamento com desmopressina pode ser usado como adjuvante.
Pacientes com dificuldade de acordar podem não perceber o alarme; desse modo, um dos pais precisará vir e acordá-los para levá-los ao banheiro. Se a criança não acordar para urinar sempre que o alarme soar, ela provavelmente não terá melhora com a terapia de alarme. A terapia de alarme é superior a todas as outras terapias, pois cerca de metade das crianças terá uma resposta durável após a conclusão da terapia.[34] Todas as outras terapias têm taxas de recidiva muito mais altas.
Se a terapia de alarme não melhorar o número de noites com enurese noturna, a desmopressina pode ser experimentada antes de instituir a terapia combinada, embora os pacientes com capacidade vesical reduzida tendam a não responder bem à desmopressina.[36][37]
Desmopressina é o tratamento de primeira escolha após a falha das medidas educacionais, comportamentais e de modificação do estilo de vida e da terapia de alarme. A desmopressina é um análogo da arginina-vasopressina (AVP) (também conhecida como hormônio antidiurético [HAD]) e atua sobre os receptores V2 nos dutos coletores e túbulos distais para reabsorver água livre. A diurese noturna em pacientes enuréticos pode estar relacionada a anormalidades na elevação noturna de AVP. A evidência do tratamento com desmopressina é bastante boa, mas é obscurecida por variações nas definições para a cura e resposta na literatura.[38][39] A desmopressina não é uma panaceia e, nos pacientes com ausência de resposta, é melhor tentar outras vias de terapia para obter uma cura duradoura. A desmopressina intranasal não é mais recomendada em alguns países (incluindo os EUA) em virtude de relatos, pós-comercialização, de convulsões relacionadas à hiponatremia.
Se o tratamento com desmopressina falhar apesar da duplicação da dose, o ciclo de ação recomendado é usar a terapia de alarme em combinação com a desmopressina. Os fatores preditores de uma boa resposta à desmopressina são pacientes com concentração de urina reduzida, capacidade vesical normal, episódios únicos de enurese noturna e resposta prévia a uma pequena dose de desmopressina.[36][40]
Para crianças que mostraram resposta ao tratamento com desmopressina (nas primeiras 8 a 12 semanas de tratamento), mas que só estão preocupadas com o potencial de os sintomas noturnos ocorrerem quando não estão em casa (por exemplo, ao dormir na casa de um amigo), a desmopressina pode ser utilizada de forma intermitente por curtos períodos, em que a necessidade de ficar seca à noite é considerada mais importante para a criança.
Em crianças que não respondem à terapia de alarme, à desmopressina ou à terapia combinada, é adequado investigar a possibilidade de bexiga hiperativa noturna. Medicamentos que relaxam o músculo detrusor, como a oxibutinina ou tolterodina, são instituídos empiricamente. Eles não devem ser usados sozinhos, mas como terapia adjuvante. A tolterodina ainda não está aprovada para crianças em alguns países, mas mostrou-se eficaz e tem pouco ou nenhum efeito adverso.[41] A desmopressina associada à oxibutinina foi usada em conjunto em algumas crianças com sucesso quando a oxibutinina isolada não funcionou.
A imipramina é a farmacoterapia mais antiga para a enurese noturna. No entanto, dado o seu perfil de efeitos adversos e o desenvolvimento de uma farmacoterapia melhor, ela não é recomendada, exceto em casos específicos. É também usada para o tratamento de transtorno de deficit da atenção com hiperatividade (TDAH). Em pacientes refratários às terapias convencionais e com TDAH concomitante, a imipramina pode ser prescrita. As principais preocupações são a probabilidade de suicídio e a cardiotoxicidade. Em virtude desse perfil de efeitos adversos e da eficácia limitada, ela deve ser administrada com a ajuda de especialistas em psiquiatria mais experientes com seu uso. O mecanismo de ação não é claro, mas postulou-se estar relacionado à redução da atividade do músculo detrusor e ao aumento da capacidade vesical, em decorrência de atividade anticolinérgica e simpatomimética. Embora seja prescrita em doses menores para enurese que para condições psiquiátricas, ela ainda representa um risco para o paciente e os membros da família, que podem tomá-la acidentalmente.[42][43][44]
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Um ensaio clínico randomizado e controlado por placebo estudou a eficácia em curto prazo de uma pequena dose de fluoxetina para tratar crianças de 8 a 18 anos sem outros sintomas urinários, constipação ou diagnóstico neuropsiquiátrico.[45] Descobriu-se que o grupo tratado com fluoxetina teve menos noites de cama molhada quando comparado com o grupo do placebo nas marcas de 4, 8 e 12 semanas de tratamento. No entanto, a eficácia diminuiu após a marca de 4 semanas e o estudo foi limitado a 12 semanas. Esses dados intrigantes apoiam o uso da fluoxetina no tratamento da enurese noturna monossintomática primária. Estudos adicionais podem ser necessários para investigar os efeitos a longo prazo da fluoxetina, se o aumento da dosagem da fluoxetina altera o desfecho e se a fluoxetina seria benéfica em pacientes com um diagnóstico neuropsiquiátrico. Também valeria a pena ver uma análise multivariada que investigasse se há uma mudança nos padrões de evacuação nos pacientes em uso de fluoxetina, pois ela tem um efeito colateral de diarreia. A fluoxetina vem com um aviso de probabilidade de suicídio em crianças, o que deve ser considerado ao se realizarem tentativas com este medicamento.
Recorrência
Com cada abordagem de tratamento, a recorrência é comum, mas a resolução espontânea ocorre a uma taxa de 5% a 10% ao ano.[1] O manejo da recidiva é restabelecer o tratamento. Somente o tratamento com alarme demonstrou efeitos duráveis significativamente maiores que o histórico de taxa de remissão de 15% ao ano após a interrupção do tratamento.
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