Abordagem
O diagnóstico de hipoglicemia clinicamente significativa nos adultos é feito quando a concentração de glicose sérica for baixa (<3.3 mmol/L [60 mg/dL]) e sintomas simpatoadrenais ou neuroglicopênicos estiverem presentes. Isso é confirmado ao se estabelecer a tríade de Whipple, que consiste em sintomas hipoglicêmicos, acompanhados de baixa concentração de glicose sérica, e resolução dos sintomas após a elevação da concentração da glicose sérica para normal.[13][18] Níveis de glicose abaixo da variação normal indicam falha na regulação dos níveis de insulina, circulação excessiva de compostos semelhantes à insulina, falha nos mecanismos contrarregulatórios, falta de enzimas necessárias para a produção de glicose, falta de substrato necessário para a gliconeogênese ou alteração grave na função dos órgãos necessários para a produção de glicose, por exemplo, fígado e rins.
Quadro clínico
O paciente que apresenta hipoglicemia deve conseguir descrever:
Sintomas simpatoadrenais:
Sudorese
Ansiedade
Náuseas
Tremor
Fome
Parestesia generalizada
Palpitações.
Ou sintomas neuroglicopênicos:
Visão turva
Tontura
Confusão
Disartria
Sonolência
Convulsões
Deficit neurológico focal também é possível.
Pode não haver progressão dos sintomas simpatoadrenais para neuroglicopenia. A relação temporal entre o início dos sintomas e a dieta, o horário das refeições ou a administração de medicamentos deve ser questionada. O momento dos sintomas de hipoglicemia em relação à refeição ou sua ocorrência durante um estado de jejum pode oferecer dicas quanto à presença de certas doenças. Se os sintomas ocorrerem depois que o paciente tiver começado uma nova medicação ou ingerido conhecidamente um secretagogo de insulina, como uma sulfonilureia, a causa iatrogênica é fortemente suspeitada. Sintomas que ocorrem enquanto o paciente está em estado de jejum sugerem um insulinoma, hipersecreção de fator de crescimento semelhante à insulina (IGF)-II ou distúrbio do eixo hipotálamo-hipofisário ou seus órgãos-alvos. Sintomas que ocorrem logo após a refeição aumentam a possibilidade de hipertrofia de ilhotas ou nesidioblastose.
Hipoglicemia reativa tardia pode ocorrer até 3-5 horas após uma refeição em alguns pacientes com pré-diabetes ou com intolerância à glicose e durante a gestação.
Hipoglicemia na apresentação, teste inicial
Se o paciente estiver apresentando sintomas de hipoglicemia na apresentação, ou em qualquer momento da avaliação, a concentração de glicose sérica ou plasmática deve ser prontamente avaliada. As medições de glicose sérica e plasmática são equivalentes para fins práticos, mas os glicosímetros são imprecisos abaixo da variação normal; portanto, é necessária uma avaliação laboratorial.[37]
Se a glicemia estiver <2.8 mmol/L (<50 mg/dL), exames adicionais devem ser coletados imediatamente, incluindo insulina sérica, peptídeo C, pró-insulina, etanol, beta-hidroxibutirato, exames de função hepática e renal e níveis de secretagogos de insulina (sulfonilureias). Em pacientes com baixa energia crônica, alterações de peso inexplicadas, hiperpigmentação ou outra suspeita de disfunção hipofisária ou endócrina, também deve-se considerar a avaliação dos níveis séricos de cortisol, hormônio do crescimento humano (HGH), hormônio estimulante da tireoide (TSH) e hormônio adrenocorticotrófico (ACTH).
Sem hipoglicemia na apresentação, jejum na internação
Na presença de sintomas hipoglicêmicos, mas com concentração de glicose sanguínea >2.8 mmol/L (>50 mg/dL), o paciente pode não apresentar hipoglicemia clinicamente significativa. Se os sintomas forem leves e inespecíficos, investigações adicionais devem ser adiadas até a confirmação da presença de hipoglicemia por leituras adicionais da glicemia, ou se os sintomas forem típicos ou graves, o paciente pode ser internado para um jejum de 48 a 72 horas.
É discutível se o jejum de 48 horas sob observação é adequado para se obter o diagnóstico; observou-se que o jejum total de 72 horas sob observação identifica indivíduos com insulinoma não identificados no jejum de 48 horas.[38] Durante o jejum, o paciente pode tomar bebidas não calóricas e sem cafeína e é incentivado a permanecer ativo. O nível glicêmico é verificado a cada 6 horas. Quando a concentração glicêmica medida por glicemia capilar for <3.3 mmol/L (<60 mg/dL), os níveis glicêmicos devem ser verificados a cada hora, juntamente com os níveis séricos de pró-insulina, peptídeo C e insulina. O exame termina com qualquer uma das seguintes ocorrências: início de sintomas simpatoadrenais ou neuroglicopênicos, níveis glicêmicos <2.8 mmol/L (<50 mg/dL) ou conclusão das 72 horas de jejum sob observação.
No caso de sintomas hipoglicêmicos acompanhados de concentração de glicose sanguínea <2.8 mmol/L (<50 mg/dL), os seguintes exames adicionais devem ser realizados: níveis séricos de sulfonilureia, beta-hidroxibutirato, cortisol, HGH e ACTH. Em seguida, o paciente recebe 1 mg de glucagon por via intramuscular. O nível de glicose é verificado após 30 minutos, e o paciente pode então comer.[39]
O teste oral de tolerância à glicose deve ser realizado para excluir diabetes mellitus, uma vez que hipoglicemia reativa tardia ocorrendo até 3-5 horas após uma refeição pode ocorrer em alguns pacientes com pré-diabetes ou com intolerância à glicose e durante a gestação.
Sem hipoglicemia na apresentação, teste de supressão de insulina
Opcionalmente, um teste de supressão de insulina pode ser realizado. Insulina a 0.4 a 0.6 unidade/kg é administrada por via intravenosa após o jejum noturno. A glicemia é avaliada por glicemia capilar a cada 5 minutos. A concentração de glicose sanguínea deve cair para <3.3 mmol/L (<60 mg/dL) em 15 a 25 minutos. Nesse momento e em outros 3 intervalos adicionais de 5 minutos, o sangue é colhido para se medirem os níveis de glicemia, peptídeo C, cortisol e HGH séricos. O paciente recebe 50 mL de dextrose a 50% por via intravenosa para ajudar na recuperação ao final do teste.
Exames adicionais para peptídeo C elevado
Elevação inadequada de peptídeo C, pró-insulina e insulina sugere insulinoma ou uso de sulfonilureia.[34]
Esses resultados devem levar ao teste sérico da sulfonilureia, e, se for negativo, exames de imagem para detectar um insulinoma.
Os exames de imagem começam com uma tomografia computadorizada (TC) do abdome e da pelve, com ou sem contraste intravenoso. Se ela não detectar o insulinoma suspeitado, uma ultrassonografia transabdominal é realizada, e, se também não conseguir localizar o insulinoma, uma ultrassonografia endoscópica pode ser realizada. A cintilografia nuclear com octreotida pode ser usada se o insulinoma suspeitado ainda não tiver sido localizado.[40]
Exames adicionais para peptídeo C reduzido
Um beta-hidroxibutirato baixo e um aumento rápido acima de 1.4 mmol/L (25 mg/dL) na glicose sérica em 30 minutos após a administração de glucagon sugere a presença de insulina exógena excessiva ou IGF-II.
Níveis baixos de peptídeo C, pró-insulina e insulina sugerem excesso de IGF-II, que devem levar os exames de imagem a detectar tumor mesenquimal. Características após 72 horas de jejum sob observação: nível baixo de insulina, beta-hidroxibutirato baixo, aumento >1.4 mmol/L (>25 mg/dL) na glicose em resposta aos glucagons e níveis elevados de IGF-II sérico.
Os exames de imagem começam com uma TC do abdome e da pelve, com ou sem contraste intravenoso. Como os tumores são geralmente grandes quando provocam hipoglicemia clinicamente significativa, eles também podem ser detectáveis ao exame físico.
Os níveis de insulina são altos, mas os níveis de pró-insulina e peptídeo C são baixos em caso de injeção furtiva de insulina.
Os anticorpos séricos para insulina confirmam a injeção furtiva de insulina como causa da hipoglicemia.
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