Abordagem
O diagnóstico é desafiador, pois a doença raramente é observada na prática clínica. Uma avaliação cuidadosa dos sinais e sintomas físicos, com história familiar, são úteis, mas análises laboratoriais e genéticas são essenciais para o diagnóstico definitivo.
Anamnese e exame físico
Os pacientes normalmente são encaminhados a um pediatra depois da consulta com o médico de atenção primária, pois os sinais e sintomas iniciais muitas vezes se apresentam nos primeiros meses de vida. Os pais são fenotipicamente normais. O diagnóstico ainda pode ser desconhecido em outros familiares porque a perda heterozigota de proteína microssomal de transferência de triglicerídeos (MTTP) é tolerada com função suficiente do alelo de tipo selvagem.
Os pais frequentemente notarão fezes com odor desagradável, além de história de vômitos ou distensão abdominal. A avaliação regular da consistência, odor e frequência das fezes do paciente é essencial para o diagnóstico. Deve surgir a suspeita do diagnóstico se a criança apresentar deficit no crescimento ou retardo no desenvolvimento de acordo com as tabelas de crescimento padrão (estatura, peso e perímetro cefálico).[1][2]
Se a doença não for detectada e o paciente for mais idoso, os sintomas mais preocupantes e progressivos poderão ter evoluído, o que reflete a deficiência de nutrientes, vitaminas lipossolúveis e ácidos graxos livres.[2] As manifestações neurológicas se devem à deficiência de vitaminas A e E e incluem neuropatia periférica, distúrbios de movimento e oculares, como oftalmoplegia e retinite pigmentosa.[1][2][5] Os sistemas nervosos central e periférico são afetados, pelo que os pacientes apresentam achados do neurônio motor superior ou inferior.[6] Os pacientes podem apresentar disfunção cerebelar (por exemplo, ataxia, disartria, dismetria), bem como comprometimento da função da coluna posterior, com perda de propriocepção e reflexos tendinosos profundos.[2][21] O paciente ou os familiares poderão observar deficiências visuais, cegueira noturna, ataxia, dismetria, contrações musculares, disartria e fraqueza muscular.[2][19] Tem sido relatada retinopatia pigmentar atípica com edema bilateral do disco óptico.[22] Problemas neuromusculares sintomáticos são observados em aproximadamente um terço dos pacientes não tratados até os 10 anos de idade; geralmente, mais tarde se desenvolve ataxia. Além disso, se tiver ocorrido anemia secundária à desnutrição, os pacientes poderão se queixar de fadiga e aparentar palidez.
Pode haver hepatomegalia decorrente de esteatose hepática.[2]
O diagnóstico definitivo provavelmente será obtido no ambiente de subespecialidade, em virtude da crescente conscientização sobre a doença e da familiaridade com os testes necessários. Recomenda-se o encaminhamento a um oftalmologista, um neurologista e um gastroenterologista. O oftalmologista poderá encontrar sinais de inflamação retiniana no exame físico.[23]
Avaliação laboratorial
A investigação inicial tipicamente inclui a obtenção de amostras fecais, esfregaço de sangue e perfil lipídico em jejum; no entanto, nenhum desses testes é confirmatório. Em virtude da raridade dessa doença, muitas vezes não se faz inicialmente um teste genético, mas o mesmo é necessário para o diagnóstico.
Os testes para ajudar/confirmar o diagnóstico incluem o seguinte.
O perfil lipídico em jejum mostra níveis muito baixos ou ausentes de triglicerídeos plasmáticos, colesterol total, lipoproteínas de muito baixa densidade, lipoproteína de baixa densidade e a ausência de apolipoproteína B (apo B).[1]
Também devem ser investigados inicialmente os níveis de vitamina A, E e K, uma vez que níveis baixos confirmarão o diagnóstico. (A vitamina D é ativada na pele pelos raios ultravioleta a partir de metabólitos produzidos endogenamente, mas os níveis ainda podem estar abaixo do normal). Normalmente, os níveis de vitamina E são indetectáveis.
O esfregaço de sangue mostra anemia e acantócitos (eritrócitos com aparência estrelada).[2][24]
Além disso, a amostra fecal mostra um nível elevado de gordura.
A transaminase hepática pode estar elevada.[2]
Os testes de coagulação podem mostrar tempo de tromboplastina parcial elevado e o perfil de ferro pode apresentar baixo nível de ferro.
A biópsia intestinal é desnecessária para o diagnóstico; entretanto, ela pode ser realizada no processo de identificar esse raro diagnóstico. Os resultados podem mostrar a aparência característica de extremidades das vilosidades com aparência de renda e gotículas lipídicas nos enterócitos.
O teste diagnóstico definitivo é a avaliação da MTTP e exige um laboratório especializado em distúrbios lipídicos ou genéticos.
Testes genéticos para mutações, deleções ou inserções no gene MTTP associadas à abetalipoproteinemia confirmam o diagnóstico em sujeitos com suspeita de acometimento.[7][10] O gene da apolipoproteína B (apo B) deve também ser rastreado, pois a hipobetalipoproteinemia homozigótica familiar pode produzir um fenótipo bioquímico e clínico semelhante ao da abetalipoproteinemia.[7]
Outros testes
Se a doença tiver evoluído, oftalmoscopia direta e indireta realizadas por um oftalmologista podem identificar degeneração retiniana.[23] Se o paciente começar a mostrar sinais de danos neurológicos, como ataxia ou tremor de intenção, o neurologista pode realizar estudos eletrodiagnósticos.[2] Os potenciais evocados podem apresentar velocidade de condução somatossensitiva anormal. A velocidades de condução pode ser reduzida com a diminuição da amplitude dos potenciais sensoriais. Podem aparecer evidências de desmielinização dos nervos periféricos na eletromiografia.[6]
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