Abordagem

Os objetivos do tratamento para pacientes com MSCC são prevenir a deterioração clínica, aliviar a dor e outros sintomas e manter ou restaurar a capacidade funcional. O tratamento envolve corticosteroides inicialmente, seguidos por radioterapia com ou sem cirurgia.[19][54] Uma abordagem multidisciplinar, que envolve oncologia clínica, oncologia radiológica e neurocirurgia, é importante para otimizar o tratamento e os desfechos do paciente.[40][55]

O tratamento da MSCC pode não ser justificado em algumas circunstâncias (por exemplo, em pacientes com paralisia com mais de 1 semana de duração, baixa capacidade funcional basal, e expectativa de vida curta [dias ou semanas] em decorrência de doença subjacente).[7] Qualquer decisão de não tratar deve ser tomada em conjunto com o paciente.[7]

Posicionamento e órteses

Órteses externas com órteses espinhais podem ser consideradas como opção de tratamento conservador para fratura por compressão vertebral patológica e dor relacionada à metástase vertebral. As órteses oferecem suporte e podem ajudar os pacientes na adesão às precauções (ou seja, não dobrar, não erguer, não torcer).[56][57] A literatura para orientar o uso de órteses no manejo de fraturas por compressão patológicas é limitada; no entanto, um relatório do International Spine Oncology Consortium defende a órtese externa como opção de tratamento sugerida para pacientes com metástase vertebral.[58]

Corticosteroides

Os corticosteroides devem ser iniciados o mais rapidamente possível para os indivíduos com sintomas neurológicos ou sinais de MSCC, de preferência em até 12 horas após o início dos sintomas, com o objetivo de melhorar ou, pelo menos, estabilizar o deficit neurológico antes do tratamento definitivo.[40]​ Os corticosteroides proporcionam alívio da dor, reduzem os edemas associados a tumores e podem ser oncolíticos para alguns tumores.[19][54]​ Há um consenso de que o tratamento com corticosteroides associado à radioterapia é mais efetivo que a radioterapia isoladamente.[59]

Os corticosteroides são contraindicados se houver confirmação ou suspeita significativa de linfoma.

Não há evidências sobre o tipo de corticosteroide preferível ou sobre a dosagem ideal ou a duração do tratamento.[59][60][61] As diretrizes da National Comprehensive Cancer Network dos EUA e as diretrizes do National Institute for Health and Care Excellence do Reino Unido recomendam dexametasona.[40]​​[54] Orientações canadenses de 2012 também recomendam dexametasona, mas alertam sobre o uso de doses de ataque altas de corticosteroides, pois há risco de efeitos adversos graves.[62]

Após iniciar o tratamento com radioterapia ou cirurgia, os corticosteroides devem ser reduzidos gradualmente por vários dias e interrompidos, pois os benefícios de longo prazo são limitados e há risco de efeitos adversos graves. Os corticosteroides também devem ser reduzidos gradualmente, com o objetivo de interromper completamente o tratamento em pacientes não submetidos a cirurgia ou radioterapia.[7][19][40][59]

Escolha do tratamento

O tratamento compreende radioterapia com ou sem cirurgia. Muitos fatores devem ser levados em consideração ao decidir o tratamento definitivo. Isso inclui o quadro neurológico do paciente, o grau de compressão da medula espinhal, a expectativa de vida, a extensão da doença metastática, a estabilidade da coluna, a radiossensibilidade do tumor e as preferências do paciente.[7][54][60][63] Os cuidados paliativos podem ser a opção preferida em alguns casos.

O Spinal Instability Neoplastic Score (SINS) pode ser usado para analisar se a avaliação cirúrgica é necessária.[20][33][36][37][38][40]​ O Spine Oncology Study Group recomenda realizar uma avaliação cirúrgica em todos os pacientes com escore SINS acima de 7.[36]

A estrutura NOMS (doença neurológica, oncológica, estabilidade mecânica e sistêmica) ilustra a necessidade de uma abordagem multidisciplinar para tratar o comprometimento da coluna vertebral. Os elementos neurológicos e oncológicos determinam as indicações cirúrgicas e a abordagem para a radioterapia. A instabilidade vertebral mecânica isolada é indicação para intervenção cirúrgica, se o paciente a tolerar. O componente sistêmico considera a extensão da doença sistêmica e seu impacto no desfecho do tratamento e na tolerância.[29]

Outros sistemas de classificação que auxiliam na tomada de decisão são os escores de Tokuhashi e Tomita. O escore de Tokuhashi baseia-se em seis parâmetros de prognóstico para pacientes com metástase: quadro clínico geral, número de metástases extraespinhais, número de metástases vertebrais, presença de metástases viscerais, tipo de tumor primário e deficit neurológico.[40][64] O escore de Tomita usa três fatores prognósticos - o grau de malignidade, metástases viscerais e metástases ósseas - para a tomada de decisão sobre o tratamento.[65]

As indicações para radioterapia isolada incluem:

  • Tumores sensíveis à radioterapia (Carcinoma pulmonar de células pequenas e mieloma)

  • Ausência de instabilidade vertebral

  • Declínio neurológico rapidamente progressivo com expectativa de vida limitada

  • A presença de comorbidades clínicas significativas.

As indicações para radioterapia associada a cirurgia incluem:

  • Pacientes com expectativa de vida acima de 6 meses, com parte da função neurológica útil preservada (avaliação manual de força muscular do MRC grau 3 e acima) e apto a receber anestesia geral

  • Diagnóstico tecidual necessário

  • Instabilidade vertebral

  • Locais limitados de comprometimento vertebral

  • Tumores resistentes à radioterapia.

Radioterapia

A radioterapia por si só está associada a número menor de complicações que a cirurgia, mas pode não ser tão eficaz. Pode ser administrada:

  • Como tratamento paliativo para pacientes com prognóstico desfavorável

  • De maneira urgente como tratamento de primeira linha para evitar a deterioração neurológica adicional

  • Após a cirurgia, com o objetivo de reduzir a recorrência local.

Radioterapia paliativa para alívio da dor

O tratamento paliativo com radioterapia para o alívio da dor é adequado para pacientes com prognóstico desfavorável (por exemplo, com expectativa de vida inferior a 6 meses, pouca capacidade funcional e paraplegia estabelecida por mais de 24 horas). Uma dose única de 8 Gy em uma fração é comum.[7][19][33][66]

Radioterapia para melhorar a função

Vários esquemas diferentes foram usados com o objetivo de melhorar a função motora, o estado da marcha e a sobrevida. Exemplos típicos incluem 20 Gy em cinco frações, ou 30 a 40 Gy em 10 frações. Cronogramas de ciclos mais longos podem estar associados a menos recorrências em campo.[7][33][54][67][68]

Uma revisão Cochrane de 2015 concluiu que os benefícios de uma dose de radiação (8 Gy), duas doses (16 Gy) e outo doses (30 Gy) provavelmente foram similares para adultos deambulantes com MSCC que apresentam espinha estável e sobrevida predita de menos de 6 meses. No entanto, não ficou claro no estudo se uma dose é tão eficaz quando duas ou mais doses para prevenir a recorrência de tumor local.[60] Uma metanálise não relatou evidências de diferenças na resposta motora, disfunção vesical ou sobrevida global entre a radioterapia de fração única e de fração múltipla para pacientes com MSCC e prognóstico limitado.[69]

Um ensaio clínico randomizado e controlado (ECRC) relatou que uma fração única de 10 Gy não foi inferior a 20 Gy em cinco frações para preservar a mobilidade em 5 semanas em pacientes com MSCC que não passaram por descompressão cirúrgica.[70] Em outro ECRC, uma dose única de 8 Gy não atendeu aos critérios de não inferioridade para o desfecho primário (deambulante em 8 semanas), em comparação com 20 Gy de radioterapia em 5 frações, em pacientes com MSCC com expectativa de vida estimada em mais de 8 semanas, mas que não podem ser submetidos a cirurgia. Os autores observaram que a importância clínica desse achado não estava clara.[71]

Os potenciais benefícios da radioterapia de fração única incluem menor carga do tratamento para pacientes com expectativa de vida limitada e melhor adesão ao tratamento. Os esquemas padrão de radioterapia podem alterar o suprimento de sangue aos ossos, causando necrose avascular, que pode afetar as atividades da vida diária.[66]

Radiocirurgia estereotáxica

A radiocirurgia estereotáxica é a administração usando a orientação de imagens para uma ou mais doses altas de radiação para uma área definida, contornada na forma do tumor. Há evidências de superioridade da radiocirurgia estereotáxica em relação à radioterapia convencional para metástases vertebrais, mas poucas evidências de superioridade para tratar a compressão da medula aguda.[33][55][68]​​​​[72][73]

Radioisótopos

Radioisótopos com afinidade para ossos, como estrôncio-89, fósforo-32, RAD001 ou antígeno de membrana específico da próstata marcado com lutécio-177 (Lu177-PSMA), representam uma opção para o tratamento de pacientes com metástases ósseas, principalmente para a dor.[74] Esses emissores de beta tumoricidas são administrados por via intravenosa.

Cirurgia

Há várias abordagens para a cirurgia de descompressão, mas as evidências são limitadas em relação a qual delas é a mais eficaz.[46][54][75][76] A abordagem ideal varia de acordo com fatores como o estado deambulante do paciente, o local da lesão, a presença de compressão óssea e instabilidade vertebral, comorbidades, fatores cirúrgicos técnicos e potenciais complicações.[77]

As técnicas cirúrgicas incluem:

  • Vertebrectomia: pode ser realizada por meio de abordagem posterolateral ou anterior. Esta técnica comprovou ser eficaz para melhorar a capacidade deambulante e aliviar a dorsalgia.[19][62]

  • Laminectomia descompressiva posterior: tradicionalmente usada para tratar MSCC, mas sua eficácia só foi demonstrada para compressão da medula espinhal posterior; além disso, pode causar instabilidade vertebral se usada para lesões em outros locais.[19][33] Assim, a laminectomia com estabilização é recomendada.[78]

  • Cirurgia de separação. A coluna é estabilizada e uma parte do tumor é removido para criar uma margem em torno da medula espinhal, com o objetivo de reduzir os potenciais danos da radioterapia subsequente.[33][79]

  • Métodos de estabilização percutânea. São usados para o manejo de fratura por compressão vertebral patológica causada por doença metastática, com o objetivo de reduzir a dor e a incapacidade funcional. As técnicas incluem vertebroplastia e cifoplastia. Podem ser usadas em conjunto com outros tratamentos, como radioterapia e radiocirurgia.[80]

As potenciais complicações da cirurgia incluem infecção, instabilidade vertebral, hemorragia, lesão na raiz/medula, complicações respiratórias e interferência na cicatrização da ferida. Na cifoplastia, pode haver vazamento dos materiais de preenchimento. O risco de diferentes complicações varia dependendo da abordagem cirúrgica.[81][82]

Cuidados de suporte

Várias terapias de suporte podem ser adequadas, dependendo das circunstâncias do paciente.[19][40]

Prevenção do tromboembolismo venoso

Profilaxia deve ser administrada a todos os pacientes para evitar tromboembolismo venoso e possível embolia pulmonar.

A profilaxia farmacológica deve ser usada a menos que seja contraindicada; medidas não farmacológicas (por exemplo, meias de compressão graduada, dispositivos de compressão pneumática intermitente) podem ser usadas para os pacientes com alto risco de sangramento.[83]

Consulte Profilaxia do tromboembolismo venoso.

Manutenção do volume e da pressão arterial

O tratamento da disfunção autonômica e a prevenção da hipotensão resultante podem ser necessários, particularmente em pacientes com envolvimento cervical, pois isso pode contribuir para comprometimentos neurológicos adicionais. Com base na literatura sobre lesão na medula espinhal traumática aguda, a pressão arterial média (PAM) deve ser mantida acima de 85-90 mmHg.[84]

Em casos agudos, o tratamento consiste em inserção de cateter central, com ressuscitação volêmica e/ou vasopressores. A ortostasia também pode afetar pacientes após os primeiros 7 dias após a compressão da medula. O manejo inclui garantir a hidratação adequada, usar meias de compressão e cintas abdominais e tratamentos farmacológicos.

Prevenção de úlceras gástricas de estresse fisiológico

A prevenção de úlceras de estresse fisiológico com um inibidor da bomba de prótons ou antagonista H2 é indicada por pelo menos 4 semanas após a cirurgia da medula espinhal.[85]

Manejo vesical e intestinal

As funções vesical e intestinal devem ser avaliadas e monitoradas. O manejo deve levar em consideração se o padrão é indicativo de danos ao neurônio motor inferior ou superior.

Caso seja necessário o cateterismo da bexiga, um cateter intermitente é preferível, pois está associado a taxas mais baixas de infecção do trato urinário e trauma uretral. Um cateter de demora pode ser usado se o cateterismo intermitente não for viável.[86][87]

Um programa intestinal (para ajudar a prevenir movimentos intestinais involuntários, constipação e impactação do intestino), laxantes e/ou evacuação intestinal podem ser necessários.[88]

Outras terapias de suporte

Deve-se realizar a avaliação de risco para úlcera por pressão. As abordagens preventivas incluem a rotação manual ou automática regular de pacientes em repouso no leito, incentivando os pacientes que não estejam em repouso no leito a se movimentarem regularmente (a cada poucas horas) e o uso de dispositivos para aliviar a pressão. Consulte Úlceras por pressão.

O suporte nutricional deve incluir alimentos isotônicos e avaliação de disfagia.

Pode ser necessária ventilação mecanicamente assistida ou tosse manualmente assistida.

Reabilitação

Os esforços de reabilitação estão concentrados em tratar os sintomas e as deficiências físicas. Esses esforços devem ser voltados para o paciente, com os objetivos de maximizar a função e prevenir complicações futuras.[7][19][40]​ As intervenções podem incluir fisioterapia e terapia ocupacional, prescrições de equipamentos médicos duráveis, inclusive órteses, recomendações relativas ao controle da dor e recomendações sobre tratamentos intestinais e vesicais.

Uma grande proporção de pacientes com MSCC recebe alta após o tratamento.[89] Os pacientes com tumores na medula espinhal que participaram de programas de reabilitação apresentaram melhoras na função, humor, qualidade de vida e sobrevida em um estudo, mas os autores observaram que o acesso a esses programas pode ser limitado.[21]

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