Abordagem
Geralmente, suspeita-se de choque primeiro pela pressão arterial baixa ou decrescente e deterioração aguda em outros sinais vitais, como aumento da frequência cardíaca, aumento da frequência respiratória, diminuição das saturações de oxigênio, redução do nível de consciência ou diminuição do débito urinário.
O choque também pode ser previsto em relação a um diagnóstico estabelecido, na maioria das vezes de infarto agudo do miocárdio, infecção grave ou hemorragia grave. Um paciente em choque deve ser tratado em um ambiente de cuidados intensivos sempre que possível.
Como reconhecer um paciente em choque
Os pacientes com choque aparentam mal-estar. Eles geralmente descrevem sintomas específicos da etiologia subjacente (por exemplo, dor torácica, dispneia ou dor abdominal). A cognição alterada é o sinal mais sensível e universal da hipoperfusão. Agitação e sofrimento caracterizam os estágios iniciais e mais leves, enquanto a falta de resposta indica um choque mais grave e avançado.[3]
Sinais clínicos do choque
A hipoperfusão sustentada induz à disfunção variável dos órgãos, com sinais dependendo do grau de hipoperfusão, duração do episódio e habilidade do paciente de compensar.
Os sinais mais comuns incluem:
Resposta ao estresse (taquicardia, taquipneia)
Centralização do sangue através da vasoconstrição periférica (membros frios, pele mosqueada ou pálida, enchimento capilar lento)[1][2][3]
A hipotensão é geralmente definida como uma pressão arterial sistólica do adulto <90 mmHg, ou uma pressão arterial média <65 mmHg no choque séptico (sepse com hipotensão).[2][25] Uma pressão arterial diastólica baixa sugere vasodilatação arterial (como na anafilaxia ou sepse).[26] A medição direta por meio de dispositivos com manguitos automáticos ou um acesso arterial é preferencial à esfigmomanometria de rotina, porque a medição direta da pressão arterial é mais precisa e permite o monitoramento contínuo. Se um acesso arterial for usado, isso fornece acesso para amostragem de sangue arterial.[1] No entanto, a pressão arterial é uma medida indireta da perfusão. Uma leitura normal da pressão arterial não descarta o choque.[1] A hipoperfusão pode estar presente em pressões arteriais maiores. A hipoperfusão sustentada ou grave leva consistentemente a uma hipotensão arterial.
A pressão de pulso estreitada (a diferença entre as pressões sistólica e diastólica; normalmente 35-45 mmHg) sugere vasoconstrição arterial (como ocorre no choque cardiogênico ou hipovolemia) e pode ocorrer com taquiarritmias rápidas.[26] No entanto, a pressão de pulso é uma função tanto do débito cardíaco quanto da função arterial. Como o débito cardíaco é afetado pela fase da respiração, a pressão de pulso deve ser medido todas as vezes no mesmo ponto no ciclo respiratório para permitir a comparação.
A hipotensão em conjunto com sinais de hipoperfusão é um diagnóstico de choque, e deve-se encaminhar para um tratamento apropriado. Por outro lado, a hipotensão sozinha, sem disfunção dos órgãos, não requer intervenção imediata, embora revisão e monitoramento regulares sejam importantes.
Os parâmetros mais úteis incluem mudança na cognição e deterioração dos sinais vitais (frequência cardíaca, frequência respiratória, temperatura e saturações de oxigênio). O tempo de enchimento capilar pode ser tardio, indicando baixa perfusão da pele, mas isso não é um diagnóstico de choque, pois pode ser afetado pela idade e temperatura do ambiente.
Os valores da frequência cardíaca e da pressão arterial podem ser usados para calcular o Índice de Choque. O Índice de Choque demonstrou ser um método clinicamente útil à beira do leito para estimar o nível de choque e mortalidade em potenciais estados de choque hemorrágicos e relacionados à infecção. O Índice de Choque é determinado pela divisão da frequência cardíaca pela pressão arterial sistólica. A faixa normal é de 0.5 a 0.7; SI elevado >1.0 está associado à necessidade de manejo de cuidados intensivos e mortalidade potencial.[27]
Determinação da etiologia do choque: história
Embora todas as causas de choque requeiram diagnóstico e manejo imediato da etiologia subjacente, algumas requerem tratamento imediato e devem ser prontamente identificadas (por exemplo, hemorragia, pneumotórax hipertensivo, tamponamento cardíaco, arritmias e anafilaxia).
A história geralmente revela informações valiosas para restringir as possíveis causas, porém o tratamento é prioridade em pacientes em choque. Particularmente, pergunte sobre doença cardíaca prévia, medicamentos (especialmente os que foram iniciados ou interrompidos recentemente), quaisquer alergias existentes e possíveis exposições a alérgenos, afecções existentes - como aneurisma da aorta abdominal, e quaisquer doenças ou hospitalização recentes (o que pode aumentar o risco de sepse ou embolia pulmonar).
Determinação da etiologia do choque: exame físico
A avaliação e o tratamento rápidos geralmente ocorrem ao mesmo tempo. Cognição, frequência do pulso, pressão arterial e frequência respiratória vão revelar se um paciente está melhorando ou deteriorando com o tratamento.
Os principais achados no exame físico são:
Choque obstrutivo: o pneumotórax hipertensivo é caracterizado por distensão da veia jugular, diferenças na excursão torácica, ressonância à percussão, menor frêmito vocal e ausência de murmúrios vesiculares na área do pneumotórax, bem como desvio da traqueia. Caso haja forte suspeita, deve-se realizar descompressão imediata inserindo-se uma cânula no segundo espaço intercostal na linha médio-clavicular (ou no quinto espaço intercostal da linha axilar anterior) no lado do pneumotórax e ouvir o ruído de escape de ar. Isso deve resultar em melhora nos sinais vitais. A distensão da veia jugular com bulha cardíaca hipofonética e bradicardia são características de tamponamento cardíaco. A embolia pulmonar grave geralmente está presente com o aumento da frequência respiratória (>20 respirações/minuto), hipóxia e taquicardia sinusal; pode ser difícil diferenciar clinicamente esses sintomas de outras causas de choque.
Descompressão por agulha de um pneumotórax hipertensivo – Vídeo de demonstraçãoComo descomprimir um pneumotórax hipertensivo. Demonstra a inserção de uma cânula intravenosa de grosso calibre no quarto espaço intercostal em um adulto.
Choque cardiogênico: infarto do miocárdio é a causa mais comum de choque cardiogênico, mas os sinais clínicos geralmente são inespecíficos.[4] A hipotensão (pressão arterial sistólica <90 mmHg) é a principal manifestação clínica do choque, mas não é suficiente para o diagnóstico.[4]
Pode-se ouvir um sopro novo ou alterado na ausculta cardíaca caso haja alguma anormalidade valvar presente. Geralmente, o edema pulmonar ocorre em casos graves com estertores na ausculta pulmonar e estase jugular; a pele costuma ficar mosqueada, mas pode estar úmida por conta da diaforese. Choque cardiogênico devido a insuficiência ventricular direita pode estar presente com hipotensão profunda como achado primário.
Choque vasogênico: o choque medular geralmente é indicado por uma paralisia inicialmente flácida abaixo do nível da lesão, com história compatível com trauma ou lesão espinhal. A bexiga pode ser palpável por causa da retenção urinária. A principal característica da anafilaxia pode ser o rápido edema da face e da língua, em que o controle das vias aéreas é uma consideração de urgência. São comuns rash eritematoso pruriginoso disseminado, sudorese e periferias quentes. Caso haja probabilidade de anafilaxia, adrenalina intramuscular é justificada. O choque séptico requer evidências de infecção e hipotensão, apesar de débito e enchimento cardíacos adequados. Os sinais podem incluir febre ou baixa temperatura corporal, extremidades quentes e sinais específicos do local da infecção. Uma erupção cutânea petequial é caracterizada por septicemia meningocócica, mas também pode ocorrer com outros micróbios.
Choque hipovolêmico: o sangramento pode ser óbvio (por exemplo, hematêmese, hematoquezia, melena) ou sugerido por sinais de trauma grave, incluindo fraturas em ossos longos. Pode haver abdome sensível com sangramento intra-abdominal (por exemplo, gravidez ectópica ou aneurisma roto da aorta abdominal). Queimaduras extensas podem ser indicativas de perdas consideráveis de líquidos. O choque séptico também apresenta qualificações de choque hipovolêmico.
Investigações urgentes
As investigações iniciais servem para diagnosticar choque, monitorar o efeito das intervenções e refinar as possíveis etiologias. Elas podem incluir:
ECG para procurar sinais de isquemia cardíaca (desvio do segmento ST, ondas Q anormais ou perda da onda R, ondas T negativas discordantes ou bloqueio de ramo) e arritmias potencialmente críticas, sobretudo taquicardia de complexo largo.[3][15][31]
Hemograma completo, bioquímica sérica, proteína C-reativa e lactato para obter evidências de sepse, lesão renal aguda e hipoperfusão tecidual; devem ser obtidas hemoculturas quando houver suspeita de sepse; níveis elevados de procalcitonina podem ajudar a diferenciar sepse de causas de síndrome da resposta inflamatória sistêmica.[1][2][3][32]
Ultrassonografia focada no abdome e no tórax para demonstrar ou descartar sangramento crítico (por exemplo, tamponamento, líquido livre na cavidade abdominal ou aneurisma aórtico), avaliar a função cardíaca e o aumento das cavidades cardíacas (sobretudo do ventrículo direito na embolia pulmonar maciça), avaliar pneumotórax e condensação pulmonar e também o diâmetro e o enchimento da veia cava inferior para determinar volemia vascular.
A gasometria arterial ou a gasometria venosa para avaliar o estado ácido-básico e a oxigenação são úteis em todas as causas de choque. O deficit de base pode ajudar a direcionar a ressuscitação fluídica[33] A gasometria venosa é cada vez mais usada, pois é menos invasiva e menos dolorosa que a gasometria arterial.[34]
Glicose sanguínea para evidências de hipoglicemia ou hiperglicemia, o que pode ser uma causa ou consequência de choque (por exemplo, cetoacidose diabética).[35]
Teste de gravidez urinário rápido para mulheres em idade fértil e ultrassonografia pélvica caso haja suspeita de gravidez ectópica rota.
A radiografia torácica pode oferecer pistas relacionadas à etiologia, como um mediastino alargado na ruptura aórtica, hemotórax ou sombra cardíaca globular sugerindo (mas não diagnosticando) tamponamento cardíaco. A pneumonia geralmente pode ser confirmada pela radiografia torácica, mas, em pneumonias precoces ou estados hipovolêmicos, há a possibilidade de que uma pneumonia existente não seja detectada com radiografia convencional.
Investigações adicionais
Testes adicionais podem ser usados para identificar a etiologia precisa e podem incluir (dependendo da etiologia provável):
Ultrassonografia ou tomografia computadorizada (TC)
A ultrassonografia pode ser realizada à beira do leito, enquanto o paciente deve ser estabilizado antes de tentar uma transferência para um aparelho para TC.
Ecocardiografia
Isso pode ser realizado à beira do leito
A ecocardiografia fornece avaliação hemodinâmica, incluindo débito cardíaco, volume sistólico, enchimento ventricular, pós-carga ventricular esquerda e outros parâmetros que ajudam a determinar a etiologia do estado de choque e auxiliam no manejo contínuo do paciente.[1]
Dióxido de carbono ao final da expiração (capnografia)
O fluxo lateral ou a capnografia direta (quando as vias aéreas endotraqueais estão em vigor) pode ser útil na avaliação da perfusão pulmonar compatível com a ventilação. No ambiente de cuidados intensivos, o dióxido de carbono expirado abaixo do esperado (ou decrescente) medido por capnografia está associado a uma combinação prejudicada de perfusão e ventilação pulmonar. Isso pode ajudar a determinar a presença de choque.[36]
Cateter venoso central
A linha venosa central pode ser útil, mas requer tempo, equipamentos e habilidades especiais, bem como um certo grau de estabilidade do paciente. A pressão arterial venosa central e as saturações de oxigênio venoso podem ajudar a diferenciar a etiologia do choque e a julgar a eficácia do tratamento.[37] Um ensaio clínico randomizado e controlado relatou que o uso de cateteres venosos centrais impregnados de antibiótico ou heparina reduziram infecções secundárias (iatrogênicas) na corrente sanguínea.[38]
Como colher uma amostra de sangue venoso da fossa antecubital usando uma agulha a vácuo.
Como registrar um ECG. Demonstra a colocação de eletrodos no tórax e nos membros.
Como obter uma amostra de sangue arterial da artéria radial.
Como realizar uma punção da artéria femoral para coletar uma amostra de sangue arterial.
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