Abordagem
A dor musculoesquelética na coluna lombar pode ser diagnosticada clinicamente com base na anamnese e no exame físico. É um diagnóstico de exclusão: portanto, o médico deve eliminar causas específicas de lombalgia de comprometimento neurológico, neoplasia, artrite inflamatória, fratura ou dor referida de outros locais ou sistemas de órgãos.
História
Os pacientes com lombalgia devem ser questionados em relação a episódios e tratamentos prévios, início, duração, localização, irradiação, características, fatores agravantes e atenuantes e gravidade da dor lombar. A dor musculoesquelética na coluna lombar pode ser incômoda, em facada, lacerante, ardente, elétrica e/ou associada a espasmos musculares. O histórico das terapias prévias deve ser obtido, incluindo fisioterapia, acupuntura, massagem, estimulação elétrica transcutânea de nervo, medicamentos, injeções, manipulação vertebral ou cirurgia.
A anamnese deve incluir perguntas específicas sobre sintomas radiculares de dor, parestesia, dormência e fraqueza nas pernas. Geralmente, a dor lombar musculoesquelética não irradia para as pernas. Se irradiar, não passa do joelho. Se a dor estiver localizada abaixo do joelho, ela não poderá ser atribuída apenas à dor lombar musculoesquelética, e o diferencial é ampliado para incluir patologias como radiculopatia, estenose da coluna vertebral, neuropatia periférica, claudicação vascular e patologia dos membros inferiores.[3]
A anamnese também deve ser direcionada para descartar sinais de alerta:[3][4]
Trauma significante recente ou trauma mais leve em idade >50 anos
Perda de peso inexplicada
Imunossupressão
História de câncer
Uso de drogas por via intravenosa
Infecção do trato urinário
Uso prolongado de corticosteroides
Osteoporose
Deficit neurológico focal com sintomas progressivos ou incapacitantes
Início agudo de retenção urinária ou incontinência por transbordamento
Incontinência fecal ou perda do tônus do esfíncter anal
Anestesia em sela
Fraqueza motora global ou progressiva dos membros inferiores
Duração da lombalgia >6 semanas, que não melhora com o tratamento conservador.
Caso haja sinal de alerta, são necessárias investigações adicionais e exames de imagem. A presença de um sinal de alerta indica lombalgia possivelmente associada a outra causa específica, incluindo síndrome da cauda equina, neoplasia, infecção, fratura vertebral, artrite inflamatória e relato de outro sistema de orgânico (por exemplo, pielonefrite) ou localização (isto é, disfunção sacroilíaca). A infecção da coluna vertebral é comum nas pessoas com condições associadas a imunossupressão. Os sintomas da infecção da coluna vertebral podem incluir febre e disfunção neurológica.[61]
Depois que o diagnóstico de dor lombar inespecífica for estabelecido, uma investigação mais profunda na história funcional, ocupacional, social e psiquiátrica deve ser obtida para abordar os fatores de risco, incluindo obesidade, riscos ocupacionais, tabagismo e estressores psicossociais. Comorbidades psiquiátricas, como depressão, ansiedade e somatização, aumentam o risco de evolução para dor crônica incapacitante.[62] Fatores de risco para desfechos mais desfavoráveis em 1 ano incluem comportamentos mal-adaptativos de enfrentamento da dor, sinais não orgânicos, comprometimento funcional, mau estado geral de saúde e presença de comorbidades psiquiátricas.[34]
As evidências disponíveis sugerem que o médico deve considerar consultar a psiquiatria em caso de suspeita de transtornos de humor e de ansiedade.[34][35]
Exame físico
Um exame musculoesquelético e neurológico focado deve ser realizado.
Exame musculoesquelético direcionado
A coluna deve ser examinada em busca de deformidade evidente (por exemplo, em fraturas) e curvatura anormal (escoliose, cifose, lordose), que podem causar dor em uma minoria dos casos. Isso deve levar o médico a solicitar radiografias para documentar a curvatura da linha basal e encaminhamento ortopédico para casos moderados a graves.
Os processos espinhosos e a musculatura devem ser palpados, sentindo bandas tensas, que causam dor somente no local do toque, e pontos desencadeadores (podem ter o aspecto de nó) que produzem dor irradiada em outro local. Esses achados sugerem dor miofascial.
Avalie a amplitude de movimento (ADM) ativa e passiva ao solicitar aos pacientes que fiquem em posição ortostática e instruí-los a ativamente flexionarem-se, estenderem-se e curvarem-se lateralmente o máximo que puderem. Dor à flexão que irradia para a perna sugere hérnia de disco com pinçamento em uma raiz nervosa; dor à extensão pode sugerir artropatia da faceta ou estenose da coluna vertebral. ADM altamente restrita em um paciente mais jovem pode sugerir espondilite anquilosante.
Todo paciente com dor lombar deve fazer um exame de quadril. A ADM passiva de cada quadril deve ser avaliada com o paciente deitado na posição supina. Deve haver normalmente 135° de flexão, extensão para 15° além da posição neutra e aproximadamente 45° de rotação interna e externa. Dor em qualquer desses movimentos sugere patologia do quadril, e uma radiografia do quadril deve ser realizada.
Podem ser realizados exames adicionais, dependendo do diagnóstico diferencial que esteja sendo considerado.
Teste de Schober
Realizado em caso de suspeita de espondiloartrite anquilosante. O ponto médio da espinha ilíaca póstero-superior é localizado, e um ponto 10 cm acima e outro ponto 5 cm abaixo são marcados com uma caneta. O paciente é instruído a curvar-se o máximo para frente, e a distância entre os 2 pontos marcados é medida. O teste é positivo quando a distância entre os 2 pontos é <20 cm. Teste de Schober positivo em combinação com achados positivos no exame sacroilíaco (SI), idade <40 anos ou história familiar positiva requerem encaminhamento a um reumatologista.
Teste de FABER (flexão, adução e rotação externa do quadril)
Avalia a patologia do quadril e sacroilíaca, dependendo se a dor está localizada na articulação do quadril ou sacroilíaca. É realizado pedindo ao paciente que fique em posição supina deitada e, então, fazendo flexão, abdução e rotação externa das articulações do quadril.
Teste de Gaenslen
Avalia a patologia da articulação sacroilíaca. é realizado com pacientes na posição supina deitados na beira da mesa de exame e pedindo a eles que flexionem um quadril ("leve o joelho até o peito") enquanto estendem o outro quadril sobre a beira da mesa de exame ("deixe a perna caindo da mesa"). Dor em qualquer uma das articulações sacroilíacas sugere patologia. Se esses testes forem positivos, uma radiografia da coluna lombossacra deve ser realizada. Se houver patologia sacroilíaca em combinação com flexão/extensão restrita da coluna, é necessário encaminhamento ao reumatologista.
Teste da elevação da perna estendida
Avalia a radiculopatia. Com o paciente na posição supina, 1 perna é elevada flexionando o quadril enquanto se mantém o joelho estendido. Se o paciente sentir dor irradiando além do joelho com esse movimento, o teste é positivo e sugere uma radiculopatia. Observação: o teste não é positivo se o paciente apresentar desconforto na região posterior da coxa (comumente devido ao alongamento do músculo criado por esse movimento).
Exame neurológico dirigido
Avalia a força motora, as sensibilidades térmica e tátil e os reflexos tendinosos profundos.
O exame motor deve incluir os testes musculares manuais da flexão do quadril, extensão do quadril, flexão do joelho, extensão do joelho, flexão plantar do tornozelo, dorsiflexão do tornozelo e extensão e flexão do hálux.
Exame sensitivo: percepção da sensibilidade tátil, à dor e vibratória da nádega, região perianal e membros inferiores é testada. Deve ser igual bilateralmente.
Os reflexos na patela (L4) e tornozelo (S1) são testados.
Teste da resposta plantar: as solas de ambos os pés são arranhadas com um objeto pontudo ao longo da superfície plantar lateral do pé e depois atravessando para a superfície medial ao redor da região da primeira articulação metatarsofalângica. Um hálux para cima com os outros pododáctilos se afastando é uma resposta positiva e sugere patologia do neurônio motor superior; um hálux para baixo é normal.
Considerações sobre o diagnóstico devem ser reavaliadas se uma anormalidade for encontrada no exame neurológico. O foco deve ser na classificação do padrão da seguente maneira:
Mielopatia/radiculopatia
Sugeridas por uma combinação de perda sensorial um nível abaixo, sinais do neurônio motor superior (como reflexos aumentados ou resposta plantar para cima) e fraqueza motora um nível abaixo.
Atenção especial deve ser dada à área perianal e, em particular, ao tônus retal reduzido, que pode sugerir lesão na cauda equina e requer investigação imediata.
Mielopatias são decorrentes de problemas com a medula espinhal e podem ser secundárias à estenose da coluna vertebral, além de etiologias menos comuns, como doença desmielinizante, sífilis, insuficiência vascular, mielite transversa ou deficiência de vitamina B12.
Radiculopatia é sugerida por deficits no dermátomo e no miótomo. Se forem sugeridas mielopatia ou radiculopatia no exame, uma ressonância nuclear magnética (RNM) da coluna lombossacra deve ser obtida, e o encaminhamento a um especialista em coluna vertebral deve ser considerado se os sintomas neurológicos forem graves ou progressivos.
Neuropatia periférica/plexopatia
Sugeridas por sinais do neurônio motor inferior de fraqueza e RTPs reduzidos; as causas mais comuns desses sintomas são neuropatia periférica diabética e amiotrofia diabética.
Se for sugerida neuropatia ou plexopatia periférica pelo padrão do comprometimento motor, sensitivo ou de reflexo, investigações adicionais por eletromiografia (EMG) são indicadas.
Exames laboratoriais e de imagem
Avaliação do paciente com dor lombar com exames laboratoriais/de imagem só deve ser feita com base na suspeita clínica de certos cenários ou quando a dor persistir por >6 semanas apesar do tratamento conservador.
A RNM sem contraste intravenoso é a investigação de primeira linha preferida para a maioria dos pacientes com sintomas que persistem por mais de 6 semanas.[3]
Estudos de imagem e/ou investigações adicionais são necessários para os pacientes que apresentarem sinais de alerta: trauma significativo recente; perda de peso inexplicada; imunossupressão; história de câncer; uso de drogas intravenosas; infecção do trato urinário; uso prolongado de corticosteroides; pequena queda ou levantamento de peso em uma pessoa potencialmente osteoporótica ou idosa; deficit neurológico focal com sintomas progressivos ou incapacitantes; início agudo de retenção urinária ou incontinência por transbordamento; perda de tônus do esfíncter anal ou incontinência fecal; anestesia em sela; fraqueza motora global ou progressiva nos membros inferiores; ou duração da dor lombar >6 semanas.[3][4]
Se houver suspeita de fratura, a investigação inicial deve ser uma radiografia da coluna lombar. Caso haja preocupação persistente sobre fratura do corpo vertebral, deve ser realizada uma tomografia computadorizada (TC) para obter uma análise óssea detalhada.[3] Em caso de suspeita de neoplasia ou infecção, uma RNM da coluna lombar com e sem contraste intravenoso é a investigação de primeira escolha.[3]
Suspeita de síndrome da cauda equina
RNM sem contraste intravenoso é o exame de imagem de primeira escolha para a avaliação de pacientes com suspeita de síndrome da cauda equina.[3]
A síndrome da cauda equina é uma emergência neurocirúrgica que requer encaminhamento imediato para tratamento adicional. Consulte Síndrome da cauda equina (Abordagem de tratamento).
Dor progressiva ou distúrbios sensitivos ou motores nos membros inferiores
Sugere sintomas neurológicos. Isso requer RNM da coluna lombossacra para avaliar o grau de pinçamento neurológico das raízes nervosas ou medula espinhal. Se a RNM for contraindicada, a mielotomografia é um substituto apropriado.
Suspeita de espondilite anquilosante ou outros distúrbios reumatológicos
História de rigidez matinal durando >1 hora, história familiar positiva ou dores articulares simétricas requer encaminhamento imediato a um reumatologista. Antes do encaminhamento, exames laboratoriais básicos, como hemograma completo, velocidade de hemossedimentação (VHS) e proteína C-reativa, bem como radiografia da coluna total (incluindo articulações SI), podem ser solicitados para servir de ponto inicial da investigação reumatológica.
Osteomielite
História de uso de drogas intravenosas, fatores de risco para tuberculose, imunossupressão ou presença de febre/calafrios devem justificar a consideração de osteomielite. Febre, flutuação e sensibilidade extrema na coluna durante o exame físico podem estar presentes. Hemograma completo, VHS, proteína C-reativa e hemoculturas devem ser solicitados. Em caso de suspeita de tuberculose, um derivado proteico purificado (PPD) deve ser usado. Em todos os casos, a investigação de imagem deve começar com uma radiografia da coluna lombossacra.
Se não houver evidências de osteomielite, mas ainda houver suspeita, uma cintilografia óssea deve ser solicitada. Novamente, se não houver evidência de osteomielite, mas ainda houver suspeita clínica elevada, uma RNM de alta sensibilidade da coluna lombossacra deve ser solicitada.
Alguns médicos ignoram a cintilografia óssea e prosseguem para a RNM se as radiografias simples forem negativas. Se qualquer um dos estudos de imagem for positivo, um encaminhamento ortopédico deve ser considerado.
Suspeita de neoplasia maligna
Pode surgir se o paciente tiver história de câncer, perda de peso inexplicada, dor noturna persistente ou dor em repouso. Um rastreamento de câncer adequado à idade e sexo deve ser iniciado.
Pielonefrite
Pode resultar em dorsalgia ou dor no flanco. Os pacientes geralmente relatam outros sintomas, incluindo mal-estar, febre, calafrios e disúria. Urinálise e cultura podem ajudar no diagnóstico.
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