Abordagem
A abordagem de tratamento é baseada no diagnóstico correto, na compreensão da história natural da afecção e na efetividade das várias opções de tratamento. O manejo das preocupações familiares geralmente é o maior desafio e pode ser abordado ao fornecer o diagnóstico correto, educação, tranquilização e acompanhamento para pais preocupados, e pela resistência em realizar uma intervenção com a criança para satisfazer os pais. Embora a posição do membro inferior e a aparência da marcha possam ser uma preocupação de muitos pais e familiares, a intervenção cirúrgica ortopédica deve ser baseada em objetivos em longo prazo, como evitar degeneração e dor das articulações e impedir o declínio na capacidade de andar em crianças com doenças neuromusculares. Deformidades que resultam em deficits funcionais durante a marcha (ou seja, não bem compensadas) são abordadas com cirurgia corretiva elaborada para restaurar o alinhamento anatômico normal.[25]
Pacientes saudáveis (sem comorbidades) com desvio dos pés para dentro ("in-toeing") ou para fora ("out-toeing") e perfil rotacional com 2 desvios padrão dentro da média para sua idade
O tratamento dos problemas torcionais nessas crianças é desnecessário e ineficaz.[1][2]
O tratamento inicial é a tranquilização e o convencimento da família de que a observação é a melhor opção e que a condição pode remitir ao longo de meses ou anos. Lactentes e crianças pequenas com torção tibial medial devem evitar dormir na posição pronada e sentar sobre os pés. Crianças pequenas e maiores com anteversão femoral aumentada devem sentar com as pernas cruzadas e evitar sentar na posição "W". Intervenções não cirúrgicas, como cabos de torção, talas noturnas, calçados em cunhas corretivas, fisioterapia ou uma combinação destes, não são eficazes para alterar o alinhamento ou para normalizar a marcha.[1][3][74]
Encaminhamento a um ortopedista deve ser considerado nas seguintes situações: 1) famílias que requerem tranquilização adicional; 2) um diagnóstico incerto ou exame de rastreamento inconclusivo; 3) crianças com antepé rígido em adução; e 4) crianças mais velhas ou adolescentes com dor na perna ou incapacidade.
Pacientes saudáveis (sem comorbidades) com desvio dos pés para dentro ("in-toeing") ou para fora ("out-toeing") com perfil rotacional com 2 desvios padrão além da média para sua idade
Desvio dos pés para dentro ("in-toeing") decorrente de torção tibial medial: cerca de 1% das crianças com "in-toeing" apresentam torção tibial medial persistente na terceira infância ou adolescência, a qual é suficientemente grave para causar insatisfação com a aparência da marcha ou função.[1][26][28][66][74][75] O tratamento com talas noturnas é defendido por alguns (embora haja evidências limitadas de suporte), mas pode ser penoso para a família e para a criança. O tratamento com palmilhas rígidas para marcha (uma órtese rígida inserida dentro do calçado) também é defendido por alguns, pois pode reduzir a taxa de tropeços e aliviar a preocupação dos pais quanto à estética da marcha da criança com "in-toeing".[76][77] Entretanto, pesquisas adicionais são necessárias para demonstrar os benefícios desse tratamento antes da aplicação disseminada na prática clínica.[78] Correção cirúrgica é indicada em crianças selecionadas com idade acima de 8 anos com deformidade significativa que prejudica a função da marcha[26][28] e com um ângulo coxa-pé >3 desvios padrão (DPs) além da média.[79] Alinhamento femoral deve ser considerado antes do tratamento cirúrgico, pois a rotação femoral pode agravar ou compensar a torção tibial.
"Out-toeing" decorrente de torção tibial lateral: geralmente é mais problemático que torção tibial medial e provavelmente requer correção cirúrgica. A correção cirúrgica é indicada em crianças com idade acima de 8 anos com deformidade funcional significativa e com um ângulo coxa-pé >40° ou 3 DPs além da média.[79]
Torção femoral medial (anteversão femoral aumentada): em casos raros (<1%), a torção femoral medial pode persistir e ser suficientemente grave para causar incapacidade na terceira infância ou adolescência. Tratamento cirúrgico nunca é indicado profilaticamente. A correção cirúrgica, que consiste de uma osteotomia femoral rotacional (geralmente realizada no fêmur proximal), pode ser indicada em crianças mais velhas com deformidades graves com >3 DPs além da média, rotação medial do quadril de 80° a 90° ou rotação lateral de 0°, rotação externa de 20° ou menos, e incapacidade funcional significativa.[79]
Síndrome do mau alinhamento torcional
A torção tibial lateral e a torção femoral medial excessivas, associadas a sintomas no joelho anterior, inclusive dor patelofemoral, subluxação da patela ou, raramente, luxação, são inicialmente tratadas de modo conservador.
Síndrome do mau alinhamento torcional em crianças com paralisia cerebral
A deformidade torcional é apenas um fator que contribui para a marcha patológica em pacientes com paralisia cerebral.[80] Desequilíbrio muscular, espasticidade e contraturas podem exigir medicações de redução do tônus (por exemplo, toxina botulínica tipo A)[81][82]ou procedimentos em tecidos moles (tenotomia, transferência de tendão e liberação muscular) antes dos procedimentos ósseos.[11][83] Alguns pacientes podem se beneficiar de osteotomias de desrotação para melhorar o alinhamento dos membros e a marcha.[84] Embora a análise da marcha possa auxiliar na tomada de decisão, indicações de intervenção cirúrgica são menos claras na literatura nessa população.[45][74]
Metatarso varo
A maioria das deformidades de metatarso varo se corrige espontaneamente, com pouca ou nenhuma incapacidade em longo prazo, mesmo no caso de deformidade residual leve a moderada.[85][86] Pode-se observar um pé flexível (o antepé pode ser abduzido de modo passivo de modo que a linha bissetriz do calcanhar esteja além do segundo espaço interdigital). Um pé flexível que se corrige na linha média pode ser tratado com um programa de alongamento domiciliar.[87] Um pé que não se corrige na linha média e não melhora com alongamento pode ser engessado seriadamente a cada 1 a 2 semanas. Os resultados do engessamento são melhores quando iniciados antes dos 8 meses de idade. Cirurgia ocasionalmente é considerada em crianças >4 anos para pés com deformidade grave.
Pé torto
Os pacientes devem ser encaminhados a um ortopedista para tratamento.
Pé chato (pé plano valgo)
Pés chatos indolores e flexíveis geralmente não são patológicos e não predispõem uma criança a ter dores nos pés como um adulto. Pés chatos flexíveis e assintomáticos não requerem intervenções, e não há evidências de que o uso de calçados corretivos ou inserções sejam eficazes para pés chatos indolores.[46][87] Em crianças sintomáticas, o tratamento inicial é tranquilização e calçados com um suporte em arco bem formado em crianças mais velhas. Uma órtese personalizada pode ser prescrita se a dor persistir apesar do uso de uma órtese pronta para uso. Pés chatos flexíveis associados com dor no retropé decorrente da contração dos músculos sóleo e gastrocnêmio podem ser tratados com exercícios de alongamento do tendão de Aquiles. Pés chatos rígidos e doloridos requerem encaminhamento a um ortopedista.
Doença de Blount
Na doença de Blount infantil, a deformidade é restrita à tíbia proximal (sem comprometimento femoral). Antes dos 18 meses, a diferenciação entre arqueamento fisiológico e doença de Blount é difícil. Nesse grupo, o rastreamento radiográfico de rotina e o encaminhamento não são custo-efetivos e expõem as crianças à radiação desnecessária. Para crianças <3 anos, recomenda-se observação a cada 3 a 6 meses. Aparelhos (com uma órtese tornozelo-joelho-pé reta medial) têm eficácia limitada em certos pacientes nos primeiros estágios da doença. Correção cirúrgica é necessária em caso de falha da órtese ou para deformidade grave antes dos 4 anos de idade.
A doença de Blount adolescente requer encaminhamento a um ortopedista para tratamento. Cirurgia para restaurar o alinhamento anatômico normal é a base do tratamento.
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