Etiologia
A hérnia inguinal ocorre em razão de um defeito na estrutura do canal inguinal, que pode ser congênito ou adquirido.
As formas congênitas de hérnia indireta ocorrem porque o conduto peritoniovaginal não consegue realizar uma regressão.
Defeitos adquiridos ocorrem em razão de uma degeneração e de alterações gordurosas nos tecidos do assoalho inguinal. Uma degeneração miopectínea progressiva causa fraqueza, resultando na dilatação do anel interno (uma abertura na fáscia transversal) e/ou fraqueza direta da parede posterior do canal inguinal.
Há uma predisposição familiar ou hereditária no desenvolvimento da hérnia inguinal.[17][18]
Doenças do tecido conjuntivo, como a síndrome de Marfan e a síndrome de Ehlers-Danlos, podem predispor à formação da hérnia.[19][20] Também é mais provável que a hérnia da virilha se desenvolva entre pacientes com anormalidades adquiridas do tecido conjuntivo, incluindo o latirismo (uma condição neurotóxica causada pela ingestão de formas específicas de legumes).[21]
Foi observado que os pacientes com hérnia inguinal têm metabolismo anormal do colágeno e níveis de colágeno reduzidos.[21][22] As anormalidades bioquímicas e ultraestruturais do colágeno também estão associadas às hérnias inguinais. O colágeno pode mostrar uma precipitabilidade de sal alterada e uma hidroxilação anormal, com uma quantidade reduzida de formas (poliméricas) maduras, insolúveis e espessas. A imagem microscópica de fibrilas de colágeno pode mostrar edemas, periodicidade irregular, largura variável e algum posicionamento intracelular.[23] Os motivos para essas alterações são desconhecidos, mas estudos de tecidos obtidos de pacientes com hérnia demonstram taxas de proliferação de fibroblastos embotados em culturas de tecidos, bem como taxas reduzidas de incorporação de prolina no colágeno do músculo esquelético.[24][25][26]
A prostatectomia radical prévia representa um risco adquirido para hérnia inguinal.[27] A prostatectomia radical aberta tem a maior incidência de hérnia inguinal, seguida pela prostatectomia radical laparoscópica e assistida por robô.[28]
Fisiopatologia
Geralmente, as hérnias inguinais indiretas ocorrem por causa de um conduto peritoniovaginal persistente decorrente de uma falha na regressão normal, que deixa um saco peritoneal vazio no canal inguinal. A hérnia torna-se clinicamente evidente quando o intestino ou outro conteúdo abdominal preenche e alarga o saco vazio, criando uma protuberância visível e palpável. O saco herniário acompanha o cordão espermático (ou o ligamento redondo, em mulheres), podendo estender-se até o saco escrotal nos homens. Ele acompanha o ligamento redondo até o tubérculo púbico, nas mulheres. As hérnias indiretas podem ser congênitas (proximamente aderentes ao canal deferente) ou adquiridas (nas estruturas do cordão, mas anatomicamente separadas do canal). A maioria dos casos de hérnia nas mulheres é indireta.
As hérnias diretas são sempre adquiridas e, portanto, incomuns abaixo dos 25 anos de idade. Uma hérnia inguinal direta ocorre em razão da degeneração e de alterações gordurosas na aponeurose da fáscia transversal, a qual constitui o assoalho inguinal ou a parede posterior na área do trígono de Hesselbach. (o triângulo de Hesselbach é definido inferiormente pelo ligamento inguinal, lateralmente pela artéria e veia epigástrica inferior e, medialmente pela borda lateral do reto abdominal). A maioria das hérnias diretas não tem um revestimento peritoneal verdadeiro e não contém gordura intestinal, mas sim gordura pré-peritoneal e, ocasionalmente, gordura vesical. No entanto, uma hérnia direta, grande e de longa duração pode abrigar o intestino ou outro conteúdo abdominal e se estender até ao escroto.
O estrangulamento raramente ocorre com a hérnia direta, pois geralmente o defeito estrutural em uma hérnia direta é uma fraqueza difusa e alongamento dos tecidos do assoalho inguinal, em vez de um defeito em formato de anel distinto e bem definido. O estrangulamento é mais comum na hérnia indireta, principalmente se ela passar por um colo estreito na forma de um anel interno apertado. Como os segmentos do intestino se deslocam através do defeito na parede abdominal anterior, a compressão pode causar sequestro de fluido dentro do lúmen do intestino herniado. Inicialmente, isso prejudica a drenagem linfática e venosa, o que aumenta ainda mais o edema. Com o tempo, isso pode comprometer o fornecimento arterial e causar isquemia. Consequentemente, ocorre uma gangrena e, se não for tratada, resultará em perfuração. Inicialmente, ocorre uma peritonite dentro do saco e, em seguida, ela se dissemina para a cavidade peritoneal.
Classificação
As hérnias inguinais podem ser classificadas em diretas ou indiretas, com base na relação do saco herniário com a artéria epigástrica inferior. No entanto, essa classificação é usada principalmente por anatomistas e não é útil clinicamente. As classificações de Nyhus e da European Hernia Society são mais úteis clinicamente.[1][2]
Dessas, a classificação de Nyhus tende a ser mais fácil de entender e usar na prática clínica.
Classificação de Nyhus[1]
Tipo 1 - hérnia inguinal indireta com anel interno normal (congênita, conforme observada em lactentes e crianças).
Tipo 2 - hérnia indireta com anel interno dilatado, mas com parede inguinal posterior normal (geralmente observada em crianças e adultos jovens).
Tipo 3 - defeitos na parede posterior (assoalho inguinal):
3A: hérnia direta
3B: hérnia indireta com anel interno dilatado associado com fraqueza da parede posterior, ou causado por ela; inclui a hérnia por deslizamento. As hérnias do Tipo 3B são adquiridas, não congênitas
3C: hérnia femoral.
Tipo 4 - hérnia inguinal recorrente:
4A: hérnia direta
4B: hérnia indireta
4C: hérnia femoral
4D: combinação de 4A, 4B e 4C.
Classificação da European Hernia Society (EHS)[3][4]
A classificação da EHS baseia-se nos seguintes três fatores:[3]
Tipo de hérnia: primária ou recorrente
Hérnia em local anatômico: lateral, medial ou femoral
Tamanho do orifício da hérnia: <1.5 cm (um dedo - EHS I), 1.5 cm a 3 cm (dois dedos - EHS II) ou >3 cm (mais de dois dedos - EHS III).
Anatômica
1. Direta - o saco herniário sai através da porção medial do assoalho inguinal para a artéria epigástrica inferior e para o anel inguinal profundo.
2. Indireta - o saco herniário sai através do anel inguinal (profundo) interno, lateralmente à artéria epigástrica inferior. Uma importante subclassificação da hérnia indireta é a hérnia por deslizamento, na qual o cólon fundido com o peritônio sai através do anel inguinal interno.
A hérnia inguinal ainda pode ser subclassificada nos seguintes grupos:
Redutível - os conteúdos da hérnia podem ser completamente reduzidos.
Irredutível ou encarcerada - os conteúdos não podem ser reduzidos. Se o intestino estiver encarcerado, ele não poderá ser reduzido na cavidade peritoneal, mas seu suprimento de sangue não será comprometido.
Estrangulada - uma hérnia encarcerada, na qual o suprimento de sangue dos conteúdos da hérnia estão comprometidos, causando isquemia. A menos que seja aliviada, ocorrerá gangrena e perfuração do segmento intestinal afetado. Uma hérnia estrangulada também pode conter um omento ou outra víscera, como a bexiga.
Termos anatômicos adicionais[5]
Bubonocele - a hérnia inguinal fica confinada ao canal inguinal.
Funicular - o saco herniário estende-se além do anel superficial, mas não alcança o escroto.
Completa (escrotal) - o saco herniário se estende até o escroto, com os testículos na extremidade do saco herniário.
Hérnia do obturador - hérnia protrusa pelo forame do obturador; ocorre principalmente em idosos e pacientes longilíneos.
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