Abordagem

O objetivo do tratamento de abscessos anorretais é realizar a drenagem adequada do abscesso, sem danificar os esfíncteres anais.[4]

Antibióticos não são uma alternativa à drenagem cirúrgica desses abscessos. As diretrizes recomendam reservar antibióticos adjuvantes para pacientes com celulite associada, imunocomprometimento ou sinais de infecção sistêmica.[4] A antibioticoterapia é também indicada para pacientes com diabetes e valvopatia cardíaca. Nestas circunstâncias, um antibiótico de amplo espectro com cobertura para anaeróbios e gram-negativos seria apropriado.

A drenagem do abscesso deve ser realizada sem atraso indevido, devido ao potencial de o abscesso se disseminar provocando infecção necrosante de partes moles, causando sepse com risco de vida.[11][24] O desenvolvimento de infecção necrosante das partes moles é mais frequente em idosos, pacientes com diabetes e indivíduos imunossuprimidos (por exemplo, pacientes com vírus da imunodeficiência humana [HIV], alcoolismo ou tumor maligno; os que estão recebendo quimioterapia; os com história de transplante de órgãos sólidos), tendo mortalidade relatada de 25% a 35%.[25] No entanto, algumas evidências sugerem que pacientes imunossuprimidos com neutropenia e ausência de flutuação no exame físico podem ser tratados inicialmente apenas com antibióticos, sendo a drenagem cirúrgica considerada após uma consulta multidisciplinar.[4][26]

A drenagem externa do abscesso perianal e perirretal é apropriada, ao passo que os abscessos interesfincterianos e supraelevadores devem ser drenados internamente para dentro do canal anal e do reto, respectivamente, para evitar a criação de fístulas extraesfincterianas ou supraesfincterianas. Em pacientes com abscessos anorretais associados com a doença de Crohn, o tratamento da condição subjacente deve ser considerado após a sepse anorretal aguda ter sido tratada.[1][27] ConsulteDoença de Crohn (abordagem de manejo).

O tratamento de uma fístula anal é controverso.[28][29][30][31][32]

Tratamento cirúrgico

Os abscessos perianais podem frequentemente ser drenados no consultório ou pronto-socorro, com anestesia local e drenado externamente usando uma incisão com orientação radial em relação ao ânus. Esta incisão apresenta o potencial de danificar os esfíncteres anais se a incisão se estender demais medialmente, mas nos pacientes com fístula anal associada, simplificará o tratamento da fístulas posteriores. Os abscessos perirretais devem ser drenados em sala de cirurgia, onde a anestesia ideal pode ser utilizada.

A alternativa para a drenagem do abscesso é uma incisão curvilínea paralela ao ânus. Esta incisão apresenta risco menor para os esfíncteres anais, mas pode tornar o tratamento subsequente mais desafiador no caso de pacientes com fístula anal associada. Qualquer que seja a incisão que for usada, uma elipse de pele pode ser removida ou uma segunda incisão menor pode ser feita perpendicularmente à incisão primária no seu ponto médio (incisão em cruz) para impedir a reaproximação das bordas da pele. Um pequeno cateter de drenagem pode ser utilizado para facilitar a drenagem de infecções mais profundas.

Se o exame no momento da drenagem cirúrgica revelar uma fístula anal associada, pode-se considerar o tratamento da fístula ao mesmo tempo.[4][29][31][32] Uma revisão Cochrane sugere que a cirurgia de fístula deve ser realizada no momento da drenagem do abscesso, pois isso reduz a persistência e recorrência do abscesso/fístula e a necessidade de cirurgia posterior, e que a intervenção deve ser recomendada em pacientes cuidadosamente selecionados.[33] Fístulas anais superficiais, que envolvam menos de 30% do mecanismo esfincteriano, podem ser tratadas por fistulotomia.[4] Uma alternativa poderia ser a colocação de um sedenho plástico solto para funcionar como dreno.[28][30] O sedenho reduz o risco de abscesso anorretal recorrente e permite tratar a fístula preservando o esfíncter, depois da resolução da infecção aguda e de o trajeto fistuloso ter amadurecido. Se for constatado que a fístula anal envolve mais de 30% do mecanismo esfincteriano, a fistulotomia não é uma opção, mas pode-se ainda considerar a colocação de um sedenho para prevenir abscesso anorretal recorrente.[24]

Se o abscesso estiver sendo drenado fora de sala de cirurgia ou sob anestesia local, talvez não seja possível a realização de um exame anal satisfatório ou colocar um sedenho. Nesta circunstância, há um risco de abscesso anorretal recorrente. Os abscessos interesfincterianos e supraelevadores frequentemente requerem anestesia geral para possibilitar um exame anal satisfatório para fazer o diagnóstico e drenar o abscesso. Estes abscessos devem ser drenados internamente para dentro do canal anal e do reto, respectivamente.[10][17] Fístulas anais só raramente ocorrem depois da drenagem desses abscessos, portanto não há necessidade de se considerar o tratamento da fístula no momento da drenagem do abscesso.

Cuidado pós-operatório da ferida

No pós-operatório, os pacientes deverão começar a tomar banho de água confortavelmente quente 2 ou 3 vezes ao dia para limpar a ferida, até que a cura tenha ocorrido. Banhos também devem ser usados para limpeza após as evacuações. Curativos absorventes podem ser usados para evitar manchar a roupa de baixo, se a drenagem continuar. Não há evidências de boa qualidade para respaldar o uso de curativos internos (tamponamento) para curar cavidades de abscessos perianais.[34]

Antibioticoterapia adjuvante

Geralmente reservada para pacientes com celulite associada, imunocomprometimento ou sinais de infecção sistêmica.[4] Antibióticos são também indicados para pacientes com diabetes ou história de valvopatia cardíaca. Deve-se começar a administração de antibióticos de amplo espectro com cobertura para anaeróbios e gram-negativos no pré-operatório e descontinuá-la dentro de 24 horas após a cirurgia ou após a resolução da celulite. Não existe regime antibiótico padronizado na literatura. Geralmente, alguma combinação de penicilina de amplo espectro intravenosa (por exemplo, ampicilina/sulbactam) ou cefalosporina de segunda ou terceira geração (por exemplo, cefoxitina ou cefotetana) é combinada com clindamicina, ciprofloxacino ou metronidazol.

Não há evidência clínica que dê suporte a cobertura antibiótica tripla. Alguns autores também recomendam acrescentar um aminoglicosídeo (gentamicina ou tobramicina) ao regime, porém deve-se levar em consideração as complicações potenciais. Os aminoglicosídeos são conhecidos por causar nefrotoxicidade e ototoxicidade. Se forem utilizados por mais de 24 horas, os níveis séricos precisam ser monitorados.

Nos pacientes que apresentam infecção necrosante das partes moles, antibióticos de amplo espectro, como os descritos acima, são obrigatórios. Além do que, uma abordagem cirúrgica mais agressiva é justificada, com desbridamento completo dos tecidos moles infectados. Várias idas à sala de cirurgia são frequentemente necessárias até que o processo necrosante seja controlado. Devido à taxa de letalidade das infecções necrosantes de partes moles, a assistência em uma unidade de terapia intensiva é necessária.[25]

Falha do tratamento

Drenagem adequada do abscesso deve resultar em melhora imediata dos sintomas. Caso contrário, o reexame sob anestesia é indicado para garantir a drenagem completa do abscesso. A drenagem inadequada do abscesso ocorre mais frequentemente em pacientes com abscessos em forma de ferradura quando o componente pós-anal ou isquiorretal do abscesso está mais proeminente e é drenado, mas os outros componentes deste abscesso não são reconhecidos e tratados.[35][36]

A recorrência do abscesso anorretal ocorrerá em cerca de 11% dos pacientes, geralmente a partir de uma fístula anal não reconhecida.[28][37] Em pacientes que desenvolvem um abscesso anorretal recorrente ou cuja ferida da drenagem inicial não cicatrizar, o exame feito por um cirurgião geral ou colorretal é indicado para descartar uma fístula anal como a causa destes problemas. Em pacientes com abscesso anorretal recorrente e fatores de risco, como o HIV ou imunossupressão, ou em pacientes de regiões em desenvolvimento, deve-se também levar em consideração algumas das causas raras do abscesso anorretal, como a tuberculose ou actinomicose. Técnicas microbiológicas e de cultura específicas podem ser necessárias na identificação dessas condições.[21][22]

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