Abordagem
O abscesso hepático é uma doença incomum. As características e os sinais na anamnese são geralmente inespecíficos. Portanto, é importante considerar um baixo limiar para a suspeita de abscesso hepático como possível causa para a queixa apresentada. Exames de imagem do fígado e culturas do fluido do abscesso são fundamentais para fazer o diagnóstico e identificar o(s) organismo(s) causador(es).
História
Anormalidades subjacentes do trato biliar, idade >50 anos, neoplasia maligna, diabetes mellitus, dentição de má qualidade e procedimentos biliares ou hepáticos intervencionistas são fortemente associados a fatores de risco para o desenvolvimento de abscesso hepático piogênico. Pacientes originários de áreas endêmicas para amebíase ou que visitaram tais áreas apresentam um risco maior de abscesso hepático amebiano.[2]
Os sintomas mais comuns na apresentação do abscesso piogênico são febre, calafrios, fadiga, náuseas, vômitos e dor abdominal. Se o diafragma está inflamado por conta da infecção subjacente, então, tosse, dispneia e dor pleurítica também podem estar presentes. Nesses casos, pode ocorrer dor referida na ponta do ombro direito. Os pacientes com abscesso hepático fúngico apresentam sintomas semelhantes. Eles geralmente são imunocomprometidos ou neutropênicos.[20] Os sintomas geralmente ocorrem quando o sistema imunológico se recupera (quando a contagem de neutrófilos começa a aumentar).
Em geral, os sintomas ocorrem de maneira insidiosa, podem ser inespecíficos e apresentam duração variável. Os sintomas de abscesso amebiano são semelhantes aos do abscesso piogênico, mas têm maior probabilidade de estarem associados a um início agudo.[20] Outros sintomas de amebíase, como diarreia, podem coexistir. Pacientes com infecção particularmente grave (de qualquer tipo) também podem desenvolver sintomas de maneira mais rápida.
Exame físico
Febre, sensibilidade no quadrante superior direito e hepatomegalia geralmente são encontradas no exame físico. Entretanto, a ausência desses achados não descarta o diagnóstico de abscesso hepático. Apenas alguns pacientes com abscesso hepático têm icterícia, que normalmente ocorre em um estágio tardio da doença. Ocasionalmente, pode haver desenvolvimento de derrame pleural, resultando em achados típicos no exame físico de tórax de macicez à percussão, ausência de murmúrios vesiculares, frêmito tátil diminuído e transmissão vocal diminuída na zona inferior direita. Raramente, a ascite pode estar presente. Pacientes com doença grave, geralmente com bacteremia ou colangite, podem apresentar sinais de choque.
Exame laboratorial
Os pacientes com suspeita de abscesso hepático devem realizar os exames laboratoriais básicos, incluindo:
Hemograma completo
Níveis de albumina sérica, aminotransferase, bilirrubina e fosfatase alcalina
Tempo de protrombina (TP) e tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPa)
Hemoculturas.
Anemia e leucocitose com uma elevada contagem de neutrófilos são comuns. Os testes bioquímicos do fígado, especialmente a fosfatase alcalina, são anormais na maioria dos pacientes. A albumina sérica geralmente é baixa. Embora esses achados sugiram doença hepática, eles são inespecíficos. O TP e o TTPa são realizados para verificar se a coagulação sanguínea está dentro dos limites normais antes da aspiração ser realizada. As hemoculturas podem identificar o organismo causador em aproximadamente metade dos pacientes e deverão ser obtidas se houver suspeita de abscesso hepático. As hemoculturas devem ser obtidas antes da administração de antibióticos.
Se houver suspeita de abscesso amebiano, a sorologia pode ser diagnóstica. Nos casos em que há coexistência de diarreia, o ensaio imunoenzimático para Entamoeba histolytica pode detectar o antígeno de Entamoeba histolytica em uma amostra de fezes.
A proteína C-reativa é um teste inespecífico que pode ser usado para monitorar a resposta inflamatória e, então, a resposta ao tratamento.[28]
Como colher uma amostra de sangue venoso da fossa antecubital usando uma agulha a vácuo.
Exames de imagem
Os exames de imagem iniciais preferenciais são a tomografia computadorizada (TC) abdominal com contraste e a ultrassonografia abdominal.[30][31] A ressonância nuclear magnética (RNM) é mais sensível que a ultrassonografia e que a TC para abscessos pequenos, mas é mais cara e mais limitada em termos de disponibilidade. A sensibilidade da TC para abscesso hepático é mais alta que a da ultrassonografia (97% vs 85%).[32][33] Em geral, realiza-se uma TC. Ocasionalmente, tanto a ultrassonografia quanto a TC são realizadas: por exemplo, se uma ultrassonografia inicial tiver sido inadequada ou negativa apesar de uma forte suspeita para um diagnóstico de abscesso hepático. A ultrassonografia e a TC podem ser usadas para guiar a aspiração da coleção suspeita. As vantagens da ultrassonografia são a ampla disponibilidade, o baixo custo e a ausência da necessidade de um agente de contraste. A TC permite o exame detalhado dos órgãos adjacentes ao fígado e tem maior sensibilidade. Um abscesso geralmente se apresenta à ultrassonografia ou à TC como uma coleção de fluidos localizada (mais frequentemente) do lado direito com edema circundante.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Tomografia computadorizada (TC) mostrando um abscesso hepático (7 cm x 5 cm) em um homem de 46 anos de idade que apresentou febre, fadiga e tosseDo acervo de imagens radiológicas do Massachusetts General Hospital [Citation ends].[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Tomografia computadorizada (TC) (vista coronal) mostrando abscesso hepático em um homem de 46 anos de idade que apresentava febre, fadiga e tosseDo acervo de imagens radiológicas do Massachusetts General Hospital [Citation ends].
A RNM com contraste também pode ser útil no diagnóstico de abscesso hepático e pode ajudar a diferenciar de outras causas de massa hepática, por exemplo, neoplasia maligna.[34] No entanto, a RNM é um exame caro, requer administração de contraste de gadolínio e pode ter disponibilidade limitada.
Antes da aspiração, é importante verificar se todos os parâmetros de coagulação estão dentro dos limites normais. A aspiração do fluido do abscesso confirma o diagnóstico de abscesso e orienta a antibioticoterapia. Entretanto, a cultura de uma amostra de um dreno existente não é útil para orientar a terapêutica antimicrobiana.[35] O fluido deve ser enviado para coloração de Gram e para culturas aeróbias e anaeróbias.
A aspiração da lesão confirma o diagnóstico de abscesso amebiano, mas pode não ser necessária. O aspirado é geralmente um fluido viscoso de cor vermelha amarronzada ("pasta de anchova" ou "molho de chocolate").[20] Um diagnóstico definitivo de abscesso hepático amebiano é obtido pela detecção do antígeno no fluido do abscesso hepático ou por reação em cadeia da polimerase (normalmente realizada em um laboratório de referência) com o pus do abscesso hepático.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Patologia macroscópica de abscesso amebiano do fígado; tubo de pus "chocolate" do abscessoCentros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC)/Dr. Mae Melvin; Dr. E. West of Mobile, AL [Citation ends].
A aspiração/amostragem deverão ser evitadas se houver evidências de coagulação anormal. Também serão contraindicadas se houver suspeita de cisto hidático, por conta do baixo, mas real, risco de anafilaxia. Entretanto, a aspiração pode, ocasionalmente, ser realizada em pacientes com possível doença hidática quando o diagnóstico de abscesso hepático amebiano permanecer uma possibilidade ou quando a aspiração for realizada como parte da terapia. A aspiração deve ser realizada apenas por médicos com experiência nesses procedimentos e em centros especializados em tratar esses pacientes.
Uma radiografia torácica também será indicada se houver quaisquer sintomas ou sinais respiratórios no exame físico (por exemplo, sintomas sugestivos de irritação diafragmática ou sinais de derrame pleural).[20]
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