Abordagem

O diagnóstico é baseado na história e no exame clínico. Não existem achados laboratoriais específicos. No entanto, é importante considerar e excluir todas as possíveis causas sistêmicas de úlceras recorrentes, como doença celíaca, especialmente em pessoas com sintomas ou sinais sistêmicos ou adultos sem história prévia de ulceração oral.[1][6] Além disso, uma úlcera solitária com duração superior a 3 semanas pode representar neoplasia maligna e justificaria o encaminhamento urgente a um especialista.[29] Isso exigirá investigação adicional e pode envolver biópsia incisional.

História

O início de estomatite aftosa recorrente (EAR) geralmente ocorre durante a infância; em 80% dos casos, ela se desenvolve antes dos 30 anos. A história deve incluir detalhamento do padrão episódico/natureza cíclica da ulceração, número de úlceras, duração, idade de início e quaisquer fatores desencadeantes associados. Uma história familiar é importante, pois mais de 42% dos pacientes têm parentes de primeiro grau com EAR.[1][10] A EAR é mais grave e começa em uma idade menor em pacientes com uma história familiar positiva.[1] Os fatores desencadeantes do início de um episódio de ulceração ativa podem incluir trauma (por exemplo, depois de escovar os dentes com muita força) e determinados alimentos (por exemplo, chocolate, amendoim, café e produtos de glúten).[3] Em algumas pacientes, as úlceras coincidem com a fase lútea do ciclo menstrual e geralmente cessam com o uso de contraceptivos orais ou durante a gestação.[6]

Exame físico clínico

As úlceras normalmente ocorrem na mucosa oral não queratinizada: na mucosa bucal, no assoalho da boca ou no ventre da língua. Existem três apresentações clínicas da EAR.[1][2][6]

  • As úlceras aftosas menores são responsáveis por 75% a 85% de todos os casos de EAR. Elas têm menos de 10 mm de diâmetro e costumam se curar em 7-10 dias sem cicatrização desfigurante. Elas são encontradas principalmente na mucosa não queratinizada de lábios, bochechas, assoalho da boca, sulcos ou ventre da língua.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Estomatite aftosa recorrente (EAR): aftas menoresDo acervo pessoal de Crispian Scully, MD, PhD, FDSRCS, FRCPath [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@60483a6c

  • As úlceras aftosas maiores (10% a 15% de todos os casos de EAR) são redondas ou ovais e têm mais de 10 mm de diâmetro. Elas são frequentemente mais dolorosas e persistentes que as aftas menores. Elas envolvem qualquer sítio oral, incluindo a mucosa queratinizada (palato e dorso da língua). Ocorrem em grupos de 1 a 6 por vez. Elas se curam lentamente ao longo de 10-40 dias, ou mais, ocasionalmente, costumam ser recorrentes e podem deixar cicatrizes.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Estomatite aftosa recorrente (EAR): aftas maioresDo acervo pessoal de Crispian Scully, MD, PhD, FDSRCS, FRCPath [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@5570f6de

  • As úlceras aftosas herpetiformes são mais raras que as úlceras aftosas maiores e menores e geralmente se apresentam como várias (5-100) úlceras distintas do tamanho de uma cabeça de alfinete que aumentam de tamanho e se aglutinam para formar grandes áreas de ulceração. Mimetizam estomatite por herpes simples, mas não são precedidas por vesículas ou bolhas e não são comunicáveis. Costumam ser extremamente dolorosas. Podem envolver qualquer local oral, incluindo a mucosa queratinizada (palato e dorso da língua). Cicatrizam ao longo de 10 dias ou mais e reaparecem com tanta frequência que a ulceração pode parecer contínua. Ocorrem em uma faixa etária ligeiramente mais avançada que as outras formas de EAR e principalmente em mulheres.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Estomatite aftosa recorrente (EAR): ulceração herpetiformeExtraída de: Scully C, Flint S, Porter SR, et al. Oral and Maxillofacial diseases. London UK; 2004. Usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@2b39588b

A ulceração oral com aspecto clínico semelhante à EAR (ulceração aftosa) pode se apresentar como uma manifestação de diversos distúrbios sistêmicos.

  • A ulceração aftosa pode ocorrer em estados de imunodeficiência, incluindo infecção por HIV ou disfunção de neutrófilos (por exemplo, como um componente da neutropenia cíclica).[6][30]

  • A USA pode ocorrer na síndrome de Behçet. Esses pacientes podem apresentar ou ter uma história de úlceras semelhantes à aftosa que ocorrem na mucosa genital ou em outras mucosas, eritema nodoso ou outras lesões cutâneas, uveíte, envolvimento das articulações ou manifestações do sistema nervoso central.[1][31] Na síndrome MAGIC (úlceras bucais e genitais com cartilagem inflamada), uma variante da doença de Behçet, uma condrite generalizada pode se manifestar juntamente com aftas maiores.[32]

  • Os outros estados autoinflamatórios nos quais pode ocorrer USA incluem febre periódica com aftas, faringite e adenite (síndrome PFAPA), e síndrome periódica associada ao receptor do fator de necrose tumoral.[33][34] Nesses pacientes, a febre é característica; lesões cutâneas e outras também podem estar presentes, como linfadenopatia cervical.

  • Deficiências hematínicas (ferro, ácido fólico ou vitamina B12) também podem se manifestar com USA como um componente da anemia subjacente, ou no estágio de pré-anemia, geralmente com estomatite angular e/ou feridas na língua. Palidez, fadiga, fraqueza, diminuição da tolerância a exercícios e dispneia ao se exercitar podem resultar da anemia em si e devem ser confirmadas na história. A avaliação de outros sinais de deficiência de ferro (por exemplo, glossite, estomatite angular e unhas em colher) deve ser feita. Em pacientes com deficiência de vitamina B12, uma ampla gama de outros sinais e sintomas pode estar presente. Uma história de dieta pobre em fontes de folato e fenitoína ou consumo compulsivo de bebidas alcoólicas pode sugerir deficiência de folato.

  • A ulceração aftosa também pode ser uma característica de doença inflamatória intestinal, ambas da doença de Crohn e de colite ulcerativa (menos comum) e doença celíaca. Nesses pacientes, a ulceração muito provavelmente reflete as deficiências hematínicas associadas.[6][35]

  • Deve ser colhida uma história medicamentosa completa. A USA foi relatada em pacientes em uso de anti-inflamatórios não esteroidais, betabloqueadores, nicorandil (bloqueador de canais de potássio), inibidores da ECA, antibióticos, anticonvulsivantes, anticoagulantes e metotrexato.[1][36]

Investigações laboratoriais

Embora não existam achados laboratoriais específicos em EAR, em alguns pacientes (por exemplo, quando a história e o exame sugerem uma deficiência nutricional ou um distúrbio hematológico), o hemograma completo e a estimativa hematínica (ferritina sérica, folato sérico/nos glóbulos vermelhos e vitamina B12 sérica) são indicados para excluir deficiências de ferro e vitamina.[1] Em pacientes de todas as faixas etárias com suspeita de doença celíaca, o teste de imunoglobulina A-transglutaminase tecidual sérica pode ser uma investigação inicial apropriada. O exame de infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) deve ser considerado em pacientes com história de infecções (candidíase, leucoplasia pilosa) ou neoplasias (sarcoma de Kaposi, linfoma) associadas ao HIV, ou outras evidências clínicas ou fatores de risco de infecção por HIV.[1] O aumento da viscosidade do plasma ou da velocidade de hemossedimentação pode ser observado nos estados autoinflamatórios. Em pacientes com resultados anormais, o diagnóstico de USA é mais provável que a EAR. Nesses pacientes, o diagnóstico definitivo dependerá de investigações subsequentes conforme apropriadas. Sintomas de doença autoimune (por exemplo, lesões na pele) ao lado de úlceras podem justificar um teste de fator antinuclear para descartar uma doença autoimune.

Uma úlcera solitária com duração superior a 3 semanas pode representar neoplasia maligna e justificaria o encaminhamento urgente a um especialista.[29] Isso exigirá investigação adicional e pode envolver biópsia incisional.

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