Abordagem

A poliarterite nodosa (PAN) não relacionada à infecção pelo vírus da hepatite B (HBV) é tratada, em grande parte, da mesma forma que as outras vasculites, por meio de imunossupressão, com ênfase em terapia precoce e agressiva, principalmente em doença grave.

O tratamento da PAN relacionada ao HBV é diferente, pois, embora a imunossupressão possa determinar o controle da vasculite, ela também está associada à replicação viral elevada. Um ciclo curto de imunossupressão agressiva é seguido de plasmaférese e terapia antiviral concomitante.

O escore de 5 fatores

Esse escore pode ser usado para previsão da sobrevida na PAN.[19] Considera-se que um escore de um ou mais sugere um prognóstico desfavorável e exija uma terapia mais agressiva.

Os cinco fatores, a cada um dos quais é atribuído um ponto se estiver presente, são:

  • Proteinúria >1 g/dia

  • Creatinina >120.5 mmol/L (>1.58 mg/dL)

  • Cardiomiopatia

  • Sintomas gastrointestinais

  • Comprometimento do sistema nervoso central.

PAN não relacionada ao HBV

O principal objetivo é controlar a atividade da vasculite, evitando, portanto, a progressão de doença que traga risco de vida e constitua ameaça aos órgãos. A imunossupressão é a base do tratamento, portanto uma atenção cuidadosa à prevenção e à detecção de complicações da terapia é essencial.

Foi demonstrado que a mortalidade decorrente de PAN é elevada no primeiro ano, com 58% a 73% de mortes precoces causadas por vasculite não controlada.[53][54][55] Consequentemente, a PAN deve ser tratada agressivamente e sem demora, principalmente em pacientes com doença grave (os que apresentam pontuação ≥1 no escore de 5 fatores). A maioria dos ensaios clínicos publicados observou uma combinação de pacientes com diferentes tipos de vasculite primária estudados em conjunto: por exemplo, PAN e síndrome de Churg-Strauss. Essa abordagem foi adotada por causa da relativa raridade dessas doenças.[55]

Os ensaios clínicos sobre PAN não relacionada ao HBV demonstraram que a combinação de ciclofosfamida e corticosteroides reduz o índice de recidivas, mas não afeta a mortalidade total em 10 anos.[56] Entretanto, em uma análise retrospectiva de 278 pacientes, os que apresentaram uma pontuação ≥2 no escore de 5 fatores obtiveram uma melhora significativa na sobrevida ao serem tratados com ciclofosfamida e corticosteroides em comparação com corticosteroides isoladamente.[55]

Pacientes com pontuação ≥1 no escore de 5 fatores recebem um corticosteroide oral em um esquema de lenta redução de dosagem, objetivando a supressão do corticosteroide em até 15 a 18 meses. Podem ser administrados pulsos intravenosos de corticosteroides antes das infusões de ciclofosfamida, o que pode permitir a diminuição mais rápida da dosagem de corticosteroide oral.

Pulsos intravenosos de ciclofosfamida são preferidos, pois constatou-se que eles são tão eficazes quanto os esquemas orais; eles também diminuem a exposição total à ciclofosfamida e reduzem os efeitos adversos.[57][58] Deve ser considerado o rastreamento para tuberculose antes do uso de ciclofosfamida.[59][60] O risco de infertilidade pelo uso de ciclofosfamida deve ser discutido, com opções oferecidas, como a criopreservação de oócitos e esperma, embora, na prática, isso raramente ocorra na doença grave, uma vez que o tratamento precisa ser iniciado antes de os arranjos para a coleta serem feitos.[59]

Não foi constatado que o uso de plasmaférese reduz as recidivas ou melhora a mortalidade, em comparação com corticosteroides isoladamente ou corticosteroides associados a ciclofosfamida.[61][62] O número de infusões de ciclofosfamida parece ser relevante em pacientes com escores de prognóstico desfavorável (ou seja, pontuação ≥1 no escore de 5 fatores). Doze infusões, em comparação com 6, acarretam uma diminuição significativa na probabilidade de recidiva (razão de riscos 0.44, P = 0.02).[63]

Após um ciclo inicial de 3 a 6 meses de ciclofosfamida, a manutenção da remissão com azatioprina, leflunomida ou metotrexato mostrou ser eficaz em pacientes com vasculite associada a anticorpo anticitoplasma de neutrófilo (ANCA).[64][65][66][67] Não há evidências para essa abordagem especificamente na PAN, mas os achados de um ensaio clínico sobre vasculites associadas a ANCA podem ser extrapolados para PAN, tornando a manutenção com alternativas à ciclofosfamida uma opção potencial de tratamento.[57][59]

Em pacientes que apresentam recidiva significativa (definida como doença que oferece risco à vida ou aos órgãos), a ciclofosfamida deve ser reiniciada para tentar obter a remissão.

O French Vasculitis Group recomendou anteriormente que pacientes com pontuação 0 no escore de 5 fatores fossem tratados somente com corticosteroides, adicionando ciclofosfamida como agente de segunda linha em caso de doença persistente ou recidiva, apesar do uso de corticosteroides. No entanto, isso está associado a uma mortalidade de 12%.[68] Um estudo adicional realizado pelo mesmo grupo mostrou que 80% dos pacientes com pontuação 0 no escore de 5 fatores atingiram a remissão somente com corticosteroides, mas a remissão foi sustentada apenas em 40%.[69] Em pacientes que não alcançaram a remissão ou apresentaram recidiva com o uso isolado de corticosteroides, foi usada azatioprina ou ciclofosfamida intravenosa em pulsos para induzir a remissão com sucesso.[69] No entanto, um estudo subsequente com esse grupo em 2017 não mostrou nenhum benefício adicional, em termos de taxa de remissão ou recidiva, após a adição de azatioprina para o tratamento com prednisolona.[70]

Na vasculite associada a ANCA, o metotrexato, e não a ciclofosfamida, pode ser eficaz em induzir a remissão de doença sem aspectos intensos.[71][72][73] Entretanto, não houve estudos similares com relação à PAN.

PAN relacionada ao HBV

Historicamente, os pacientes eram tratados com imunossupressão, o que poderia acarretar o controle da vasculite, mas que também promoveu a replicação viral contínua, ocasionando, portanto, um aumento na cronicidade e intensidade da infecção por HBV.[13][74][75][76] Foi mostrado que a replicação viral contínua é uma característica de prognóstico desfavorável na infecção por HBV, trazendo alto risco de cirrose e carcinoma hepatocelular.[77][78][79]

Os esquemas de tratamento começam com imunossupressão agressiva na forma de alta dose de corticosteroides orais por 2 semanas, para reduzir dano aos órgãos-alvo de vasculite não controlada.

A próxima etapa é usar plasmaférese como meio de remover fisicamente os imunocomplexos.[80]

O uso concomitante de terapia antiviral nessa etapa reduz a carga viral, que, por sua vez, reduz o estímulo para a produção de imunocomplexos, interrompe a replicação viral e acarreta soroconversão.[20][81][82] O agente antiviral de escolha é lamivudina, comprovadamente eficaz na soroconversão de pacientes com hepatite B crônica e pode ser usada por via oral.[83] Um ensaio clínico observacional demonstrou remissão clínica em 90% dos pacientes em até 6 meses e soroconversão de positividade de antígeno e da hepatite B (HbeAg) para anticorpo antiantígeno E do vírus da hepatite B (anti-HBe) em 66.7% dos pacientes em até 9 meses.[84] Foi relatado que a cura pode ser obtida nos pacientes soroconvertidos.[81] Não há ensaios clínicos randomizados e controlados em virtude da raridade da doença.[20]

Na recidiva da PAN, a condição do HBV deve ser verificada e, caso ele seja positivo, precisa ser erradicado antes do tratamento contra PAN. O médico encarregado do tratamento deve se reunir com seus hepatologistas locais para obter aconselhamento sobre a terapia antiviral alternativa para tratamento do HBV, em vez de simplesmente repetir o ciclo de lamivudina.

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