Abordagem

O diagnóstico da toxicidade por anfetaminas é basicamente clínico. Os pacientes geralmente apresentam hiperatividade do sistema nervoso simpático e uma história de uso de substâncias ilícitas ou legítimas (lícitas) no passado recente.

Impressão inicial

Pacientes com toxicidade por anfetaminas geralmente apresentam comportamento agitado, irracional, inquieto e agressivo, podendo mostrar sinais de hipervigilância, paranoia e psicose.[38] O controle do distúrbio comportamental pode ser necessário antes de se fazer um diagnóstico preciso e tentar o tratamento.[38][39] Na ausência de história do paciente ou de outra testemunha confiável, há forte suspeita da toxicidade por psicoestimulantes em pacientes com essa apresentação.[38]

Outro possível indicador do uso indevido de anfetaminas é o comparecimento recente em raves (festas de jovens com música dançante eletrônica) e/ou participação vigorosa de dança em casas noturnas. Usuários de drogas em casas noturnas têm maior probabilidade de usar diversas substâncias ilícitas, as quais podem impedir que se tenha uma compreensão clara da situação clínica.[40][41][42] Frequentadores de raves têm maior probabilidade de relatar uso frequente de 3,4-metilenodioximetanfetamina.[42] Dentição fraca ("boca de metanfetamina”) também pode fornecer indícios de potencial uso indevido de anfetaminas.[43][44]

História

O risco significativo de overdose de anfetaminas é manifestado por fatores de risco conhecidos, como exposição a temperatura elevada, exercício físico, sudorese e depleção de volume, frequentar casas noturnas ou raves, uso de várias substâncias ou bebidas alcoólicas, ansiedade, depressão, desvio comportamental ou criminalidade e transtorno de déficit da atenção com hiperatividade (TDAH).[31][33]

Se o paciente for cooperativo, ou se for possível obter uma história confiável da família ou de amigos, uma história detalhada de uso de drogas pode revelar uso indevido de drogas anterior, um fator de risco conhecido para overdose de anfetaminas. O questionamento inclui uso atual e anterior, tipo, via, quantidade e tempo, e potência (por exemplo, duração e intensidade do efeito) da droga ingerida. É comum o uso de várias substâncias (por exemplo, bebidas alcoólicas, maconha [cannabis], cocaína e heroína), o que pode confundir e complicar o quadro clínico.[27][45][46] Todas as possibilidades de uso indevido de substâncias são investigadas, incluindo medicamentos de prescrição.[40][41][42] É muito importante identificar os medicamentos dos pacientes que podem interagir com anfetaminas e causar toxicidade serotoninérgica (por exemplo, inibidores da recaptação de serotonina, metoclopramida, sumatriptana, lítio, dextrometorfano).[29][47]

Sintomas como palpitação e dor torácica requerem um exame à parte. Uma overdose de anfetaminas pode aumentar a demanda por oxigênio miocárdico (com aumento de frequência cardíaca, contratilidade e tensão da parede) causando um aumento do risco de infarto agudo do miocárdio, isquemia e disritmia.[39][48][49] Dor abdominal pode sugerir isquemia mesentérica ou uma possível ingestão de drogas em grande quantidade com obstrução gastrointestinal.[50] Cefaleia pode ser o achado inicial de hemorragia subaracnoide ou sangramento intracerebral. Achados pertinentes da história clínica incluem exposição à hepatite B, hepatite C ou vírus da imunodeficiência humana (HIV; indicadores indiretos de estilo de vida de alto risco), lesões físicas traumáticas, que são comuns no cenário de uso indevido de substâncias, e doença psiquiátrica subjacente (possivelmente não tratada, como ansiedade e depressão).

Exame

Sinais objetivos podem ser as únicas pistas de overdose de anfetaminas se o paciente não for cooperativo, não admitir o uso de psicoestimulantes ou se não houver uma história corroborativa. Sinais de intoxicação por anfetaminas incluem:[8][9][16][23][38]

  • Taquicardia

  • Hipertermia (se >39.5 °C [>103 °F]) pode indicar toxicidade grave com risco de vida, e sedação e resfriamento imediatos são necessários

  • Depleção de volume

  • Agitação extrema ou distúrbio comportamental agudo

  • Convulsões

  • Nível de consciência alterado (por exemplo, desorientação, confusão, delirium)

  • Cefaleia intensa

  • Hipertensão

  • Dificuldade respiratória (por exemplo, taquipneia, dispneia)

  • Dor torácica ou arritmias cardíacas.

Rubor facial na presença de pirexia pode ser um achado precoce no exame físico, sustentando o diagnóstico de toxicidade por anfetaminas. A depleção de volume é típica de atividades de dança ou esforço físico em ambientes sociais quentes e aglomerados. Paradoxalmente, estimulantes podem mascarar a sede e diminuir o consumo de líquidos, exacerbando, assim, o grau de depleção de volume.[51]

Distúrbios comportamentais e mentais podem ser uma manifestação de doença psiquiátrica subjacente ou de hiperatividade do sistema nervoso simpático. Convulsões podem acompanhar a hemodiluição e hiponatremia com edema cerebral, assim como cefaleias. Podem ocorrer sintomas respiratórios (por exemplo, taquipneia) no contexto de comprometimento cardiovascular ou como síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA). A SDRA é uma sequela conhecida da hipertermia, com achados semelhantes aos da intermação (alta temperatura, acidose metabólica, insuficiência renal). A taquicardia, com ou sem arritmias, com o aumento do esforço cardíaco, pode causar insuficiência cardíaca.[39][52][53][54][55]

Outros sinais podem incluir:

  • Constrição mandibular (trismo)

  • Rigidez muscular

  • Tremor ou movimentos repetitivos

  • Fala rápida

  • Andar de um lado para outro

  • Diaforese

  • Alucinações ou delírios

  • Pupilas dilatadas que reagem lentamente à luz.

O uso regular e prolongado de substâncias pode ficar evidente por sinais óbvios de desnutrição e evidência de marcas de agulha ou tromboflebite nos membros. Sinais de lesão traumática também podem estar presentes, como é comum em toxicidade medicamentosa. Hemorragia subaracnoide é uma apresentação incomum mas conhecida na overdose de anfetaminas, e requer uma avaliação cuidadosa do fundo do olho para papiledema e uma vigilância dos sinais neurológicos focais.

Sinais de toxicidade serotoninérgica

A toxicidade serotoninérgica pode manifestar-se clinicamente como o seguinte:[29][47]

  • Agitação

  • Diaforese

  • Febre >38 °C (100 °F)

  • Tremor

  • Hiper-reflexia

  • Hipertonicidade

  • Clônus ocular, espontâneo ou induzido.

A estimulação do sistema nervoso central pode incitar agitação e tremor. Clônus e sinais de Babinski bilaterais também caracterizam uma toxicidade serotoninérgica, com achados neuromusculares normalmente mais pronunciados nos membros inferiores.

Exames laboratoriais

O nível glicêmico capilar é feito imediatamente à beira do leito para descartar hipoglicemia. Investigações laboratoriais formais podem incluir:

  • Eletrólitos, glicose, ureia, creatinina, testes de função hepática, tempo de protrombina, TTP, INR, creatina quinase, peptídeo natriurético do tipo B e troponina séricos[56]

  • Urinálise (a tira reagente pode reagir de forma cruzada positiva para sangue em rabdomiólise)[56]

  • Amostra de urina para rastreamento de drogas (detecta uso de drogas ilícitas ao longo dos últimos dias)[57]

  • Avaliação do nível de álcool no ar expirado ou no sangue.

Exames por imagem

Dependendo da apresentação, dos achados e, em alguns casos, da intuição, os seguintes exames de imagem podem ser apropriados:

  • Radiografia torácica caso o paciente apresente dor torácica ou dispneia

  • TC de baixa dose (TCBD) do abdome e da pelve (pode revelar pacotes de drogas em embalagens ingeridas ou escondidas em cavidades corporais)[58]

  • Tomografia computadorizada (TC) ou ressonância nuclear magnética (RNM) do crânio (em pacientes com cefaleia grave, estados de consciência alterados, convulsões ou sinais neurológicos não explicados por toxicidade serotoninérgica); TC é a modalidade de imagem craniana inicial mais comum, pois a RNM é mais difícil e demorada enquanto se tenta manejar a overdose de anfetaminas agudamente, embora seja melhor para identificar lesões na interface branco-cinzenta

  • Angiografia cerebral em pacientes com <40 anos com hemorragia intracerebral não traumática, já que um aumento de noradrenalina provoca efeitos cardiovasculares, notadamente hipertensão, com risco de hemorragia do sistema nervoso central e acidente vascular cerebral.[2]

Outra

Eletrocardiograma (ECG) é realizado rotineiramente em todos os pacientes. Pacientes com dor torácica, taquicardia ou arritmia também são submetidos a monitoramento cardíaco contínuo.[23][39][48][49]

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