Etiologia
A toxicidade por anfetaminas ocorre com mais frequência no contexto do uso recreativo. Ela pode ocorrer em usuários inexperientes, ocasionais, compulsivos ou regulares. Overdose intencional também acontece. A composição real das substâncias ilícitas é muito variável e a overdose pode ocorrer quando o conteúdo das substâncias ativas é maior que em preparados usados anteriormente, quando o tipo de anfetamina é diferente do esperado ou quando se usam doses mais altas, seja intencional ou acidentalmente.[16][17] O risco de toxicidade é maior nas formas de anfetaminas injetadas devido aos altos níveis de pico plasmático. Ocasionalmente, pode ocorrer toxicidade com tentativas de esconder a substância em cavidades do corpo, seja para contrabando (ingestão) ou como estratégia de emergência para evitar a descoberta (ocultação) por autoridades.[18] É comum o uso de outras substâncias (especialmente álcool) associadas às anfetaminas, o que complica o quadro clínico inicial de toxicidade aguda.[19][20][21]
Fisiopatologia
As anfetaminas aumentam a liberação e bloqueiam a recaptação dos neurotransmissores monoaminérgicos dopamina, noradrenalina e serotonina nas sinapses neuronais centrais. As anfetaminas e seus derivados, como as metanfetaminas, afetam mais a noradrenalina, enquanto compostos relacionados à MDMA atuam mais na serotonina. Em grandes quantidades, todos produzem sintomas semelhantes de superestimulação simpática e podem causar toxicidade serotoninérgica.[8][22][23] No entanto, as anfetaminas também mostraram ter efeitos neurobiológicos disseminados a jusante em sistemas não monoaminérgicos como glutamato, opioide endógeno, endocanabinoide e acetilcolina.[24]
Complicações graves dependem parcialmente da suscetibilidade do indivíduo e das circunstâncias de uso.[9] Por exemplo, hipertermia associada à MDMA e diaforese profusa são comuns e exacerbadas pelo ambiente quente e aglomerado com atividade física vigorosa das festas dançantes nas quais essas substâncias são consumidas. Esse cenário pode causar depleção de volume com perda de grande quantidade de sódio no suor.[4][5] Se o usuário beber grande quantidade de água para combater a sede, a hemodiluição e a hiponatremia (facilitadas pela secreção inapropriada de hormônio antidiurético e pela retenção de líquido) podem causar edema cerebral e convulsões.[6][7] Após a hipertermia, podem também ocorrer rabdomiólise, acidose metabólica, insuficiência renal, coagulação intravascular disseminada (CIVD) com risco de microinfartos e síndrome do desconforto respiratório agudo.[6][7][25] Insuficiência renal aguda pode ser resultado da toxicidade direta da mioglobina nos túbulos renais ou de isquemia renovascular em resposta à vasoconstrição arteriolar renal. Pode ocorrer necrose hepatocelular decorrente de hipertermia, de ausência do gene CYP2D6 da citocromo P450 oxidase ou, possivelmente, por um mecanismo mediado imunologicamente.[6][7][8] O aumento de noradrenalina circulante induzido pelas anfetaminas produz efeitos cardiovasculares, notadamente hipertensão, com risco de hemorragia no sistema nervoso central. A taquicardia, com ou sem arritmias, e o aumento do trabalho cardíaco podem causar insuficiência cardíaca.[6][7][8][9]
Fatalidades decorrentes da toxicidade por anfetaminas acontecem através de diversos mecanismos, incluindo:[8][23][26][27]
Hipertermia
Efeitos cardiovasculares
Trauma (geralmente associado à confiança excessiva ou comportamento arriscado sob a influência da substância)
Hemorragia subaracnoide ou intracraniana
Acidente vascular cerebral (AVC)
Hiponatremia (em toxicidade por MDMA)
Sequelas da toxicidade por serotonina
Insuficiência hepática
coagulopatia intravascular disseminada (CIVD)
Insuficiência renal aguda.
Classificação
Nível de excitação, cooperação e comportamento[1]
Overdoses de anfetaminas são classificadas clinicamente com uma avaliação pragmática da excitação ou sedação do paciente após o tratamento. Isso é importante porque, se não forem tratadas, os efeitos psicoestimulantes das anfetaminas tomadas em excesso podem atrapalhar as tentativas de diagnosticar e tratar o paciente. A Escala de Agitação-Sedação de Richmond (RASS) é um escore amplamente reconhecido e utilizado para esse objetivo:[1]
+4 (combativo): visivelmente combativo ou violento, oferece perigo imediato para o pessoal de enfermagem
+3 (muito agitado): puxa ou remove tubos ou cateteres ou apresenta comportamento agressivo para com a equipe
+2 (agitado): movimentos frequentes sem uma finalidade ou assincronia paciente-ventilador
+1 (inquieto): ansioso ou apreensivo, mas movimentos não agressivos ou vigorosos
0 (alerta e calmo): presta atenção ao cuidador espontaneamente
-1 (sonolento): não está totalmente alerta, mas apresenta despertar sustentado (>10 segundos) com contato visual ao som da voz
-2 (sedação leve): acorda brevemente (<10 segundos) e faz contato visual ao som da voz
-3 (sedação moderada): qualquer movimento (mas sem contato visual) ao som da voz
-4 (sedação profunda): ausência de resposta ao som da voz, exceto por qualquer movimento à estimulação física
-5 (não despertável): ausência de resposta ao som da voz ou à estimulação física.
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