Abordagem

O tratamento é sintomático. O principal objetivo do tratamento é melhorar ou estabilizar a cognição, o comportamento, as atividades da vida diária, bem como manter a segurança. As evidências de tratamentos para DCL aumentaram nos últimos anos, e há várias revisões e metanálises disponíveis.[32][36][37] Dados de doenças relacionadas, como doença de Alzheimer (DA) e doença de Parkinson, também podem fornecer informações para o tratamento da DCL.[32]

Os pacientes com DCL têm uma deficiência de acetilcolina e dopamina, os tratamentos devem ser iniciados e ajustados em pequenos incrementos e baixas doses para minimizar os efeitos adversos. O uso de medicamentos antipsicóticos deve ser evitado o máximo possível, devido à sensibilidade elevada de pacientes com DCL aos efeitos adversos desses medicamentos, inclusive aumento da mortalidade.[32]

Deve-se adotar uma abordagem prioritária voltada aos problemas. É necessário fazer uma lista de todos os sintomas que o paciente, os familiares e outros cuidadores desejam tratar (que talvez não sejam os mesmos). Deve-se chegar a um consenso sobre quais sintomas tratar e em qual ordem, tendo em mente que a melhora de um sintoma pode vir acompanhada da deterioração de outro.[32] Devem ser levados em consideração os problemas cognitivos, comportamentais, psiquiátricos, motores, autonômicos e do sono. Uma resposta limitada a alguns tratamentos ou a sensibilidade aos efeitos adversos deve ser identificada e monitorada.

Cuidados de suporte

O fornecimento de suporte e informação é uma parte essencial dos cuidados de pacientes com demência.

Após o diagnóstico, devem ser fornecidos educação, suporte e recursos ao paciente, seus familiares e outros cuidadores, com foco nos principais sintomas comportamentais e psicológicos da DCL e como eles se traduzem em necessidades de cuidados.[38] O planejamento deve se concentrar em atender às necessidades vigentes e antecipar problemas futuros. Os familiares e cuidadores devem ter poderes para ajudar o paciente a tomar decisões relativas à sua saúde e propriedade, à administração de suas finanças, à administração de medicamentos, ao preparo de refeições, etc. A discussão de diretivas avançadas e cuidados no final da vida que possa ser antecipada requer sensibilidade, com base em uma boa relação entre o paciente e o profissional e entre os familiares e o profissional.[38][39][40] Talvez seja necessário um acompanhamento jurídico nos casos que necessitem de tutela e manuseio de finanças, principalmente porque a DCL afeta as funções executivas necessárias para tomar decisões financeiras responsáveis. Deve-se disponibilizar um assistente social, psicólogo ou outro profissional da saúde mental para oferecer suporte emocional e contribuição psicossocial.

A discussão sobre a condução de veículos é um tópico que desperta fortes sentimentos, normalmente associados ao desejo do paciente de manter a autonomia. Recomenda-se restringir as prerrogativas de condução de veículos, especialmente para os pacientes com alucinações visuais. As diretrizes da American Academy of Neurology sugerem que os pacientes com demência não estão em seu juízo perfeito para avaliar sua própria capacidade e que um teste prático, dirigindo um veículo, deve ser realizado para avaliar melhor essas habilidades.[41]

Avaliação ambiental

É necessária uma atenção especial à questão da segurança do paciente em casa, principalmente daqueles que vivem sozinhos ou cujos familiares puderem dar muito pouco apoio. Um terapeuta ocupacional deve realizar uma avaliação da segurança domiciliar, bem como uma avaliação das necessidades de transporte, condução de veículos e autocuidado. As quedas, em particular, podem ser limitantes, e talvez seja necessário fazer algumas mudanças para garantir a segurança no domicílio. A fisioterapia e consultas de terapia ocupacional podem proporcionar estratégias úteis para evitar lesões. Um ambiente de sono seguro deve ser assegurado para os pacientes com distúrbio comportamental do sono de movimento rápido dos olhos (REM).[42]

A adesão aos medicamentos deve ser monitorada em casa, e as listas de medicamentos devem ser revisadas a cada consulta.

Suporte para a família e cuidadores

A orientação e apoio aos cuidadores é parte integrante do plano de cuidados de qualquer paciente com demência. Existem evidências de que os cuidadores acreditem ser particularmente difícil lidar com a depressão, a apatia, a flutuação cognitiva e, especialmente, os sintomas psicóticos associados com a DCL.[43] Os cuidadores devem ser informados sobre as técnicas de enfrentamento e sobre as organizações de apoio locais e nacionais, como a Lewy Body Dementia Association. Lewy Body Dementia Association Opens in new window O Savvy Caregiver Program é um programa psicoeducacional validado para cuidadores, que foi adaptado para comunidades com diversidade racial e étnica como um programa on-line "tele-savvy".[44][45][46]

Assistência domiciliar, serviços de repouso e cuidados domiciliares

Muitos pacientes precisam de ajuda profissional em casa para proporcionar descanso à família, bem como supervisão e assistência ao paciente. Os serviços de creche para adultos podem proporcionar descanso aos cuidadores e pacientes e podem ser usados conjuntamente com os cuidados domiciliares.

Em muitos casos, o cuidado domiciliar contínuo não é mais possível em virtude da natureza da situação de cuidado (por exemplo, cônjuge que não pode se aposentar) ou de comportamentos problemáticos. Os pacientes que necessitam de cuidados domiciliares devem ser assistidos em uma unidade especializada em demência.

Intervenções não farmacológicas e comportamentais

As evidências de eficácia de intervenções não farmacológicas e comportamentais para pacientes com DCL são limitadas devido à falta de ensaios clínicos adequados. No entanto, essas intervenções demonstraram ser valiosas em outros tipos de demência (por exemplo, DA) e para psicose.[47]

As intervenções com algumas evidências de eficácia para demência incluem as seguintes:

  • Intervenções psicológicas (por exemplo, terapia cognitivo-comportamental e treinamento cognitivo) podem melhorar a cognição e os distúrbios comportamentais e reduzir os sintomas de ansiedade e depressão em indivíduos com demência.[48][49][50] [ Cochrane Clinical Answers logo ]

  • O exercício pode melhorar o declínio cognitivo, as atividades da vida diária e os distúrbios motores.[47]

  • Intervenções multifatoriais, inclusive atividade física, terapia ocupacional e musicoterapia, podem ser eficazes para a psicose na demência.[47]

  • Relatou-se que as intervenções baseadas em música melhoram moderadamente os sintomas de depressão e, possivelmente, o comportamento, o bem-estar emocional e a ansiedade nos pacientes com demência, mas têm pouco ou nenhum efeito sobre a cognição, a agitação ou a agressividade.[50][51]

  • Massagem terapêutica, intervenções assistidas por animais e intervenções personalizadas podem reduzir a agitação na demência.[52]

Inibidores da colinesterase e memantina para sintomas cognitivos e comportamentais.

Semelhante à DA, o tratamento de primeira linha para o comprometimento cognitivo e os sintomas comportamentais na demência com corpos de Lewy (DCL) é feito com inibidores da colinesterase.[1][53][54] [ Cochrane Clinical Answers logo ] Os três inibidores da colinesterase usados com maior frequência são a donepezila, rivastigmina e galantamina.

Donepezila e rivastigmina demonstraram melhorar a cognição e os sintomas comportamentais sem exacerbação significativa dos sintomas motores na maioria dos casos; as evidências de eficácia de galantamina são limitadas.[32][36][37] No entanto, podem ocorrer náuseas, vômitos, salivação em excesso, sonhos vívidos, sonolência, hipotensão ortostática e síncope.[55] Os efeitos adversos do uso crônico de inibidores da colinesterase incluem a perda de peso, coriza e cãibras musculares.

O antagonista do receptor de N-metil-D-aspartato (NMDA) memantina é bem tolerado, embora as evidências de eficácia na DCL (como monoterapia ou combinado com um inibidor da colinesterase) sejam mistas e limitadas.[32][36][53][56][57]

Sintomas de psicose

Abordagens não farmacológicas são o tratamento de primeira linha para psicose na demência. Elas incluem fornecer um ambiente confortável com iluminação adequada, corrigir a visão e diminuir os fatores desencadeantes visuais. Aumentar o envolvimento social e as atividades diárias pode ajudar a mascarar os sintomas psicóticos.

É importante identificar e controlar adequadamente os potenciais fatores precipitantes para psicose; por exemplo, infecções subjacentes, privação de sono, desidratação e dor intensa.

Antipsicóticos

O uso de antipsicóticos para o manejo do quadro agudo de distúrbios comportamentais em pacientes com DCL deve ser evitado ao máximo, devido ao risco de aumento dos efeitos adversos e da mortalidade.[1][32] As possíveis complicações incluem aumento da rigidez, imobilidade, confusão, sedação, quedas posturais, ganho de peso, diabetes e aumento do risco de mortalidade.[55] Reações graves de sensibilidade a antipsicótico foram registradas em até 50% dos pacientes com demência com corpos de Lewy (DCL).[1][32]

A American Psychiatric Association recomenda reservar os antipsicóticos para sintomas considerados graves e perigosos e/ou que causem sofrimento significativo, e avaliar a eficácia e os efeitos adversos para equilibrar continuamente a relação de risco/benefício em cada caso.[58] O uso de antipsicóticos em pacientes com demência não é uma indicação registrada da Food and Drug Administration dos EUA ou de agências reguladoras similares.

Antipsicóticos atípicos de baixa dose podem ser considerados em situações agudas ou para sintomas graves que não respondem a outros tratamentos (tratamentos não farmacológicos e inibidores da colinesterase), em que é tomada uma decisão equilibrada na qual os benefícios superam os riscos.[1][32] Antipsicóticos típicos não devem ser usados devido a sua tendência de agravar o parkinsonismo. O paciente e seus familiares devem ser envolvidos na tomada de decisões antes de iniciar um antipsicótico. Deve-se procurar a orientação de um especialista sobre a escolha do medicamento e a dosagem, e os medicamentos devem ter as doses ajustadas em incrementos bem pequenos. Recomenda-se fazer um rastreamento de doenças cardíacas e um eletrocardiograma (ECG) basal.

Não há evidências para dar suporte ao uso de antipsicóticos atípicos particulares em pacientes com DCL.[1][32][59] A quetiapina é bem tolerada e não piora a função motora, mas não há evidências de eficácia suficientes. A clozapina demonstrou ser eficaz para tratar a psicose associada com a doença de Parkinson, mas sua eficácia e tolerabilidade na DCL não foi estabelecida. A risperidona pode melhorar a agitação na demência, mas está associada com sintomas extrapiramidais. Pimavanserin (um antipsicótico com agonismo e antagonismo inversos específicos para o receptor de 5-HT2A) mostrou efeitos antipsicóticos em pacientes com psicose associada com doença de Parkinson ou demência.[1][32][60]

Psicose ou distúrbios afetivos graves podem exigir a hospitalização do paciente, mas a maioria das comorbidades psiquiátricas pode ser tratada com cuidados ambulatoriais.

Distúrbio comportamental do sono REM (DCR)

DCR geralmente acompanha a DCL.

O clonazepam é um tratamento estabelecido para o DCR, e deve ser administrado em doses baixas.[1][22][23][32][42]​​ Cerca de 90% dos pacientes respondem ao tratamento quando administrado 30 minutos antes de deitar; não foi observada nenhuma tolerância.[61] Deve-se evitar a supressão abrupta. A melatonina de liberação imediata também tem sido defendida como tratamento de primeira linha para o DCR, embora as evidências de sua eficácia sejam mistas. A melatonina pode ser mais segura que o clonazepam para os pacientes idosos, pois o clonazepam pode ser metabolizado lentamente, além de aumentar os riscos de piora da cognição, comprometimento da marcha e quedas.[1][22][23][42]

Depressão e/ou ansiedade comórbidas

A depressão e a ansiedade são comuns em pacientes com DCL. Devem ser consideradas intervenções não farmacológicas.[48][62]

Embora não existam estudos controlados específicos para o tratamento medicamentoso de depressão em pacientes com DCL, as opçõpes incluem inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRSs), como sertralina ou citalopram, inibidores de recaptação de serotonina-noradrenalina, como venlafaxina, e mirtazapina, devido ao seu perfil limitado de efeitos adversos e à farmacocinética favorável. O tratamento deve ser orientado pela tolerabilidade e resposta individual do paciente.[1] [ Cochrane Clinical Answers logo ] Os antidepressivos com atividades anticolinérgicas (por exemplo, tricíclicos) devem ser evitados. A fluoxetina de ação prolongada (um ISRS) pode ser apropriada nos casos em que a dosagem diária não seja viável. Os pacientes com demência avançada podem precisar de preparações líquidas.

Os ansiolíticos (como buspirona) podem ser úteis. Os inibidores da colinesterase ou memantina podem ter alguma eficácia nesse sentido.[63][64] Os benzodiazepínicos podem causar sedação durante o dia, e reações paroxísticas podem ocorrer quando novos medicamentos são iniciados. O alprazolam pode ser usado para controle de ansiedade, mas pode causar sedação, e convulsões de abstinência foram relatadas.[65]

Distúrbio comportamental agudo e ansiedade grave com ou sem agitação

Para pacientes com distúrbio comportamental agudo, o tratamento é orientado pelas alterações comportamentais: se são primárias (devido à demência subjacente), secundárias (por exemplo, devido a uma doença comórbida, polimedicação, desidratação, dor, falta de sono) ou mista (alterações primárias exacerbadas por alterações secundárias ou vice-versa). O tratamento de causas secundárias geralmente alivia os distúrbios comportamentais associados.

Para alterações comportamentais primárias graves, os antipsicóticos atípicos podem ser usados com precaução para psicose ou sintomas similares a mania com agressividade intensa, se os benefícios superarem os riscos.[1][32] Um estabilizador do humor, como o valproato, também pode ser considerado juntamente com medicamentos psicotrópicos para ajudar a aliviar a agressividade.[66]

Pacientes com sintomas motores significativos

Devido aos possíveis efeitos adversos, os sintomas motores só deverão ser tratados com medicação se forem graves e se interferirem nas atividades da vida diária. Se necessário, os agentes dopaminérgicos, normalmente a levodopa, devem ser administrados em uma pequena dose inicial e ajustados lentamente.[1][32] Poucos ensaios clínicos controlados estão disponíveis, e deve-se ter cuidado com o possível agravamento da cognição, alucinações e comportamento. Uma resposta motora significativa é observada em aproximadamente um terço dos pacientes, e os pacientes mais jovens respondem melhor. Frequentemente observa-se uma duração limitada da resposta.[67][68]

Cuidados paliativos e no final da vida

Os cuidados na fase avançada/terminal incluem medidas paliativas, escolhas de fim da vida e discussão dos objetivos dos cuidados com a família.[38][39][40]

As preferências do paciente e seus familiares em relação às intervenções no final da vida - inclusive tratamento, ressuscitação e prolongamento da vida quando surgirem condições tratáveis - devem ser discutidas no início da evolução da doença.

Os cuidados no final da vida geralmente se concentram em fornecer conforto e necessidades básicas (por exemplo, ajuda com alimentação e limpeza, controle adequado da dor, bons cuidados com a pele e prevenção de lesões por quedas ou desventuras). Cuidados extremamente agressivos, como alimentação por tubo enteral, podem agravar a morbidade, sem evidências de melhora na qualidade de vida, sobrevida ou desfecho.[69]

O uso deste conteúdo está sujeito ao nosso aviso legal