Abordagem

O tratamento eficaz do movimento paradoxal das pregas vocais (MPPV) começa e se baseia em uma abordagem de equipe abrangente no contexto de uma equipe multidisciplinar experiente e com os conhecimentos necessários. A equipe pode incluir o médico de atenção primária, um especialista em alergia/asma, um cardiologista, um pneumologista, um otorrinolaringologista, um fonoaudiólogo, um especialista em medicina esportiva, um psicólogo, um psiquiatra e/ou um gastroenterologista.

A combinação de tratamento comportamental, tratamento clínico do refluxo e da asma e aconselhamento (se indicado) tem uma alta taxa de êxito na eliminação dos ataques respiratórios paradoxais, mas o tratamento precisa ser adaptado para cada indivíduo, pois um plano de tratamento global para todos não é útil.[24]

Tratamento de emergência

Os indivíduos com MPPV não diagnosticado comparecem frequentemente no pronto-socorro com ataques respiratórios de início súbito, e muitas vezes são erroneamente diagnosticados com exacerbação aguda de asma. Geralmente esses pacientes apresentam as seguintes características:

  • Prescrição de altas doses de medicamentos para asma

  • Várias visitas ao pronto-socorro

  • História pregressa de intubação ou traqueotomia[83]

  • Contagem de imunoglobulina E (IgE) baixa e contagem de eosinófilos normal[76]

  • Queixas nasais com tomografia computadorizada (TC) dos seios da face negativa

  • Curvas de fluxo-volume inspiratório normais ou truncadas.[78]

O quadro do ataque respiratório agudo no MPPV é variável e definido de forma imprecisa pelo paciente. Pode incluir estridor inspiratório, sibilo (inspiratório ou bifásico), dispneia, pânico, incapacidade de inspirar profundamente e/ou tensão na garganta.

Para permitir a diferenciação entre o MPPV e uma exacerbação aguda de asma, pode-se proceder da seguinte forma:

  • Peça ao paciente para arquejar ou prender a respiração: os pacientes com ataque agudo de asma não conseguirão realizar nenhuma das duas tarefas, e a dificuldade para respirar poderá se intensificar, ao passo que os pacientes com MPPV provavelmente apresentarão uma melhora ao arquejarem.[21]

O tratamento imediato de um paciente que compareça ao pronto-socorro com estridor inspiratório é o seguinte:

  • Deve-se determinar a estabilidade do paciente com avaliação e suporte das vias aéreas, da respiração (monitoramento da frequência respiratória e da saturação de oxigênio, oxigênio em alta concentração >60%) e da circulação (monitoramento do pulso e da pressão arterial [PA]). O MPPV não causa tipicamente instabilidade; se houver instabilidade, deve-se levar em consideração outras possíveis condições.

  • Os pacientes com obstrução progressiva das vias aéreas devem receber o tratamento clínico de emergência apropriado conforme a unidade.[62][84]

  • Os pacientes estáveis, sem sinais de obstrução progressiva das vias aéreas nem insuficiência cardíaca ou outra insuficiência pulmonar, devem receber oxigênio para sentirem conforto, devem ser acalmados com tranquilização contínua e encorajamento positivo, e devem ser orientados a fazer exercícios de respiração (inspirar pelo nariz e expirar pela boca, e fungar repetidamente); essas medidas devem ser continuadas ininterruptamente até que o ataque respiratório cesse.

  • Os pacientes estáveis devem em seguida ser investigados com laringoscopia flexível para se confirmar e documentar a presença de MPPV.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Laringe normal: cor normal das pregas vocais e das estruturas circundantes, pregas vocais com bordos regularesDo acervo da University of Wisconsin School of Medicine and Public Health [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@52d77adb[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Reprodução do ataque respiratório: adução do complexo aritenoideo durante a inalaçãoDo acervo da University of Wisconsin School of Medicine and Public Health [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@7205fb19

  • Se as medidas acima fracassarem na remissão do ataque respiratório, pode ser administrado heliox por meio de uma máscara.[85] O heliox é uma mistura de oxigênio e hélio (nas proporções 20:80, 30:70 ou 40:60) que causa uma redução da turbulência do fluxo aéreo por meio do relaxamento da laringe, permitindo uma resolução rápida dos sintomas e da ansiedade.[21][86]

  • Se o paciente perder a consciência, as vias aéreas, a respiração e a circulação devem ser monitoradas rigorosamente, e deve haver suporte às vias aéreas prontamente disponível. Se os sinais vitais se agravarem ou se a saturação de oxigênio diminuir, o paciente deve receber o tratamento clínico de emergência apropriado conforme a unidade. Isso deverá suscitar a investigação de uma causa que não o MPPV.

  • A intubação deve ser evitada, pois no MPPV os ataques respiratórios são autolimitados.

Terapia comportamental

O fonoaudiólogo é considerado o profissional de saúde primário para manejo comportamental relacionado ao MPPV. Fonoaudiólogos possuem conhecimento e treinamento especializados em relação às vias aéreas laríngeas.[71][87][88]

A terapia de controle laríngeo tem como objetivo eliminar o comportamento respiratório adutor, a fim de abrir as vias aéreas. A finalidade do plano de tratamento é não apenas promover o relaxamento, mas também cultivar a percepção do feedback fisiológico sutil proporcionado pelo corpo. Para se obter êxito com o manejo comportamental dos ataques respiratórios, é necessário proporcionar aos pacientes uma compreensão clara do ataque respiratório, das suas causas e dos fatores desencadeantes, pois se o paciente não tiver confiança na sua própria capacidade de parar ou prevenir o ataque, a gravidade desse pode aumentar.

As metas do manejo comportamental incluem:

  • Aumento da autoconsciência da tensão muscular física: ensina-se ao paciente a reconhecer um aumento da tensão muscular no corpo e a iniciar um exercício respiratório de abdução antes que o ataque respiratório aumente até atingir uma situação assustadora

  • Aumentar a percepção do início de um ataque respiratório e das respostas fisiológicas aos fatores desencadeantes conhecidos

  • Retomada da respiração diafragmática após manejo bem-sucedido de um ataque agudo[65]

  • Tratamento do refluxo laringofaríngeo (RLF), ataques respiratórios, pigarro crônico e tosse

  • Prevenção de ataques futuros

  • Desviar a atenção do tratamento clínico[89]

  • Implementação de um programa de manutenção do comportamento.

Os pacientes com MPPV devido a um irritante específico, no qual a sensibilidade ao odor desencadeia a resposta laríngea típica do MPPV, podem considerar o próprio odor como sendo a causa dos sintomas. Nesses casos pode ser necessária uma terapia comportamental, para reduzir a resposta condicionada a odores específicos, e o paciente deve ser aconselhado a evitar ou minimizar a exposição a odores de produtos químicos.[90]

É possível também utilizar terapia comportamental para reduzir a resposta condicionada a outros fatores desencadeantes do MPPV, como exercício, ações como sentar, comer e dormir, irritantes transportados pelo ar (fumaça, perfume), temperaturas extremas e estresse.[3] Os pacientes com MPPV associado a um irritante específico devem ser submetidos também a testes de alergias para a identificação de possíveis alérgenos. Manter um diário pode ser útil para os indivíduos com baixa percepção de ataques respiratórios, fatores desencadeantes, dieta e estresse físico/psicológico, para ajudar a identificar possíveis fatores desencadeantes.[1]

O tratamento comportamental com o fonoaudiólogo deve incluir no mínimo 3 a 4 visitas para se obter o melhor desfecho. Se o paciente não apresentar resposta clínica após o manejo comportamental, poderá ser necessário um tratamento comportamental adicional com o fonoaudiólogo.

Como o estresse pode estar associado ao MPPV, os pacientes devem ser incentivados a procurar vias de alívio e controle do estresse. Tais vias podem incluir aconselhamento psicológico, exercício e modificação de um estilo de vida estressante.[65]

Como os atletas frequentemente apresentam ataques de MPPV em níveis muito altos de exercício físico ou durante competições, um retreinamento respiratório adicional pode ser efetuado no local do evento esportivo.

  • Uma avaliação dos padrões respiratórios durante o exercício no evento esportivo específico revela frequentemente áreas de tensão muscular na parte superior do corpo que contribuem para a tensão dos músculos laríngeos intrínsecos e extrínsecos.

  • Exercícios respiratórios baseados na atividade devem ser introduzidos a um ritmo lento e em seguida aumentados até serem eficazes no nível competitivo.

  • O envolvimento e a educação do técnico ou treinador e o manejo comportamental da condição ajudarão a obter um desfecho positivo.

As crianças podem precisar de uma terapia mais intensiva envolvendo:

  • Manejo comportamental frequente

  • Educação e envolvimento dos pais no plano de tratamento

  • Educação do pessoal de apoio na escola da criança sobre os sinais e sintomas de um ataque respiratório, e sobre como efetuar os encaminhamentos apropriados para diagnóstico e tratamento

  • Uma pessoa de contato na escola, como enfermeiro ou assistente em sala de aula, que possa ajudar a apoiar e orientar os exercícios de recuperação, conforme necessário.[65]

A ineficácia do tratamento e a diminuição da adesão do paciente, se evidentes, ocorrerão mais provavelmente durante o manejo comportamental.

  • Os pacientes sem uma boa compreensão do MPPV e da eficácia dos exercícios respiratórios podem não seguir o plano de tratamento recomendado e, portanto, podem não obter qualquer benefício durante um ataque respiratório.

  • Alguns pacientes precisarão de várias sessões de tratamento com o fonoaudiólogo para criar um programa individualizado bem-sucedido.

  • Os pacientes precisam dedicar tempo e esforço para desenvolver a percepção pessoal e se envolver ativamente nos planos comportamentais concebidos para melhorar a função laríngea e diminuir ou eliminar as irritações laríngeas e os comportamentos prejudiciais.

  • Um indivíduo com baixa autopercepção pode precisar de orientação adicional para identificar os fatores desencadeantes e a tensão muscular física.

Biofeedback visual

Uma das medidas mais importantes para ajudar os pacientes a compreenderem o problema do MPPV e como eles poderão controlar o ataque é oferecer biofeedback durante a visualização laríngea diagnóstica.[65] Isso deve ser feito com todos os pacientes com MPPV.

  • Um exercício respiratório de abdução, que consiste em uma inspiração profunda pelo nariz seguida de uma exalação de 3 a 10 segundos de duração, deve ser introduzido durante a visualização.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Exercício respiratório de abdução: abdução do complexo aritenoideo bilateralmente com inalação nasalDo acervo da University of Wisconsin School of Medicine and Public Health [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@5490764f

  • Esse método de biofeedback aumenta o conhecimento e a compreensão do paciente sobre o MPPV e o controle das vias aéreas, e estabelece uma atitude mental propícia ao manejo comportamental independente.

Depois que os pacientes compreenderem que possuem um meio de controlar o ataque respiratório, eles expressam alívio e confiança.

Tratamento clínico de comorbidades

Todos os pacientes com suspeita ou confirmação de MPPV devem ser rigorosamente avaliados e devem receber tratamento apropriado para eventuais condições médicas subjacentes.

  • A meta principal do tratamento clínico é estimular a recuperação do tecido laríngeo e reprogramar os estímulos do sistema nervoso central para regular a laringe, restabelecendo assim a proteção das vias aéreas e os reflexos respiratórios normais.

  • O tratamento clínico pode ser necessário para asma, sintomas no trato respiratório superior, doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), RLF, tosse crônica ou doenças cardíacas e pulmonares. Ele deve ser conduzido pelo especialista apropriado e adaptado ao paciente individual.

  • Os pacientes com altos níveis de estresse e ansiedade devem ser avaliados para verificar se há presença de ansiedade clínica, e devem ser tratados adequadamente.

Psicoterapia

Foi observado que os adolescentes com disfunção das pregas vocais e asma coexistente apresentam mais sintomas de ansiedade que os adolescentes com asma crônica de moderada a grave isolada.[22] Os indivíduos com MPPV também apresentam um alto grau de ansiedade de separação, uma condição associada a ataques de pânico.[22]

Muitos estudos têm associado ambientes estressantes e ansiedade a ocorrência de MPPV,[17][22][52] e há indícios da presença de ansiedade e possivelmente de transtorno de conversão nessa condição.[17][22][51][53]

O encaminhamento para psicoterapia pode ser benéfico para:

  • Indivíduos nos quais há suspeita de presença de fatores psicológicos associados aos ataques respiratórios

  • Atletas encaminhados a um especialista em psicologia do esporte, com cuja ajuda a atenção do atleta é concentrada em questões relacionadas com as competições, as vitórias e como lidar com as derrotas e com as expectativas.

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