Abordagem
A falta de compreensão e consciência do movimento paradoxal das pregas vocais (MPPV) entre os médicos de atenção primária e/ou os médicos especialistas, incluindo os gastroenterologistas, pode ser causada pela falta de investigações específicas para esse distúrbio e pela confusão decorrente do grande número de termos usados para identificá-lo. Consequentemente, o médico pode não se aperceber do MPPV, contribuindo assim para o atraso do seu diagnóstico e tratamento.[63]
O diagnóstico se baseia na história clínica, nos testes de função pulmonar (TFPs) e na visualização laríngea.[24][64] As manifestações clínicas do MPPV representam um contínuo do pigarro crônico e da tosse crônica até o MPPV e o laringoespasmo, cada um refletindo diferentes graus de proteção hiperfuncional das vias aéreas.
É possível seguir uma via clínica simples quando o paciente apresenta preocupações com ataques respiratórios não diagnosticados ou ataques respiratórios que não respondem ao tratamento.[65] Quando outra doença das vias aéreas já tiver sido diagnosticada e tratada, a persistência de ataques respiratórios não controlados deve ser encaminhada para um otorrinolaringologista e para um fonoaudiólogo especializados.
Como os ataques de MPPV causam medo no paciente e nas pessoas que o rodeiam, o paciente precisa ter confiança na equipe, que, por sua vez, deve ter certeza sobre a sua própria capacidade de realizar um diagnóstico preciso. Essa combinação irá reduzir as intervenções farmacológicas desnecessárias e os comparecimentos ao pronto-socorro desnecessários.
Características da apresentação
O quadro clínico mais comum do MPPV é a descrição de um ataque respiratório agudo, especificamente com tensão na garganta e dificuldade para inalar profundamente, com consequente falta de ar.
Os ataques ocorrem de forma episódica, como resposta a fatores desencadeantes específicos, e não são caracterizados por dificuldade respiratória crônica nem por dispneia crônica.
Os sintomas apresentam uma característica rapidez de início e resolução. A dificuldade respiratória ocorre como resposta a um fator desencadeante e remite com a eliminação de tal fator desencadeante.
Os fatores desencadeantes podem incluir exercício, ações como sentar, comer e dormir, irritantes transportados pelo ar (por exemplo, fumaça, perfume, odores de produtos químicos),[48] temperaturas extremas e estresse.[3]
Os pacientes podem relatar MPPV como resposta a irritantes transportados pelo ar[48] que não eram fatores desencadeantes antes do evento inicial de MPPV.
Os pacientes que tenham sido anteriormente diagnosticados ou tratados para asma tendem a relatar a ausência de benefício com corticosteroides ou broncodilatadores por via inalatória.
Tosse crônica e movimento paradoxal das pregas vocais (MPPV) compartilham atributos semelhantes, embora idade elevada e sintomas de refluxo laringofaríngeo (RLF) tenham maior probabilidade de resultar em tosse crônica.[66] Foi relatado que a tosse está associada com o MPPV em até 59% dos casos.[1] Para além da asma e gotejamento pós-nasal, a tosse pode estar relacionada com exposição distal e proximal a ácido, microaspiração para as vias aéreas superiores e disfagia.[47] A tosse é considerada como pertencente ao contínuo do comportamento adutor das pregas vocais em resposta a estímulos sensoriais.
Outros sintomas comuns de MPPV incluem estridor inspiratório, sibilo inspiratório e bifásico, disfonia e dispneia episódica. Também pode haver sintomas de alterações na voz.[34][67] A perda da consciência é um sintoma incomum, mas grave. Ela pode ocorrer em decorrência de uma série de razões, incluindo hiperventilação ou ansiedade.
Tensão laríngea palpável (com elevação laríngea, dor e/ou sensibilidade ao redor da laringe e estreitamento do espaço tiro-hioideu.[68]) é um achado comum no exame clínico.[30]
História médica pregressa e fatores de risco
Várias condições clínicas e atividades foram identificadas como fatores de risco para o desenvolvimento de MPPV.[64] Portanto, todos os pacientes com suspeita de MPPV devem ser avaliados quanto à história relativa ao seguinte:
Refluxo laringofaríngeo (RLF) - uma pontuação do índice de sintomas de refluxo (RSI, do inglês Reflux Symptom Index) >13 indica uma correlação com o RLF (pontuação de sintomas autoadministrada de 9 perguntas; 0-45 pontos)[46]
Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE)
Asma
Infecção respiratória do trato superior
Ansiedade e estresse (emocional e físico)
Atividades atléticas competitivas
Atrofia de múltiplos sistemas (AMS)
Disfonia de tensão muscular
Distonia laríngea respiratória adutora
Cirurgia recente com intubação.
Exclusão de condições relacionadas
Quando um indivíduo consulta o médico de atenção primária e relata tosse crônica e/ou ataques respiratórios, é possível seguir uma via clínica simples.[65]
O MPPV pode ser considerado como um diagnóstico por exclusão, uma vez descartadas outras causas de tosse crônica e ataques respiratórios:
Doença reativa das vias aéreas: o MPPV é frequentemente confundido com asma, o que leva a intervenções médicas desnecessárias, desde farmacologia à hospitalização[69]
Outra doença pulmonar
Outra doença ou obstrução laríngea
Doença cardíaca
Doença do refluxo gastroesofágico (DRGE)
Doença neurológica.
Antes da avaliação e do tratamento por otorrinolaringologia/fonoaudiologia, o paciente deve ser encaminhado para:
Avaliação e tratamento da asma: asma pode coexistir com o MPPV em 14% a 56% dos indivíduos.[19][22][49][50] Portanto, o diagnóstico e o controle da asma por um especialista são importantes para iniciar a diferenciação dos ataques respiratórios. Antes do diagnóstico de movimento paradoxal das pregas vocais (MPPV), os pacientes com ataques respiratórios são frequentemente tratados para asma por vários anos, com broncodilatadores e corticosteroides.
Avaliação cardíaca e tratamento: para os pacientes com suspeita de problemas respiratórios de origem cardíaca, podem ser indicados eletrocardiograma (ECG) e prova de esforço. Deve-se considerar a mudança de medicamentos nos pacientes com tosse crônica que estejam sendo tratados com inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECAs).
Radiografia torácica: os pacientes com MPPV puro apresentarão imagens torácicas normais.[48]
Quando outra doença das vias aéreas já tiver sido diagnosticada e tratada, a persistência de ataques respiratórios não controlados deve ser encaminhada para um otorrinolaringologista e para um fonoaudiólogo especializados.
Formulário de caso clínico
Os pacientes devem preencher um formulário de caso clínico para orientar a investigação do médico quanto à natureza dos ataques respiratórios e quanto aos fatores desencadeantes, à história médica e, o que é mais importante, à conscientização do paciente. O Dysphonia Index foi desenvolvido como uma medida de autoidentificação levada a cabo por pacientes para avaliar sintomas das vias aéreas superiores. Isso pode ser incluído na história clínica e também pode ser usado para avaliar os desfechos do tratamento.[70][71]
Alguns pacientes serão capazes de diferenciar claramente a asma de outros ataques respiratórios, de identificar o início do problema, e de especificar os fatores desencadeantes. Outros irão simplesmente relatar que têm dificuldade para respirar ou tosse.
O investigador clínico deverá lidar com vários problemas para auxiliar no processo de descoberta e aprendizagem. É preciso indagar sobre os seguintes aspectos aos adolescentes e aos adultos:
Sua programação diária
Atitude em relação ao sucesso
Até que ponto os ataques respiratórios interferem na vida cotidiana ou em objetivos específicos.
Pode ser cogitada a identificação de situações de estresse e situações profissionais e/ou pessoais complexas. Os pacientes devem entender que o estresse e os problemas emocionais podem ser fatores ligados a um aumento do RLF e do MPPV.
Imagens da laringe
A nasoendoscopia com fibra óptica flexível é realizada por um fonoaudiólogo experiente ou por um otorrinolaringologista especializado e constitui a investigação primária para todos os pacientes com suspeita de MPPV,[19][23][24][34][72] pois ela permite:
A visualização completa da laringe durante a respiração em repouso, a fala e a deglutição[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Laringe normal: cor normal das pregas vocais e das estruturas circundantes, pregas vocais com bordos regularesDo acervo da University of Wisconsin School of Medicine and Public Health [Citation ends].
A visualização da laringe enquanto o paciente reproduz o ataque respiratório e/ou a respiração ruidosa[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Reprodução do ataque respiratório: adução do complexo aritenoideo durante a inalaçãoDo acervo da University of Wisconsin School of Medicine and Public Health [Citation ends].
A identificação da adução durante a inspiração ou expiração precoce durante um estado assintomático, durante os sintomas ou mediante estudo provocativo para corroborar um diagnóstico de MPPV[34]
A exclusão de outras etiologias, incluindo obstrução das vias aéreas superiores, lesões com efeito de massa, laringomalácia, tremor laríngeo, paresia/paralisia das pregas vocais e insuficiência fonatória pós-intubação.[73]
Pode ser possível apresentar uma laringe assintomática e ainda atender aos critérios para diagnóstico de MPPV.[74]
teste de função pulmonar (TFP)/traçado de fluxo-volume
Para todos os pacientes com suspeita de MPPV recomenda-se a realização de TFPs e traçados de fluxo-volume, para determinar as curvas de fluxo-volume, os quais podem corroborar ou descartar a presença de MPPV. Esses testes podem ser realizados antes ou depois da avaliação por um otorrinolaringologista e por um fonoaudiólogo.
Os TFPs revelam capacidade pulmonar total normal.
A espirometria pode ajudar na diferenciação entre distúrbios das vias aéreas restritivos e obstrutivos, e pode revelar asma comórbida ou outras patologias pulmonares restritivas ou obstrutivas.
O traçado de fluxo-volume mostra um ciclo inspiratório truncado.
Pacientes com MPPV apresentam baixa capacidade vital forçada, baixa capacidade vital inspiratória forçada e baixo volume inspiratório forçado em 0.5 segundo da fase inspiratória.[75]
A espirometria proporcionará resultados diagnósticos, mas o paciente pode necessitar de uma avaliação mais avançada, com broncoprovocação no exercício em um laboratório pulmonar.
Tomografia computadorizada (TC) dos seios da face
Uma imagem por TC dos seios nasais mostra inflamação mínima ou ausente dos seios nasais[76] no MPPV. Os pacientes com queixas nasais devem ser encaminhados para a otorrinolaringologia para uma avaliação nasal e dos seios nasais completa.
Teste de discriminação sensorial da laringe
Nessa investigação, um estímulo composto por um pulso de ar é aplicado na mucosa laríngea (inervada pelo nervo laríngeo superior) por meio de uma nasoendoscopia com fibra óptica flexível para determinar o seu nível de sensibilidade.[77]
Pacientes com MPPV e RLF,[33] assim como pacientes com DRGE e tosse,[45] apresentam diminuição da sensibilidade laríngea, conforme avaliada por meio do teste de discriminação sensorial da laringe.
O teste de discriminação sensorial da laringe tem sido relatado, mas não é realizado de forma rotineira em todos os centros, e há pesquisas em andamento sobre a sua eficácia.
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