Abordagem
As principais metas no tratamento do estado hiperosmolar hiperglicêmico (EHH) são:
Restauração do deficit de volume. A fluidoterapia deve ser iniciada imediatamente depois das avaliações laboratoriais iniciais. A infusão de cloreto de sódio 0.9% deve começar a uma taxa de 1 a 2 L/hora para a primeira hora
Remissão da hiperglicemia
Correção das anormalidades eletrolíticas (o nível de potássio deve ser >3.3 mmol/L [<3.3 mEq/L]) antes do início da terapia com insulina). O uso de insulina em um paciente com hipocalemia pode reduzir mais ainda o potássio sérico em virtude do deslocamento do potássio para o espaço intracelular, que pode resultar em paralisia respiratória, arritmias cardíacas e morte
O tratamento de eventos desencadeantes e prevenção de complicações.
Embora seja possível tratar o EHH leve e descomplicado em unidades de tratamento intermediário ou de redução gradual, muitos casos exigirão cuidados em unidade de terapia intensiva (UTI). O sucesso do tratamento requer o monitoramento frequente dos parâmetros clínicos e laboratoriais para atingir os critérios de resolução. Deve-se manter um protocolo de tratamento e um fluxograma para registrar os estágios de tratamento e dados laboratoriais.[9]
Deve-se buscar o diagnóstico de fatores precipitantes, como infecção do trato urinário, pneumonia ou medicamentos causadores, bem como o tratamento adequado com antibióticos ou a remoção do medicamento desencadeante.[2]
Pacientes com instabilidade hemodinâmica, cardiovascular, respiratória ou estado mental alterado
O diagnóstico de instabilidade hemodinâmica é feito observando hipotensão e sinais clínicos de má perfusão de tecidos, incluindo oligúria, cianose, membros frios e estado mental alterado. Esses pacientes necessitam de internação urgente na UTI.
Após a admissão na UTI, é necessário um monitoramento frequente da pressão arterial e hemodinâmica. Também são necessários um cateter venoso central e/ou cateterismo de Swan-Ganz e oximetria percutânea contínua. A oxigenação e a proteção das vias aéreas são cruciais. Intubação e ventilação mecânica são comumente necessárias, com monitoramento constante dos parâmetros respiratórios.
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Cuidados de suporte
Devem-se realizar o diagnóstico de fatores precipitantes, como infecções ou medicamentos causadores, e o tratamento adequado (p. ex., antibióticos para a infecção ou a remoção de um medicamento desencadeante) em todos os pacientes, conforme apropriado.[2] O monitoramento do estado hemodinâmico, parâmetros respiratórios e débito urinário é essencial, particularmente em pacientes hemodinamicamente instáveis. O monitoramento frequente da glicose à beira do leito deve ser realizado a cada 1 a 2 horas até que a hiperglicemia seja corrigida.[2]
Após a avaliação laboratorial inicial, os eletrólitos séricos devem ser verificados a cada 2 a 4 horas, e o cálcio, fosfato de magnésio, ureia e creatinina são verificados a cada 2 a 6 horas, dependendo do quadro clínico do paciente e da resposta à terapia. A medição repetida dos níveis de cetonas no soro/urina não é indicada. Um fluxograma classificando esses achados, assim como o estado mental, sinais vitais, dose de insulina, fluidoterapia, terapia com eletrólitos e débito urinário, permite analisar com facilidade a resposta ao tratamento e remissão de crises.[9]
Fluidoterapia
Pacientes com depleção de volume grave (100 mL/kg ou aproximadamente 7 a 9 L, hipotensão ortostática ou supina, membranas mucosas ressecadas, turgor cutâneo diminuído) devem receber ressuscitação fluídica em associação com a fluidoterapia de manutenção. O estado da hidratação deve ser continuamente avaliado clinicamente. A maioria das diretrizes clínicas recomenda a administração de cloreto de sódio a 0.9% (soro fisiológico) como ressuscitação inicial devido à sua ampla disponibilidade, menor custo e eficácia na restauração do volume circulante em estudos clínicos.
No contexto de déficit de volume grave e choque e na ausência de comprometimento cardíaco, os pacientes devem receber cloreto de sódio a 0.9% em infusão de 15 a 20 mL/kg/hora ou 1 a 2 L durante a primeira hora.[2][44] Uma vez corrigida a hipotensão, a ressuscitação fluídica deve ser mantida com cloreto de sódio a 0.9% a 250 a 500 mL/hora.[44]
Adultos mais velhos ou pacientes com insuficiência cardíaca ou doença renal em estágio terminal em diálise devem ser tratados com cautela, com bolus menores de soluções isotônicas (por exemplo, bolus de 250 mL) e avaliação frequente do estado hemodinâmico.[3][54] Nesses pacientes, o uso de um protocolo padrão de reposição de fluidos pode estar associado a complicações relacionadas ao tratamento, incluindo sobrecarga de volume, ventilação mecânica e maior tempo de internação.[54]
A fluidoterapia de manutenção é baseada no nível de sódio sérico corrigido. Sódio corrigido (mmol/L [mEq/L]) = sódio medido (mmol/L) + 0.016 x (glicose sérica - 100).
Em pacientes com EHH, o tempo usual para resolução da hiperglicemia é entre 8 e 10 horas e o declínio não deve exceder 5.0 a 6.7 mmol/L/hora (90 a 120 mg/dL/hora) para prevenir edema cerebral. A reposição de fluidos inicial diminuirá a concentração de glicose e a osmolalidade, causando um deslocamento de água para o espaço intracelular, o que pode resultar em um aumento no sódio sérico (uma redução de 5.6 mmol/L [100 mg/dL] resultará em um aumento de 1.6 mmol/L na concentração de sódio).[2][9][44]
O aumento inicial do sódio sérico não é uma indicação para administrar fluidos hipotônicos, e a administração de cloreto de sódio a 0.45% só é indicada se a osmolalidade não estiver diminuindo, apesar do equilíbrio hídrico positivo adequado e da administração apropriada de insulina. Para evitar uma queda muito rápida na osmolalidade, algumas pessoas recomendam que a insulina seja suspensa até que a glicose pare de cair com a administração inicial de fluidos isolada.[44]
Terapia para hiperosmolalidade
A osmolalidade plasmática é geralmente superior a 320 mmol/kg (320 mOsm/kg) no EHH. Da mesma forma, a taxa de declínio do sódio sérico não deve exceder 10 mmol/L em 24 horas e a taxa de queda na osmolalidade não deve ser maior que 3.0 a 8.0 mOsm/kg/hora para minimizar o risco de complicações neurológicas. Uma rápida redução da osmolalidade plasmática pode causar edema cerebral e, portanto, recomenda-se que a osmolalidade plasmática não seja reduzida por mais de 3 mmol/kg/hora (3 mOsm/kg/hora). Isso pode ser atingido pelo monitoramento da osmolalidade plasmática, adicionando dextrose à fluidoterapia intravenosa, uma vez que a glicose plasmática fique abaixo de 250 a 300 mg/dL, e selecionando a concentração correta de soro fisiológico intravenoso dependendo da concentração de sódio sérico.[44]
Vasopressores
Se a hipotensão persistir após a hidratação forçada, um agente vasopressor deve ser iniciado sob a supervisão de um especialista.[55] Os pacientes que requerem medicamentos vasoativos (vasopressores e/ou inotrópicos) precisam de monitoramento contínuo em um ambiente de cuidados intensivos.
Insulinoterapia
A meta é uma redução regular, mas gradual, da glicose sérica e da osmolalidade sérica (para reduzir o risco de complicações do tratamento; p. ex., hipoglicemia e hipocalemia) por uma insulinoterapia de baixa dose.
Uma infusão intravenosa contínua de insulina regular é usualmente recomendada se o potássio sérico for >3.3 mmol/L (>3.3 mEq/L). A insulina pode ser iniciada com um bolus seguido por uma infusão contínua.[2]
Se a glicose sérica não cair em pelo menos 10% na primeira hora, um novo bolus deve ser administrado, continuando a taxa de infusão de insulina anterior. Uma vez que a glicose sanguínea atingir 300 mg/dL ou menos, a infusão de insulina deve ser reduzida, mantendo a glicemia entre 200 e 300 mg/dL, até que o paciente esteja mentalmente alerta.[2]
Reduções rápidas nas concentrações de glicose sanguínea precisam ser evitadas para impedir alterações osmolares súbitas e edema cerebral. Em uma série de casos foi registrado que a duração média do tratamento até a correção da hiperglicemia é de 9 ± 1 hora.[15] A reposição de fluidos e a insulinoterapia de baixa dose diminuem a concentração de glicose plasmática a uma taxa de 2.8 a 4.2 mmol/L/hora (50 a 75 mg/dL/hora).
A administração subcutânea de insulina por meio de uma escala móvel isolada não é recomendada no tratamento de EHH.
Terapia com potássio
A insulinoterapia e a correção da hiperosmolalidade levam o potássio para dentro das células, podendo causar hipocalemia grave. A meta é manter os níveis de potássio na faixa normal, a fim de prevenir complicações da hipocalemia, incluindo a paralisia respiratória e a disritmia cardíaca. A insulinoterapia, a correção da acidose, a expansão do volume e o aumento da perda urinária de potássio diminuem o potássio sérico. Dentro de 48 horas após a internação, os níveis de potássio geralmente diminuem de 1 a 2 mmol/L em pacientes com cetoacidose diabética (CAD), EHH e CAD/EHH mistos. Para prevenir a hipocalemia, a reposição de potássio deve ser iniciada após os níveis séricos caírem abaixo de 5.0 mmol/L, com o objetivo de manter um nível de potássio de 4 a 5 mmol/L.
Se o potássio sérico basal estiver <3.3 mmol/L (<3.3 mEq/L):
A insulinoterapia deve ser adiada e o potássio deve ser reposto até >3.3 mmol/L (3.3 mEq/L; as diretrizes sugerem a reposição com 20 a 30 mmol [20 a 30 mEq] de potássio por litro de fluido de infusão, embora na prática recomendemos 10 a 20 mmol por litro).[2]
Se o nível de potássio sérico basal estiver de 3.4 a 5.2 mmol/L (3.4 a 5.3 mEq/L):
A reposição de potássio deve ser iniciada com 20 a 30 mmol/L (20 a 30 mEq/L) em cada litro de fluidoterapia intravenosa.[2]
Se o nível basal de potássio sérico for >5.3 mmol/L (>5.3 mEq/L):
a reposição de potássio não é necessária, mas os níveis devem ser verificados a cada 2 horas.[2]
Terapia com fosfato
O fosfato total fica baixo na SHH, mas a reposição de fosfato de rotina não resultou em benefícios clínicos para os pacientes.[4]
Na presença de hipofosfatemia grave (<0.32 mmol/L [<1 mg/dL]) em pacientes com disfunção cardíaca (por exemplo, sinais de disfunção ventricular esquerda), anemia sintomática ou depressão respiratória (por exemplo, diminuição da saturação de oxigênio), pode ser indicada uma terapia cuidadosa com fosfato para evitar a disfunção cardíaca, respiratória e musculoesquelética.[2]
Tratamento em curso
O tratamento e o monitoramento devem continuar até a remissão da SHH. Os critérios para a remissão da SHH são:[2]
Glicose plasmática normal
Osmolalidade plasmática normal
Hemodinâmica normal e melhora do estado mental.
Uma vez que o EHH se resolver e o paciente for capaz de tolerar a ingestão oral, a transição para a insulina subcutânea precisa ser iniciada. Os pacientes devem receber insulina subcutânea entre 1 a 2 horas antes do término da infusão de insulina, para permitir tempo suficiente para que a insulina subcutânea comece a funcionar.
A insulina de ação intermediária ou prolongada é recomendada para requisitos basais e a insulina de ação curta para o controle glicêmico prandial.
Inserção guiada por ultrassom de um cateter venoso central (CVC) não tunelizado na veia jugular interna direita, usando a técnica de inserção de Seldinger.
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