Abordagem

A suspeita e o diagnóstico clínicos de síndromes de Vibrio dependem da existência de uma história de manuseio ou limpeza de frutos do mar, ingestão de frutos do mar ou exposição a águas salobras/oceânicas, principalmente quando associada a um hospedeiro com comorbidade subjacente (por exemplo, imunocomprometido, com doença hepática subjacente).

Infecções por Vibrio podem se manifestar como:

  • Sepse ou infecção sistêmica grave associada à ingestão de frutos do mar com ou sem celulite necrosante metastática ou gangrena simétrica periférica

  • Ferida no local da inoculação com infecção cutânea/de tecidos moles localizada com ou sem sepse ou infecção sistêmica grave

  • Síndromes de gastroenterite

  • Infecções superficiais por inoculação (isto é, conjuntivite, otite externa).

A sepse é definida por disfunção de órgãos com risco de vida causada por uma resposta desregulada do hospedeiro a uma infecção. O choque séptico é definido como um subconjunto de sepse com disfunção circulatória e celular ou metabólica associada a um risco mais alto de mortalidade.[42]

Sepse ou infecção sistêmica grave associada à ingestão de frutos do mar

O Vibrio vulnificus ou o Vibrio parahaemolyticus adquirido por ingestão de frutos do mar crus ou malcozidos pode produzir rapidamente choque séptico fatal em pacientes imunocomprometidos ou com doença hepática subjacente. Algumas horas ou dias após a ingestão dos frutos do mar, o paciente pode desenvolver sepse com coagulação intravascular disseminada (CIVD) e infecção necrosante de tecidos moles de membros inferiores metastática.

Se não houver lesões cutâneas presentes, outras causas de sepse (existem muitas) devem ser consideradas. Um alto nível de suspeita deve surgir se houver história médica de distúrbio hepático ou imunodeficiência, e consumo ou contato recente com frutos do mar.

Achados clínicos de sepse (por exemplo, febre, taquicardia, taquipneia) podem estar presentes, e o paciente pode parecer apreensivo. A doença grave se manifesta com a presença de evidências laboratoriais de disfunção de órgão, podendo haver obnubilação e confusão por parte do paciente. Em caso de choque séptico, o paciente está hipotenso e não tem boa resposta clínica à prova volêmica.

Exames que devem ser realizados incluem:

  • Hemograma completo com contagem diferencial e de plaquetas: uma contagem de leucócitos pode mostrar neutropenia e a contagem de plaquetas pode estar reduzida

  • Perfil metabólico básico: os níveis de bicarbonato podem estar reduzidos, indicando acidose metabólica; a creatinina pode estar elevada, sugerindo disfunção renal

  • O diagnóstico é confirmado por hemocultura: hemoculturas devem ser solicitadas antes do início do tratamento com antibióticos, caso isso não causa nenhum atraso substancial no tratamento (ou seja, <45 minutos).[42]

Em pacientes com suspeita clínica de sepse, porém ser confirmação, o lactato sanguíneo pode ser usado como exame diagnóstico adjuvante.[42] O diagnóstico de patógenos independentes da cultura foi relatado usando-se sequenciamento genético metagenômico de próxima geração.[43]

Para mais informações sobre o diagnóstico de sepse, consulte Sepse em adultos.

Infecção cutânea/de tecidos moles localizada associada à ferida no local da inoculação

A infecção associada à inoculação cutânea resulta da contaminação de uma lesão aberta por água salobra ou do mar ou de lesões penetrantes não cicatrizadas. A lesão pode evoluir ao longo de horas a dias, de uma celulite local para uma infecção necrosante de pele e de tecidos moles, e pode estar acompanhada por bacteremia e sepse em um hospedeiro suscetível (por exemplo, imunocomprometido, com doença hepática subjacente).[28][44]

Deve-se suspeitar do diagnóstico com base na história epidemiológica de exposição a frutos do mar e/ou exposição a águas salobras/oceânicas de uma ferida aberta existente ou uma ferida perfurante adquirida em ambiente marinho.

Os achados clínicos variam dependendo do nível de envolvimento dos tecidos moles, da ocorrência de bacteremia e da resposta sistêmica do hospedeiro à infecção.

Exames que devem ser realizados incluem:

  • Hemograma completo com diferencial e contagem de plaquetas: a contagem de leucócitos pode estar elevada, normal ou reduzida. As plaquetas podem estar normais ou diminuídas

  • Perfil metabólico básico: os níveis de bicarbonato podem estar reduzidos, indicando acidose metabólica; a creatinina pode estar elevada, sugerindo disfunção renal

  • A hemocultura pode identificar o agente causador: hemoculturas devem ser solicitadas antes do início do tratamento com antibióticos, caso isso não causa nenhum atraso substancial no tratamento (ou seja, <45 minutos)[42]

  • Coloração de Gram e cultura da ferida: deve-se passar o swab no líquido das bolhas cutâneas e na base da úlcera para coloração de Gram. Uma coloração que demonstra bastonetes gram-negativos em um paciente com comorbidades subjacentes e exposição a frutos do mar ou à água do mar sugere infecção por Vibrio.

  • Exames diagnósticos independentes de cultura: podem ser usados para identificar vibriões, mas uma amostra positiva deve ser confirmada por cultura sempre que possível.[45]​ A tecnologia de ionização-dessorção a laser assistida por matriz acoplada a espectroscopia de massas por tempo de voo (MALDI-TOF) pode ser usada para identificar rapidamente organismos em cultura.

  • [Figure caption and citation for the preceding image starts]: Alteração gangrenosa com bolhas hemorrágicas em um paciente com cirrose que desenvolveu choque séptico e bacteremia por Vibrio vulnificusDa coleção de imagens dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@711039d0[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Lesão por inoculação de Vibrio vulnificus com celulite precoceDa coleção de imagens dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@1e3bd282[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Bacilos curvos gram-negativos (seta) isolados de uma amostra de sangueDa coleção de imagens dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@1d60fd85

Síndromes de gastroenterite

A ingestão de frutos do mar crus ou malcozidos pode resultar, em 24 a 72 horas, em gastroenterite caracterizada por cólica abdominal e diarreia aquosa. Pode ocorrer febre, e a diarreia pode conter muco e/ou sangue. Em hospedeiros saudáveis, a doença geralmente é autolimitada.[46]​ Pode ocorrer como sintomas concomitantes à sepse em hospedeiros comprometidos.[4][28][35]

A suspeita do diagnóstico deve surgir a partir da história de consumo recente de frutos do mar. Os vibriões crescem bem, mas podem não ser prontamente identificados nos meios de cultura de rotina usados pelo laboratório clínico para isolamento de patógeno nas fezes.

Os exames incluem:

  • Coprocultura: quando há suspeita de infecção por Vibrio e, particularmente, V parahaemolyticus, a coprocultura em um meio seletivo para Vibrio (isto é, meio de cultura de tiossulfato-citrato-sais biliares-sacarose [TCBS]) deve ser solicitada na investigação da diarreia.[47]​ O diagnóstico diferencial da diarreia associada a alimentos inclui Salmonella, Shigella, Campylobacter e norovírus, entre outros patógenos[48]

  • Exames de rotina de ureia e eletrólitos: indicados para avaliar o grau de desidratação do paciente e da acidose metabólica resultante da perda de eletrólitos nas fezes

  • Hemocultura: indicada se o paciente estiver febril ou tiver outros sinais de possível sepse.

  • Exame diagnóstico independente de cultura: pode ser usado para identificar vibriões, por exemplo, amostra de fezes testada com reação em cadeia da polimerase diagnóstica. As amostras positivas devem ser confirmadas por cultura sempre que possível.[45]​ A tecnologia de ionização-dessorção a laser assistida por matriz acoplada a espectroscopia de massas por tempo de voo (MALDI-TOF) pode ser usada para identificar rapidamente organismos em cultura.

Infecções superficiais por inoculação

Há relatos de que vibriões não coléricos causam infecções oftálmicas e otológicas, como otite externa, conjuntivite, ceratite ou endoftalmite, após lesões causadas por fragmentos de concha, contaminação por água do mar ou feridas penetrantes.[3][4]

Sinais e sintomas de infecção otológica por Vibrio não colérico mimetizam outras causas de otite externa. O diagnóstico é sugerido pelo isolamento de um Vibrio em culturas do meato acústico externo, e melhora clínica insatisfatória ou lenta com antibióticos tópicos que contêm polimixina, bacitracina e neomicina. No caso de infecção oftálmica, o diagnóstico é feito por esfregaço com coloração de Gram, cultura e testes de sensibilidade in vitro dos isolados de amostras oculares apropriadas (isto é, swab conjuntival, raspagem de córnea e aspirados da câmara anterior ou posterior para conjuntivite, ceratite, hipópio ou endoftalmite, respectivamente).

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