Abordagem

As infecções virais são as causas mais comuns de labirintite. Geralmente elas ocorrem em adultos, enquanto a labirintite bacteriana purulenta é mais comum em crianças com propensão a otite. A labirintite serosa, diferentemente da supurativa, é ainda mais comum em pacientes adultos e pediátricos.

O diagnóstico diferencial dos pacientes que apresentam tontura e vertigem muitas vezes pode ser direcionado com uma história aprofundada e exames físicos. Estudos de imagem (por exemplo, ressonância nuclear magnética [RNM] e tomografia computadorizada [TC]) geralmente são solicitados, pois pacientes com neoplasias da fossa posterior podem ter uma variedade de apresentações que podem mimetizar outros distúrbios vestibulares. Qualquer pessoa que apresente sintomas unilaterais na orelha interna deve ser investigada quanto à presença de alguma patologia retrococlear. Os tumores da fossa posterior incluem schwannoma vestibular (neuroma acústico), meningiomas, tumores de cerebelo ou de tronco encefálico, e cistos epidermoides.

História

Os pacientes com labirintite geralmente apresentam tontura rotatória grave e náuseas e vômitos associados. Eles podem apresentar perda auditiva unilateral e zumbido na orelha. A perda auditiva é neurossensorial (ou seja, relacionada ao ouvido interno/oitavo nervo craniano), e não condutora (ou seja, devida a causas do ouvido médio). A perda auditiva significativa, com ou sem zumbido associado, diferencia a labirintite da neurite vestibular.[1] A vertigem aguda pode durar até 72 horas e é geralmente acompanhada de desequilíbrio persistente (problemas de equilíbrio) e vertigem breve (que dura apenas alguns segundos) após movimentos rápidos da cabeça ou do corpo.[4] Se o paciente tiver mais de um episódio de tontura rotatória, deve-se considerar o diagnóstico de doença de Menière. Embora a vertigem possa ser causada por doenças infecciosas, há várias causas potenciais que precisam ser descartadas (por exemplo, vertigem pós-traumática ou vertigem de origem cerebrovascular).

Perguntas importantes que são essenciais para estabelecer o diagnóstico incluem:

  • Você poderia descrever a tontura que sente (por exemplo, rotatória, desequilíbrio, flutuante, sensação de desfalecimento)? Tontura é um termo amplo, e essa pergunta ajuda a determinar a sensação real do paciente.

  • Conte-me sobre seu primeiro episódio de vertigem. Qual foi a duração deste episódio? Isso pode ajudar o médico a determinar se o paciente teve labirintite ou neurite vestibular.

  • Qual a duração de suas tonturas atuais? A investigação da duração dos períodos de tontura do paciente pode fornecer informações importantes para o diagnóstico.

  • Você já teve algum episódio prévio de tontura ou vertigem? A vertigem recorrente ajuda também a estabelecer melhor o diagnóstico diferencial.

  • Você apresenta algum outro sintoma associado (ou seja, perda auditiva, zumbido, plenitude auricular etc.)? Sintomas auditivos concomitantes à tontura aumentam a probabilidade de a fonte da tontura ser periférica.

  • Mudanças de posição do corpo lhe causam tontura? Uma resposta positiva a essa pergunta restringe o diferencial às seguintes possibilidades: vertigem posicional paroxística benigna, ortostasia, vestibulopatia periférica descompensada ou vestibulopatia bilateral.

  • Você tem história de cefaleia (por exemplo, enxaqueca, tensão muscular)? Uma resposta positiva aumenta a probabilidade de que a enxaqueca seja a fonte de tontura.

  • Você iniciou algum medicamento novo ou alterou algum medicamento? Existem vários medicamentos que podem causar tontura.

  • O que faz sua tontura melhorar ou piorar? A tontura associada ao movimento ajuda a estabelecer melhor o diagnóstico diferencial.

  • Você teve infecção do trato respiratório superior recentemente? Uma resposta positiva pode indicar neurite vestibular.

É essencial avaliar outros sintomas neurológicos como disartria, disfagia, dor ou dormência facial, fraqueza facial, fraqueza ou dormência nos membros, já que eles podem apontar para um acidente vascular cerebral envolvendo o tronco encefálico.[15]

Várias ferramentas, como o inventário das deficiências da vertigem e o SF-36, podem ser usadas para avaliar o impacto da tontura na qualidade de vida do paciente.[16]

Outra abordagem que se concentra na avaliação da tontura, conhecida como abordagem TiTrATE (do inglês, Timing, Triggers, And Targeted Exams, ou seja, tempo, gatilhos e exames direcionados), examina o tempo e os possíveis gatilhos dos sintomas para ajudar a diagnosticar a causa.[17]

Exame físico

Pacientes que apresentam quadro agudo podem apresentar significativa dificuldade de andar. É também frequente a presença de nistagmo horizonto-rotatório espontâneo (movimento rápido e involuntário dos olhos) com a fase rápida indo em direção à orelha não envolvida.[18]

O equilíbrio do paciente deve ser avaliado usando um teste de Romberg e de marcha tandem.[18] Os pacientes provavelmente não conseguirão realizar marcha tandem (andar com um pé diretamente na frente do outro, em tandem), e podem cair no teste de Romberg (ficar de pé com os pés juntos e os olhos fechados).

O exame com diapasão de 512 Hz (colocando o diapasão na testa ou nos dentes maxilares e perguntando ao pacientes em que orelha o som estava mais alto) pode localizar rapidamente a orelha afetada e determinar se a perda auditiva é neurossensorial ou condutiva. O som será percebido na orelha afetada quando houver perda auditiva condutiva unilateral, ou na orelha não afetada quando houver perda auditiva neurossensorial unilateral. O resultado deste teste é combinado com o resultado do teste de Rinne para interpretar o tipo de perda auditiva.[19]

O teste de Rinne permite que o examinador determine se a perda auditiva se deve a causas na orelha média (perda auditiva condutiva) ou orelha interna/oitavo nervo craniano (perda auditiva neurossensorial). A base do diapasão de 512-Hz é colocada na mastoide e o paciente indica quando não consegue mais ouvir o som. Assim que o som não for mais audível, o diapasão é colocado na frente da orelha e o paciente responde quando está conseguindo ouvir o som. Se o som estiver alto quando o diapasão estiver na mastoide, o paciente tem perda auditiva condutiva. Se o som estiver mais alto com o diapasão na frente da orelha, a perda auditiva é neurossensorial ou a audição é normal.

Um exame profundo da orelha com um otoscópio ou microscópio permite um diagnóstico de otite média e colesteatoma. A presença de otorreia deve alertar o médico quanto à presença de otite média crônica ou aguda com perfuração da membrana timpânica. Uma inspeção cuidadosa de toda a membrana timpânica deve identificar um colesteatoma, a menos que haja uma grande quantidade de debris no meato acústico externo que obscureça a visualização.[Figure caption and citation for the preceding image starts]: Colesteatoma no ouvido médioDo acervo do Professor Brandon Isaacson; usado com permissão [Citation ends].com.bmj.content.model.Caption@790f6d7b

Não deve haver evidências de outros deficits neurológicos, como fraqueza nos membros inferiores e superiores, rouquidão ou fraqueza facial ou dormência. Constatou-se que o exame oculomotor à beira do leito, composto por três etapas - teste do impulso da cabeça, nistagmo e teste do skew (desalinhamento vertical) - identifica o AVC com alto grau de sensibilidade e especificidade em pacientes com sintomas vestibulares agudos e pode descartar o AVC de modo mais eficiente que a RNM ponderada por difusão.[20] Com base no modelo HINTS, um algoritmo sugere que o AVC deve ser considerado em pacientes que apresentam início agudo de tontura caso:[21]

  • Haja um padrão central de nistagmo

  • Haja desvio do nistagmo vertical (skew deviation)

  • o teste do impulso da cabeça seja negativo (em pacientes com nistagmo)

  • haja algum sinal do sistema nervoso central ao exame neurológico dirigido, ou

  • o paciente não consiga se sentar ou andar sem auxílio.

A presença de sinais meníngeos deve ser investigada se a meningite bacteriana for uma possibilidade. Por exemplo, observa-se uma erupção cutânea em 80% a 90% dos pacientes com meningite meningocócica, mais comumente 4 a 18 horas após os sintomas iniciais da doença. Normalmente, a erupção cutânea apresenta-se como um exantema purpúreo ou petequial que não desaparece após compressão, mas alguns poucos pacientes podem apresentar inicialmente lesões eritematosas maculares ou maculopapulares inespecíficas.

Deve-se examinar a função cerebelar pedindo ao paciente que realize as provas dedo-nariz, calcanhar-joelho e movimentos rápidos alternados.[15]

Audiometria

O exame audiométrico é útil para documentar a extensão da perda auditiva e confirmar a orelha afetada. Geralmente, a perda auditiva é do tipo neurossensorial. No entanto, os pacientes com malformações na orelha interna (ou seja, aqueduto vestibular aumentado) podem apresentar sintomas semelhantes, e uma mistura de perda auditiva com diversos componentes neurossensoriais.

Os testes vestibulares com eletronistagmografia, teste da cadeira rotatória e potencial evocado miogênico vestibular não são indicados no quadro agudo. No entanto, esses testes podem fornecer informações adicionais sobre a compensação vestibular e testes no local da lesão depois que o paciente tiver se recuperado do estágio agudo da labirintite.[18]

Exames laboratoriais

Os pacientes com labirintite após uma meningite bacteriana devem realizar culturas adequadas do líquido cefalorraquidiano. Outros testes sorológicos para sífilis e vírus da imunodeficiência humana (HIV) podem ser justificados se a apresentação for atípica ou se o paciente tiver outros fatores de risco.[22] Se os testes sorológicos forem negativos, pode haver suspeita de doenças autoimunes (por exemplo, síndrome de Cogan ou doença de Behçet).[5] Para pacientes com náuseas e vômitos intensos, um perfil metabólico básico deve ser avaliado para selecionar a reposição adequada de cristaloides e eletrólitos. Avalie a glicose sanguínea capilar em todos os pacientes com suspeita de AVC e providencie uma neuroimagem urgente.[23]

Exames por imagem

O exame de imagem pode ajudar a descartar diagnósticos diferenciais.

Em caso de suspeita de AVC agudo, o exame de TC de crânio pode identificar a ocorrência de infarto e fornecer informações suficientes para a tomada de decisão sobre o tratamento agudo.[23] Pode-se determinar a extensão do infarto com o exame de RNM subsequente do crânio com imagem ponderada por difusão. Caso haja suspeita de fratura do osso temporal, o exame de TC de crânio pode determinar a extensão da fratura.[24] A RNM ou a TC de crânio podem revelar malformações do ouvido interno e neoplasia do osso temporal. O exame de TC do osso petroso temporal pode mostrar evidências de opacificação do ouvido médio ou do processo mastoide e deve ser solicitado se houver suspeita de que o paciente apresenta mastoidite. A TC pode também ser útil em pacientes com suspeita de deiscência do canal semicircular superior e, também, para confirmar o colesteatoma.[25][26]

Qualquer paciente com perda auditiva assimétrica deve ser submetido a uma avaliação coclear com ressonância nuclear magnética (RNM) com gadolínio a fim de investigar outras causas da perda auditiva. Por exemplo, mais de 10% dos pacientes com schwannoma vestibular (neuroma acústico) apresentam perda auditiva súbita. O realce labiríntico na RNM com gadolínio no quadro de meningite é um preditor significativo de perda auditiva.[27]

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